Causalidade circular e causação mental: uma saída para a oposição internalismo versus externalismo?

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Haselager, Willem Ferdinand Gerardus
Data de Publicação: 2002
Outros Autores: Gonzalez, Maria E. Q.
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Manuscrito (Online)
Texto Completo: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/manuscrito/article/view/8644654
Resumo: O debate internalismo versus externalismo é frequentemente construído na forma de uma oposição direta entre conteúdo mental e causação mental. Tal oposição reforça uma tendência a se tomar partido no debate. Alguns sustentam que o fisicalismo falhou, uma vez que não existe uma explicação sobre o papel do conteúdo mental externo na causação interna do comportamento. Outros (notavelmente Jaegwon Kim) tomam o partido do fisicalismo e argumentam que ele não deixa lugar para um papel causal do conteúdo mental (ou para a mente em geral). Defendemos aqui a hipótese de que o debate internalismo versus externalismo não necessita de um vencedor e propomos a dissolução de tal oposição. Indicaremos uma saída para essa disputa focalizando a suposição fisicalista segundo a qual o conteúdo mental não pode desempenhar um papel causal genuíno na produção do comportamento. De acordo com Kim, o fisicalismo nos coloca diante de um dilema: o mental pode ser reduzido ao físico ou, alternativamente, o mental não pode ser reduzido ao físico. No primeiro caso, o conteúdo mental torna-se um mero epifenômeno. No segundo, a irredutibilidade do mental deixa inexplicado, e, portanto misterioso, o seu poder causal. Diferentemente de Kim, procuraremos escapar do dilema sugerido, ao mesmo tempo em que preservaremos o fisicalismo. Procuraremos mostrar que o dilema “epifenomenalize ou mistifique” é falso, uma vez que ele pressupõe uma concepção de explicação e de redução que, embora seja predominante na ciência cognitiva, não leva em consideração a natureza dinâmica da cognição. Uma análise cuidadosa da estratégia explanatória cognitivista – i.e redução via análise funcional (decomposição e localização) – revela que ela é válida apenas para sistemas nos quais a interação entre os seus componentes internos é mínima. Tal análise coincide com a visão cognitivista da mente entendida como um sistema composto por representações mentais. Sustentaremos que a mente é um sistema incorporado e situado, cuja natureza dinâmica não pode ser explicada pela estratégia cognitivista tradicional. Como ocorre frequentemente com os sistemas dinâmicos, a causalidade circular se faz presente, o que significa dizer que variáveis de ordem superior, no plano macroscópico, restringem o comportamento dos componentes de ordem inferior, no plano microscópico. Esta noção de causalidade circular indica a importância de variáveis no plano macroscópico para os processos que operam no plano microscópico. Forneceremos exemplos de aplicação da causalidade circular na cognição para ilustrar a inadequação das estratégias explanatórias reducionistas tradicionais. Concluiremos, então, que o dilema proposto por Kim pressupõe um modelo de explicação reducionista que é inapropriado para abordar os aspectos dinâmicos da cognição. Mais especificamente, argumentaremos que o fisicalismo não conduz ao epifenomenalismo nem ao mistério. De modo geral, sustentamos que uma compreensão apropriada da natureza dinâmica da cognição pode fornecer uma saída para a oposição perene entre externalismo e internalismo.
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