Da forma ao pó
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2022 |
Tipo de documento: | Dissertação |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP |
Texto Completo: | https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16133/tde-29072022-183452/ |
Resumo: | Aqui tudo parece que era ainda construção e já é ruína, cantou Caetano Veloso, em 1991, parafraseando Claude Lévi-Strauss, alertando que algo andava fora da ordem. Um paradoxo anunciado: dois extremos aproximados de um mesmo processo. Por um lado, a construção, desejo humano de dar forma à matéria. Por outro, o arruinamento, a natureza, e o tempo que esfacela construções a pó. No entanto, aquilo que ainda era, já é, como se o processo característico entre a construção e a ruína tivesse sido embaralhado ou se encontrasse num entrave. A contradição se revela pelo ato que não se realiza por completo, e que, antes que se possa concluir, já parece estar condenado à sua estruição. A metáfora, apropriada pelo antropólogo belga, parece procurar representar as mais diversas contradições brasileiras, reveladas no esforço em conferir forma a este jovem país-nação, na coexistência entre suas faces arcaicas e modernas. Anunciada pela ideia de construção, ou seja, de projeto a se edificar, a metáfora faz referência ao gesto fundamental da arquitetura, bem como às dimensões inexoráveis de seu iminente fim, o de se tornar ruína. O nó, ou o ciclo do processo que não se realiza, parece uma das questões centrais da arte no Brasil a partir dos anos 1960, em consonância com o singular contexto brasileiro, como bem nota o crítico de arte Rodrigo Naves, em seu livro A forma difícil. Desvelado no próprio esforço em dar forma à matéria, tal indício é elemento fundamental para esta reflexão, especialmente em determinados trabalhos de Nuno Ramos, Laura Vinci e Brígida Baltar, atravessados por obras literárias como as de Carlos Drummond de Andrade e Clarice Lispector. Neste recorte, o embate com os processos de formalização é questão central. Por vezes, como uma espécie de recusa, salientados pelo caráter arredio da matéria, como o pó e a lama. Em outras, por mimetizarem os processos naturais e entrópicos de transformação da matéria, como maciços de pedra reduzidos a pó. Ou seja, trabalhos que se dão pelo impasse entre a matéria que não estaria completamente sujeita à forma ainda que tampouco fosse a completa negação da forma , bem como não se realizaria se não pelo fracasso da própria forma, em uma operação informe, em referência ao termo utilizado pelo pensador francês Georges Bataille. Dito de outro modo, era como se, dentro de um esforço racional (de dar forma às coisas), pudesse haver a possibilidade de alguma imprevisibilidade (inerente à própria matéria), uma subversão ao desejo comum dissimulado em paradigmas como ordenação, estruturação e coesão. Da forma ao pó é fruto da reflexão sobre os processos de formalização e dissolução da matéria, procurando desvelar, em visão mais ampla, as contradições que o enfrentamento com a matéria do mundo implica nas artes visuais. Em constante diálogo com elementos da arquitetura como projeto, construção, arruinamento e reconstrução , o ato e o esforço de se pensar da forma ao pó poderia ser também a expressão do controverso desejo de se dar forma ao pó. |
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Da forma ao póFrom form to dustArte brasileiraBrazilian artBrígida BaltarBrígida BaltarFormFormaFormlessGeorges BatailleGeorges BatailleInformeLaura VinciLaura VinciMatériaMatterNuno RamosNuno RamosAqui tudo parece que era ainda construção e já é ruína, cantou Caetano Veloso, em 1991, parafraseando Claude Lévi-Strauss, alertando que algo andava fora da ordem. Um paradoxo anunciado: dois extremos aproximados de um mesmo processo. Por um lado, a construção, desejo humano de dar forma à matéria. Por outro, o arruinamento, a natureza, e o tempo que esfacela construções a pó. No entanto, aquilo que ainda era, já é, como se o processo característico entre a construção e a ruína tivesse sido embaralhado ou se encontrasse num entrave. A contradição se revela pelo ato que não se realiza por completo, e que, antes que se possa concluir, já parece estar condenado à sua estruição. A metáfora, apropriada pelo antropólogo belga, parece procurar representar as mais diversas contradições brasileiras, reveladas no esforço em conferir forma a este jovem país-nação, na coexistência entre suas faces arcaicas e modernas. Anunciada pela ideia de construção, ou seja, de projeto a se edificar, a metáfora faz referência ao gesto fundamental da arquitetura, bem como às dimensões inexoráveis de seu iminente fim, o de se tornar ruína. O nó, ou o ciclo do processo que não se realiza, parece uma das questões centrais da arte no Brasil a partir dos anos 1960, em consonância com o singular contexto brasileiro, como bem nota o crítico de arte Rodrigo Naves, em seu livro A forma difícil. Desvelado no próprio esforço em dar forma à matéria, tal indício é elemento fundamental para esta reflexão, especialmente em determinados trabalhos de Nuno Ramos, Laura Vinci e Brígida Baltar, atravessados por obras literárias como as de Carlos Drummond de Andrade e Clarice Lispector. Neste recorte, o embate com os processos de formalização é questão central. Por vezes, como uma espécie de recusa, salientados pelo caráter arredio da matéria, como o pó e a lama. Em outras, por mimetizarem os processos naturais e entrópicos de transformação da matéria, como maciços de pedra reduzidos a pó. Ou seja, trabalhos que se dão pelo impasse entre a matéria que não estaria completamente sujeita à forma ainda que tampouco fosse a completa negação da forma , bem como não se realizaria se não pelo fracasso da própria forma, em uma operação informe, em referência ao termo utilizado pelo pensador francês Georges Bataille. Dito de outro modo, era como se, dentro de um esforço racional (de dar forma às coisas), pudesse haver a possibilidade de alguma imprevisibilidade (inerente à própria matéria), uma subversão ao desejo comum dissimulado em paradigmas como ordenação, estruturação e coesão. Da forma ao pó é fruto da reflexão sobre os processos de formalização e dissolução da matéria, procurando desvelar, em visão mais ampla, as contradições que o enfrentamento com a matéria do mundo implica nas artes visuais. Em constante diálogo com elementos da arquitetura como projeto, construção, arruinamento e reconstrução , o ato e o esforço de se pensar da forma ao pó poderia ser também a expressão do controverso desejo de se dar forma ao pó.Here everything seems to be still under construction and already in ruins, sang Caetano Veloso, in 1991, paraphrasing Claude Lévi-Strauss, warning that something was out of order. An announced paradox: two approximate extremes of the same process. On the one hand, construction, the human desire to give form to matter. On the other hand, ruin, nature, and time crumbling buildings to dust. However, what still was, now it is, as if the characteristic process between construction and ruin had been shuffled or found itself in an obstacle. The contradiction is revealed by the act that is not carried out completely, and which, before it can be concluded, already seems to be doomed to its destruction. The metaphor, appropriated by the Belgian anthropologist, seems to try to represent the most diverse Brazilian contradictions, revealed in the effort to give form to this young country-nation, in the coexistence between its archaic and modern faces. Announced by the idea of onstruction, that is, of a project to be built, the metaphor refers to the fundamental gesture of architecture, as well as to the inexorable dimensions of its imminent end, that of becoming a ruin. The knot, or the cycle of the process that does not take place, seems to be one of the central issues of art in Brazil from the 1960s onwards, in line with the unique Brazilian context, as noted by art critic Rodrigo Naves, in his book A forma difícil. Unveiled in the very effort to give form to the matter, such evidence is a fundamental element for this research, especially in certain works by Nuno Ramos, Laura Vinci, and Brígida Baltar, crossed by literary works such as those by Carlos Drummond de Andrade and Clarice Lispector. In this excerpt, the clash with the formalization processes is a central issue. Sometimes, as a kind of refusal, highlighted by the withdrawable character of matter, like dust and mud. In others, because they mimic the natural and entropic processes of matter transformation, such as stone masses reduced to dust. That is, works that occur due to the impasse between the matter that would not be completely subject to the formeven if it were not the complete negation of the form, as well as would not be carried out if not for the failure of the form itself, in a formless operation, in reference to the term used by the French thinker Georges Bataille. In other words, it was as if, within a rational effort (to give form to things), there could be the possibility of some unpredictability (inherent in matter itself), a subversion to the common desire hidden in paradigms such as ordering, structuring, and cohesion. From form to dust is the result of the research on the processes of formalization and dissolution of matter, seeking to unveil, in a broader view, the contradictions that the confrontation with the matter of the world implies in the visual arts. In constant dialogue with architectural elementssuch as design, construction, ruination, and reconstruction, the act and effort to think from form to dust could also be the expression of the controversial desire to give form to dust.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPWisnik, Guilherme TeixeiraBritto, Fernanda2022-03-18info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/16/16133/tde-29072022-183452/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2022-08-02T14:52:35Zoai:teses.usp.br:tde-29072022-183452Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212022-08-02T14:52:35Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false |
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