Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Mesquita, José Carlos Vilhena
Data de Publicação: 2018
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10400.1/12183
Resumo: O suplício e a humilhação pública infligidos a Felipa de Sousa, pelo horrendo Tribunal do Santo Ofício, não podem ser esquecidos, merecendo ser sempre rememorado como algo que avilta e indigna a liberdade de género, que oblitera a opção sexual, que agride a tolerância e impede a integração social, que, em suma, impossibilita o direito à diferença. Foi através do sacrifício de muitas mulheres que, como Felipa de Sousa, sofreram a opressão sexista e foram ostracizadas ou estigmatizadas devido às suas opções sexuais, que as mentalidades avançaram no sentido da tolerância, da integração e do reformismo no mundo. Felizmente, na civilização ocidental o processo histórico avançou no sentido da conquista das liberdades e direitos individuais – desde a luta do sufragismo e do feminismo até à igualdade plena de género. Todavia, é de todos sabido que ainda existem por esse mundo muitas centenas de milhões de mulheres, que se sentem privadas da sua liberdade sexual e da sua opção de género. É para essas mulheres, que nunca puderam revelar o seu desejo nem expressar livremente a sua preferência sexual, que escrevi este artigo, personificando na memória de Felipa de Sousa, uma homenagem a todas as mulheres dos cinco continentes que ainda não desfrutam do direito de poderem expressar livremente as suas afeições, as suas preferências sexuais e o livre arbítrio no amor. A 18 de Dezembro de 1591, em Salvador da Bahia – uma das mais ricas e mais prósperas cidades do Brasil –, os esbirros da Inquisição após persistente interrogatório, conseguiram obter da cristã-velha, Paula de Siqueira, de 38 anos de idade, a denúncia de haver praticado o “abominável pecado nefando” da «sodomia foeminarum», isto é, o sacrilégio da contranatura, com uma mulher de 35 anos, chamada Felipa de Sousa, natural de Tavira, no reino do Algarve. Deste modo, tão imprevisto quanto surpreendente, emergiu ao conhecimento público o primeiro caso de perseguição sexual e de condenação da prática de lesbianismo pelo Tribunal do Santo Ofício em terras de Vera Cruz. A singularidade deste tipo de flagício herético, o modo como o processo foi dirimido pelo Inquisidor, e sobretudo o facto da principal vítima ser uma mulher algarvia, de quem se ignorava a própria existência, mas que é hoje um símbolo universal da liberdade de género e da opção sexual, levou-me a escrever este trabalho, não apenas por curiosidade académica, mas também por solidariedade com os que sofrem a exclusão, o opróbrio e o estigma da diferença.
id RCAP_428c327d216d6f9e706e401db3ce76a6
oai_identifier_str oai:sapientia.ualg.pt:10400.1/12183
network_acronym_str RCAP
network_name_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository_id_str
spelling Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"BrasilSodomiaInquisiçãoAuto-de-FéLesbianismoAlgarveTaviraTorturaO suplício e a humilhação pública infligidos a Felipa de Sousa, pelo horrendo Tribunal do Santo Ofício, não podem ser esquecidos, merecendo ser sempre rememorado como algo que avilta e indigna a liberdade de género, que oblitera a opção sexual, que agride a tolerância e impede a integração social, que, em suma, impossibilita o direito à diferença. Foi através do sacrifício de muitas mulheres que, como Felipa de Sousa, sofreram a opressão sexista e foram ostracizadas ou estigmatizadas devido às suas opções sexuais, que as mentalidades avançaram no sentido da tolerância, da integração e do reformismo no mundo. Felizmente, na civilização ocidental o processo histórico avançou no sentido da conquista das liberdades e direitos individuais – desde a luta do sufragismo e do feminismo até à igualdade plena de género. Todavia, é de todos sabido que ainda existem por esse mundo muitas centenas de milhões de mulheres, que se sentem privadas da sua liberdade sexual e da sua opção de género. É para essas mulheres, que nunca puderam revelar o seu desejo nem expressar livremente a sua preferência sexual, que escrevi este artigo, personificando na memória de Felipa de Sousa, uma homenagem a todas as mulheres dos cinco continentes que ainda não desfrutam do direito de poderem expressar livremente as suas afeições, as suas preferências sexuais e o livre arbítrio no amor. A 18 de Dezembro de 1591, em Salvador da Bahia – uma das mais ricas e mais prósperas cidades do Brasil –, os esbirros da Inquisição após persistente interrogatório, conseguiram obter da cristã-velha, Paula de Siqueira, de 38 anos de idade, a denúncia de haver praticado o “abominável pecado nefando” da «sodomia foeminarum», isto é, o sacrilégio da contranatura, com uma mulher de 35 anos, chamada Felipa de Sousa, natural de Tavira, no reino do Algarve. Deste modo, tão imprevisto quanto surpreendente, emergiu ao conhecimento público o primeiro caso de perseguição sexual e de condenação da prática de lesbianismo pelo Tribunal do Santo Ofício em terras de Vera Cruz. A singularidade deste tipo de flagício herético, o modo como o processo foi dirimido pelo Inquisidor, e sobretudo o facto da principal vítima ser uma mulher algarvia, de quem se ignorava a própria existência, mas que é hoje um símbolo universal da liberdade de género e da opção sexual, levou-me a escrever este trabalho, não apenas por curiosidade académica, mas também por solidariedade com os que sofrem a exclusão, o opróbrio e o estigma da diferença.Arquivo Municipal de LouléSapientiaMesquita, José Carlos Vilhena2018-12-14T14:42:41Z2018-112018-11-01T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/articleapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10400.1/12183por0872-2323info:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2023-07-24T10:24:06ZPortal AgregadorONG
dc.title.none.fl_str_mv Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
title Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
spellingShingle Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
Mesquita, José Carlos Vilhena
Brasil
Sodomia
Inquisição
Auto-de-Fé
Lesbianismo
Algarve
Tavira
Tortura
title_short Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
title_full Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
title_fullStr Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
title_full_unstemmed Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
title_sort Felipa de Sousa, algarvia condenada na Inquisição pelo "pecado nefando da sodomia"
author Mesquita, José Carlos Vilhena
author_facet Mesquita, José Carlos Vilhena
author_role author
dc.contributor.none.fl_str_mv Sapientia
dc.contributor.author.fl_str_mv Mesquita, José Carlos Vilhena
dc.subject.por.fl_str_mv Brasil
Sodomia
Inquisição
Auto-de-Fé
Lesbianismo
Algarve
Tavira
Tortura
topic Brasil
Sodomia
Inquisição
Auto-de-Fé
Lesbianismo
Algarve
Tavira
Tortura
description O suplício e a humilhação pública infligidos a Felipa de Sousa, pelo horrendo Tribunal do Santo Ofício, não podem ser esquecidos, merecendo ser sempre rememorado como algo que avilta e indigna a liberdade de género, que oblitera a opção sexual, que agride a tolerância e impede a integração social, que, em suma, impossibilita o direito à diferença. Foi através do sacrifício de muitas mulheres que, como Felipa de Sousa, sofreram a opressão sexista e foram ostracizadas ou estigmatizadas devido às suas opções sexuais, que as mentalidades avançaram no sentido da tolerância, da integração e do reformismo no mundo. Felizmente, na civilização ocidental o processo histórico avançou no sentido da conquista das liberdades e direitos individuais – desde a luta do sufragismo e do feminismo até à igualdade plena de género. Todavia, é de todos sabido que ainda existem por esse mundo muitas centenas de milhões de mulheres, que se sentem privadas da sua liberdade sexual e da sua opção de género. É para essas mulheres, que nunca puderam revelar o seu desejo nem expressar livremente a sua preferência sexual, que escrevi este artigo, personificando na memória de Felipa de Sousa, uma homenagem a todas as mulheres dos cinco continentes que ainda não desfrutam do direito de poderem expressar livremente as suas afeições, as suas preferências sexuais e o livre arbítrio no amor. A 18 de Dezembro de 1591, em Salvador da Bahia – uma das mais ricas e mais prósperas cidades do Brasil –, os esbirros da Inquisição após persistente interrogatório, conseguiram obter da cristã-velha, Paula de Siqueira, de 38 anos de idade, a denúncia de haver praticado o “abominável pecado nefando” da «sodomia foeminarum», isto é, o sacrilégio da contranatura, com uma mulher de 35 anos, chamada Felipa de Sousa, natural de Tavira, no reino do Algarve. Deste modo, tão imprevisto quanto surpreendente, emergiu ao conhecimento público o primeiro caso de perseguição sexual e de condenação da prática de lesbianismo pelo Tribunal do Santo Ofício em terras de Vera Cruz. A singularidade deste tipo de flagício herético, o modo como o processo foi dirimido pelo Inquisidor, e sobretudo o facto da principal vítima ser uma mulher algarvia, de quem se ignorava a própria existência, mas que é hoje um símbolo universal da liberdade de género e da opção sexual, levou-me a escrever este trabalho, não apenas por curiosidade académica, mas também por solidariedade com os que sofrem a exclusão, o opróbrio e o estigma da diferença.
publishDate 2018
dc.date.none.fl_str_mv 2018-12-14T14:42:41Z
2018-11
2018-11-01T00:00:00Z
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
dc.type.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/article
format article
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv http://hdl.handle.net/10400.1/12183
url http://hdl.handle.net/10400.1/12183
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.relation.none.fl_str_mv 0872-2323
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.format.none.fl_str_mv application/pdf
dc.publisher.none.fl_str_mv Arquivo Municipal de Loulé
publisher.none.fl_str_mv Arquivo Municipal de Loulé
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron:RCAAP
instname_str Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron_str RCAAP
institution RCAAP
reponame_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
collection Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository.name.fl_str_mv
repository.mail.fl_str_mv
_version_ 1777303912632549376