Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Fernando Pessoa de Albuquerque
Data de Publicação: 2020
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: https://doi.org/10.11606/T.5.2020.tde-09022021-094039
Resumo: Esta pesquisa investigou as relações entre Homens e Saúde Mental, a partir da perspectiva de Gênero e dos Estudos sobre Masculinidades, analisando as expressões do sofrimento mental por homens usuários de serviços de atenção de psicossocial. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa em dois CAPS de Brasília-DF, com base em observações participantes em atividades de rotina dos serviços, entre 2017 e 2019, e 16 entrevistas semiestruturadas com usuários homens, selecionados durante as atividades observadas. Os dados foram categorizados em 4 eixos: exercício das masculinidades e sofrimentos mentais; o cuidado ofertado aos homens na Rede de Atenção Psicossocial; Uso de álcool e masculinidades, comportamentos violentos, saúde mental e masculinidades. Os homens entrevistados são majoritariamente negros, pobres, desempregados, migrantes, com baixa escolaridade, que vivenciam uma sobreposição de fatores de vulnerabilidade agravada pela vivência de transtornos mentais ou do uso prejudicial de substâncias psicoativas. Os achados revelaram que as expectativas não-realizadas sobre o que deve ser um \"homem de verdade\" interferem negativamente nas condições de saúde mental, levando os entrevistados a sentirem-se alijados da condição de homem, especialmente, por não trabalharem e não proverem a família. É possível asseverar que em um mundo marcado pelo domínio do capital, o valor de um homem é confundido pelo seu poder de compra e a falta de emprego estável é um abalo à identidade masculina, levando os entrevistados a assumirem comportamentos de risco para compensarem o distanciamento da Masculinidade Hegemônica, como o uso abusivo de álcool. Destaca-se que as opressões por classe e raça se interseccionam com os sofrimentos mentais de masculinidades subalternas, estigmatizadas pela \"doença mental\" e pelo uso abusivo de álcool. A expressão de emoções e sofrimentos representa um afastamento de um modelo idealizado do que é ser homem, relacionado ao sentimento de invulnerabilidade. Por isso, emocionar-se é interpretado, pelos usuários dos CAPS, como coisa de \"fresco\", \"fraco\" ou um \"fracasso\", o que dificulta o acesso e a adesão dos homens a cuidados em saúde mental. Observou-se que esse silenciamento das emoções opera por meio de mecanismos de defesa relacionados à negação, fuga, projeção e pela \"passagem ao ato\", especialmente pela expressão da raiva, emoção legitimada pela Masculinidade Hegemônica. Observou-se ainda a importante função psicodinâmica das bebidas alcoólicas no psiquismo dos homens e suas relações com a construção sociocultural das masculinidades, identificando-se o uso da \"cachaça\" como refúgio ou meio de obter coragem para expressar emoções ou comportamentos para restabelecer posições de poder nas relações, por meio de atos violentos, principalmente, contra as mulheres. Nos CAPS, foi possível identificar práticas de promoção à saúde mental masculina adequadas aos homens, como os Grupo terapêuticos de Homens, que permitem a problematização de padrões hegemônicos do que é \"ser homem\" e representam uma possibilidade de inclusão da perspectiva de gênero nos serviços de saúde mental. Avalia-se que os CAPS, ao reconhecerem questões de gênero envolvidas na experiência do sofrimento psíquico, podem contribuir para a desconstrução da imagem idealizada da masculinidade hegemônica, possibilitando a expressão das emoções e de novos modos de ser homem
id USP_adf64a696a1b5b7bfbd574ab8cf4e999
oai_identifier_str oai:teses.usp.br:tde-09022021-094039
network_acronym_str USP
network_name_str Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
repository_id_str 2721
spelling info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesis Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial Mental suffering and gender: men and care in the Psychosocial Attention Network 2020-09-22Lilia Blima SchraiberMarcia Thereza Couto FalcãoWagner dos Santos FigueiredoValeska Maria Zanello de LoyolaFernando Pessoa de AlbuquerqueUniversidade de São PauloMedicina (Medicina Preventiva)USPBR Alcohol drinking Consumo de bebidas alcoólicas Gender Gênero Interseccionalidade Intersectionality Masculinidade Masculinities Mental health Men´s health Saúde do homem Saúde mental Esta pesquisa investigou as relações entre Homens e Saúde Mental, a partir da perspectiva de Gênero e dos Estudos sobre Masculinidades, analisando as expressões do sofrimento mental por homens usuários de serviços de atenção de psicossocial. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa em dois CAPS de Brasília-DF, com base em observações participantes em atividades de rotina dos serviços, entre 2017 e 2019, e 16 entrevistas semiestruturadas com usuários homens, selecionados durante as atividades observadas. Os dados foram categorizados em 4 eixos: exercício das masculinidades e sofrimentos mentais; o cuidado ofertado aos homens na Rede de Atenção Psicossocial; Uso de álcool e masculinidades, comportamentos violentos, saúde mental e masculinidades. Os homens entrevistados são majoritariamente negros, pobres, desempregados, migrantes, com baixa escolaridade, que vivenciam uma sobreposição de fatores de vulnerabilidade agravada pela vivência de transtornos mentais ou do uso prejudicial de substâncias psicoativas. Os achados revelaram que as expectativas não-realizadas sobre o que deve ser um \"homem de verdade\" interferem negativamente nas condições de saúde mental, levando os entrevistados a sentirem-se alijados da condição de homem, especialmente, por não trabalharem e não proverem a família. É possível asseverar que em um mundo marcado pelo domínio do capital, o valor de um homem é confundido pelo seu poder de compra e a falta de emprego estável é um abalo à identidade masculina, levando os entrevistados a assumirem comportamentos de risco para compensarem o distanciamento da Masculinidade Hegemônica, como o uso abusivo de álcool. Destaca-se que as opressões por classe e raça se interseccionam com os sofrimentos mentais de masculinidades subalternas, estigmatizadas pela \"doença mental\" e pelo uso abusivo de álcool. A expressão de emoções e sofrimentos representa um afastamento de um modelo idealizado do que é ser homem, relacionado ao sentimento de invulnerabilidade. Por isso, emocionar-se é interpretado, pelos usuários dos CAPS, como coisa de \"fresco\", \"fraco\" ou um \"fracasso\", o que dificulta o acesso e a adesão dos homens a cuidados em saúde mental. Observou-se que esse silenciamento das emoções opera por meio de mecanismos de defesa relacionados à negação, fuga, projeção e pela \"passagem ao ato\", especialmente pela expressão da raiva, emoção legitimada pela Masculinidade Hegemônica. Observou-se ainda a importante função psicodinâmica das bebidas alcoólicas no psiquismo dos homens e suas relações com a construção sociocultural das masculinidades, identificando-se o uso da \"cachaça\" como refúgio ou meio de obter coragem para expressar emoções ou comportamentos para restabelecer posições de poder nas relações, por meio de atos violentos, principalmente, contra as mulheres. Nos CAPS, foi possível identificar práticas de promoção à saúde mental masculina adequadas aos homens, como os Grupo terapêuticos de Homens, que permitem a problematização de padrões hegemônicos do que é \"ser homem\" e representam uma possibilidade de inclusão da perspectiva de gênero nos serviços de saúde mental. Avalia-se que os CAPS, ao reconhecerem questões de gênero envolvidas na experiência do sofrimento psíquico, podem contribuir para a desconstrução da imagem idealizada da masculinidade hegemônica, possibilitando a expressão das emoções e de novos modos de ser homem This research investigates the relationships between Men and Mental Health, from the perspective of Gender and Men´s Studies, analyzing the expressions of mental suffering by men who use psychosocial care services. To this end, a qualitative research was carried out in two Psychosocial Care Centers (CAPS) in Brasília-DF, based on observations in routine services activities, between 2017 and 2019, and 16 semi-structured interviews with male users, selected during the observed activities. The data were categorized into 4 axes: performing masculinities and mental sufferings; the care provided to men in the Psychosocial Care Network; Alcohol use and masculinities; violent behaviors, mental health and masculinities. The studied population was composed mainly of black, poor, unemployed, migrant men, with low education, who experience an overlap of vulnerability factors aggravated by the experience of mental disorders or the harmful use of psychoactive substances. The findings revealed that unfulfilled expectations about masculinity patterns interfere negatively in mental health conditions, leading respondents to feel detached from the condition of men, especially when they are out of work and unable to provide for their family. It is possible to assert that in a world marked by the domination of capital, the value of a man is mistaken for his purchasing power and the lack of stable employment is a blow to the male identity, leading the interviewees to assume risky behaviors to make up for the detachment from the Hegemonic Masculinity, such as alcohol abuse. It is noteworthy that oppressions by class and race are intersected with the mental suffering of subordinate masculinities, stigmatized by \"mental illness\" or by the alcohol abuse. The expression of emotions and sufferings represents a departure from an idealized model of what it is to be a man, associated with the feeling of invulnerability. For this reason, getting emotional is interpreted, by CAPS users, as something \"fragile\", \"weak\" or a \"failure\", which makes it difficult for men to access and adhere to mental health care. It was observed that such silencing of emotions operates by means of defense mechanisms related to denial, escape, projection and by \"acting out\", mainly by the expression of anger, an emotion legitimized by the Hegemonic Masculinity. It was also observed the important psycho-dynamic function of alcoholic beverages in the psyche of men and its relationship with the sociocultural construction of masculinities, identifying the use of \"cachaça\" as a refuge or means of finding courage to express emotions or behaviors to reestablish positions of power in relationships, through violent acts, mainly against women. At CAPS, it was possible to identify effective male mental health promotion practices, suitable for men, such as the Men\'s Therapeutic Groups, which allow problematizing hegemonic patterns of what it means to \"be a man\" and represent a possibility of including the gender perspective in mental health services. It is believed that the CAPS, upon recognizing the gender issues involved in the experience of mental suffering, can contribute to the deconstruction of an idealized image of hegemonic masculinity, allowing the expression of emotions and of new ways of being a man https://doi.org/10.11606/T.5.2020.tde-09022021-094039info:eu-repo/semantics/openAccessporreponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USP2023-12-21T18:31:03Zoai:teses.usp.br:tde-09022021-094039Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212023-12-22T12:22:13.861213Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
dc.title.pt.fl_str_mv Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
dc.title.alternative.en.fl_str_mv Mental suffering and gender: men and care in the Psychosocial Attention Network
title Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
spellingShingle Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
Fernando Pessoa de Albuquerque
title_short Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
title_full Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
title_fullStr Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
title_full_unstemmed Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
title_sort Sofrimento mental e gênero: os homens e o cuidado na rede de atenção psicossocial
author Fernando Pessoa de Albuquerque
author_facet Fernando Pessoa de Albuquerque
author_role author
dc.contributor.advisor1.fl_str_mv Lilia Blima Schraiber
dc.contributor.referee1.fl_str_mv Marcia Thereza Couto Falcão
dc.contributor.referee2.fl_str_mv Wagner dos Santos Figueiredo
dc.contributor.referee3.fl_str_mv Valeska Maria Zanello de Loyola
dc.contributor.author.fl_str_mv Fernando Pessoa de Albuquerque
contributor_str_mv Lilia Blima Schraiber
Marcia Thereza Couto Falcão
Wagner dos Santos Figueiredo
Valeska Maria Zanello de Loyola
description Esta pesquisa investigou as relações entre Homens e Saúde Mental, a partir da perspectiva de Gênero e dos Estudos sobre Masculinidades, analisando as expressões do sofrimento mental por homens usuários de serviços de atenção de psicossocial. Para isso, foi realizada uma pesquisa qualitativa em dois CAPS de Brasília-DF, com base em observações participantes em atividades de rotina dos serviços, entre 2017 e 2019, e 16 entrevistas semiestruturadas com usuários homens, selecionados durante as atividades observadas. Os dados foram categorizados em 4 eixos: exercício das masculinidades e sofrimentos mentais; o cuidado ofertado aos homens na Rede de Atenção Psicossocial; Uso de álcool e masculinidades, comportamentos violentos, saúde mental e masculinidades. Os homens entrevistados são majoritariamente negros, pobres, desempregados, migrantes, com baixa escolaridade, que vivenciam uma sobreposição de fatores de vulnerabilidade agravada pela vivência de transtornos mentais ou do uso prejudicial de substâncias psicoativas. Os achados revelaram que as expectativas não-realizadas sobre o que deve ser um \"homem de verdade\" interferem negativamente nas condições de saúde mental, levando os entrevistados a sentirem-se alijados da condição de homem, especialmente, por não trabalharem e não proverem a família. É possível asseverar que em um mundo marcado pelo domínio do capital, o valor de um homem é confundido pelo seu poder de compra e a falta de emprego estável é um abalo à identidade masculina, levando os entrevistados a assumirem comportamentos de risco para compensarem o distanciamento da Masculinidade Hegemônica, como o uso abusivo de álcool. Destaca-se que as opressões por classe e raça se interseccionam com os sofrimentos mentais de masculinidades subalternas, estigmatizadas pela \"doença mental\" e pelo uso abusivo de álcool. A expressão de emoções e sofrimentos representa um afastamento de um modelo idealizado do que é ser homem, relacionado ao sentimento de invulnerabilidade. Por isso, emocionar-se é interpretado, pelos usuários dos CAPS, como coisa de \"fresco\", \"fraco\" ou um \"fracasso\", o que dificulta o acesso e a adesão dos homens a cuidados em saúde mental. Observou-se que esse silenciamento das emoções opera por meio de mecanismos de defesa relacionados à negação, fuga, projeção e pela \"passagem ao ato\", especialmente pela expressão da raiva, emoção legitimada pela Masculinidade Hegemônica. Observou-se ainda a importante função psicodinâmica das bebidas alcoólicas no psiquismo dos homens e suas relações com a construção sociocultural das masculinidades, identificando-se o uso da \"cachaça\" como refúgio ou meio de obter coragem para expressar emoções ou comportamentos para restabelecer posições de poder nas relações, por meio de atos violentos, principalmente, contra as mulheres. Nos CAPS, foi possível identificar práticas de promoção à saúde mental masculina adequadas aos homens, como os Grupo terapêuticos de Homens, que permitem a problematização de padrões hegemônicos do que é \"ser homem\" e representam uma possibilidade de inclusão da perspectiva de gênero nos serviços de saúde mental. Avalia-se que os CAPS, ao reconhecerem questões de gênero envolvidas na experiência do sofrimento psíquico, podem contribuir para a desconstrução da imagem idealizada da masculinidade hegemônica, possibilitando a expressão das emoções e de novos modos de ser homem
publishDate 2020
dc.date.issued.fl_str_mv 2020-09-22
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
dc.type.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/doctoralThesis
format doctoralThesis
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv https://doi.org/10.11606/T.5.2020.tde-09022021-094039
url https://doi.org/10.11606/T.5.2020.tde-09022021-094039
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.publisher.none.fl_str_mv Universidade de São Paulo
dc.publisher.program.fl_str_mv Medicina (Medicina Preventiva)
dc.publisher.initials.fl_str_mv USP
dc.publisher.country.fl_str_mv BR
publisher.none.fl_str_mv Universidade de São Paulo
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
instname:Universidade de São Paulo (USP)
instacron:USP
instname_str Universidade de São Paulo (USP)
instacron_str USP
institution USP
reponame_str Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
collection Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
repository.name.fl_str_mv Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)
repository.mail.fl_str_mv virginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.br
_version_ 1794502587729313792