O transplante e a questão da alteridade: biologia e subjetividade

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Soares, Teresa Cristina
Data de Publicação: 2009
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Institucional da FIOCRUZ (ARCA)
Texto Completo: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/2572
Resumo: O desenvolvimento do conceito de corpo é marcado pela visão dissociada do homem em sua relação com a natureza, com conseqüentes implicações na epidemiologia. Este estudo tem a perspectiva de entender o corpo como integrado numa rede de elementos constitutivos, numa dinâmica de interações entre seus componentes e entre estes e outros seres e seu ambiente. Esta dinâmica se dá num contexto de alteridade, entendida não apenas no sentido das relações humanas, mas na sua acepção original, como “qualidade do que é outro”. Estudos recentes da biologia permitem supor um elo entre a questão da alteridade e suas raízes biológicas, integrando-a aos processos do adoecer. A capacidade de ação, de rearranjo do ser vivo em uma dinâmica de relações regulatórias e a noção de identidade são considerados na discussão dos fenômenos imunes. A alteridade aqui é vista como inata e biológica, no interior da qual a subjetividade é construída. Não há como considerar a alteridade sem aludir à subjetividade e à individualidade. Estes aspectos aparecem com clareza na experiência do transplante. Para desvendá-la, foi realizado um estudo qualitativo com base na abordagem fenomenológica, inspirado nas teorias da complexidade e referenciado por aporte teórico de vários saberes, num diálogo interdisciplinar. Foram realizadas vinte entrevistas em profundidade com pessoas que passaram pela experiência do transplante, independentemente do tipo de transplante realizado, do sexo ou grau de instrução. Após análise, foram identificadas as seguintes unidades de significado: a doença, um susto; riqueza de detalhes: a memória do corpo; qualidade (?) de vida antes do transplante; o tempo de espera; um telefonema: o chamado para uma nova vida; acordando diferente: começo de uma nova história; o estranhamento; alteridade: dívida, dádiva e gratidão; a dívida negativa; rejeição: a ameaça que vem de dentro; a dívida positiva; doadores vivos; nascendo de novo: uma vida “praticamente normal”; mudança de valores: o transplante como um caminho de transformação; a rede de alteridade – conexões e esgarçamentos. Estas unidades de significado deram origem a quatro grandes temas que foram distribuídos nos seguintes capítulos: A Vida Antes do Transplante; O Transplante de (uma nova) Vida; Paradoxos da Alteridade: fechamento e abertura; A Vida Depois do Transplante. O estudo conclui considerando que tudo o que o homem é está enraizado na sua biologia, nela incluída e justaposta a dimensão subjetiva. A dimensão subjetiva humana é cunhada nas interações com os outros e com o meio. O ser humano (e, acreditamos, todo ser vivo) é constitutivamente relacional. Está, portanto, atrelado a uma dinâmica de alteridade, vivida de maneira radical pela pessoa transplantada. Sugere, assim, a conclusão de que não há separação entre mente e corpo, embora ainda subsista uma ponte a construir sobre o conhecimento para transpor o hiato entre as questões biológicas, as práticas intervencionistas e a experiência subjetiva.