Ambientes decorativos românticos em casas nobres do Norte de Portugal : expressões oitocentistas e sua permanência até ao século XX

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Osório, Helena Cristina Afonso de Azevedo
Data de Publicação: 2007
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10400.14/9854
Resumo: Os ambientes decorativos onde todas as artes se harmonizam, integram-se num quase esquecimento. Alguns ambientes do Romantismo por nós estudados chegaram intactos aos dias de hoje. Infelizmente, outros foram vítimas de partilhas entre herdeiros e da insustentável manutenção das grandes casas. Frisamos bem a reforma inevitável nos ambientes do século XIX porque a mudança de hábitos tornou imprescindíveis novos compartimentos temáticos e objectos multifacetados para os decorar. O respeito pelos ambientes românticos não foi o esperado, até porque a fugaz evolução de gosto, aliada às contingências da sociedade de consumo, arrasou a sua autenticidade. O facto de serem revivalistas pôs em causa a antiguidade. Vamos procurar entendê-lo através dos ambientes românticos apresentados, pois terá chegado a altura de melhor olhar este «estilo novo» ainda considerado de gosto duvidoso e cuja inspiração proveio dos ambientes régios. No Norte de Portugal, não faltam casas com ambientes característicos deste período. Pena que não se dê o valor da história a um Romantismo que se mantém vivo. As artes oitocentistas vão buscar influências a todas as épocas, recriando o passado mais remoto, com o saber artístico, sócio-cultural e já industrializado de então. É esta aprendizagem que nos interessa focar, na medida em que mudou o rumo do estar, viver e sentir a partir de um recuo feito até à Idade Média. Repensando a existência, retirando e acumulando saberes anteriores, o século XIX evoluiu como o resumo das artes e ciências com interpretação própria. Compreendemo-lo não apenas no contexto de ser a grande era das mudanças e invenções mas, quase isolado, à mercê dos olhares e especiais sentires de cada indivíduo inserido numa dada família e camada social. A região pode fazer a diferença e não por acaso nos debruçamos sobre ambientes de casas nobres do Norte de Portugal. Parece-nos óbvio que a região acima do rio Douro, historicamente mais fechada e isolada na sua vida privada – sem esquecermos toda a zona duriense e Beira Alta –, tem melhor conservado valores e tradições ancestrais no seio das suas famílias nobres. Pela velocidade das modas, circulação de bens e famílias, adesão a estrangeiros e estrangeirismos, centralização do poder, Lisboa acabou por ser penalizada no que respeita a ambientes oitocentistas intactos. Resta-nos como referência a decoração do Palácio Nacional da Ajuda, provavelmente única no género pois até a decoração do Palácio das Tulherias foi destruída pela comuna de Paris em 1871. Sem esquecer o Palácio da Pena, considerado em 2007 uma das maravilhas de Portugal, o que atesta a popularidade actual destes ambientes. Em casas civis, os ambientes continuam abertos ao estudo não se distanciando do comportamento, gosto e viver de uma sociedade sensível ao mais variado tipo de manifestações artísticas. As casas apresentadas distinguem-se entre rurais e urbanas, sendo mistas em alguns casos, na medida em que confirmamos que «não há uma família urbana como não há uma família rural». As casas nobres de Guimarães têm algum destaque nesta nossa dissertação pois, inicialmente, pensamos debruçar-nos sobre ambientes vimaranenses em exclusivo. A abundância, originalidade e riqueza histórico-artística de exemplos a Norte do rio Douro fizeram alterar o nosso rumo, que se estendeu a outras localidades. A nossa dissertação serve de homenagem ao movimento romântico e de elogio àqueles que respeitam a sua memória, continuando a amar os ambientes destas casas, erigidas ou apenas intervencionadas em Oitocentos, que encontramos descritas nos romances e opiniões de escritores notáveis como António Augusto Teixeira de Vasconcellos, Camilo Castello Branco, Eça de Queiroz. São eles que perpetuam os modos, gentes, vivências, preconceitos (e conceitos), aromas de tempos onde o passado nunca ficou perdido. Partindo do geral, e de uma caracterização abrangente, destacamos seis dos exemplos que nos pareceram relevantes em termos de ambientes decorativos românticos em casas nobres susceptíveis de exercerem uma influência relevante na época. Num plano mais específico e estrito, estudamos ambientes de outras casas, dispersas pelo Norte português, aos quais fazemos referência. Acresce ao interesse destes espólios, característicos do acervo de famílias de nobresa fidalga e burguesa (alguns dos quais já desmantelados), a descrição de bens – o que nos transporta para a realidade das grandes casas da Nobreza da Corte, fazendo apelo para uma nobreza em ascensão desde a segunda metade do século XVIII. Após a pesquisa de casas nobres, destacamos tanto ambientes preservados como recentemente desmantelados com partilhas. Consideramos as casas de Villar d` Allen e Visconde da Gândara (no Porto), Carmo, S. Cipriano e Sezim (em Guimarães) e Boavista (em Ponte da Barca), como exemplos a relevar. Villar d` Allen, apesar de ter sido remodelada inicialmente por João Allen, foi seu filho, Alfredo Allen, 1.º Visconde de Villar d’ Allen, que a transformou no museu vivo de curiosidades ligadas à família e de naturalia, que se mantém. De todas as estudadas, Villar d’ Allen é, porventura, uma das mais românticas na medida em que conserva todas as memórias e intervenções. A casa neoclássica erigida, no Porto Oriental, pelo 1.º Visconde da Gândara apresentava já aquecimento central por meio de caldeiras num piso subterrâneo. A Casa do Carmo, ligada à família dos condes de Margaride, em Guimarães, e que recebeu os últimos reis de Portugal, encontra-se despida do seu recheio, que dispersou pela família. (Infelizmente, sofreu obras recentes que desvirtuaram os seus interiores.) No mesmo concelho, Nicola Bigaglia (1841-1908) foi chamado a intervir em São Cipriano depois de projectar a casa que é hoje conhecida por Museu da Quinta de Santiago, em Leça da Palmeira. Ao medievalismo primitivo acrescentou estéticas decorativas e arquitectónicas já enraizadas num Romantismo maduro que influenciou as primeiras décadas do século XX. Comparamo-la à Quinta de Pindela, cuja casa sofreu um último restauro e alargamento em 1885, operados pelo 2.º Visconde de Pindella, amigo pessoal de João Santiago (senhor de S. Cipriano) e pai de D. Júlia do Carmo, casada com um filho do 1.º Conde de Margaride que remodelou a casa para receber as Majestades. Também em Guimarães, distinguimos a possível contribuição do gosto de Auguste Roquemont (1804-1852) no papel de parede dos salões da Casa de Sezim. Este artista passou grandes estadas na referida localidade, deixando a sua marca por várias habitações que visitava como amigo e filho bastardo de um príncipe alemão. Já os ambientes da Casa da Boavista, em Ponte da Barca, foram concebidos em finais do século XIX por Bento Malheiro Pereira Pita de Vasconcelos, 4.º Visconde da Carreira. Apresentam gosto inglês, aparentado com Villar d’ Allen, sendo uma sua característica a farta luz proveniente das amplas aberturas que permitem o convívio com a natureza. A inspiração proveio da Casa da Carreira, dos Távora de Viana do Castelo, actualmente sede da Câmara Municipal. As obras oitocentistas foram realizadas em simultâneo, tendo os proprietários recorrido aos mesmos artífices. Nesta nossa dissertação importa-nos focar, como um todo, as artes decorativas no domínio privado que circulavam dos interiores para os exteriores com alguns elementos que permaneciam de tempos passados em viagem até à Idade Média. Foram elas produzidas em Portugal do século XIX e, já antes na Europa, pois a realidade nacional é sempre um reflexo tardio das tendências europeias. Se bem que, nesta época, muitos casos havia em que a moda ditada em Paris era logo seguida em Portugal. O expor bem, no sentido estético e na vontade de reter o olhar, não era significativo. O expor muito passou a ser um ideal – como acontece em Villar d` Allen, onde se voltou a constituir um pequeno museu de peças íntimas e memórias vivas, em homenagem a João Allen. Nos jardins, encontramos casas de fresco que se enquadram na arquitectura paisagística de formas ora geométricas ora pretensamente espontâneas. Salientamos os jardins labirínticos setecentistas do Paço de S. Cipriano, adaptados ao gosto romântico. A sua Casa de Manteiga é mesmo de arquitectura de raiz renascentista. Foi transportada para junto do tanque setecentista, com aranhões em forma de leão, em inícios do século XX. Nos próprios arbustos ou espécies arbóreas, talham-se esconderijos semelhantes a grutas onde se serviam bebidas exóticas como chá, café e chocolate. Os jardins e mata de Villar d` Allen, formados a partir de várias quintas, estão mais relacionados com o espírito romântico com percursos sinuosos, quase selvagens, pontuados por elementos arquitectónicos. Os jardins de Sezim ficam mais próximos deste ideal inglês onde as instalações da natureza, na natureza, beneficiavam de maior liberdade. De entre as espécies exóticas ressalvamos as cameleiras ou japoneiras trazidas para Portugal desde os Descobrimentos (primeiro da China, depois do Japão) que resultaram em espécies com nomes portugueses, como em Villar d’ Allen. Em termos dos arquivos existentes nas casas abordadas, deparamos com uma situação lacunosa. Não podemos afirmar que a documentação escasseie, pois a maior parte das casas estudadas tiveram a fortuna de se manterem no seio das mesmas famílias e de serem estimadas. No século XIX e inícios do século XX, havia uma real preocupação em acumular memórias e documentos (cartas, postais, recibos, cadernos de contas) e, destes arquivos desorganizados, dispersaram documentos fundamentais. Concluímos que tudo se interliga. Os artistas e executantes circulavam, apropriando-se de exemplos públicos e transpondo-os nos particulares. Os donos das casas mantinham relações com troca de saberes. Infelizmente, a maior parte dos estudos realizados e que importa concluir não cabe no tempo e espaço da presente dissertação, pelo que nos limitaremos a uma imagem de gosto (ou gostos) e ideais artísticos que sublinham a função social e cultural destes ambientes.
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Frisamos bem a reforma inevitável nos ambientes do século XIX porque a mudança de hábitos tornou imprescindíveis novos compartimentos temáticos e objectos multifacetados para os decorar. O respeito pelos ambientes românticos não foi o esperado, até porque a fugaz evolução de gosto, aliada às contingências da sociedade de consumo, arrasou a sua autenticidade. O facto de serem revivalistas pôs em causa a antiguidade. Vamos procurar entendê-lo através dos ambientes românticos apresentados, pois terá chegado a altura de melhor olhar este «estilo novo» ainda considerado de gosto duvidoso e cuja inspiração proveio dos ambientes régios. No Norte de Portugal, não faltam casas com ambientes característicos deste período. Pena que não se dê o valor da história a um Romantismo que se mantém vivo. As artes oitocentistas vão buscar influências a todas as épocas, recriando o passado mais remoto, com o saber artístico, sócio-cultural e já industrializado de então. É esta aprendizagem que nos interessa focar, na medida em que mudou o rumo do estar, viver e sentir a partir de um recuo feito até à Idade Média. Repensando a existência, retirando e acumulando saberes anteriores, o século XIX evoluiu como o resumo das artes e ciências com interpretação própria. Compreendemo-lo não apenas no contexto de ser a grande era das mudanças e invenções mas, quase isolado, à mercê dos olhares e especiais sentires de cada indivíduo inserido numa dada família e camada social. A região pode fazer a diferença e não por acaso nos debruçamos sobre ambientes de casas nobres do Norte de Portugal. Parece-nos óbvio que a região acima do rio Douro, historicamente mais fechada e isolada na sua vida privada – sem esquecermos toda a zona duriense e Beira Alta –, tem melhor conservado valores e tradições ancestrais no seio das suas famílias nobres. Pela velocidade das modas, circulação de bens e famílias, adesão a estrangeiros e estrangeirismos, centralização do poder, Lisboa acabou por ser penalizada no que respeita a ambientes oitocentistas intactos. Resta-nos como referência a decoração do Palácio Nacional da Ajuda, provavelmente única no género pois até a decoração do Palácio das Tulherias foi destruída pela comuna de Paris em 1871. Sem esquecer o Palácio da Pena, considerado em 2007 uma das maravilhas de Portugal, o que atesta a popularidade actual destes ambientes. Em casas civis, os ambientes continuam abertos ao estudo não se distanciando do comportamento, gosto e viver de uma sociedade sensível ao mais variado tipo de manifestações artísticas. As casas apresentadas distinguem-se entre rurais e urbanas, sendo mistas em alguns casos, na medida em que confirmamos que «não há uma família urbana como não há uma família rural». As casas nobres de Guimarães têm algum destaque nesta nossa dissertação pois, inicialmente, pensamos debruçar-nos sobre ambientes vimaranenses em exclusivo. A abundância, originalidade e riqueza histórico-artística de exemplos a Norte do rio Douro fizeram alterar o nosso rumo, que se estendeu a outras localidades. A nossa dissertação serve de homenagem ao movimento romântico e de elogio àqueles que respeitam a sua memória, continuando a amar os ambientes destas casas, erigidas ou apenas intervencionadas em Oitocentos, que encontramos descritas nos romances e opiniões de escritores notáveis como António Augusto Teixeira de Vasconcellos, Camilo Castello Branco, Eça de Queiroz. São eles que perpetuam os modos, gentes, vivências, preconceitos (e conceitos), aromas de tempos onde o passado nunca ficou perdido. Partindo do geral, e de uma caracterização abrangente, destacamos seis dos exemplos que nos pareceram relevantes em termos de ambientes decorativos românticos em casas nobres susceptíveis de exercerem uma influência relevante na época. Num plano mais específico e estrito, estudamos ambientes de outras casas, dispersas pelo Norte português, aos quais fazemos referência. Acresce ao interesse destes espólios, característicos do acervo de famílias de nobresa fidalga e burguesa (alguns dos quais já desmantelados), a descrição de bens – o que nos transporta para a realidade das grandes casas da Nobreza da Corte, fazendo apelo para uma nobreza em ascensão desde a segunda metade do século XVIII. Após a pesquisa de casas nobres, destacamos tanto ambientes preservados como recentemente desmantelados com partilhas. Consideramos as casas de Villar d` Allen e Visconde da Gândara (no Porto), Carmo, S. Cipriano e Sezim (em Guimarães) e Boavista (em Ponte da Barca), como exemplos a relevar. Villar d` Allen, apesar de ter sido remodelada inicialmente por João Allen, foi seu filho, Alfredo Allen, 1.º Visconde de Villar d’ Allen, que a transformou no museu vivo de curiosidades ligadas à família e de naturalia, que se mantém. De todas as estudadas, Villar d’ Allen é, porventura, uma das mais românticas na medida em que conserva todas as memórias e intervenções. A casa neoclássica erigida, no Porto Oriental, pelo 1.º Visconde da Gândara apresentava já aquecimento central por meio de caldeiras num piso subterrâneo. A Casa do Carmo, ligada à família dos condes de Margaride, em Guimarães, e que recebeu os últimos reis de Portugal, encontra-se despida do seu recheio, que dispersou pela família. (Infelizmente, sofreu obras recentes que desvirtuaram os seus interiores.) No mesmo concelho, Nicola Bigaglia (1841-1908) foi chamado a intervir em São Cipriano depois de projectar a casa que é hoje conhecida por Museu da Quinta de Santiago, em Leça da Palmeira. Ao medievalismo primitivo acrescentou estéticas decorativas e arquitectónicas já enraizadas num Romantismo maduro que influenciou as primeiras décadas do século XX. Comparamo-la à Quinta de Pindela, cuja casa sofreu um último restauro e alargamento em 1885, operados pelo 2.º Visconde de Pindella, amigo pessoal de João Santiago (senhor de S. Cipriano) e pai de D. Júlia do Carmo, casada com um filho do 1.º Conde de Margaride que remodelou a casa para receber as Majestades. Também em Guimarães, distinguimos a possível contribuição do gosto de Auguste Roquemont (1804-1852) no papel de parede dos salões da Casa de Sezim. Este artista passou grandes estadas na referida localidade, deixando a sua marca por várias habitações que visitava como amigo e filho bastardo de um príncipe alemão. Já os ambientes da Casa da Boavista, em Ponte da Barca, foram concebidos em finais do século XIX por Bento Malheiro Pereira Pita de Vasconcelos, 4.º Visconde da Carreira. Apresentam gosto inglês, aparentado com Villar d’ Allen, sendo uma sua característica a farta luz proveniente das amplas aberturas que permitem o convívio com a natureza. A inspiração proveio da Casa da Carreira, dos Távora de Viana do Castelo, actualmente sede da Câmara Municipal. As obras oitocentistas foram realizadas em simultâneo, tendo os proprietários recorrido aos mesmos artífices. Nesta nossa dissertação importa-nos focar, como um todo, as artes decorativas no domínio privado que circulavam dos interiores para os exteriores com alguns elementos que permaneciam de tempos passados em viagem até à Idade Média. Foram elas produzidas em Portugal do século XIX e, já antes na Europa, pois a realidade nacional é sempre um reflexo tardio das tendências europeias. Se bem que, nesta época, muitos casos havia em que a moda ditada em Paris era logo seguida em Portugal. O expor bem, no sentido estético e na vontade de reter o olhar, não era significativo. O expor muito passou a ser um ideal – como acontece em Villar d` Allen, onde se voltou a constituir um pequeno museu de peças íntimas e memórias vivas, em homenagem a João Allen. Nos jardins, encontramos casas de fresco que se enquadram na arquitectura paisagística de formas ora geométricas ora pretensamente espontâneas. Salientamos os jardins labirínticos setecentistas do Paço de S. Cipriano, adaptados ao gosto romântico. A sua Casa de Manteiga é mesmo de arquitectura de raiz renascentista. Foi transportada para junto do tanque setecentista, com aranhões em forma de leão, em inícios do século XX. Nos próprios arbustos ou espécies arbóreas, talham-se esconderijos semelhantes a grutas onde se serviam bebidas exóticas como chá, café e chocolate. Os jardins e mata de Villar d` Allen, formados a partir de várias quintas, estão mais relacionados com o espírito romântico com percursos sinuosos, quase selvagens, pontuados por elementos arquitectónicos. Os jardins de Sezim ficam mais próximos deste ideal inglês onde as instalações da natureza, na natureza, beneficiavam de maior liberdade. De entre as espécies exóticas ressalvamos as cameleiras ou japoneiras trazidas para Portugal desde os Descobrimentos (primeiro da China, depois do Japão) que resultaram em espécies com nomes portugueses, como em Villar d’ Allen. Em termos dos arquivos existentes nas casas abordadas, deparamos com uma situação lacunosa. Não podemos afirmar que a documentação escasseie, pois a maior parte das casas estudadas tiveram a fortuna de se manterem no seio das mesmas famílias e de serem estimadas. No século XIX e inícios do século XX, havia uma real preocupação em acumular memórias e documentos (cartas, postais, recibos, cadernos de contas) e, destes arquivos desorganizados, dispersaram documentos fundamentais. Concluímos que tudo se interliga. Os artistas e executantes circulavam, apropriando-se de exemplos públicos e transpondo-os nos particulares. Os donos das casas mantinham relações com troca de saberes. Infelizmente, a maior parte dos estudos realizados e que importa concluir não cabe no tempo e espaço da presente dissertação, pelo que nos limitaremos a uma imagem de gosto (ou gostos) e ideais artísticos que sublinham a função social e cultural destes ambientes.Decorative environments where all the arts harmonize, integrated in an almost oblivion. Some environments of Romanticism studied by us have arrived intact to this day. Unfortunately, others were victims of sharing between heirs and the unsustainable maintenance of large houses. We strongly emphasize the inevitable reform in the nineteenth century environments because the change of habits made essential new thematic compartments and multifaceted objects to decorate them. Respect for romantic environments was not what was expected, because the fleeting evolution of taste, coupled with the contingencies of consumer society, wiped out its authenticity. The fact of being revivalists took away their antiquity. Let us try to understand it through the romantic environments presented, because it is time to look better at this "new style" still considered of doubtful taste and whose inspiration came from the royal environments. In the north of Portugal, there are no shortage of houses with environments typical of this period. It is a pity that the value of history is not given to a Romanticism that remains alive. The eighteenth-century arts will seek influences at all times, recreating the most remote past, with the artistic and socio-cultural knowledge, and already industrialized time. We are interested in focusing on this learning that has changed the course of being, living and feeling in a journey back in time to the Middle Ages. Rethinking existence, withdrawing and accumulating previous knowledge, the nineteenth century evolved as the abstract of the arts and sciences with its own interpretation. We understand this not only in the context of being the great era of changes and inventions, but almost isolated, at the mercy of the special looks and feelings of each individual inserted in a determined family and social layer. The region can make the difference and not by chance we look at environments of noble houses of the North of Portugal. It seems obvious to us that the region above the river Douro, historically more closed and isolated in its private life – not forgetting the entire area of Douro and Beira Alta – has better preserved ancestral values and traditions within its noble families. By the speed of fashions, circulation of goods and families, adhesion to foreigners and foreigners, centralization of power, Lisbon ended up being penalized for intact eighteenth-century environments. The decoration of Ajuda National Palace is probably the only one of its kind, since even the decoration of Tuileries Palace was destroyed by the commune of Paris in 1871. Without forgetting the Palácio da Pena, considered in 2007 one of the wonders of Portugal, which attests to the current popularity of these environments. In civil houses, environments remain open to study, not distancing themselves from the behavior, taste and living of a society sensitive to the most varied type of artistic manifestations. The houses presented differ between rural and urban, and are mixed in some cases, as we confirm that "there is no urban family as there is no rural family". The noble houses of Guimarães have some highlight in our dissertation because, initially, we think about exclusive Vimaranenses environments. The abundance, originality and historical-artistic richness of these examples of the north Douro river have changed our course, which has spread to other localities. Our dissertation serves as a tribute to the romantic movement and of praise to those who respect its memory, continuing to love the environments of these houses, erected or only intervened in the Eighth, which we find described in the novels and opinions of notable writers such as António Augusto Teixeira de Vasconcellos, Camilo Castello Branco, Eça de Queiroz. It is they who perpetuate the ways, people, experiences, prejudices (and concepts), scents of times where the past was never lost. Starting from the general, and of a comprehensive characterization, we highlight six of the examples that seemed relevant to us in terms of romantic decorative environments in noble houses that could exert a relevant influence at the time. In a more specific and strict plan, we study environments of other houses, dispersed by the North of Portugal, to which we make reference. In addition to the interest of these estates, characteristic of the collection of noble and bourgeois noble families (some of which have already been dismantled), the description of goods – which transports us to the reality of the great houses of the Court Nobility, appealing to a nobility in since the second half of the 18th century. After searching for noble houses, we highlight both preserved and recently dismantled environments with shares. We consider the houses of Villar d` Allen and Visconde da Gândara (in Porto), Carmo, S. Cipriano and Sezim (in Guimarães) and Boavista (in Ponte da Barca), as examples to be highlighted. Villar d` Allen, although initially remodeled by John Allen, was his son, Alfredo Allen, 1st Viscount of Villar d' Allen, who transformed it into the living museum of curiosities linked to the family and naturalia, which remains. Of all those studied, Villar d' Allen is perhaps one of the most romantic in that it preserves all memories and interventions. In the neoclassical house, erected in Eastern Porto by the 1st Viscount of Gândara, already exhibited a central heating by means of boilers in an underground floor. Casa do Carmo, attached to the family of the counts of Margaride in Guimarães, and which received the last kings of Portugal, is stripped of its filling, which has been dispersed by the family. (Unfortunately, it has undergone recent works that have distorted its interiors.) In the same county, Nicola Bigaglia (1841-1908) was called to intervene in S. Cipriano after designing the house which is now known as Museum of Quinta de Santiago, in Leça da Palmeira. Primitive medievalism added decorative and architectural aesthetics already rooted in a mature romanticism that influenced the first decades of the twentieth century. We compare it to Quinta de Pindela, whose house was last restored and enlarged in 1885, operated by the 2nd Viscount of Pindella, personal friend of João Santiago (lord of S. Cipriano) and father of D. Júlia do Carmo, married with a son of the 1st Count of Margaride who remodeled the house to receive the Majesties. Also in Guimarães, we distinguish the possible contribution of the taste of Auguste Roquemont (1804-1852) in the wallpaper of the halls of the House of Sezim. This artist spent great stays in that locality, leaving his mark by several dwellings that he visited like friend and bastard son of a German prince. The ambiences of the Casa da Boavista, in Ponte da Barca, were conceived at the end of the 19th century by Bento Malheiro Pereira Pita de Vasconcelos, 4th Viscount of Carreira. It have an English taste, related to Villar d' Allen, and its characteristic is the abundant light coming from the wide openings that allow the conviviality with nature. The inspiration came from the Casa da Carreira, the family Távora of Viana do Castelo, now the seat of the Town Hall. The eighteenth-century works were carried out simultaneously, and the owners appealed to the same craftsmen. In this dissertation it is important to focus on the decorative arts in the private domain that circulated from the interiors to the exteriors with some elements that remained from time to time in the Middle Ages. They were produced in nineteenth-century in Portugal and, even earlier in Europe, because our national reality is always a late reflection of European trends. Although, at this time, there were many cases in which the fashion dictated in Paris was soon followed in Portugal. Exposing well, in the aesthetic sense and in the will to retain the gaze, was not significant. Exposing a lot became an ideal – as in Villar d` Allen, where became a small museum of intimate pieces and living memories, in honor of John Allen. In the gardens, we find houses of “fresco” that fit into the landscape architecture of forms sometimes geometric or presumably spontaneous. We highlight the 17th century labyrinthine gardens of the Paço de S. Cipriano, adapted to the romantic taste. Its Butter House is even of Renaissance architecture. It was transported to the seventeenth century tank, with lion-shaped spiders, in the early twentieth century. In the shrubs or tree species themselves, caves-like hideouts were served exotic drinks such as tea, coffee, and chocolate. The gardens and woods of Villar d` Allen, formed from several farms, are more related to the romantic spirit with sinuous, almost savage paths punctuated by architectural elements. Sezim gardens are closer to this English ideal where nature facilities, in nature, benefit from greater freedom. Among the exotic species are the “cameleiras” or “japoneiras” brought to Portugal from the Discoveries (first from China, after Japan) that resulted in species with Portuguese names, as in Villar d' Allen. In terms of the archives in the houses covered, we are faced with a lacuna situation. We can not say that documentation is scarce, since most of the houses studied were fortunate to remain within the same families and to be estimated. In the nineteenth and early twentieth centuries, there was a real concern to accumulate memories and documents (letters, postcards, receipts, notebooks) and, from these disorganized files, dispersed key documents. We conclude that everything is interconnected. Artists and performers circulated, appropriating public examples and transposing them into private individuals. The owners of the houses had relations with exchange of knowledge. Unfortunately, most of the studies that have been carried out and which are to be concluded do not fit the time and space of this dissertation, so we will limit ourselves to an image of artistic taste (or tastes) and ideals that underline the social and cultural function of these environments.Sousa, Gonçalo de Vasconcelos eVeritati - Repositório Institucional da Universidade Católica PortuguesaOsório, Helena Cristina Afonso de Azevedo2013-01-15T10:09:10Z200920072009-01-01T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10400.14/9854porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2023-07-12T17:14:39Zoai:repositorio.ucp.pt:10400.14/9854Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-19T18:08:33.128401Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse
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Osório, Helena Cristina Afonso de Azevedo
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Revivalism
Romanticism
description Os ambientes decorativos onde todas as artes se harmonizam, integram-se num quase esquecimento. Alguns ambientes do Romantismo por nós estudados chegaram intactos aos dias de hoje. Infelizmente, outros foram vítimas de partilhas entre herdeiros e da insustentável manutenção das grandes casas. Frisamos bem a reforma inevitável nos ambientes do século XIX porque a mudança de hábitos tornou imprescindíveis novos compartimentos temáticos e objectos multifacetados para os decorar. O respeito pelos ambientes românticos não foi o esperado, até porque a fugaz evolução de gosto, aliada às contingências da sociedade de consumo, arrasou a sua autenticidade. O facto de serem revivalistas pôs em causa a antiguidade. Vamos procurar entendê-lo através dos ambientes românticos apresentados, pois terá chegado a altura de melhor olhar este «estilo novo» ainda considerado de gosto duvidoso e cuja inspiração proveio dos ambientes régios. No Norte de Portugal, não faltam casas com ambientes característicos deste período. Pena que não se dê o valor da história a um Romantismo que se mantém vivo. As artes oitocentistas vão buscar influências a todas as épocas, recriando o passado mais remoto, com o saber artístico, sócio-cultural e já industrializado de então. É esta aprendizagem que nos interessa focar, na medida em que mudou o rumo do estar, viver e sentir a partir de um recuo feito até à Idade Média. Repensando a existência, retirando e acumulando saberes anteriores, o século XIX evoluiu como o resumo das artes e ciências com interpretação própria. Compreendemo-lo não apenas no contexto de ser a grande era das mudanças e invenções mas, quase isolado, à mercê dos olhares e especiais sentires de cada indivíduo inserido numa dada família e camada social. A região pode fazer a diferença e não por acaso nos debruçamos sobre ambientes de casas nobres do Norte de Portugal. Parece-nos óbvio que a região acima do rio Douro, historicamente mais fechada e isolada na sua vida privada – sem esquecermos toda a zona duriense e Beira Alta –, tem melhor conservado valores e tradições ancestrais no seio das suas famílias nobres. Pela velocidade das modas, circulação de bens e famílias, adesão a estrangeiros e estrangeirismos, centralização do poder, Lisboa acabou por ser penalizada no que respeita a ambientes oitocentistas intactos. Resta-nos como referência a decoração do Palácio Nacional da Ajuda, provavelmente única no género pois até a decoração do Palácio das Tulherias foi destruída pela comuna de Paris em 1871. Sem esquecer o Palácio da Pena, considerado em 2007 uma das maravilhas de Portugal, o que atesta a popularidade actual destes ambientes. Em casas civis, os ambientes continuam abertos ao estudo não se distanciando do comportamento, gosto e viver de uma sociedade sensível ao mais variado tipo de manifestações artísticas. As casas apresentadas distinguem-se entre rurais e urbanas, sendo mistas em alguns casos, na medida em que confirmamos que «não há uma família urbana como não há uma família rural». As casas nobres de Guimarães têm algum destaque nesta nossa dissertação pois, inicialmente, pensamos debruçar-nos sobre ambientes vimaranenses em exclusivo. A abundância, originalidade e riqueza histórico-artística de exemplos a Norte do rio Douro fizeram alterar o nosso rumo, que se estendeu a outras localidades. A nossa dissertação serve de homenagem ao movimento romântico e de elogio àqueles que respeitam a sua memória, continuando a amar os ambientes destas casas, erigidas ou apenas intervencionadas em Oitocentos, que encontramos descritas nos romances e opiniões de escritores notáveis como António Augusto Teixeira de Vasconcellos, Camilo Castello Branco, Eça de Queiroz. São eles que perpetuam os modos, gentes, vivências, preconceitos (e conceitos), aromas de tempos onde o passado nunca ficou perdido. Partindo do geral, e de uma caracterização abrangente, destacamos seis dos exemplos que nos pareceram relevantes em termos de ambientes decorativos românticos em casas nobres susceptíveis de exercerem uma influência relevante na época. Num plano mais específico e estrito, estudamos ambientes de outras casas, dispersas pelo Norte português, aos quais fazemos referência. Acresce ao interesse destes espólios, característicos do acervo de famílias de nobresa fidalga e burguesa (alguns dos quais já desmantelados), a descrição de bens – o que nos transporta para a realidade das grandes casas da Nobreza da Corte, fazendo apelo para uma nobreza em ascensão desde a segunda metade do século XVIII. Após a pesquisa de casas nobres, destacamos tanto ambientes preservados como recentemente desmantelados com partilhas. Consideramos as casas de Villar d` Allen e Visconde da Gândara (no Porto), Carmo, S. Cipriano e Sezim (em Guimarães) e Boavista (em Ponte da Barca), como exemplos a relevar. Villar d` Allen, apesar de ter sido remodelada inicialmente por João Allen, foi seu filho, Alfredo Allen, 1.º Visconde de Villar d’ Allen, que a transformou no museu vivo de curiosidades ligadas à família e de naturalia, que se mantém. De todas as estudadas, Villar d’ Allen é, porventura, uma das mais românticas na medida em que conserva todas as memórias e intervenções. A casa neoclássica erigida, no Porto Oriental, pelo 1.º Visconde da Gândara apresentava já aquecimento central por meio de caldeiras num piso subterrâneo. A Casa do Carmo, ligada à família dos condes de Margaride, em Guimarães, e que recebeu os últimos reis de Portugal, encontra-se despida do seu recheio, que dispersou pela família. (Infelizmente, sofreu obras recentes que desvirtuaram os seus interiores.) No mesmo concelho, Nicola Bigaglia (1841-1908) foi chamado a intervir em São Cipriano depois de projectar a casa que é hoje conhecida por Museu da Quinta de Santiago, em Leça da Palmeira. Ao medievalismo primitivo acrescentou estéticas decorativas e arquitectónicas já enraizadas num Romantismo maduro que influenciou as primeiras décadas do século XX. Comparamo-la à Quinta de Pindela, cuja casa sofreu um último restauro e alargamento em 1885, operados pelo 2.º Visconde de Pindella, amigo pessoal de João Santiago (senhor de S. Cipriano) e pai de D. Júlia do Carmo, casada com um filho do 1.º Conde de Margaride que remodelou a casa para receber as Majestades. Também em Guimarães, distinguimos a possível contribuição do gosto de Auguste Roquemont (1804-1852) no papel de parede dos salões da Casa de Sezim. Este artista passou grandes estadas na referida localidade, deixando a sua marca por várias habitações que visitava como amigo e filho bastardo de um príncipe alemão. Já os ambientes da Casa da Boavista, em Ponte da Barca, foram concebidos em finais do século XIX por Bento Malheiro Pereira Pita de Vasconcelos, 4.º Visconde da Carreira. Apresentam gosto inglês, aparentado com Villar d’ Allen, sendo uma sua característica a farta luz proveniente das amplas aberturas que permitem o convívio com a natureza. A inspiração proveio da Casa da Carreira, dos Távora de Viana do Castelo, actualmente sede da Câmara Municipal. As obras oitocentistas foram realizadas em simultâneo, tendo os proprietários recorrido aos mesmos artífices. Nesta nossa dissertação importa-nos focar, como um todo, as artes decorativas no domínio privado que circulavam dos interiores para os exteriores com alguns elementos que permaneciam de tempos passados em viagem até à Idade Média. Foram elas produzidas em Portugal do século XIX e, já antes na Europa, pois a realidade nacional é sempre um reflexo tardio das tendências europeias. Se bem que, nesta época, muitos casos havia em que a moda ditada em Paris era logo seguida em Portugal. O expor bem, no sentido estético e na vontade de reter o olhar, não era significativo. O expor muito passou a ser um ideal – como acontece em Villar d` Allen, onde se voltou a constituir um pequeno museu de peças íntimas e memórias vivas, em homenagem a João Allen. Nos jardins, encontramos casas de fresco que se enquadram na arquitectura paisagística de formas ora geométricas ora pretensamente espontâneas. Salientamos os jardins labirínticos setecentistas do Paço de S. Cipriano, adaptados ao gosto romântico. A sua Casa de Manteiga é mesmo de arquitectura de raiz renascentista. Foi transportada para junto do tanque setecentista, com aranhões em forma de leão, em inícios do século XX. Nos próprios arbustos ou espécies arbóreas, talham-se esconderijos semelhantes a grutas onde se serviam bebidas exóticas como chá, café e chocolate. Os jardins e mata de Villar d` Allen, formados a partir de várias quintas, estão mais relacionados com o espírito romântico com percursos sinuosos, quase selvagens, pontuados por elementos arquitectónicos. Os jardins de Sezim ficam mais próximos deste ideal inglês onde as instalações da natureza, na natureza, beneficiavam de maior liberdade. De entre as espécies exóticas ressalvamos as cameleiras ou japoneiras trazidas para Portugal desde os Descobrimentos (primeiro da China, depois do Japão) que resultaram em espécies com nomes portugueses, como em Villar d’ Allen. Em termos dos arquivos existentes nas casas abordadas, deparamos com uma situação lacunosa. Não podemos afirmar que a documentação escasseie, pois a maior parte das casas estudadas tiveram a fortuna de se manterem no seio das mesmas famílias e de serem estimadas. No século XIX e inícios do século XX, havia uma real preocupação em acumular memórias e documentos (cartas, postais, recibos, cadernos de contas) e, destes arquivos desorganizados, dispersaram documentos fundamentais. Concluímos que tudo se interliga. Os artistas e executantes circulavam, apropriando-se de exemplos públicos e transpondo-os nos particulares. Os donos das casas mantinham relações com troca de saberes. Infelizmente, a maior parte dos estudos realizados e que importa concluir não cabe no tempo e espaço da presente dissertação, pelo que nos limitaremos a uma imagem de gosto (ou gostos) e ideais artísticos que sublinham a função social e cultural destes ambientes.
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