DA INSERÇÃO À LEGITIMAÇÃO:: DILEMAS E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO FÍSICA COM A EDUCAÇÃO INFANTIL

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Mello, André da Silva
Data de Publicação: 2022
Outros Autores: Bersch, Ângela Adriane, Ribeiro, Camila Borges, Martins , Rodrigo Lema Del Rio
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Revista Didática Sistêmica
Texto Completo: https://periodicos.furg.br/redsis/article/view/13907
Resumo: A Educação Infantil foi reconhecida como a primeira etapa da Educação Básica pela LDB, que tem como objetivo principal o desenvolvimento integral das crianças. Atualmente, a Educação Infantil vem passando por um processo de expansão e consolidação, no Brasil, que é decorrente, principalmente, da Emenda Constitucional nº 59∕2009, que tornou obrigatória a matrícula e a frequência de crianças de quatro e cincos anos de idade, em instituições formais de ensino, em todo o território nacional. Esses processos de expansão e institucionalização, da primeira etapa da Educação Básica, vêm acompanhados de preocupações pedagógicas acerca da organização e operacionalização do trabalho educativo com as crianças. Por esse ângulo, as práticas pedagógicas precisam conciliar as dimensões do cuidar e do educar e promover uma dinâmica curricular resultante de experiências que não fragmentem o conhecimento, respeitando, sobretudo, a bagagem histórica e social que as crianças carregam consigo. É nesse cenário que vimos percebendo a inserção de professores de Educação Física na Educação Infantil. Com a intenção de debater acerca das contribuições específicas que as práticas corporais assumem, na constituição curricular da Educação Infantil, por meio da mediação pedagógica exercida por profissionais com formação nessa área de conhecimento, propomos a organização deste Dossiê, entendendo ser uma forma de potencializar as discussões que focalizam essa relação da Educação Física com a Educação Infantil. Este Dossiê é fruto de uma ação coletiva interinstitucional, construída por docentes vinculados à Universidade Federal do Rio Grande (FURG), à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), por meio dos grupos de pesquisa ECCOS (Educação, Corpo e Cultura do Movimento), ECOINFÂNCIAS (Infâncias, ambientes e ludicidade) e NAIF (Núcleo de Aprendizagens com as Infâncias e seus Fazeres). Celebramos essa experiência de fazer compartilhado, que expressa uma forma salutar de produzirmos conhecimento, pela via da constituição de redes dialógicas e colaborativas, potencializadas pelas novas tecnologias. Afirmamos, com este trabalho de publicação do Dossiê, o papel central dos grupos de pesquisa e das universidades públicas brasileiras como instituições indispensáveis para o avanço do pensamento crítico, da cidadania e do desenvolvimento científico em nosso País, principalmente, em um cenário tão adverso que enfrentamos, seja pela dureza de vivenciarmos uma Pandemia que nos imputa perdas de pessoas queridas, seja pelos ataques sistemáticos à autonomia, à democracia e ao financiamento da educação pública nacional. Mesmo com todas essas questões que nos afligem nos planos pessoal, profissional e acadêmico, estamos satisfeitos em poder contar com a confiança de colegas docentes que se dispuseram a socializar suas produções conosco e contar com a generosidade de outros tantos colegas que se somaram a nós na tarefa de analisar, criteriosamente, cada manuscrito submetido à Revista Didática Sistêmica. Esses movimentos de interlocução criam e reforçam laços pessoais/profissionais/acadêmicos que nos revigoram e nos mantêm firmes no propósito de defender a vida, a ciência e a educação. Neste Dossiê, contamos com 16 artigos produzidos por professores-pesquisadores vinculados à educação básica e ao ensino superior, provenientes de todas as cinco regiões geográficas do Brasil. Essa abrangência nacional é relevante, pois nos apresenta pistas acerca dos distintos modos como a presença de professores com formação em Educação Física vem sendo pensada e materializada na Educação Infantil. Marcado pela diversidade de aportes teóricos e metodológicos, o Dossiê é composto por ensaios, relatos de experiências e artigos originais construídos a partir das contribuições da Sociologia, da Filosofia, da Pedagogia e da História Cultural. A problematização da relação da Educação Física com a Educação Infantil se baseou em pesquisas, assumidas pelos seus autores, de caráter qualitativo, pedagógico, narrativo, descritivo-interpretativo, bibliográfico, documental e pesquisa-ação. O conjunto de textos que forma o presente Dossiê aborda temáticas variadas que discutem regulamentações de cunho legal e pedagógico sobre a Educação Física e a Educação Infantil; pressupostos para a formação docente; a presença de professores especialistas na primeira etapa da Educação Básica em contexto específicos; a dinâmica curricular articulada por diferentes linguagens; o papel do brincar e do movimento nas práticas pedagógicas; o trato pedagógico de práticas corporais específicas (como é o caso da dança); o mapeamento da literatura científica pertinente ao tema e as perspectivas pedagógicas de Educação Física para a Educação Infantil. O primeiro artigo, assinado por Leonardo de Carvalho Duarte e Marcos Garcia Neira, analisa as teses e dissertações defendidas sobre Educação Infantil defendidas em Programas de Pós-graduação em Educação Física, entre os anos de 2010 e 2020. Identificaram mudanças paradigmáticas nesses estudos no que concerne à aproximação da área com referenciais contemporâneos das Ciências Humanas e Sociais, preservando alguma incidência da Psicologia do Desenvolvimento, mas ampliando o diálogo com as teorias curriculares críticas e pós-críticas. Os trabalhos do referido período constatam que, embora haja uma ampliação significativa de estudos sociais sobre as infâncias, ainda persiste o desafio da escuta, da participação e da coautoria das crianças em pesquisas e em práticas pedagógicas da Educação Física na Educação Infantil. Na sequência, as autoras Roseli Belmonte Machado, Isabela Dutra Correa da Silva e Marcela Dutra Correa da Silva analisam o capítulo da BNCC referente à Educação Infantil, destacando os discursos que legitimam a área da Educação Física. Em outra frente de análise, examinam o modo como acontece a prática pedagógica da Educação Física na Educação Infantil. A partir desse estudo, notaram que há orientações curriculares que indicam para uma formação integral, emancipada e livre do sujeito infantil. Todavia, nas práticas da Educação Física, há operações de governamento que conduzem para um disciplinamento do corpo. Em sentido oposto, defendem, a partir de suas convicções assumidas no texto, que liberdade e disciplina são conceitos afins na constituição dos sujeitos infantis contemporâneos.             O terceiro artigo analisa a “base de conhecimentos para o ensino de professores de Educação Física na pré-escola”, com foco na identificação e na compreensão do sujeito e do conteúdo. Para os autores Luana Zanotto, Fernando Donizete Alves e Carlos Januário, o conhecimento docente sobre a criança advém da relação cotidiana pedagógica estabelecida para com ela, e os conteúdos são eleitos em função dos interesses das crianças, sendo que os jogos e brincadeiras populares prevalecem na organização dos processos de ensino-aprendizagem. Concluem defendendo que a participação do professor de Educação Física, na Educação Infantil, seja estabelecida por meio de um trabalho docente articulado entre áreas do conhecimento.             O artigo de Juliano Silveira é o quarto trabalho deste Dossiê e traz reflexões sobre a importância das práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física no âmbito da Educação Infantil. Nessa perspectiva, consideram-se os sentidos e significados atribuídos ao movimento humano, o direito ao acesso à cultura corporal de movimento e os desafios do cotidiano pedagógico. As discussões evidenciadas, no texto, indicam a necessidade de diálogos em torno da construção de uma Educação Física da Educação Infantil, superando representações reducionistas sobre o seu papel, possibilitando uma docência compartilhada.             O quinto artigo oferece aos leitores uma reflexão teórica com foco em dois cenários: o “estático” e o “dinâmico”, conceituados pelos filósofos Parménides e Heráclito. O exercício crítico-reflexivo dos autores António Camilo Cunha e Zenaide Galvão analisa as dinâmicas formativas e curriculares no campo da “Educação (Física) Infantil”, contidas, especialmente, na Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Apontam, em suas considerações, que as práxis se apresentam tanto como “cenários estáticos” quanto como “cenários dinâmicos” na interlocução entre docentes e as crianças.             Uirá de Siqueira Farias e Graciele Massoli Rodrigues apresentam, no sexto artigo, reflexões tecidas “COM” vinte e seis crianças de cinco anos da Educação Infantil, duas pedagogas e um professor de educação física. Para eles, ser professor “COM” as crianças exige uma convocação para se construir uma educação emancipadora, necessária para todos/as que acreditam que a escola possa promover a dialogicidade e a curiosidade epistemológica.             O sétimo artigo deste Dossiê, que tem como signatários Julio Cesar de Lucca Junior e Glauco Nunes Souto Ramos, analisa as perspectivas de docentes de Educação Física sobre o ensino deste componente curricular na educação infantil, na rede municipal de São Carlos/SP. As conclusões evidenciam distintos modos de ensinar e, apesar de os professores assinalarem o preparo para a docência, os autores percebem, por parte de alguns deles, a falta de clareza ao distinguir e conceituar elementos essenciais para esse exercício. No oitavo artigo, as autoras Bethânia Costa Alves Zandomínegue, Raquel Firmino Magalhães Barbosa e Vanessa Guimarães discutem uma proposta de currículo articulada para a Educação Infantil ou na Educação Infantil, a partir do diálogo com diferentes linguagens, áreas do conhecimento e sujeitos da comunidade escolar. As mediações com a cultura popular, o Projeto Institucional e o Plano de Ação da Educação Física se constituíram como engrenagens essenciais para a materialização de uma “engenharia do currículo”.             Na esteira das propostas de discussão curriculares na/para a Educação Infantil, Renata de Moraes Lino e Ingrid Dittrich Wiggers discorrem, no nono artigo, sobre um projeto pedagógico desenvolvido colaborativamente por professores de atividades e de educação física, em uma instituição pública do Distrito Federal. O projeto abordou a tríade "alimentação, higiene e valores", mediada pela literatura infantil, para nortear as atividades voltadas às crianças. Em paralelo, fomentaram a formação entre os professores participantes, como forma de subsidiar todo o desenvolvimento das etapas do projeto. Destacaram que o diálogo, o trabalho coletivo ao longo do processo e a interdisciplinaridade representam, em suas palavras, uma “perspectiva heurística” para a atuação docente na Educação Infantil.             O décimo artigo trouxe à tona uma análise dos usos e das apropriações que os dinamizadores de Artes e Educação Física fazem das danças populares na Educação Infantil de Vitória/ES. Erica Bolzan, Rodrigo Lema Del Rio Martins e André da Silva Mello apontam que esses docentes fazem diferentes usos dessas danças em seus cotidianos, em estreita articulação com os projetos institucionais das unidades escolares. Contudo, ressaltam que são poucas as mediações pedagógicas que valorizam as agências das crianças. Em que pesem as dificuldades relacionadas à questão da religiosidade para o trabalho com as danças populares, concluem que essas práticas corporais se apresentam como conhecimentos potentes para tematizações e reflexões sobre as questões étnico-raciais nas instituições infantis.             No décimo primeiro artigo, Adriana Martins Correia demonstra um trabalho pedagógico construído a partir da articulação entre a experiência da autora na docência e os debates com professores em formação inicial e continuada na Universidade, colocados em perspectiva com a literatura a respeito: das relações entre escola e poder; da educação das infâncias; e do ensino da dança na escola. Ao final, são apresentadas algumas propostas e experiências que buscam deslocar o cantar-dançar para além de uma lógica mecânica e prescritiva, vislumbrando a potência da criatividade das infâncias.             Kézia Rodrigues Nunes e Carlos Eduardo Ferraço, autores do décimo segundo artigo, contribui com este Dossiê ao focalizar as redes de sentidos de currículo com narrativas de experiências docentes de educação física na educação infantil. A pesquisa situa-se no bojo dos estudos curriculares pós-críticos da educação e realiza uma tessitura das práticas curriculares em Vitória/ES. Sem buscar realizar comparações entre o ensino remoto e o presencial, afirma, com os/as professores e suas práticas cotidianas, possibilidades gestadas na escola, indicando temáticas, saberesfazeres e questões potentes para serem ampliadas, especialmente, no contexto pandêmico atual. Encontramos, no décimo terceiro artigo, uma discussão sobre o lugar da Educação Física na Educação Infantil, no município do Rio Grande-RS. As autoras Camila Borges Ribeiro, Josiane Vian Domingues e Ângela Adriane Schmidt Bersch constatam que a inserção do/a professor/a de Educação Física, nessa etapa de ensino no município, é recente e não atende a todas as escolas municipais, mas integra um movimento estimulado pelos projetos de lei que trataram dessa questão. Por esse ângulo, identificam potencialidades e fragilidades para pensar estratégias de qualificação da ação docente nesse contexto.             O décimo quarto artigo, de autoria de Heloisa Elesbão, Natália de Borba Nunes e Maria Cecília da Silva Camargo, reconhece o corpo e o movimento como potentes manifestações expressivas das crianças. Ao considerarem a relevância do binômio corpo/movimento e da centralidade do brincar na Educação Infantil, debatem o lugar destinado pelas professoras ao brincar e ao “se-movimentar” no cotidiano de turmas de Educação Infantil em duas escolas de Ensino Fundamental, em um município da região central do Rio Grande do Sul. As narrativas docentes evidenciaram que as professoras têm perspectivas distintas sobre a importância do brincar e do “se-movimentar” no cotidiano da EI, ora reconhecendo o corpo e o movimento como linguagem infantil, ora reduzindo o binômio como instrumento para o desenvolvimento de outras habilidades.             O décimo quinto artigo lança luz sobre as experiências de inserção da Educação Física na Educação Infantil de Brasília. Neste texto, Graciele Pereira Lemos e Jonatas Maia da Costa apresentam as bases normativas do programa “Educação com Movimento”. Explicitam que o objetivo é que o professor de educação física realize um trabalho integrado e interdisciplinar junto aos pedagogos na educação das crianças pequenas. O programa anseia por um desenvolvimento em compasso com as suas diretrizes que sugerem como “auspiciosas” as contribuições da educação física na educação da infância.             O último artigo do Dossiê, décimo sexto na sequência, é assinado por Bruna Drielly de Menezes Andrade e Victor José Machado de Oliveira. Eles investigaram como se dá a presença da Educação Física na Educação Infantil em Manaus/AM. Com efeito, discorrem sobre o projeto “Caravana da Educação Infantil”, em que os professores de Educação Física se inserem na primeira etapa da Educação Básica manauara, com a função de assessorar as professoras generalistas. Para eles, a “Caravana” possui potencialidades para crescer, porém alertam para o risco de adoção do modelo disciplinar escolarizante. A síntese dos textos apresentados, nestas páginas, denota que as provocações que fizemos, na ementa do Dossiê, foram respondidas, qualitativamente, pela comunidade acadêmica da Educação Física, dedicada aos temas sensíveis à Educação Infantil. Portanto, em nossa compreensão, os artigos reforçam a percepção de que a relação dessa área de conhecimento com a primeira etapa da Educação Básica vem crescendo nas últimas décadas, impulsionada por questões legais, administrativas e, sobretudo, pedagógicas. A inserção da Educação Física tem ganhado espaço e se consolidado na dinâmica curricular da Educação Infantil, em especial, pela centralidade do corpo/movimento e dos jogos/brincadeiras nos processos pedagógicos desenvolvidos na primeira etapa da Educação Básica. Em outra vertente, o material, aqui sistematizado, reafirma a Educação Infantil como uma etapa da Educação Básica que não se organiza de forma disciplinar, preconizando que o trabalho pedagógico não seja efetivado de maneira fragmentada, tampouco assume como foco a preparação cognitiva e motora das crianças para as etapas posteriores - ensino fundamental e médio. Nesse sentido, a dinâmica curricular da Educação Infantil exige a integração entre as diferentes áreas de conhecimento e profissionais que atuam com as crianças de zero a cinco anos de idade, por meio de processos de ensino-aprendizagem que promovam o desenvolvimento integral da criança, potencializando sua participação, expressão, criação e manifestação de interesses. As reflexões tecidas, neste Dossiê, oferecem aos leitores da Revista Didática Sistêmica novas chaves de leitura sobre o assunto abordado, fazendo emergir compreensões que permitem avançar nas discussões em que as agências das crianças, com o seu protagonismo e com os sentidos que elas constroem nas relações com as atividades lúdicas, sejam valorizadas, reconhecendo-as como sujeitos ativos do seu próprio desenvolvimento e aprendizagem.
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Por esse ângulo, as práticas pedagógicas precisam conciliar as dimensões do cuidar e do educar e promover uma dinâmica curricular resultante de experiências que não fragmentem o conhecimento, respeitando, sobretudo, a bagagem histórica e social que as crianças carregam consigo. É nesse cenário que vimos percebendo a inserção de professores de Educação Física na Educação Infantil. Com a intenção de debater acerca das contribuições específicas que as práticas corporais assumem, na constituição curricular da Educação Infantil, por meio da mediação pedagógica exercida por profissionais com formação nessa área de conhecimento, propomos a organização deste Dossiê, entendendo ser uma forma de potencializar as discussões que focalizam essa relação da Educação Física com a Educação Infantil. Este Dossiê é fruto de uma ação coletiva interinstitucional, construída por docentes vinculados à Universidade Federal do Rio Grande (FURG), à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), por meio dos grupos de pesquisa ECCOS (Educação, Corpo e Cultura do Movimento), ECOINFÂNCIAS (Infâncias, ambientes e ludicidade) e NAIF (Núcleo de Aprendizagens com as Infâncias e seus Fazeres). Celebramos essa experiência de fazer compartilhado, que expressa uma forma salutar de produzirmos conhecimento, pela via da constituição de redes dialógicas e colaborativas, potencializadas pelas novas tecnologias. Afirmamos, com este trabalho de publicação do Dossiê, o papel central dos grupos de pesquisa e das universidades públicas brasileiras como instituições indispensáveis para o avanço do pensamento crítico, da cidadania e do desenvolvimento científico em nosso País, principalmente, em um cenário tão adverso que enfrentamos, seja pela dureza de vivenciarmos uma Pandemia que nos imputa perdas de pessoas queridas, seja pelos ataques sistemáticos à autonomia, à democracia e ao financiamento da educação pública nacional. Mesmo com todas essas questões que nos afligem nos planos pessoal, profissional e acadêmico, estamos satisfeitos em poder contar com a confiança de colegas docentes que se dispuseram a socializar suas produções conosco e contar com a generosidade de outros tantos colegas que se somaram a nós na tarefa de analisar, criteriosamente, cada manuscrito submetido à Revista Didática Sistêmica. Esses movimentos de interlocução criam e reforçam laços pessoais/profissionais/acadêmicos que nos revigoram e nos mantêm firmes no propósito de defender a vida, a ciência e a educação. Neste Dossiê, contamos com 16 artigos produzidos por professores-pesquisadores vinculados à educação básica e ao ensino superior, provenientes de todas as cinco regiões geográficas do Brasil. Essa abrangência nacional é relevante, pois nos apresenta pistas acerca dos distintos modos como a presença de professores com formação em Educação Física vem sendo pensada e materializada na Educação Infantil. Marcado pela diversidade de aportes teóricos e metodológicos, o Dossiê é composto por ensaios, relatos de experiências e artigos originais construídos a partir das contribuições da Sociologia, da Filosofia, da Pedagogia e da História Cultural. A problematização da relação da Educação Física com a Educação Infantil se baseou em pesquisas, assumidas pelos seus autores, de caráter qualitativo, pedagógico, narrativo, descritivo-interpretativo, bibliográfico, documental e pesquisa-ação. O conjunto de textos que forma o presente Dossiê aborda temáticas variadas que discutem regulamentações de cunho legal e pedagógico sobre a Educação Física e a Educação Infantil; pressupostos para a formação docente; a presença de professores especialistas na primeira etapa da Educação Básica em contexto específicos; a dinâmica curricular articulada por diferentes linguagens; o papel do brincar e do movimento nas práticas pedagógicas; o trato pedagógico de práticas corporais específicas (como é o caso da dança); o mapeamento da literatura científica pertinente ao tema e as perspectivas pedagógicas de Educação Física para a Educação Infantil. O primeiro artigo, assinado por Leonardo de Carvalho Duarte e Marcos Garcia Neira, analisa as teses e dissertações defendidas sobre Educação Infantil defendidas em Programas de Pós-graduação em Educação Física, entre os anos de 2010 e 2020. Identificaram mudanças paradigmáticas nesses estudos no que concerne à aproximação da área com referenciais contemporâneos das Ciências Humanas e Sociais, preservando alguma incidência da Psicologia do Desenvolvimento, mas ampliando o diálogo com as teorias curriculares críticas e pós-críticas. Os trabalhos do referido período constatam que, embora haja uma ampliação significativa de estudos sociais sobre as infâncias, ainda persiste o desafio da escuta, da participação e da coautoria das crianças em pesquisas e em práticas pedagógicas da Educação Física na Educação Infantil. Na sequência, as autoras Roseli Belmonte Machado, Isabela Dutra Correa da Silva e Marcela Dutra Correa da Silva analisam o capítulo da BNCC referente à Educação Infantil, destacando os discursos que legitimam a área da Educação Física. Em outra frente de análise, examinam o modo como acontece a prática pedagógica da Educação Física na Educação Infantil. A partir desse estudo, notaram que há orientações curriculares que indicam para uma formação integral, emancipada e livre do sujeito infantil. Todavia, nas práticas da Educação Física, há operações de governamento que conduzem para um disciplinamento do corpo. Em sentido oposto, defendem, a partir de suas convicções assumidas no texto, que liberdade e disciplina são conceitos afins na constituição dos sujeitos infantis contemporâneos.             O terceiro artigo analisa a “base de conhecimentos para o ensino de professores de Educação Física na pré-escola”, com foco na identificação e na compreensão do sujeito e do conteúdo. Para os autores Luana Zanotto, Fernando Donizete Alves e Carlos Januário, o conhecimento docente sobre a criança advém da relação cotidiana pedagógica estabelecida para com ela, e os conteúdos são eleitos em função dos interesses das crianças, sendo que os jogos e brincadeiras populares prevalecem na organização dos processos de ensino-aprendizagem. Concluem defendendo que a participação do professor de Educação Física, na Educação Infantil, seja estabelecida por meio de um trabalho docente articulado entre áreas do conhecimento.             O artigo de Juliano Silveira é o quarto trabalho deste Dossiê e traz reflexões sobre a importância das práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física no âmbito da Educação Infantil. Nessa perspectiva, consideram-se os sentidos e significados atribuídos ao movimento humano, o direito ao acesso à cultura corporal de movimento e os desafios do cotidiano pedagógico. As discussões evidenciadas, no texto, indicam a necessidade de diálogos em torno da construção de uma Educação Física da Educação Infantil, superando representações reducionistas sobre o seu papel, possibilitando uma docência compartilhada.             O quinto artigo oferece aos leitores uma reflexão teórica com foco em dois cenários: o “estático” e o “dinâmico”, conceituados pelos filósofos Parménides e Heráclito. O exercício crítico-reflexivo dos autores António Camilo Cunha e Zenaide Galvão analisa as dinâmicas formativas e curriculares no campo da “Educação (Física) Infantil”, contidas, especialmente, na Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Apontam, em suas considerações, que as práxis se apresentam tanto como “cenários estáticos” quanto como “cenários dinâmicos” na interlocução entre docentes e as crianças.             Uirá de Siqueira Farias e Graciele Massoli Rodrigues apresentam, no sexto artigo, reflexões tecidas “COM” vinte e seis crianças de cinco anos da Educação Infantil, duas pedagogas e um professor de educação física. Para eles, ser professor “COM” as crianças exige uma convocação para se construir uma educação emancipadora, necessária para todos/as que acreditam que a escola possa promover a dialogicidade e a curiosidade epistemológica.             O sétimo artigo deste Dossiê, que tem como signatários Julio Cesar de Lucca Junior e Glauco Nunes Souto Ramos, analisa as perspectivas de docentes de Educação Física sobre o ensino deste componente curricular na educação infantil, na rede municipal de São Carlos/SP. As conclusões evidenciam distintos modos de ensinar e, apesar de os professores assinalarem o preparo para a docência, os autores percebem, por parte de alguns deles, a falta de clareza ao distinguir e conceituar elementos essenciais para esse exercício. No oitavo artigo, as autoras Bethânia Costa Alves Zandomínegue, Raquel Firmino Magalhães Barbosa e Vanessa Guimarães discutem uma proposta de currículo articulada para a Educação Infantil ou na Educação Infantil, a partir do diálogo com diferentes linguagens, áreas do conhecimento e sujeitos da comunidade escolar. As mediações com a cultura popular, o Projeto Institucional e o Plano de Ação da Educação Física se constituíram como engrenagens essenciais para a materialização de uma “engenharia do currículo”.             Na esteira das propostas de discussão curriculares na/para a Educação Infantil, Renata de Moraes Lino e Ingrid Dittrich Wiggers discorrem, no nono artigo, sobre um projeto pedagógico desenvolvido colaborativamente por professores de atividades e de educação física, em uma instituição pública do Distrito Federal. O projeto abordou a tríade "alimentação, higiene e valores", mediada pela literatura infantil, para nortear as atividades voltadas às crianças. Em paralelo, fomentaram a formação entre os professores participantes, como forma de subsidiar todo o desenvolvimento das etapas do projeto. Destacaram que o diálogo, o trabalho coletivo ao longo do processo e a interdisciplinaridade representam, em suas palavras, uma “perspectiva heurística” para a atuação docente na Educação Infantil.             O décimo artigo trouxe à tona uma análise dos usos e das apropriações que os dinamizadores de Artes e Educação Física fazem das danças populares na Educação Infantil de Vitória/ES. Erica Bolzan, Rodrigo Lema Del Rio Martins e André da Silva Mello apontam que esses docentes fazem diferentes usos dessas danças em seus cotidianos, em estreita articulação com os projetos institucionais das unidades escolares. Contudo, ressaltam que são poucas as mediações pedagógicas que valorizam as agências das crianças. Em que pesem as dificuldades relacionadas à questão da religiosidade para o trabalho com as danças populares, concluem que essas práticas corporais se apresentam como conhecimentos potentes para tematizações e reflexões sobre as questões étnico-raciais nas instituições infantis.             No décimo primeiro artigo, Adriana Martins Correia demonstra um trabalho pedagógico construído a partir da articulação entre a experiência da autora na docência e os debates com professores em formação inicial e continuada na Universidade, colocados em perspectiva com a literatura a respeito: das relações entre escola e poder; da educação das infâncias; e do ensino da dança na escola. Ao final, são apresentadas algumas propostas e experiências que buscam deslocar o cantar-dançar para além de uma lógica mecânica e prescritiva, vislumbrando a potência da criatividade das infâncias.             Kézia Rodrigues Nunes e Carlos Eduardo Ferraço, autores do décimo segundo artigo, contribui com este Dossiê ao focalizar as redes de sentidos de currículo com narrativas de experiências docentes de educação física na educação infantil. A pesquisa situa-se no bojo dos estudos curriculares pós-críticos da educação e realiza uma tessitura das práticas curriculares em Vitória/ES. Sem buscar realizar comparações entre o ensino remoto e o presencial, afirma, com os/as professores e suas práticas cotidianas, possibilidades gestadas na escola, indicando temáticas, saberesfazeres e questões potentes para serem ampliadas, especialmente, no contexto pandêmico atual. Encontramos, no décimo terceiro artigo, uma discussão sobre o lugar da Educação Física na Educação Infantil, no município do Rio Grande-RS. As autoras Camila Borges Ribeiro, Josiane Vian Domingues e Ângela Adriane Schmidt Bersch constatam que a inserção do/a professor/a de Educação Física, nessa etapa de ensino no município, é recente e não atende a todas as escolas municipais, mas integra um movimento estimulado pelos projetos de lei que trataram dessa questão. Por esse ângulo, identificam potencialidades e fragilidades para pensar estratégias de qualificação da ação docente nesse contexto.             O décimo quarto artigo, de autoria de Heloisa Elesbão, Natália de Borba Nunes e Maria Cecília da Silva Camargo, reconhece o corpo e o movimento como potentes manifestações expressivas das crianças. Ao considerarem a relevância do binômio corpo/movimento e da centralidade do brincar na Educação Infantil, debatem o lugar destinado pelas professoras ao brincar e ao “se-movimentar” no cotidiano de turmas de Educação Infantil em duas escolas de Ensino Fundamental, em um município da região central do Rio Grande do Sul. As narrativas docentes evidenciaram que as professoras têm perspectivas distintas sobre a importância do brincar e do “se-movimentar” no cotidiano da EI, ora reconhecendo o corpo e o movimento como linguagem infantil, ora reduzindo o binômio como instrumento para o desenvolvimento de outras habilidades.             O décimo quinto artigo lança luz sobre as experiências de inserção da Educação Física na Educação Infantil de Brasília. Neste texto, Graciele Pereira Lemos e Jonatas Maia da Costa apresentam as bases normativas do programa “Educação com Movimento”. Explicitam que o objetivo é que o professor de educação física realize um trabalho integrado e interdisciplinar junto aos pedagogos na educação das crianças pequenas. O programa anseia por um desenvolvimento em compasso com as suas diretrizes que sugerem como “auspiciosas” as contribuições da educação física na educação da infância.             O último artigo do Dossiê, décimo sexto na sequência, é assinado por Bruna Drielly de Menezes Andrade e Victor José Machado de Oliveira. Eles investigaram como se dá a presença da Educação Física na Educação Infantil em Manaus/AM. Com efeito, discorrem sobre o projeto “Caravana da Educação Infantil”, em que os professores de Educação Física se inserem na primeira etapa da Educação Básica manauara, com a função de assessorar as professoras generalistas. Para eles, a “Caravana” possui potencialidades para crescer, porém alertam para o risco de adoção do modelo disciplinar escolarizante. A síntese dos textos apresentados, nestas páginas, denota que as provocações que fizemos, na ementa do Dossiê, foram respondidas, qualitativamente, pela comunidade acadêmica da Educação Física, dedicada aos temas sensíveis à Educação Infantil. Portanto, em nossa compreensão, os artigos reforçam a percepção de que a relação dessa área de conhecimento com a primeira etapa da Educação Básica vem crescendo nas últimas décadas, impulsionada por questões legais, administrativas e, sobretudo, pedagógicas. A inserção da Educação Física tem ganhado espaço e se consolidado na dinâmica curricular da Educação Infantil, em especial, pela centralidade do corpo/movimento e dos jogos/brincadeiras nos processos pedagógicos desenvolvidos na primeira etapa da Educação Básica. Em outra vertente, o material, aqui sistematizado, reafirma a Educação Infantil como uma etapa da Educação Básica que não se organiza de forma disciplinar, preconizando que o trabalho pedagógico não seja efetivado de maneira fragmentada, tampouco assume como foco a preparação cognitiva e motora das crianças para as etapas posteriores - ensino fundamental e médio. Nesse sentido, a dinâmica curricular da Educação Infantil exige a integração entre as diferentes áreas de conhecimento e profissionais que atuam com as crianças de zero a cinco anos de idade, por meio de processos de ensino-aprendizagem que promovam o desenvolvimento integral da criança, potencializando sua participação, expressão, criação e manifestação de interesses. As reflexões tecidas, neste Dossiê, oferecem aos leitores da Revista Didática Sistêmica novas chaves de leitura sobre o assunto abordado, fazendo emergir compreensões que permitem avançar nas discussões em que as agências das crianças, com o seu protagonismo e com os sentidos que elas constroem nas relações com as atividades lúdicas, sejam valorizadas, reconhecendo-as como sujeitos ativos do seu próprio desenvolvimento e aprendizagem.Lepidus2022-01-24info:eu-repo/semantics/articleinfo:eu-repo/semantics/publishedVersionapplication/pdfhttps://periodicos.furg.br/redsis/article/view/1390710.14295/rds.v23i1.13907Revista Didática Sistêmica; v. 23 n. 1 (2021): DOSSIÊ: Da inserção à legitimação: dilemas e perspectivas da educação física com a educação infantil e DOSSIÊ: Múltiplas linguagens nas infâncias; 9-151809-3108reponame:Revista Didática Sistêmicainstname:Universidade Federal do Rio Grande (FURG)instacron:FURGporhttps://periodicos.furg.br/redsis/article/view/13907/9256Copyright (c) 2022 Revista Didática Sistêmicainfo:eu-repo/semantics/openAccessMello, André da SilvaBersch, Ângela AdrianeRibeiro, Camila BorgesMartins , Rodrigo Lema Del Rio2022-01-24T16:07:06Zoai:periodicos.furg.br:article/13907Revistahttps://periodicos.furg.br/redsisPUBhttps://periodicos.furg.br/redsis/oairevdidaticasistemica@furg.br || angelabersch@gmail.com1809-31081809-3108opendoar:2022-01-24T16:07:06Revista Didática Sistêmica - Universidade Federal do Rio Grande (FURG)false
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Mello, André da Silva
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Bersch, Ângela Adriane
Ribeiro, Camila Borges
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description A Educação Infantil foi reconhecida como a primeira etapa da Educação Básica pela LDB, que tem como objetivo principal o desenvolvimento integral das crianças. Atualmente, a Educação Infantil vem passando por um processo de expansão e consolidação, no Brasil, que é decorrente, principalmente, da Emenda Constitucional nº 59∕2009, que tornou obrigatória a matrícula e a frequência de crianças de quatro e cincos anos de idade, em instituições formais de ensino, em todo o território nacional. Esses processos de expansão e institucionalização, da primeira etapa da Educação Básica, vêm acompanhados de preocupações pedagógicas acerca da organização e operacionalização do trabalho educativo com as crianças. Por esse ângulo, as práticas pedagógicas precisam conciliar as dimensões do cuidar e do educar e promover uma dinâmica curricular resultante de experiências que não fragmentem o conhecimento, respeitando, sobretudo, a bagagem histórica e social que as crianças carregam consigo. É nesse cenário que vimos percebendo a inserção de professores de Educação Física na Educação Infantil. Com a intenção de debater acerca das contribuições específicas que as práticas corporais assumem, na constituição curricular da Educação Infantil, por meio da mediação pedagógica exercida por profissionais com formação nessa área de conhecimento, propomos a organização deste Dossiê, entendendo ser uma forma de potencializar as discussões que focalizam essa relação da Educação Física com a Educação Infantil. Este Dossiê é fruto de uma ação coletiva interinstitucional, construída por docentes vinculados à Universidade Federal do Rio Grande (FURG), à Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), por meio dos grupos de pesquisa ECCOS (Educação, Corpo e Cultura do Movimento), ECOINFÂNCIAS (Infâncias, ambientes e ludicidade) e NAIF (Núcleo de Aprendizagens com as Infâncias e seus Fazeres). Celebramos essa experiência de fazer compartilhado, que expressa uma forma salutar de produzirmos conhecimento, pela via da constituição de redes dialógicas e colaborativas, potencializadas pelas novas tecnologias. Afirmamos, com este trabalho de publicação do Dossiê, o papel central dos grupos de pesquisa e das universidades públicas brasileiras como instituições indispensáveis para o avanço do pensamento crítico, da cidadania e do desenvolvimento científico em nosso País, principalmente, em um cenário tão adverso que enfrentamos, seja pela dureza de vivenciarmos uma Pandemia que nos imputa perdas de pessoas queridas, seja pelos ataques sistemáticos à autonomia, à democracia e ao financiamento da educação pública nacional. Mesmo com todas essas questões que nos afligem nos planos pessoal, profissional e acadêmico, estamos satisfeitos em poder contar com a confiança de colegas docentes que se dispuseram a socializar suas produções conosco e contar com a generosidade de outros tantos colegas que se somaram a nós na tarefa de analisar, criteriosamente, cada manuscrito submetido à Revista Didática Sistêmica. Esses movimentos de interlocução criam e reforçam laços pessoais/profissionais/acadêmicos que nos revigoram e nos mantêm firmes no propósito de defender a vida, a ciência e a educação. Neste Dossiê, contamos com 16 artigos produzidos por professores-pesquisadores vinculados à educação básica e ao ensino superior, provenientes de todas as cinco regiões geográficas do Brasil. Essa abrangência nacional é relevante, pois nos apresenta pistas acerca dos distintos modos como a presença de professores com formação em Educação Física vem sendo pensada e materializada na Educação Infantil. Marcado pela diversidade de aportes teóricos e metodológicos, o Dossiê é composto por ensaios, relatos de experiências e artigos originais construídos a partir das contribuições da Sociologia, da Filosofia, da Pedagogia e da História Cultural. A problematização da relação da Educação Física com a Educação Infantil se baseou em pesquisas, assumidas pelos seus autores, de caráter qualitativo, pedagógico, narrativo, descritivo-interpretativo, bibliográfico, documental e pesquisa-ação. O conjunto de textos que forma o presente Dossiê aborda temáticas variadas que discutem regulamentações de cunho legal e pedagógico sobre a Educação Física e a Educação Infantil; pressupostos para a formação docente; a presença de professores especialistas na primeira etapa da Educação Básica em contexto específicos; a dinâmica curricular articulada por diferentes linguagens; o papel do brincar e do movimento nas práticas pedagógicas; o trato pedagógico de práticas corporais específicas (como é o caso da dança); o mapeamento da literatura científica pertinente ao tema e as perspectivas pedagógicas de Educação Física para a Educação Infantil. O primeiro artigo, assinado por Leonardo de Carvalho Duarte e Marcos Garcia Neira, analisa as teses e dissertações defendidas sobre Educação Infantil defendidas em Programas de Pós-graduação em Educação Física, entre os anos de 2010 e 2020. Identificaram mudanças paradigmáticas nesses estudos no que concerne à aproximação da área com referenciais contemporâneos das Ciências Humanas e Sociais, preservando alguma incidência da Psicologia do Desenvolvimento, mas ampliando o diálogo com as teorias curriculares críticas e pós-críticas. Os trabalhos do referido período constatam que, embora haja uma ampliação significativa de estudos sociais sobre as infâncias, ainda persiste o desafio da escuta, da participação e da coautoria das crianças em pesquisas e em práticas pedagógicas da Educação Física na Educação Infantil. Na sequência, as autoras Roseli Belmonte Machado, Isabela Dutra Correa da Silva e Marcela Dutra Correa da Silva analisam o capítulo da BNCC referente à Educação Infantil, destacando os discursos que legitimam a área da Educação Física. Em outra frente de análise, examinam o modo como acontece a prática pedagógica da Educação Física na Educação Infantil. A partir desse estudo, notaram que há orientações curriculares que indicam para uma formação integral, emancipada e livre do sujeito infantil. Todavia, nas práticas da Educação Física, há operações de governamento que conduzem para um disciplinamento do corpo. Em sentido oposto, defendem, a partir de suas convicções assumidas no texto, que liberdade e disciplina são conceitos afins na constituição dos sujeitos infantis contemporâneos.             O terceiro artigo analisa a “base de conhecimentos para o ensino de professores de Educação Física na pré-escola”, com foco na identificação e na compreensão do sujeito e do conteúdo. Para os autores Luana Zanotto, Fernando Donizete Alves e Carlos Januário, o conhecimento docente sobre a criança advém da relação cotidiana pedagógica estabelecida para com ela, e os conteúdos são eleitos em função dos interesses das crianças, sendo que os jogos e brincadeiras populares prevalecem na organização dos processos de ensino-aprendizagem. Concluem defendendo que a participação do professor de Educação Física, na Educação Infantil, seja estabelecida por meio de um trabalho docente articulado entre áreas do conhecimento.             O artigo de Juliano Silveira é o quarto trabalho deste Dossiê e traz reflexões sobre a importância das práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de Educação Física no âmbito da Educação Infantil. Nessa perspectiva, consideram-se os sentidos e significados atribuídos ao movimento humano, o direito ao acesso à cultura corporal de movimento e os desafios do cotidiano pedagógico. As discussões evidenciadas, no texto, indicam a necessidade de diálogos em torno da construção de uma Educação Física da Educação Infantil, superando representações reducionistas sobre o seu papel, possibilitando uma docência compartilhada.             O quinto artigo oferece aos leitores uma reflexão teórica com foco em dois cenários: o “estático” e o “dinâmico”, conceituados pelos filósofos Parménides e Heráclito. O exercício crítico-reflexivo dos autores António Camilo Cunha e Zenaide Galvão analisa as dinâmicas formativas e curriculares no campo da “Educação (Física) Infantil”, contidas, especialmente, na Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Apontam, em suas considerações, que as práxis se apresentam tanto como “cenários estáticos” quanto como “cenários dinâmicos” na interlocução entre docentes e as crianças.             Uirá de Siqueira Farias e Graciele Massoli Rodrigues apresentam, no sexto artigo, reflexões tecidas “COM” vinte e seis crianças de cinco anos da Educação Infantil, duas pedagogas e um professor de educação física. Para eles, ser professor “COM” as crianças exige uma convocação para se construir uma educação emancipadora, necessária para todos/as que acreditam que a escola possa promover a dialogicidade e a curiosidade epistemológica.             O sétimo artigo deste Dossiê, que tem como signatários Julio Cesar de Lucca Junior e Glauco Nunes Souto Ramos, analisa as perspectivas de docentes de Educação Física sobre o ensino deste componente curricular na educação infantil, na rede municipal de São Carlos/SP. As conclusões evidenciam distintos modos de ensinar e, apesar de os professores assinalarem o preparo para a docência, os autores percebem, por parte de alguns deles, a falta de clareza ao distinguir e conceituar elementos essenciais para esse exercício. No oitavo artigo, as autoras Bethânia Costa Alves Zandomínegue, Raquel Firmino Magalhães Barbosa e Vanessa Guimarães discutem uma proposta de currículo articulada para a Educação Infantil ou na Educação Infantil, a partir do diálogo com diferentes linguagens, áreas do conhecimento e sujeitos da comunidade escolar. As mediações com a cultura popular, o Projeto Institucional e o Plano de Ação da Educação Física se constituíram como engrenagens essenciais para a materialização de uma “engenharia do currículo”.             Na esteira das propostas de discussão curriculares na/para a Educação Infantil, Renata de Moraes Lino e Ingrid Dittrich Wiggers discorrem, no nono artigo, sobre um projeto pedagógico desenvolvido colaborativamente por professores de atividades e de educação física, em uma instituição pública do Distrito Federal. O projeto abordou a tríade "alimentação, higiene e valores", mediada pela literatura infantil, para nortear as atividades voltadas às crianças. Em paralelo, fomentaram a formação entre os professores participantes, como forma de subsidiar todo o desenvolvimento das etapas do projeto. Destacaram que o diálogo, o trabalho coletivo ao longo do processo e a interdisciplinaridade representam, em suas palavras, uma “perspectiva heurística” para a atuação docente na Educação Infantil.             O décimo artigo trouxe à tona uma análise dos usos e das apropriações que os dinamizadores de Artes e Educação Física fazem das danças populares na Educação Infantil de Vitória/ES. Erica Bolzan, Rodrigo Lema Del Rio Martins e André da Silva Mello apontam que esses docentes fazem diferentes usos dessas danças em seus cotidianos, em estreita articulação com os projetos institucionais das unidades escolares. Contudo, ressaltam que são poucas as mediações pedagógicas que valorizam as agências das crianças. Em que pesem as dificuldades relacionadas à questão da religiosidade para o trabalho com as danças populares, concluem que essas práticas corporais se apresentam como conhecimentos potentes para tematizações e reflexões sobre as questões étnico-raciais nas instituições infantis.             No décimo primeiro artigo, Adriana Martins Correia demonstra um trabalho pedagógico construído a partir da articulação entre a experiência da autora na docência e os debates com professores em formação inicial e continuada na Universidade, colocados em perspectiva com a literatura a respeito: das relações entre escola e poder; da educação das infâncias; e do ensino da dança na escola. Ao final, são apresentadas algumas propostas e experiências que buscam deslocar o cantar-dançar para além de uma lógica mecânica e prescritiva, vislumbrando a potência da criatividade das infâncias.             Kézia Rodrigues Nunes e Carlos Eduardo Ferraço, autores do décimo segundo artigo, contribui com este Dossiê ao focalizar as redes de sentidos de currículo com narrativas de experiências docentes de educação física na educação infantil. A pesquisa situa-se no bojo dos estudos curriculares pós-críticos da educação e realiza uma tessitura das práticas curriculares em Vitória/ES. Sem buscar realizar comparações entre o ensino remoto e o presencial, afirma, com os/as professores e suas práticas cotidianas, possibilidades gestadas na escola, indicando temáticas, saberesfazeres e questões potentes para serem ampliadas, especialmente, no contexto pandêmico atual. Encontramos, no décimo terceiro artigo, uma discussão sobre o lugar da Educação Física na Educação Infantil, no município do Rio Grande-RS. As autoras Camila Borges Ribeiro, Josiane Vian Domingues e Ângela Adriane Schmidt Bersch constatam que a inserção do/a professor/a de Educação Física, nessa etapa de ensino no município, é recente e não atende a todas as escolas municipais, mas integra um movimento estimulado pelos projetos de lei que trataram dessa questão. Por esse ângulo, identificam potencialidades e fragilidades para pensar estratégias de qualificação da ação docente nesse contexto.             O décimo quarto artigo, de autoria de Heloisa Elesbão, Natália de Borba Nunes e Maria Cecília da Silva Camargo, reconhece o corpo e o movimento como potentes manifestações expressivas das crianças. Ao considerarem a relevância do binômio corpo/movimento e da centralidade do brincar na Educação Infantil, debatem o lugar destinado pelas professoras ao brincar e ao “se-movimentar” no cotidiano de turmas de Educação Infantil em duas escolas de Ensino Fundamental, em um município da região central do Rio Grande do Sul. As narrativas docentes evidenciaram que as professoras têm perspectivas distintas sobre a importância do brincar e do “se-movimentar” no cotidiano da EI, ora reconhecendo o corpo e o movimento como linguagem infantil, ora reduzindo o binômio como instrumento para o desenvolvimento de outras habilidades.             O décimo quinto artigo lança luz sobre as experiências de inserção da Educação Física na Educação Infantil de Brasília. Neste texto, Graciele Pereira Lemos e Jonatas Maia da Costa apresentam as bases normativas do programa “Educação com Movimento”. Explicitam que o objetivo é que o professor de educação física realize um trabalho integrado e interdisciplinar junto aos pedagogos na educação das crianças pequenas. O programa anseia por um desenvolvimento em compasso com as suas diretrizes que sugerem como “auspiciosas” as contribuições da educação física na educação da infância.             O último artigo do Dossiê, décimo sexto na sequência, é assinado por Bruna Drielly de Menezes Andrade e Victor José Machado de Oliveira. Eles investigaram como se dá a presença da Educação Física na Educação Infantil em Manaus/AM. Com efeito, discorrem sobre o projeto “Caravana da Educação Infantil”, em que os professores de Educação Física se inserem na primeira etapa da Educação Básica manauara, com a função de assessorar as professoras generalistas. Para eles, a “Caravana” possui potencialidades para crescer, porém alertam para o risco de adoção do modelo disciplinar escolarizante. A síntese dos textos apresentados, nestas páginas, denota que as provocações que fizemos, na ementa do Dossiê, foram respondidas, qualitativamente, pela comunidade acadêmica da Educação Física, dedicada aos temas sensíveis à Educação Infantil. Portanto, em nossa compreensão, os artigos reforçam a percepção de que a relação dessa área de conhecimento com a primeira etapa da Educação Básica vem crescendo nas últimas décadas, impulsionada por questões legais, administrativas e, sobretudo, pedagógicas. A inserção da Educação Física tem ganhado espaço e se consolidado na dinâmica curricular da Educação Infantil, em especial, pela centralidade do corpo/movimento e dos jogos/brincadeiras nos processos pedagógicos desenvolvidos na primeira etapa da Educação Básica. Em outra vertente, o material, aqui sistematizado, reafirma a Educação Infantil como uma etapa da Educação Básica que não se organiza de forma disciplinar, preconizando que o trabalho pedagógico não seja efetivado de maneira fragmentada, tampouco assume como foco a preparação cognitiva e motora das crianças para as etapas posteriores - ensino fundamental e médio. Nesse sentido, a dinâmica curricular da Educação Infantil exige a integração entre as diferentes áreas de conhecimento e profissionais que atuam com as crianças de zero a cinco anos de idade, por meio de processos de ensino-aprendizagem que promovam o desenvolvimento integral da criança, potencializando sua participação, expressão, criação e manifestação de interesses. As reflexões tecidas, neste Dossiê, oferecem aos leitores da Revista Didática Sistêmica novas chaves de leitura sobre o assunto abordado, fazendo emergir compreensões que permitem avançar nas discussões em que as agências das crianças, com o seu protagonismo e com os sentidos que elas constroem nas relações com as atividades lúdicas, sejam valorizadas, reconhecendo-as como sujeitos ativos do seu próprio desenvolvimento e aprendizagem.
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1809-3108
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