The double face of heroes: transitional justice towards the political police (PIDE/DGS) in Portugal’s democratization, 1974-1976

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Raimundo, Filipa Alves
Data de Publicação: 2007
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: eng
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10451/56284
Resumo: A presente dissertação constitui um estudo de caso sobre o processo de criminalização e julgamento da polícia política do Estado Novo português (PIDE/DGS), durante o período da transição democrática (1974-76). O objectivo é interpretar como se processou a justiça transicional em Portugal em articulação com as restantes dimensões da transição democrática, enquanto produto de uma interacção. O processo de criminalização e julgamento da PIDE enquadra-se na literatura sobre o que é habitualmente descrito como justiça transicional, traduzida pela forma de lidar com o passado (dealing with the past) no contexto específico da mudança de regime. Perante a dificuldade de delimitação do fenómeno e definição do conceito, foi tida em conta a literatura crítica à concepção dicotómica do problema – esquecimento e perdão versus punição e criminalização (Hungtinton, 1991) – que remete para a compatibilidade de medidas existentes e que passam por amnistias, comissões de verdade, saneamentos/ lustração, julgamentos, compensação de vítimas, etc. (Welsh, 1996; Amstutz, 2005; Sikkink and Walling, 2006). Neste sentido, a justiça transicional é aqui definida como o conjunto de decisões e procedimentos de deslegitimação de um passado caracterizado pelo uso abusivo da força e da violência – independentemente da sua intensidade e alcance – levado a cabo por elites e instituições ditatoriais. A justiça transicional surge no contexto de princípios e valores democráticos emergentes, sendo desencadeada pela mudança de regime. Os seus recursos podem existir previamente ou ser excepcionalmente criados com maior ou menor peso legal, financeiro ou simbólico e com o objectivo de promover ou evitar quer a responsabilização (accountability) quer a reconciliação. Sendo um acto de justiça, o conjunto das decisões e procedimentos tende a ser punitivo, mas pode igualmente restringir-se a formas de assegurar a compensação das vítimas (restoration) ou evitar a retribuição face aos responsáveis (retribution). Neste sentido, é o produto de constrangimentos e interesses colectivos distintos – domésticos e/ou internacionais – que podem ser legados do passado ou surgir em face das estruturas de oportunidade e clivagens associadas a novas instituições, elites e grupos de interesse. A hipótese teórica de partida foi adoptada com base no trabalho de Huntington (1991), segundo a qual transições por ruptura produzem processos de punição enquanto que transições por negociação tendem a não resultar na criminalização da sua elite. A investigação foi complementada com a elaboração de uma hipótese exploratória, segundo a qual seria de esperar que à medida que a transição deu lugar à consolidação democrática, a justiça transicional em Portugal terá evoluído de punitiva para reconciliatória. O modelo analítico utilizado foi adaptado de Helga Welsh (1996) e Jon Elster (2006), e englobou três dimensões: factores históricos (background factors) – natureza e duração do Estado Novo (Schmitter and O’Donnell, 1986; McAdam, 1997; Elster, 2004), grau de repressão da PIDE/DGS e o seu papel enquanto instituição repressiva (Feine, 2006; Sikking and Walling, 2007), a existência de uma guerra colonial e o tipo de transição democrática (Huntington, 1991) – contexto político (political setting) – crise de Estado (presença de forças políticas conservadoras, simultânea democratização e descolonização, e papel político dominante dos militares) (Cerezales, 2003; Pinto, 2006), natureza das forças da oposição (Brito, 2001), mudanças no sistema partidário e dinâmica da acção colectiva – e motivações ligadas ao comportamento dos actores – subdivididas em emoções, interesses político-partidários e concepções de justiça (Elster, 2004). A investigação teve por objectivo interpretar a interacção entre aquelas dimensões, considerando que os factores históricos devem ser tidos em conta quando analisando o contexto político e as motivações dos actores, considerando que estas por sua vez actuam e são influenciadas por aquele, de onde resulta o processo geral de incriminação e julgamento da polícia política. Neste sentido, dada a existência de uma crise de Estado em Portugal no contexto da transição democrática, considerou-se relevante avaliar as motivações do comportamento dos actores, recolhendo directamente elementos sobre a interacção entre a elite militar e a elite civil, conflictos internos entre forças conservadoras, moderadas e radicais face ao tema, e percepções individuais sobre a colaboração entre as forças armadas e a polícia política na Guerra Colonial (7 entrevistas não-directivas). Dada a dinâmica de acção colectiva e a natureza das forças da oposição, procurou-se captar o tipo, intensidade e variação das reividicações da sociedade civil e sua articulação com os partidos políticos (imprensa da época). Considerou-se ainda relevante medir o peso relativo da dimensão legal (análise qualitativa da legislação), assim como a posição dos partidos políticos, com base na argumentação sobre legitimidade democrática versus revolucionária (análise de conteúdo de debates parlamentares) Finalmente, tendo em conta os dados sobre a natureza e duração do Estado Novo, nível de reperssão e funções da polícia política e tipo de transição democrática, pretendeu-se definir o equilíbrio final entre medidas punitivas e de perdão, através de indicadores e tendências gerais sobre os julgamentos finais (análise qualitativa da documentação oficial e individual do Serviço de Coordenação da Extinção da PIDE/DGS e LP e análise estatística (com base numa amostra não repersentativa) dos processos individuais dos Tribunais Militares de Lisboa e colecções de acordãos do Supremo Tribunal Militar). Em concordância com a literatura já produzida sobre a transição democrática portuguesa e outras formas de ligar com o passado (Cerezales, 2003; Pinto, 2006; Rezola, 2006) concluiu-se que o processo de criminalização e julgamento dos agentes e colaboradores da PIDE se caracterizou por três momentos fundamentais,: 1) a fase de indefinição; 2) a fase de reforço da legitimidade revolucionária; 3) a fase de reforço da legitimidade democrática. A primeira fase (Abril de 1974 – Março de 1975) caracterizou-se pela indefinição do processo, para a qual contribuem as relações institucionais existentes entre as forças políticas conservadoras (ala spinolista), a elite militar (MFA) e a elite do antigo regime (ausência de motivações, guerra colonial); a predominância de temas mais decisivos para a institucionalização do novo regime político e características do mesmo (Parlamentar versus Presidencial; Sistema federal versus independência das colónias; calendariazação das eleições para a Assembleia Constituinte), ao mesmo tempo que se assistiu à espontânea emergência de reivindicações por parte da sociedade civil (anti-fascista e comunista), à rápida instrumentalização e posicionamento estratégico dos partidos políticos em função dos seus interesses (PS, PCP, partidos de extrema-esquerda). Formalmente, esta fase correspondeu à detenção de vários membros da polícia política na metrópole e nas colónias (cerca de 1000 em Junho) e à fuga de vários inspectores com responsabilidades acrescidas, nomeadamente em casos de assassinato (Rosa Casaco); à criação da “Comissão de Extinção” e à sua estrutura formal de funcionamento (despacho do CEMGFA, 5 de Junho de 1974), apesar das constantes mudanças na direcção (JSN – Rosa Coutinho, Galvão de Melo) e desenvolvimento de investigações sobre casos de assassinato (Humberto Delgado, Dias Coelho e Ribeiro dos Santos), que não careciam de legilação extraordinária. A segunda fase (Março – Novembro de 1975) foi marcada pelo reforço da legitimidade revolucionária, quer do ponto de vista das reivindicações, quer do ponto da legislação extraordinária. Para isso contribuem as constantes acusações à ineficácia e inoperância da “Comissão de Extinção”, paralelamente ao aparente reforço do domínio comunista (Miguel Judas); a intensificação da reivindicações da sociedade civil mediante e acusações de cumplicidades (fuga de alcoentre); as repercussões dos resultados eleitorais sobre o posicionamento público dos partidos políticos (moderação do discurso PS). Formalmente, esta fase correspondeu à publicação da lei de incriminação (Lei 8/75 de 25 de Julho), à criação de um tribunal especial (Lei 13/75 de Novembro). Na terceira fase (Novembro de 1975 – Janeiro de 1977) salienta-se o reforço da legitimidade democrática e a irreversibilidade do processo, na sequência do fim do “período revolucionário” e vitória das forças moderadas. Formalmente, esta fase foi marcada pela estruturação e reforço legal dos procedimentos (Lei 16/75 de Dezembro, Decreto-Lei 13/76 de Janeiro); pela publicação de legislação adicional de regulação os processos jurídicos: liberdade provisória, recurso, legislação ordinária (Lei 16/75 e Lei 18/75 de Dezembro), pela aprovação da nova Constituição (inclusão da Lei 8/75 nas disposições finais e transitórias), de definição de circunstâncias atenuantes extraordinárias (Decreto-Lei 349/76 de Março), à qual o novo poder legislativo (civil) reage com a publicação de uma lei de reforço da punição (Lei 1/77, de 12 de Janeiro). A terceira fase estende-se ainda a todo o processo de consolidação democrática, (julgamentos em tribunal militar). Os dados utilizados ilustram tendências no sentido de: 75% de julgamentos, categorias coincidentes com a esturutra da instituição (maioria de agentes menores), 18 meses de prisão preventiva sobrepondo-se às penas aplicadas, 68% de sentenças até 6 meses. Conclui-se que a transição democrática portuguesa fez um ajuste de contas com o seu passado, mas a punição deu lugar à reconciliação com a consolidação do regime. Neste processo, a não criminalização da repressão mais intensa – Guerra Colonial com responsabilidade partilhada entre as forças armadas e polícia política – leva a concluir que a criminalização e julgamento da polícia política portuguesa foi um processo de justiça transicional punitivo que envolveu perdão e reconciliação, dada a natureza dos decisores e a marginalização da elite civil e dos partidos políticos da esfera legislativa e processual.
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spelling The double face of heroes: transitional justice towards the political police (PIDE/DGS) in Portugal’s democratization, 1974-1976Justiça transicionalTransição democráticaPolícia políticaPortugalPuniçãoDomínio/Área Científica:Ciências SociaisA presente dissertação constitui um estudo de caso sobre o processo de criminalização e julgamento da polícia política do Estado Novo português (PIDE/DGS), durante o período da transição democrática (1974-76). O objectivo é interpretar como se processou a justiça transicional em Portugal em articulação com as restantes dimensões da transição democrática, enquanto produto de uma interacção. O processo de criminalização e julgamento da PIDE enquadra-se na literatura sobre o que é habitualmente descrito como justiça transicional, traduzida pela forma de lidar com o passado (dealing with the past) no contexto específico da mudança de regime. Perante a dificuldade de delimitação do fenómeno e definição do conceito, foi tida em conta a literatura crítica à concepção dicotómica do problema – esquecimento e perdão versus punição e criminalização (Hungtinton, 1991) – que remete para a compatibilidade de medidas existentes e que passam por amnistias, comissões de verdade, saneamentos/ lustração, julgamentos, compensação de vítimas, etc. (Welsh, 1996; Amstutz, 2005; Sikkink and Walling, 2006). Neste sentido, a justiça transicional é aqui definida como o conjunto de decisões e procedimentos de deslegitimação de um passado caracterizado pelo uso abusivo da força e da violência – independentemente da sua intensidade e alcance – levado a cabo por elites e instituições ditatoriais. A justiça transicional surge no contexto de princípios e valores democráticos emergentes, sendo desencadeada pela mudança de regime. Os seus recursos podem existir previamente ou ser excepcionalmente criados com maior ou menor peso legal, financeiro ou simbólico e com o objectivo de promover ou evitar quer a responsabilização (accountability) quer a reconciliação. Sendo um acto de justiça, o conjunto das decisões e procedimentos tende a ser punitivo, mas pode igualmente restringir-se a formas de assegurar a compensação das vítimas (restoration) ou evitar a retribuição face aos responsáveis (retribution). Neste sentido, é o produto de constrangimentos e interesses colectivos distintos – domésticos e/ou internacionais – que podem ser legados do passado ou surgir em face das estruturas de oportunidade e clivagens associadas a novas instituições, elites e grupos de interesse. A hipótese teórica de partida foi adoptada com base no trabalho de Huntington (1991), segundo a qual transições por ruptura produzem processos de punição enquanto que transições por negociação tendem a não resultar na criminalização da sua elite. A investigação foi complementada com a elaboração de uma hipótese exploratória, segundo a qual seria de esperar que à medida que a transição deu lugar à consolidação democrática, a justiça transicional em Portugal terá evoluído de punitiva para reconciliatória. O modelo analítico utilizado foi adaptado de Helga Welsh (1996) e Jon Elster (2006), e englobou três dimensões: factores históricos (background factors) – natureza e duração do Estado Novo (Schmitter and O’Donnell, 1986; McAdam, 1997; Elster, 2004), grau de repressão da PIDE/DGS e o seu papel enquanto instituição repressiva (Feine, 2006; Sikking and Walling, 2007), a existência de uma guerra colonial e o tipo de transição democrática (Huntington, 1991) – contexto político (political setting) – crise de Estado (presença de forças políticas conservadoras, simultânea democratização e descolonização, e papel político dominante dos militares) (Cerezales, 2003; Pinto, 2006), natureza das forças da oposição (Brito, 2001), mudanças no sistema partidário e dinâmica da acção colectiva – e motivações ligadas ao comportamento dos actores – subdivididas em emoções, interesses político-partidários e concepções de justiça (Elster, 2004). A investigação teve por objectivo interpretar a interacção entre aquelas dimensões, considerando que os factores históricos devem ser tidos em conta quando analisando o contexto político e as motivações dos actores, considerando que estas por sua vez actuam e são influenciadas por aquele, de onde resulta o processo geral de incriminação e julgamento da polícia política. Neste sentido, dada a existência de uma crise de Estado em Portugal no contexto da transição democrática, considerou-se relevante avaliar as motivações do comportamento dos actores, recolhendo directamente elementos sobre a interacção entre a elite militar e a elite civil, conflictos internos entre forças conservadoras, moderadas e radicais face ao tema, e percepções individuais sobre a colaboração entre as forças armadas e a polícia política na Guerra Colonial (7 entrevistas não-directivas). Dada a dinâmica de acção colectiva e a natureza das forças da oposição, procurou-se captar o tipo, intensidade e variação das reividicações da sociedade civil e sua articulação com os partidos políticos (imprensa da época). 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Em concordância com a literatura já produzida sobre a transição democrática portuguesa e outras formas de ligar com o passado (Cerezales, 2003; Pinto, 2006; Rezola, 2006) concluiu-se que o processo de criminalização e julgamento dos agentes e colaboradores da PIDE se caracterizou por três momentos fundamentais,: 1) a fase de indefinição; 2) a fase de reforço da legitimidade revolucionária; 3) a fase de reforço da legitimidade democrática. A primeira fase (Abril de 1974 – Março de 1975) caracterizou-se pela indefinição do processo, para a qual contribuem as relações institucionais existentes entre as forças políticas conservadoras (ala spinolista), a elite militar (MFA) e a elite do antigo regime (ausência de motivações, guerra colonial); a predominância de temas mais decisivos para a institucionalização do novo regime político e características do mesmo (Parlamentar versus Presidencial; Sistema federal versus independência das colónias; calendariazação das eleições para a Assembleia Constituinte), ao mesmo tempo que se assistiu à espontânea emergência de reivindicações por parte da sociedade civil (anti-fascista e comunista), à rápida instrumentalização e posicionamento estratégico dos partidos políticos em função dos seus interesses (PS, PCP, partidos de extrema-esquerda). Formalmente, esta fase correspondeu à detenção de vários membros da polícia política na metrópole e nas colónias (cerca de 1000 em Junho) e à fuga de vários inspectores com responsabilidades acrescidas, nomeadamente em casos de assassinato (Rosa Casaco); à criação da “Comissão de Extinção” e à sua estrutura formal de funcionamento (despacho do CEMGFA, 5 de Junho de 1974), apesar das constantes mudanças na direcção (JSN – Rosa Coutinho, Galvão de Melo) e desenvolvimento de investigações sobre casos de assassinato (Humberto Delgado, Dias Coelho e Ribeiro dos Santos), que não careciam de legilação extraordinária. A segunda fase (Março – Novembro de 1975) foi marcada pelo reforço da legitimidade revolucionária, quer do ponto de vista das reivindicações, quer do ponto da legislação extraordinária. Para isso contribuem as constantes acusações à ineficácia e inoperância da “Comissão de Extinção”, paralelamente ao aparente reforço do domínio comunista (Miguel Judas); a intensificação da reivindicações da sociedade civil mediante e acusações de cumplicidades (fuga de alcoentre); as repercussões dos resultados eleitorais sobre o posicionamento público dos partidos políticos (moderação do discurso PS). Formalmente, esta fase correspondeu à publicação da lei de incriminação (Lei 8/75 de 25 de Julho), à criação de um tribunal especial (Lei 13/75 de Novembro). Na terceira fase (Novembro de 1975 – Janeiro de 1977) salienta-se o reforço da legitimidade democrática e a irreversibilidade do processo, na sequência do fim do “período revolucionário” e vitória das forças moderadas. 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Perante a dificuldade de delimitação do fenómeno e definição do conceito, foi tida em conta a literatura crítica à concepção dicotómica do problema – esquecimento e perdão versus punição e criminalização (Hungtinton, 1991) – que remete para a compatibilidade de medidas existentes e que passam por amnistias, comissões de verdade, saneamentos/ lustração, julgamentos, compensação de vítimas, etc. (Welsh, 1996; Amstutz, 2005; Sikkink and Walling, 2006). Neste sentido, a justiça transicional é aqui definida como o conjunto de decisões e procedimentos de deslegitimação de um passado caracterizado pelo uso abusivo da força e da violência – independentemente da sua intensidade e alcance – levado a cabo por elites e instituições ditatoriais. A justiça transicional surge no contexto de princípios e valores democráticos emergentes, sendo desencadeada pela mudança de regime. Os seus recursos podem existir previamente ou ser excepcionalmente criados com maior ou menor peso legal, financeiro ou simbólico e com o objectivo de promover ou evitar quer a responsabilização (accountability) quer a reconciliação. Sendo um acto de justiça, o conjunto das decisões e procedimentos tende a ser punitivo, mas pode igualmente restringir-se a formas de assegurar a compensação das vítimas (restoration) ou evitar a retribuição face aos responsáveis (retribution). Neste sentido, é o produto de constrangimentos e interesses colectivos distintos – domésticos e/ou internacionais – que podem ser legados do passado ou surgir em face das estruturas de oportunidade e clivagens associadas a novas instituições, elites e grupos de interesse. A hipótese teórica de partida foi adoptada com base no trabalho de Huntington (1991), segundo a qual transições por ruptura produzem processos de punição enquanto que transições por negociação tendem a não resultar na criminalização da sua elite. A investigação foi complementada com a elaboração de uma hipótese exploratória, segundo a qual seria de esperar que à medida que a transição deu lugar à consolidação democrática, a justiça transicional em Portugal terá evoluído de punitiva para reconciliatória. O modelo analítico utilizado foi adaptado de Helga Welsh (1996) e Jon Elster (2006), e englobou três dimensões: factores históricos (background factors) – natureza e duração do Estado Novo (Schmitter and O’Donnell, 1986; McAdam, 1997; Elster, 2004), grau de repressão da PIDE/DGS e o seu papel enquanto instituição repressiva (Feine, 2006; Sikking and Walling, 2007), a existência de uma guerra colonial e o tipo de transição democrática (Huntington, 1991) – contexto político (political setting) – crise de Estado (presença de forças políticas conservadoras, simultânea democratização e descolonização, e papel político dominante dos militares) (Cerezales, 2003; Pinto, 2006), natureza das forças da oposição (Brito, 2001), mudanças no sistema partidário e dinâmica da acção colectiva – e motivações ligadas ao comportamento dos actores – subdivididas em emoções, interesses político-partidários e concepções de justiça (Elster, 2004). A investigação teve por objectivo interpretar a interacção entre aquelas dimensões, considerando que os factores históricos devem ser tidos em conta quando analisando o contexto político e as motivações dos actores, considerando que estas por sua vez actuam e são influenciadas por aquele, de onde resulta o processo geral de incriminação e julgamento da polícia política. Neste sentido, dada a existência de uma crise de Estado em Portugal no contexto da transição democrática, considerou-se relevante avaliar as motivações do comportamento dos actores, recolhendo directamente elementos sobre a interacção entre a elite militar e a elite civil, conflictos internos entre forças conservadoras, moderadas e radicais face ao tema, e percepções individuais sobre a colaboração entre as forças armadas e a polícia política na Guerra Colonial (7 entrevistas não-directivas). Dada a dinâmica de acção colectiva e a natureza das forças da oposição, procurou-se captar o tipo, intensidade e variação das reividicações da sociedade civil e sua articulação com os partidos políticos (imprensa da época). Considerou-se ainda relevante medir o peso relativo da dimensão legal (análise qualitativa da legislação), assim como a posição dos partidos políticos, com base na argumentação sobre legitimidade democrática versus revolucionária (análise de conteúdo de debates parlamentares) Finalmente, tendo em conta os dados sobre a natureza e duração do Estado Novo, nível de reperssão e funções da polícia política e tipo de transição democrática, pretendeu-se definir o equilíbrio final entre medidas punitivas e de perdão, através de indicadores e tendências gerais sobre os julgamentos finais (análise qualitativa da documentação oficial e individual do Serviço de Coordenação da Extinção da PIDE/DGS e LP e análise estatística (com base numa amostra não repersentativa) dos processos individuais dos Tribunais Militares de Lisboa e colecções de acordãos do Supremo Tribunal Militar). Em concordância com a literatura já produzida sobre a transição democrática portuguesa e outras formas de ligar com o passado (Cerezales, 2003; Pinto, 2006; Rezola, 2006) concluiu-se que o processo de criminalização e julgamento dos agentes e colaboradores da PIDE se caracterizou por três momentos fundamentais,: 1) a fase de indefinição; 2) a fase de reforço da legitimidade revolucionária; 3) a fase de reforço da legitimidade democrática. 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Formalmente, esta fase correspondeu à detenção de vários membros da polícia política na metrópole e nas colónias (cerca de 1000 em Junho) e à fuga de vários inspectores com responsabilidades acrescidas, nomeadamente em casos de assassinato (Rosa Casaco); à criação da “Comissão de Extinção” e à sua estrutura formal de funcionamento (despacho do CEMGFA, 5 de Junho de 1974), apesar das constantes mudanças na direcção (JSN – Rosa Coutinho, Galvão de Melo) e desenvolvimento de investigações sobre casos de assassinato (Humberto Delgado, Dias Coelho e Ribeiro dos Santos), que não careciam de legilação extraordinária. A segunda fase (Março – Novembro de 1975) foi marcada pelo reforço da legitimidade revolucionária, quer do ponto de vista das reivindicações, quer do ponto da legislação extraordinária. Para isso contribuem as constantes acusações à ineficácia e inoperância da “Comissão de Extinção”, paralelamente ao aparente reforço do domínio comunista (Miguel Judas); a intensificação da reivindicações da sociedade civil mediante e acusações de cumplicidades (fuga de alcoentre); as repercussões dos resultados eleitorais sobre o posicionamento público dos partidos políticos (moderação do discurso PS). Formalmente, esta fase correspondeu à publicação da lei de incriminação (Lei 8/75 de 25 de Julho), à criação de um tribunal especial (Lei 13/75 de Novembro). Na terceira fase (Novembro de 1975 – Janeiro de 1977) salienta-se o reforço da legitimidade democrática e a irreversibilidade do processo, na sequência do fim do “período revolucionário” e vitória das forças moderadas. Formalmente, esta fase foi marcada pela estruturação e reforço legal dos procedimentos (Lei 16/75 de Dezembro, Decreto-Lei 13/76 de Janeiro); pela publicação de legislação adicional de regulação os processos jurídicos: liberdade provisória, recurso, legislação ordinária (Lei 16/75 e Lei 18/75 de Dezembro), pela aprovação da nova Constituição (inclusão da Lei 8/75 nas disposições finais e transitórias), de definição de circunstâncias atenuantes extraordinárias (Decreto-Lei 349/76 de Março), à qual o novo poder legislativo (civil) reage com a publicação de uma lei de reforço da punição (Lei 1/77, de 12 de Janeiro). A terceira fase estende-se ainda a todo o processo de consolidação democrática, (julgamentos em tribunal militar). Os dados utilizados ilustram tendências no sentido de: 75% de julgamentos, categorias coincidentes com a esturutra da instituição (maioria de agentes menores), 18 meses de prisão preventiva sobrepondo-se às penas aplicadas, 68% de sentenças até 6 meses. Conclui-se que a transição democrática portuguesa fez um ajuste de contas com o seu passado, mas a punição deu lugar à reconciliação com a consolidação do regime. Neste processo, a não criminalização da repressão mais intensa – Guerra Colonial com responsabilidade partilhada entre as forças armadas e polícia política – leva a concluir que a criminalização e julgamento da polícia política portuguesa foi um processo de justiça transicional punitivo que envolveu perdão e reconciliação, dada a natureza dos decisores e a marginalização da elite civil e dos partidos políticos da esfera legislativa e processual.
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