Salavessa, partir e voltar? o fenómeno do envelhecimento e da desertificação

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Miguéns, João Transmontano de Oliveira
Data de Publicação: 2000
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10174/15080
Resumo: Introdução - Salavessa é Alentejo, mas não é bem Alentejo. Tem traços de Beira. É menos plano, menos amplo, mais variado. Terra de transição, nela ainda encontramos os espaços abertos e muito levemente ondulados de peneplanície alentej ana a par com os relevos vigorosos da Serra de S. Mamede. Os latifúndios do Sul dão lugar a hortas, pequenas propriedades que se dividem por muitos donos e se dispõem em mosaico numa paisagem de morros mais marcados e vales mais cavados. As suas terras desenham-se em poucas linhas, as suas ruas e casas são de uma só cor. Respira-se na aldeia quietude, e silêncio. É a sensação de que o tempo não tem pressa. Os seus habitantes parecem carregar vidas duras mas altivas e que parecem querer dizer que não vale a pena ter pressa, que o tempo é parte de uma eternidade. Fortes laços de afinidade ligam-me à aldeia de Salavessa. Dela foram naturais os meus avós paternos e o meu pai, dela fizeram parte muitos momentos da minha infância e adolescência. E embora me fosse distanciando da aldeia, à medida que os anos iam passando, nunca dela me desliguei, embora os contactos se tornassem bem mais espaçados, porém sempre acompanhei de maneira intensa o seu trajecto de envelhecimento e desertificação. A riqueza, se é que ela existe, neste trabalho, reside antes de mais, no facto de ser uma história atenta aos detalhes mais reveladores deste universo social. Gostaria de focar um aspecto relativo à escolha do local que constitui o objecto da dissertação da minha tese. Macfarlane (1977) enunciou claramente os prós e os contras do método de estudo de uma comunidade, debruçando-se em particular sobre o problema da delineação da limitação da sua realidade. Com que precisão delimitamos a comunidade que estudamos? As suas fronteiras são definidas pela arena geográfica? Agimos segundo uma divisão política ou administrativa? Ou centramo-nos num grupo de pessoas que habitam em determinado local? Estes critérios raramente coincidem e podem sem dúvida, mudar ao longo do tempo. Salavessa não é excepção. Simplesmente os seus problemas coabitam também com os problemas concelhios e mesmo numa mancha mais longa com quase o interior do país. Apesar de manter a sua identidade, os problemas da desertificação e envelhecimento são similares com outras terras, não havendo limites administrativos, geográficos ou outros que estabeleçam fronteiras. Pela minha mão aprendi ainda mais com este trabalho a sentir a Salavessa. Terra fechada, a negar a desanuviada perspectiva dos grandes e livres espaços, a aldeia esconde por defesa os seus dramas mais dolorosos, os seus contrastes mais originais e pungentes. Sentir hoje a Salavessa é um acto que deixa marcas, uma tarefa que simultaneamente desencanta e fortalece a quem se empenha em descobrir os Porquês, de uma existência absurda, geograficamente situada a escassas dezenas de quilómetros daquilo a que se convencionou chamar progresso e civilização, mas infinitamente distante das nossas ideias feitas e assentes de citadinos evoluídos. Salavessa, uma aldeia entre muitas outras do Alentejo, do interior, imagem típica do envelhecimento e desertificação, é actualmente terra onde as pessoas se fortalecem de sol, onde a felicidade ainda sobrevive. E por isto eu digo que esta permanente redescoberta que vivi, me desencantou, pela ausência de uma terra que eu desejaria com vida, mas ao mesmo tempo me trouxe esperança, pelos objectivos que passam pelas propostas de revitalização que proponho nesta dissertação, que espero encontrem eco nos homens responsáveis politicamente, no sentido de transformar homens e mulheres condenados em seres que podem aguardar, serena e pacificamente a transformação e revitalização. Não posso, nem quero esquecer, que a Salavessa depois deste trabalho, entrou com mais força na minha vida, de forma intensa e imperecível. Os problemas da Salavessa são os de quase todas as aldeias do Interior. Do que conheço da Salavessa, e dos seus caminhos de ilusões do passado e do presente, permanentemente perdidos, cheguei ao fim desta dissertação de tese, a sentir os seus dramas, que um dia hão-de ter limites. Por isso, passei a estar convosco, Salavessences, e vos acompanho no vosso desencanto do passado, e na vossa esperança de sempre.
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Dela foram naturais os meus avós paternos e o meu pai, dela fizeram parte muitos momentos da minha infância e adolescência. E embora me fosse distanciando da aldeia, à medida que os anos iam passando, nunca dela me desliguei, embora os contactos se tornassem bem mais espaçados, porém sempre acompanhei de maneira intensa o seu trajecto de envelhecimento e desertificação. A riqueza, se é que ela existe, neste trabalho, reside antes de mais, no facto de ser uma história atenta aos detalhes mais reveladores deste universo social. Gostaria de focar um aspecto relativo à escolha do local que constitui o objecto da dissertação da minha tese. Macfarlane (1977) enunciou claramente os prós e os contras do método de estudo de uma comunidade, debruçando-se em particular sobre o problema da delineação da limitação da sua realidade. Com que precisão delimitamos a comunidade que estudamos? As suas fronteiras são definidas pela arena geográfica? Agimos segundo uma divisão política ou administrativa? Ou centramo-nos num grupo de pessoas que habitam em determinado local? Estes critérios raramente coincidem e podem sem dúvida, mudar ao longo do tempo. Salavessa não é excepção. Simplesmente os seus problemas coabitam também com os problemas concelhios e mesmo numa mancha mais longa com quase o interior do país. Apesar de manter a sua identidade, os problemas da desertificação e envelhecimento são similares com outras terras, não havendo limites administrativos, geográficos ou outros que estabeleçam fronteiras. Pela minha mão aprendi ainda mais com este trabalho a sentir a Salavessa. Terra fechada, a negar a desanuviada perspectiva dos grandes e livres espaços, a aldeia esconde por defesa os seus dramas mais dolorosos, os seus contrastes mais originais e pungentes. Sentir hoje a Salavessa é um acto que deixa marcas, uma tarefa que simultaneamente desencanta e fortalece a quem se empenha em descobrir os Porquês, de uma existência absurda, geograficamente situada a escassas dezenas de quilómetros daquilo a que se convencionou chamar progresso e civilização, mas infinitamente distante das nossas ideias feitas e assentes de citadinos evoluídos. Salavessa, uma aldeia entre muitas outras do Alentejo, do interior, imagem típica do envelhecimento e desertificação, é actualmente terra onde as pessoas se fortalecem de sol, onde a felicidade ainda sobrevive. E por isto eu digo que esta permanente redescoberta que vivi, me desencantou, pela ausência de uma terra que eu desejaria com vida, mas ao mesmo tempo me trouxe esperança, pelos objectivos que passam pelas propostas de revitalização que proponho nesta dissertação, que espero encontrem eco nos homens responsáveis politicamente, no sentido de transformar homens e mulheres condenados em seres que podem aguardar, serena e pacificamente a transformação e revitalização. Não posso, nem quero esquecer, que a Salavessa depois deste trabalho, entrou com mais força na minha vida, de forma intensa e imperecível. Os problemas da Salavessa são os de quase todas as aldeias do Interior. Do que conheço da Salavessa, e dos seus caminhos de ilusões do passado e do presente, permanentemente perdidos, cheguei ao fim desta dissertação de tese, a sentir os seus dramas, que um dia hão-de ter limites. 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