Reconversão em habitação
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2012 |
Tipo de documento: | Dissertação |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) |
Texto Completo: | http://hdl.handle.net/10174/12334 |
Resumo: | “Reconversão. Gerar um lugar no que parecia ser um mero desperdício. É preciso sonhar mais os espaços. Como vamos sonhando estas páginas. São o lugar que criámos. Com os nossos instrumentos e referências e vontades. Um lugar que evoluirá no tempo e nas palavras.” Pedro Jordão, Revista Nu nº02 “Lugares”, p.02. Num mundo repleto de ideias e pensamentos, abandonos e perdas, sonhos e conquistas, encontrase um Homem criador de um mundo próprio no qual a casa é o seu abrigo. Um abrigo, como sinónimo de protecção, pode ser qualquer tipo de espaço, com capacidade de responder a várias exigências e que, a partir de um pensamento lógico, pode ser transformado, renovado, tornando‐se em espaço de habitar aberto para um mundo exterior. Um mundo no qual a cidade, feita de descontinuidade, sofreu um processo de crescimento e urbanização, expandindo os seus limites; enquanto que as aldeias permaneceram estagnadas no tempo, não houve evolução apenas o abandono das marcas e actividades próprias de um povo. Esta consequente evolução, principalmente industrial e tecnológica, levou ao abandono de antigos edifícios, os quais desempenhavam uma função utilitária e se mostravam imprescindíveis na vida do homem, tornando‐se consequentemente em elementos marcantes na paisagem e na memória de uma época. São exemplos as pequenas fábricas, armazéns, celeiros ou palheiros, moinhos e adegas, esquecidos no tempo, degradados com o abandono. O que deles permanece e sobrevive ao vigor do tempo provoca no homem um estado de sensibilidade, desafiando‐o a proteger e a manter de alguma forma a sua história, memória ou simplesmente a sua qualidade material, espacial e formal. Para além de reabilitar ou recuperar o que existe, as preexistências (De pre‐ +existência, qualidade do que é preexistente, prioridade de existência, existência anterior.), interessa também reutilizar e reconverter, transformando e dando uma nova função ao espaço. Numa época em que a habitação e o modo de habitar se tornam importantes na vivência do homem, porque não utilizar estas preexistências e transformá‐las no seu abrigo, atribuindo‐lhes uma nova função mas mantendo a sua própria essência? “A reconversão é um tipo de intervenção que possibilita uma relativa liberdade no desenho de projecto e tem por base critérios que permitem um maior grau de transformação, face a outro tipo de acções, como o restauro ou a reabilitação.”1 Esta intervenção parte da percepção do espaço, da relação que este tem com o lugar e da relação que poderá vir a ter com quem o habitar. Torna‐se, desta forma, pertinente questionar de que modo um edifício que foi criado para uma função pode ser transformado em habitação, reconhecendo quais os factores condicionantes ou estimulantes que poderão permitir essa transformação. Há um programa habitacional que de certa forma se ajustará à preexistência como matéria de projecto e que só fará sentido se revelar funcionalidade e conforto, sendo importante a sensibilidade e conhecimento do arquitecto e a relação deste com quem vai habitar – o utente. “(...) a nova função traz sempre consigo a necessidade de reorganizar a funcionalidade dos espaços para acomodar o novo uso. Este processo que obriga à adaptação dos espaços à nova função é sempre delicado e poucas vezes bem sucedido.” 2 A preexistência, muito mais que um limite no processo de projectar, pode tornar‐se no elemento provocatório para o questionar de uma nova forma de habitar. Interessa perceber, então, o que é o habitar, o abrigo, a casa; de que forma estes conceitos se relacionam, não só entre eles mas também com a paisagem, o lugar e o homem. Numa intervenção deste carácter, de que modo é alterada a ligação com a paisagem e o território, o lugar, abordando questões como a memória e a essência do lugar – o genius loci. “Podemos dizer que, por numerosos que sejam os tempos e os espaços em que se fala do lugar, é pela impossibilidade de ser outra coisa, que é deste lugar que se refere, e a sua essência nos permite identificá‐lo, nomeá‐lo e distingui‐lo de imediato de todo e qualquer outro lugar.” 3 Após abordagem e análise destes vários temas, e para complementar este processo, são contextualizadas e analisadas cinco obras de cinco arquitectos diferentes, as quais, para além de se diferenciarem em vários aspectos, têm um ponto comum em relação ao conceito inicial. Ambos projectos partem de preexistências, sendo estas reconvertidas em habitações unifamiliares privilegiando a qualidade arquitectónica. Esta análise descritiva e crítica procura explorar o processo arquitectónico de uma intervenção com esta especificidade, perceber as suas consequências e delimitar as principais condicionantes, compreendendo de que forma estas influenciaram a condição final – a CASA. Uma abordagem baseada numa investigação documental, na procura de perceber o processo projectual perante os diversos contextos em comum entre os cinco casos. Estes são exemplos representativos das questões deste tema e são apresentados segundo uma lógica cronológica na qual não se pretende distinguir por qualquer tipo de relevância. É de notar, nos casos referidos, uma consciente importância em estabelecer diálogos entre a tradição e a contemporaneidade, e um verdadeiro interesse no estudo das várias especificidades inerentes à reconversão de usos. São espaços e formas que sugerem emoções, recriam imagens e indicam referências, num pleno respeito pela tradição, pelas memórias, pela autenticidade do habitar. Cinco arquitectos, de diferentes linguagens, que se recusam a propor modelos ou a seguir regras e padrões, e se mostram conscientes da importância de projectar sobre o construído, com uma forte sensibilidade aliada a um vasto conhecimento. Estes projectos apresentam‐se como casos específicos no percurso e nos eixos de referência dos seus autores, sempre ligados às suas próprias vivências passadas e que, de certa forma, influenciaram cada resultado. Procuram uma ética de intervenção equilibrada e perceptível, onde é de notar a preocupação na ideia de continuidade, embora a preexistência seja vista como um elemento provocatório e definidor do projecto, no qual o saber contemporâneo se torna no prolongamento do tempo antigo. São cinco casos nos quais as preexistências apresentam escala e capacidade de integrar um novo programa ‐ habitação unifamiliar. Entre transformações em habitações permanentes ou habitações sazonais e temporárias, quatro dos casos em estudo situam‐se em diferentes pontos de Portugal e um só caso num outro país europeu, Bélgica, permitindo assim uma análise mais abrangente e comparativa. São cinco projectos, de cinco diferentes arquitectos, que partem todos de preexistências, cada uma com as suas próprias condicionantes, e que se transformam em cinco diferentes soluções seguindo uma linha de pensamento, de procura e de diálogo semelhante. Os edifícios rurais, construídos como resposta a uma necessidade existente, eram definidos consoante o tipo de produto que iriam armazenar e consequentemente a altura do ano (estação do ano). Uma arquitectura rural e vernacular definida e caracterizada a partir da relação existente entre a terra e o homem; e por isso seleccionaram‐se cinco casos, todos eles diferentes no tipo de função que desempenhavam: a quinta (na qual se armazenavam utensílios e alguns produtos para utilização na terra), o palheiro (local de armazenamento de palha), a adega (armazenamento e tratamento da uva para transformação em vinho), o sequeiro (armazenamento de fruta e secagem de cereais) e o celeiro (armazenamento de cereais). Partindo destes casos alcançaram‐se variadas soluções na procura da continuidade em construir sobre o construído, partindo de memórias e linguagens já definidas, as quais poderiam ser transformadas e definidas como uma nova arquitectura, neste caso contemporânea. No primeiro caso adicionam‐se novos volumes aos já existentes, no segundo mantêm‐se os materiais e técnicas tradicionais, no terceiro parte‐se do preexistente como um limite entre dois tempos, no quarto caso reconstrói‐se a preexistência e redefine‐se as suas proporções e dimensões e, no último caso é o próprio arquitecto que acaba por ser o habitante, permitindo assim uma relação mais acertada entre a transformação do espaço construído e quem o irá habitar. 1 . “Senti necessidade de não alterar a relação deste núcleo construído com a paisagem, como se fosse só um volume, só uma casa. E no entanto articulá‐lo. Há mais núcleos deste tipo, nem sempre bem articulados. É fundamental manter a concentração das construções e não disseminar.” Arquitecto Álvaro Siza Vieira ‐ antiga quinta . Casa na Bélgica . 1997_2003. 2 . “É a tentativa de fundir os tempos num tempo que é híbrido em que aparece, de alguma forma, à vista a cara do edifício em diferentes tempos.” Arquitecto João Mendes Ribeiro ‐ antigo palheiro . Casa em Cortegaça . 2000_2004. 3 . “O que é rico no processo, é desenhar o espaço que existe entre as duas coisas, é desenhar o ar entre o limite exterior e os novos compartimentos que precisam de existir. E não só o programa como o desenho é organizado em ordem a esse espaço que fica.” Arquitectos Manuel e Francisco Aires Mateus ‐ antiga adega . Casa em Brejos de Azeitão . 2001_2003. 4 . “Entre a absoluta fidelidade ao preexistente, necessariamente obrigando a um qualquer acrescento, e a sua reinterpretação num novo modelo que preservasse a sua essência, escolhemos o segundo caminho. Assim renasceu o sequeiro (...).” Arquitecto José Gigante ‐ antigo sequeiro . Casa em Guimarães . 2002_2005. 5 . “Ardeu um celeiro em Montemor. Alguém aproveitou a oportunidade, compartimentou o espaço e fez uma casa banal. Amanhou o quintal, cuidou da nogueira e rasgou janelas para a rua principal. Depois de habitada, a casa foi novamente abandonada.” Arquitecto Miguel Figueira – antigo celeiro . Casa de Montemor . 2006; ### ABSTRACT: “Conversion. Generate a place in what appeared to be a mere waste. We need to dream more spaces. How we are dreaming these pages. They are the place that we created. With our tools, references and wills. A place that will evolve over time and words.” Pedro Jordão, Revista Nu nº02 “Lugares”, p.02. In a world full of ideas and thoughts, abandonment and losses, dreams and achievements, there is a man creator of his own world in which the home is his refuge. A shelter as synonymous of protection may be any type of space, capable of responding to various requirements and which, from a logical thought, can be transformed, refurbished, becoming a living space open to an outside world. A world in which the city, made of discontinuity, underwent a process of growth and urbanization, expanding its limits, while the villages remained stagnant over time, there was no evolution only the abandonment of their own brands and activities of the people. This subsequent developments, especially industrial and technology, led to the abandonment of old buildings, which played a utilitarian function and showed themselves indispensable in the life of man, thus becoming its main features in the landscape and memory of a time. The examples are small factories, warehouses, barns, mills and wineries, forgotten over time, degraded with abandonment. What remains of them and survive the force of time, cause in man a state of sensitivity, daring him to protect and maintain somehow their story, memory or simply its quality material, spatial and formal. Besides to rehabilitate or restore what exists, preexistence (De + pre‐existence, quality that is preexisting priority of existence, former existence.), also interested to reuse and convert, turning and giving a new function space. At a time when housing and way of living become important in the experience of man, why not use these preexistences and turn them to their shelter, giving them a new function but keeping its essence? "The conversion is a type of intervention which allows a relative freedom in the design of the project and is based on criteria that allow a greater degree of transformation, compared to other types of actions, such as the restoration or rehabilitation." This intervention starts of the perception of space, the relationship that it has with the place and the relationship that is likely to have with whoever who will inhabit it. It is thus pertinent to question how a building that was created for a function can be turned into housing, recognizing what factors or conditions that may enable this exciting transformation. There is a housing program that somehow adjusts the preexistence as required design and that will only make sense if they prove functionality and comfort, it is important the sensitivity and knowledge of the architect and the relationship with those who will inhabit ‐ the user. "(...) the new function always brings the need to reorganize the functionality of spaces to accommodate the new use. This process that requires adaptation to the new function spaces is always delicate and rarely successful." The preexistence, much more than a threshold in the process of designing, can become the provocative element to question for a new way of living. Interest realize then what is inhabit, shelter, house, how these concepts relate, not only among themselves but also with the landscape, place and man. In an intervention of this nature, how the connection is changed with the landscape or territory, the place, approaching issues such as memory and essence of the place ‐ the genius Locci. "We can say that, for numerous times and spaces in which we speak of the place, is the inability to be anything else, that this place is referred, and its essence allows us to identify it, name it and immediately distinguish it from any other place." After the approach and analysis of various topics and to complement this process, are contextualized and analyzed five works from five different architects, which, in addition to differentiate into various aspects, have a common point in relation to the initial concept. Both projects start with preexistences,which are converted into private homes, privileging architectural quality. This descriptive analysis and critique seeks to explore the process of architectural intervention with this specificity, realize the consequences and outline the major constraints, including how these have influenced the final condition – THE HOUSE. An approach based on documental research, in seeking to understand the design process before the various contexts in common among the five cases. These are representative examples of this theme and are chronologically presented according to a logic in which it is not intended to distinguish any kind of relevance. It is noted, in the cases mentioned, a conscious importance of establishing dialogue between tradition and contemporaneity and an interest in the study of various specificities of the conversion of uses. They are spaces and shapes that suggest emotions, recreate images and indicate references, in a full respect of tradition, memories and authenticity of inhabitat. Five architects, different languages, who refuse to propose models or follow rules and standards, and show they aware of the importance of planning on the built, with a strong sensitivity combined with a vast knowledge. These projects are presented as special cases in the course and reference axes of the authors, always connected to their own past experiences and that somehow influenced each result. They seek a balanced and noticeable intervention ethic where it is noted the concern on the idea of continuity, although the preexistence is seen as provocative and defining element of the project, on which contemporary knowledge becomes the extension of the old time. There are five cases, which one with scale and capacity to integrate a new program ‐ single‐family housing. Between changes in seasonal and permanent housing or temporary housing, four of the case studies are located in different points in Portugal and one case in another European country, Belgium, permitting a more comprehensive and comparative analysis. There are five projects of five different architects, starting all of the preexistence. Each one with its own constraints become a different solution with a similar line of thought and dialogue. The rural buildings, when constructed as a response of existing needs, were defined according to the type of the product that would store and consequently to the time of year (season). A rural and vernacular architecture defined and characterized by the existent relationship between man and earth, and so became a selection of five cases, all of different type of role they played, the farm in which utensils were stored and some products for use on land), the haystack (local storage of straw), the cellar (storage and transformation of grapes for processing into wine), the sequeiro (fruit and cereals storage and drying place) and the barn (grain storage). All the cases reach several solutions, on which architect sought to build on the built, with memories and languages already defined that could transform and define such a new architecture, in this case, contemporary. In the first case new volumes are added to those already existing, on the second the architect keeps the traditional materials and techniques, on the third the architects start of the preexisting as a boundary between two times, in the fourth case the architect rebuilds the preexistence and redefines its proportions and dimensions, on the last case, is the architect himself who ends up being the inhabitant of the new space, thus allowing a more accurate relationship between the transformation of the built and who will inhabit 1 . "I felt the need to not change the core of this relationship built with the landscape, as if only one volume, only a house. And yet articulate it. There are more such centers, not always well articulated. It is essential to maintain the concentration of buildings and not spread." Architect Álvaro Siza Vieira ‐ old farmhouse. House in Belgium. 1997_2003. 2 . "It is the attempt to merge times in a time which is hybrid in which it appears in some way to view the face of the building at different times." Architect João Mendes Ribeiro ‐ old haystacks. House in Cortegaça. 2000_2004. 3 . "What is rich in the process is to design the space that exists between the two things, is to draw air from the outside limit and new compartments that need to exist. And not only is the program as the design arranged in the order of that left space.” Architects Manuel and Francisco Aires Mateus ‐ old wine cellar. House in Brejos Azeitão. 2001_2003. 4 . "Among the absolute fidelity to preexisting necessarily forcing any one add, and its reinterpretation in a new model that preserves its essence, we chose the second path. The ‘sequeiro’ has reborn (...)." Architect José Gigante ‐ old upland. House in Guimarães. 2002_2005. 5 . "It burned a barn in Montemor. Someone took the opportunity, partitioned the space and made a vulgar house. Arranged the yard, took care of the walnut tree and ripped windows to the main street. Once populated, the house was again abandoned." Architect Miguel Figueira ‐ old barn. House Montemor. 2006 |
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Um mundo no qual a cidade, feita de descontinuidade, sofreu um processo de crescimento e urbanização, expandindo os seus limites; enquanto que as aldeias permaneceram estagnadas no tempo, não houve evolução apenas o abandono das marcas e actividades próprias de um povo. Esta consequente evolução, principalmente industrial e tecnológica, levou ao abandono de antigos edifícios, os quais desempenhavam uma função utilitária e se mostravam imprescindíveis na vida do homem, tornando‐se consequentemente em elementos marcantes na paisagem e na memória de uma época. São exemplos as pequenas fábricas, armazéns, celeiros ou palheiros, moinhos e adegas, esquecidos no tempo, degradados com o abandono. O que deles permanece e sobrevive ao vigor do tempo provoca no homem um estado de sensibilidade, desafiando‐o a proteger e a manter de alguma forma a sua história, memória ou simplesmente a sua qualidade material, espacial e formal. Para além de reabilitar ou recuperar o que existe, as preexistências (De pre‐ +existência, qualidade do que é preexistente, prioridade de existência, existência anterior.), interessa também reutilizar e reconverter, transformando e dando uma nova função ao espaço. Numa época em que a habitação e o modo de habitar se tornam importantes na vivência do homem, porque não utilizar estas preexistências e transformá‐las no seu abrigo, atribuindo‐lhes uma nova função mas mantendo a sua própria essência? “A reconversão é um tipo de intervenção que possibilita uma relativa liberdade no desenho de projecto e tem por base critérios que permitem um maior grau de transformação, face a outro tipo de acções, como o restauro ou a reabilitação.”1 Esta intervenção parte da percepção do espaço, da relação que este tem com o lugar e da relação que poderá vir a ter com quem o habitar. Torna‐se, desta forma, pertinente questionar de que modo um edifício que foi criado para uma função pode ser transformado em habitação, reconhecendo quais os factores condicionantes ou estimulantes que poderão permitir essa transformação. Há um programa habitacional que de certa forma se ajustará à preexistência como matéria de projecto e que só fará sentido se revelar funcionalidade e conforto, sendo importante a sensibilidade e conhecimento do arquitecto e a relação deste com quem vai habitar – o utente. “(...) a nova função traz sempre consigo a necessidade de reorganizar a funcionalidade dos espaços para acomodar o novo uso. Este processo que obriga à adaptação dos espaços à nova função é sempre delicado e poucas vezes bem sucedido.” 2 A preexistência, muito mais que um limite no processo de projectar, pode tornar‐se no elemento provocatório para o questionar de uma nova forma de habitar. Interessa perceber, então, o que é o habitar, o abrigo, a casa; de que forma estes conceitos se relacionam, não só entre eles mas também com a paisagem, o lugar e o homem. Numa intervenção deste carácter, de que modo é alterada a ligação com a paisagem e o território, o lugar, abordando questões como a memória e a essência do lugar – o genius loci. “Podemos dizer que, por numerosos que sejam os tempos e os espaços em que se fala do lugar, é pela impossibilidade de ser outra coisa, que é deste lugar que se refere, e a sua essência nos permite identificá‐lo, nomeá‐lo e distingui‐lo de imediato de todo e qualquer outro lugar.” 3 Após abordagem e análise destes vários temas, e para complementar este processo, são contextualizadas e analisadas cinco obras de cinco arquitectos diferentes, as quais, para além de se diferenciarem em vários aspectos, têm um ponto comum em relação ao conceito inicial. Ambos projectos partem de preexistências, sendo estas reconvertidas em habitações unifamiliares privilegiando a qualidade arquitectónica. Esta análise descritiva e crítica procura explorar o processo arquitectónico de uma intervenção com esta especificidade, perceber as suas consequências e delimitar as principais condicionantes, compreendendo de que forma estas influenciaram a condição final – a CASA. Uma abordagem baseada numa investigação documental, na procura de perceber o processo projectual perante os diversos contextos em comum entre os cinco casos. Estes são exemplos representativos das questões deste tema e são apresentados segundo uma lógica cronológica na qual não se pretende distinguir por qualquer tipo de relevância. É de notar, nos casos referidos, uma consciente importância em estabelecer diálogos entre a tradição e a contemporaneidade, e um verdadeiro interesse no estudo das várias especificidades inerentes à reconversão de usos. São espaços e formas que sugerem emoções, recriam imagens e indicam referências, num pleno respeito pela tradição, pelas memórias, pela autenticidade do habitar. Cinco arquitectos, de diferentes linguagens, que se recusam a propor modelos ou a seguir regras e padrões, e se mostram conscientes da importância de projectar sobre o construído, com uma forte sensibilidade aliada a um vasto conhecimento. Estes projectos apresentam‐se como casos específicos no percurso e nos eixos de referência dos seus autores, sempre ligados às suas próprias vivências passadas e que, de certa forma, influenciaram cada resultado. Procuram uma ética de intervenção equilibrada e perceptível, onde é de notar a preocupação na ideia de continuidade, embora a preexistência seja vista como um elemento provocatório e definidor do projecto, no qual o saber contemporâneo se torna no prolongamento do tempo antigo. São cinco casos nos quais as preexistências apresentam escala e capacidade de integrar um novo programa ‐ habitação unifamiliar. Entre transformações em habitações permanentes ou habitações sazonais e temporárias, quatro dos casos em estudo situam‐se em diferentes pontos de Portugal e um só caso num outro país europeu, Bélgica, permitindo assim uma análise mais abrangente e comparativa. São cinco projectos, de cinco diferentes arquitectos, que partem todos de preexistências, cada uma com as suas próprias condicionantes, e que se transformam em cinco diferentes soluções seguindo uma linha de pensamento, de procura e de diálogo semelhante. Os edifícios rurais, construídos como resposta a uma necessidade existente, eram definidos consoante o tipo de produto que iriam armazenar e consequentemente a altura do ano (estação do ano). Uma arquitectura rural e vernacular definida e caracterizada a partir da relação existente entre a terra e o homem; e por isso seleccionaram‐se cinco casos, todos eles diferentes no tipo de função que desempenhavam: a quinta (na qual se armazenavam utensílios e alguns produtos para utilização na terra), o palheiro (local de armazenamento de palha), a adega (armazenamento e tratamento da uva para transformação em vinho), o sequeiro (armazenamento de fruta e secagem de cereais) e o celeiro (armazenamento de cereais). Partindo destes casos alcançaram‐se variadas soluções na procura da continuidade em construir sobre o construído, partindo de memórias e linguagens já definidas, as quais poderiam ser transformadas e definidas como uma nova arquitectura, neste caso contemporânea. No primeiro caso adicionam‐se novos volumes aos já existentes, no segundo mantêm‐se os materiais e técnicas tradicionais, no terceiro parte‐se do preexistente como um limite entre dois tempos, no quarto caso reconstrói‐se a preexistência e redefine‐se as suas proporções e dimensões e, no último caso é o próprio arquitecto que acaba por ser o habitante, permitindo assim uma relação mais acertada entre a transformação do espaço construído e quem o irá habitar. 1 . “Senti necessidade de não alterar a relação deste núcleo construído com a paisagem, como se fosse só um volume, só uma casa. E no entanto articulá‐lo. Há mais núcleos deste tipo, nem sempre bem articulados. É fundamental manter a concentração das construções e não disseminar.” Arquitecto Álvaro Siza Vieira ‐ antiga quinta . Casa na Bélgica . 1997_2003. 2 . “É a tentativa de fundir os tempos num tempo que é híbrido em que aparece, de alguma forma, à vista a cara do edifício em diferentes tempos.” Arquitecto João Mendes Ribeiro ‐ antigo palheiro . Casa em Cortegaça . 2000_2004. 3 . “O que é rico no processo, é desenhar o espaço que existe entre as duas coisas, é desenhar o ar entre o limite exterior e os novos compartimentos que precisam de existir. E não só o programa como o desenho é organizado em ordem a esse espaço que fica.” Arquitectos Manuel e Francisco Aires Mateus ‐ antiga adega . Casa em Brejos de Azeitão . 2001_2003. 4 . “Entre a absoluta fidelidade ao preexistente, necessariamente obrigando a um qualquer acrescento, e a sua reinterpretação num novo modelo que preservasse a sua essência, escolhemos o segundo caminho. Assim renasceu o sequeiro (...).” Arquitecto José Gigante ‐ antigo sequeiro . Casa em Guimarães . 2002_2005. 5 . “Ardeu um celeiro em Montemor. Alguém aproveitou a oportunidade, compartimentou o espaço e fez uma casa banal. Amanhou o quintal, cuidou da nogueira e rasgou janelas para a rua principal. Depois de habitada, a casa foi novamente abandonada.” Arquitecto Miguel Figueira – antigo celeiro . Casa de Montemor . 2006; ### ABSTRACT: “Conversion. Generate a place in what appeared to be a mere waste. We need to dream more spaces. How we are dreaming these pages. They are the place that we created. With our tools, references and wills. A place that will evolve over time and words.” Pedro Jordão, Revista Nu nº02 “Lugares”, p.02. In a world full of ideas and thoughts, abandonment and losses, dreams and achievements, there is a man creator of his own world in which the home is his refuge. A shelter as synonymous of protection may be any type of space, capable of responding to various requirements and which, from a logical thought, can be transformed, refurbished, becoming a living space open to an outside world. A world in which the city, made of discontinuity, underwent a process of growth and urbanization, expanding its limits, while the villages remained stagnant over time, there was no evolution only the abandonment of their own brands and activities of the people. This subsequent developments, especially industrial and technology, led to the abandonment of old buildings, which played a utilitarian function and showed themselves indispensable in the life of man, thus becoming its main features in the landscape and memory of a time. The examples are small factories, warehouses, barns, mills and wineries, forgotten over time, degraded with abandonment. What remains of them and survive the force of time, cause in man a state of sensitivity, daring him to protect and maintain somehow their story, memory or simply its quality material, spatial and formal. Besides to rehabilitate or restore what exists, preexistence (De + pre‐existence, quality that is preexisting priority of existence, former existence.), also interested to reuse and convert, turning and giving a new function space. At a time when housing and way of living become important in the experience of man, why not use these preexistences and turn them to their shelter, giving them a new function but keeping its essence? "The conversion is a type of intervention which allows a relative freedom in the design of the project and is based on criteria that allow a greater degree of transformation, compared to other types of actions, such as the restoration or rehabilitation." This intervention starts of the perception of space, the relationship that it has with the place and the relationship that is likely to have with whoever who will inhabit it. It is thus pertinent to question how a building that was created for a function can be turned into housing, recognizing what factors or conditions that may enable this exciting transformation. There is a housing program that somehow adjusts the preexistence as required design and that will only make sense if they prove functionality and comfort, it is important the sensitivity and knowledge of the architect and the relationship with those who will inhabit ‐ the user. "(...) the new function always brings the need to reorganize the functionality of spaces to accommodate the new use. This process that requires adaptation to the new function spaces is always delicate and rarely successful." The preexistence, much more than a threshold in the process of designing, can become the provocative element to question for a new way of living. Interest realize then what is inhabit, shelter, house, how these concepts relate, not only among themselves but also with the landscape, place and man. In an intervention of this nature, how the connection is changed with the landscape or territory, the place, approaching issues such as memory and essence of the place ‐ the genius Locci. "We can say that, for numerous times and spaces in which we speak of the place, is the inability to be anything else, that this place is referred, and its essence allows us to identify it, name it and immediately distinguish it from any other place." After the approach and analysis of various topics and to complement this process, are contextualized and analyzed five works from five different architects, which, in addition to differentiate into various aspects, have a common point in relation to the initial concept. Both projects start with preexistences,which are converted into private homes, privileging architectural quality. This descriptive analysis and critique seeks to explore the process of architectural intervention with this specificity, realize the consequences and outline the major constraints, including how these have influenced the final condition – THE HOUSE. An approach based on documental research, in seeking to understand the design process before the various contexts in common among the five cases. These are representative examples of this theme and are chronologically presented according to a logic in which it is not intended to distinguish any kind of relevance. It is noted, in the cases mentioned, a conscious importance of establishing dialogue between tradition and contemporaneity and an interest in the study of various specificities of the conversion of uses. They are spaces and shapes that suggest emotions, recreate images and indicate references, in a full respect of tradition, memories and authenticity of inhabitat. Five architects, different languages, who refuse to propose models or follow rules and standards, and show they aware of the importance of planning on the built, with a strong sensitivity combined with a vast knowledge. These projects are presented as special cases in the course and reference axes of the authors, always connected to their own past experiences and that somehow influenced each result. They seek a balanced and noticeable intervention ethic where it is noted the concern on the idea of continuity, although the preexistence is seen as provocative and defining element of the project, on which contemporary knowledge becomes the extension of the old time. There are five cases, which one with scale and capacity to integrate a new program ‐ single‐family housing. Between changes in seasonal and permanent housing or temporary housing, four of the case studies are located in different points in Portugal and one case in another European country, Belgium, permitting a more comprehensive and comparative analysis. There are five projects of five different architects, starting all of the preexistence. Each one with its own constraints become a different solution with a similar line of thought and dialogue. The rural buildings, when constructed as a response of existing needs, were defined according to the type of the product that would store and consequently to the time of year (season). A rural and vernacular architecture defined and characterized by the existent relationship between man and earth, and so became a selection of five cases, all of different type of role they played, the farm in which utensils were stored and some products for use on land), the haystack (local storage of straw), the cellar (storage and transformation of grapes for processing into wine), the sequeiro (fruit and cereals storage and drying place) and the barn (grain storage). All the cases reach several solutions, on which architect sought to build on the built, with memories and languages already defined that could transform and define such a new architecture, in this case, contemporary. In the first case new volumes are added to those already existing, on the second the architect keeps the traditional materials and techniques, on the third the architects start of the preexisting as a boundary between two times, in the fourth case the architect rebuilds the preexistence and redefines its proportions and dimensions, on the last case, is the architect himself who ends up being the inhabitant of the new space, thus allowing a more accurate relationship between the transformation of the built and who will inhabit 1 . "I felt the need to not change the core of this relationship built with the landscape, as if only one volume, only a house. And yet articulate it. There are more such centers, not always well articulated. It is essential to maintain the concentration of buildings and not spread." Architect Álvaro Siza Vieira ‐ old farmhouse. House in Belgium. 1997_2003. 2 . "It is the attempt to merge times in a time which is hybrid in which it appears in some way to view the face of the building at different times." Architect João Mendes Ribeiro ‐ old haystacks. House in Cortegaça. 2000_2004. 3 . "What is rich in the process is to design the space that exists between the two things, is to draw air from the outside limit and new compartments that need to exist. And not only is the program as the design arranged in the order of that left space.” Architects Manuel and Francisco Aires Mateus ‐ old wine cellar. House in Brejos Azeitão. 2001_2003. 4 . "Among the absolute fidelity to preexisting necessarily forcing any one add, and its reinterpretation in a new model that preserves its essence, we chose the second path. The ‘sequeiro’ has reborn (...)." Architect José Gigante ‐ old upland. House in Guimarães. 2002_2005. 5 . "It burned a barn in Montemor. Someone took the opportunity, partitioned the space and made a vulgar house. Arranged the yard, took care of the walnut tree and ripped windows to the main street. Once populated, the house was again abandoned." Architect Miguel Figueira ‐ old barn. House Montemor. 2006Universidade de Évora2015-01-08T11:32:30Z2015-01-082012-01-01T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesishttp://hdl.handle.net/10174/12334http://hdl.handle.net/10174/12334TID:201889110porteses@bib.uevora.pt330Ferreira, Mariana Fartariainfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2024-01-03T18:54:03Zoai:dspace.uevora.pt:10174/12334Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-20T01:04:41.914389Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse |
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“Reconversão. Gerar um lugar no que parecia ser um mero desperdício. É preciso sonhar mais os espaços. Como vamos sonhando estas páginas. São o lugar que criámos. Com os nossos instrumentos e referências e vontades. Um lugar que evoluirá no tempo e nas palavras.” Pedro Jordão, Revista Nu nº02 “Lugares”, p.02. Num mundo repleto de ideias e pensamentos, abandonos e perdas, sonhos e conquistas, encontrase um Homem criador de um mundo próprio no qual a casa é o seu abrigo. Um abrigo, como sinónimo de protecção, pode ser qualquer tipo de espaço, com capacidade de responder a várias exigências e que, a partir de um pensamento lógico, pode ser transformado, renovado, tornando‐se em espaço de habitar aberto para um mundo exterior. Um mundo no qual a cidade, feita de descontinuidade, sofreu um processo de crescimento e urbanização, expandindo os seus limites; enquanto que as aldeias permaneceram estagnadas no tempo, não houve evolução apenas o abandono das marcas e actividades próprias de um povo. Esta consequente evolução, principalmente industrial e tecnológica, levou ao abandono de antigos edifícios, os quais desempenhavam uma função utilitária e se mostravam imprescindíveis na vida do homem, tornando‐se consequentemente em elementos marcantes na paisagem e na memória de uma época. São exemplos as pequenas fábricas, armazéns, celeiros ou palheiros, moinhos e adegas, esquecidos no tempo, degradados com o abandono. O que deles permanece e sobrevive ao vigor do tempo provoca no homem um estado de sensibilidade, desafiando‐o a proteger e a manter de alguma forma a sua história, memória ou simplesmente a sua qualidade material, espacial e formal. Para além de reabilitar ou recuperar o que existe, as preexistências (De pre‐ +existência, qualidade do que é preexistente, prioridade de existência, existência anterior.), interessa também reutilizar e reconverter, transformando e dando uma nova função ao espaço. Numa época em que a habitação e o modo de habitar se tornam importantes na vivência do homem, porque não utilizar estas preexistências e transformá‐las no seu abrigo, atribuindo‐lhes uma nova função mas mantendo a sua própria essência? “A reconversão é um tipo de intervenção que possibilita uma relativa liberdade no desenho de projecto e tem por base critérios que permitem um maior grau de transformação, face a outro tipo de acções, como o restauro ou a reabilitação.”1 Esta intervenção parte da percepção do espaço, da relação que este tem com o lugar e da relação que poderá vir a ter com quem o habitar. Torna‐se, desta forma, pertinente questionar de que modo um edifício que foi criado para uma função pode ser transformado em habitação, reconhecendo quais os factores condicionantes ou estimulantes que poderão permitir essa transformação. Há um programa habitacional que de certa forma se ajustará à preexistência como matéria de projecto e que só fará sentido se revelar funcionalidade e conforto, sendo importante a sensibilidade e conhecimento do arquitecto e a relação deste com quem vai habitar – o utente. “(...) a nova função traz sempre consigo a necessidade de reorganizar a funcionalidade dos espaços para acomodar o novo uso. Este processo que obriga à adaptação dos espaços à nova função é sempre delicado e poucas vezes bem sucedido.” 2 A preexistência, muito mais que um limite no processo de projectar, pode tornar‐se no elemento provocatório para o questionar de uma nova forma de habitar. Interessa perceber, então, o que é o habitar, o abrigo, a casa; de que forma estes conceitos se relacionam, não só entre eles mas também com a paisagem, o lugar e o homem. Numa intervenção deste carácter, de que modo é alterada a ligação com a paisagem e o território, o lugar, abordando questões como a memória e a essência do lugar – o genius loci. “Podemos dizer que, por numerosos que sejam os tempos e os espaços em que se fala do lugar, é pela impossibilidade de ser outra coisa, que é deste lugar que se refere, e a sua essência nos permite identificá‐lo, nomeá‐lo e distingui‐lo de imediato de todo e qualquer outro lugar.” 3 Após abordagem e análise destes vários temas, e para complementar este processo, são contextualizadas e analisadas cinco obras de cinco arquitectos diferentes, as quais, para além de se diferenciarem em vários aspectos, têm um ponto comum em relação ao conceito inicial. Ambos projectos partem de preexistências, sendo estas reconvertidas em habitações unifamiliares privilegiando a qualidade arquitectónica. Esta análise descritiva e crítica procura explorar o processo arquitectónico de uma intervenção com esta especificidade, perceber as suas consequências e delimitar as principais condicionantes, compreendendo de que forma estas influenciaram a condição final – a CASA. Uma abordagem baseada numa investigação documental, na procura de perceber o processo projectual perante os diversos contextos em comum entre os cinco casos. Estes são exemplos representativos das questões deste tema e são apresentados segundo uma lógica cronológica na qual não se pretende distinguir por qualquer tipo de relevância. É de notar, nos casos referidos, uma consciente importância em estabelecer diálogos entre a tradição e a contemporaneidade, e um verdadeiro interesse no estudo das várias especificidades inerentes à reconversão de usos. São espaços e formas que sugerem emoções, recriam imagens e indicam referências, num pleno respeito pela tradição, pelas memórias, pela autenticidade do habitar. Cinco arquitectos, de diferentes linguagens, que se recusam a propor modelos ou a seguir regras e padrões, e se mostram conscientes da importância de projectar sobre o construído, com uma forte sensibilidade aliada a um vasto conhecimento. Estes projectos apresentam‐se como casos específicos no percurso e nos eixos de referência dos seus autores, sempre ligados às suas próprias vivências passadas e que, de certa forma, influenciaram cada resultado. Procuram uma ética de intervenção equilibrada e perceptível, onde é de notar a preocupação na ideia de continuidade, embora a preexistência seja vista como um elemento provocatório e definidor do projecto, no qual o saber contemporâneo se torna no prolongamento do tempo antigo. São cinco casos nos quais as preexistências apresentam escala e capacidade de integrar um novo programa ‐ habitação unifamiliar. Entre transformações em habitações permanentes ou habitações sazonais e temporárias, quatro dos casos em estudo situam‐se em diferentes pontos de Portugal e um só caso num outro país europeu, Bélgica, permitindo assim uma análise mais abrangente e comparativa. São cinco projectos, de cinco diferentes arquitectos, que partem todos de preexistências, cada uma com as suas próprias condicionantes, e que se transformam em cinco diferentes soluções seguindo uma linha de pensamento, de procura e de diálogo semelhante. Os edifícios rurais, construídos como resposta a uma necessidade existente, eram definidos consoante o tipo de produto que iriam armazenar e consequentemente a altura do ano (estação do ano). Uma arquitectura rural e vernacular definida e caracterizada a partir da relação existente entre a terra e o homem; e por isso seleccionaram‐se cinco casos, todos eles diferentes no tipo de função que desempenhavam: a quinta (na qual se armazenavam utensílios e alguns produtos para utilização na terra), o palheiro (local de armazenamento de palha), a adega (armazenamento e tratamento da uva para transformação em vinho), o sequeiro (armazenamento de fruta e secagem de cereais) e o celeiro (armazenamento de cereais). Partindo destes casos alcançaram‐se variadas soluções na procura da continuidade em construir sobre o construído, partindo de memórias e linguagens já definidas, as quais poderiam ser transformadas e definidas como uma nova arquitectura, neste caso contemporânea. No primeiro caso adicionam‐se novos volumes aos já existentes, no segundo mantêm‐se os materiais e técnicas tradicionais, no terceiro parte‐se do preexistente como um limite entre dois tempos, no quarto caso reconstrói‐se a preexistência e redefine‐se as suas proporções e dimensões e, no último caso é o próprio arquitecto que acaba por ser o habitante, permitindo assim uma relação mais acertada entre a transformação do espaço construído e quem o irá habitar. 1 . “Senti necessidade de não alterar a relação deste núcleo construído com a paisagem, como se fosse só um volume, só uma casa. E no entanto articulá‐lo. Há mais núcleos deste tipo, nem sempre bem articulados. É fundamental manter a concentração das construções e não disseminar.” Arquitecto Álvaro Siza Vieira ‐ antiga quinta . Casa na Bélgica . 1997_2003. 2 . “É a tentativa de fundir os tempos num tempo que é híbrido em que aparece, de alguma forma, à vista a cara do edifício em diferentes tempos.” Arquitecto João Mendes Ribeiro ‐ antigo palheiro . Casa em Cortegaça . 2000_2004. 3 . “O que é rico no processo, é desenhar o espaço que existe entre as duas coisas, é desenhar o ar entre o limite exterior e os novos compartimentos que precisam de existir. E não só o programa como o desenho é organizado em ordem a esse espaço que fica.” Arquitectos Manuel e Francisco Aires Mateus ‐ antiga adega . Casa em Brejos de Azeitão . 2001_2003. 4 . “Entre a absoluta fidelidade ao preexistente, necessariamente obrigando a um qualquer acrescento, e a sua reinterpretação num novo modelo que preservasse a sua essência, escolhemos o segundo caminho. Assim renasceu o sequeiro (...).” Arquitecto José Gigante ‐ antigo sequeiro . Casa em Guimarães . 2002_2005. 5 . “Ardeu um celeiro em Montemor. Alguém aproveitou a oportunidade, compartimentou o espaço e fez uma casa banal. Amanhou o quintal, cuidou da nogueira e rasgou janelas para a rua principal. Depois de habitada, a casa foi novamente abandonada.” Arquitecto Miguel Figueira – antigo celeiro . Casa de Montemor . 2006; ### ABSTRACT: “Conversion. Generate a place in what appeared to be a mere waste. We need to dream more spaces. How we are dreaming these pages. They are the place that we created. With our tools, references and wills. A place that will evolve over time and words.” Pedro Jordão, Revista Nu nº02 “Lugares”, p.02. In a world full of ideas and thoughts, abandonment and losses, dreams and achievements, there is a man creator of his own world in which the home is his refuge. A shelter as synonymous of protection may be any type of space, capable of responding to various requirements and which, from a logical thought, can be transformed, refurbished, becoming a living space open to an outside world. A world in which the city, made of discontinuity, underwent a process of growth and urbanization, expanding its limits, while the villages remained stagnant over time, there was no evolution only the abandonment of their own brands and activities of the people. This subsequent developments, especially industrial and technology, led to the abandonment of old buildings, which played a utilitarian function and showed themselves indispensable in the life of man, thus becoming its main features in the landscape and memory of a time. The examples are small factories, warehouses, barns, mills and wineries, forgotten over time, degraded with abandonment. What remains of them and survive the force of time, cause in man a state of sensitivity, daring him to protect and maintain somehow their story, memory or simply its quality material, spatial and formal. Besides to rehabilitate or restore what exists, preexistence (De + pre‐existence, quality that is preexisting priority of existence, former existence.), also interested to reuse and convert, turning and giving a new function space. At a time when housing and way of living become important in the experience of man, why not use these preexistences and turn them to their shelter, giving them a new function but keeping its essence? "The conversion is a type of intervention which allows a relative freedom in the design of the project and is based on criteria that allow a greater degree of transformation, compared to other types of actions, such as the restoration or rehabilitation." This intervention starts of the perception of space, the relationship that it has with the place and the relationship that is likely to have with whoever who will inhabit it. It is thus pertinent to question how a building that was created for a function can be turned into housing, recognizing what factors or conditions that may enable this exciting transformation. There is a housing program that somehow adjusts the preexistence as required design and that will only make sense if they prove functionality and comfort, it is important the sensitivity and knowledge of the architect and the relationship with those who will inhabit ‐ the user. "(...) the new function always brings the need to reorganize the functionality of spaces to accommodate the new use. This process that requires adaptation to the new function spaces is always delicate and rarely successful." The preexistence, much more than a threshold in the process of designing, can become the provocative element to question for a new way of living. Interest realize then what is inhabit, shelter, house, how these concepts relate, not only among themselves but also with the landscape, place and man. In an intervention of this nature, how the connection is changed with the landscape or territory, the place, approaching issues such as memory and essence of the place ‐ the genius Locci. "We can say that, for numerous times and spaces in which we speak of the place, is the inability to be anything else, that this place is referred, and its essence allows us to identify it, name it and immediately distinguish it from any other place." After the approach and analysis of various topics and to complement this process, are contextualized and analyzed five works from five different architects, which, in addition to differentiate into various aspects, have a common point in relation to the initial concept. Both projects start with preexistences,which are converted into private homes, privileging architectural quality. This descriptive analysis and critique seeks to explore the process of architectural intervention with this specificity, realize the consequences and outline the major constraints, including how these have influenced the final condition – THE HOUSE. An approach based on documental research, in seeking to understand the design process before the various contexts in common among the five cases. These are representative examples of this theme and are chronologically presented according to a logic in which it is not intended to distinguish any kind of relevance. It is noted, in the cases mentioned, a conscious importance of establishing dialogue between tradition and contemporaneity and an interest in the study of various specificities of the conversion of uses. They are spaces and shapes that suggest emotions, recreate images and indicate references, in a full respect of tradition, memories and authenticity of inhabitat. Five architects, different languages, who refuse to propose models or follow rules and standards, and show they aware of the importance of planning on the built, with a strong sensitivity combined with a vast knowledge. These projects are presented as special cases in the course and reference axes of the authors, always connected to their own past experiences and that somehow influenced each result. They seek a balanced and noticeable intervention ethic where it is noted the concern on the idea of continuity, although the preexistence is seen as provocative and defining element of the project, on which contemporary knowledge becomes the extension of the old time. There are five cases, which one with scale and capacity to integrate a new program ‐ single‐family housing. Between changes in seasonal and permanent housing or temporary housing, four of the case studies are located in different points in Portugal and one case in another European country, Belgium, permitting a more comprehensive and comparative analysis. There are five projects of five different architects, starting all of the preexistence. Each one with its own constraints become a different solution with a similar line of thought and dialogue. The rural buildings, when constructed as a response of existing needs, were defined according to the type of the product that would store and consequently to the time of year (season). A rural and vernacular architecture defined and characterized by the existent relationship between man and earth, and so became a selection of five cases, all of different type of role they played, the farm in which utensils were stored and some products for use on land), the haystack (local storage of straw), the cellar (storage and transformation of grapes for processing into wine), the sequeiro (fruit and cereals storage and drying place) and the barn (grain storage). All the cases reach several solutions, on which architect sought to build on the built, with memories and languages already defined that could transform and define such a new architecture, in this case, contemporary. In the first case new volumes are added to those already existing, on the second the architect keeps the traditional materials and techniques, on the third the architects start of the preexisting as a boundary between two times, in the fourth case the architect rebuilds the preexistence and redefines its proportions and dimensions, on the last case, is the architect himself who ends up being the inhabitant of the new space, thus allowing a more accurate relationship between the transformation of the built and who will inhabit 1 . "I felt the need to not change the core of this relationship built with the landscape, as if only one volume, only a house. And yet articulate it. There are more such centers, not always well articulated. It is essential to maintain the concentration of buildings and not spread." Architect Álvaro Siza Vieira ‐ old farmhouse. House in Belgium. 1997_2003. 2 . "It is the attempt to merge times in a time which is hybrid in which it appears in some way to view the face of the building at different times." Architect João Mendes Ribeiro ‐ old haystacks. House in Cortegaça. 2000_2004. 3 . "What is rich in the process is to design the space that exists between the two things, is to draw air from the outside limit and new compartments that need to exist. And not only is the program as the design arranged in the order of that left space.” Architects Manuel and Francisco Aires Mateus ‐ old wine cellar. House in Brejos Azeitão. 2001_2003. 4 . "Among the absolute fidelity to preexisting necessarily forcing any one add, and its reinterpretation in a new model that preserves its essence, we chose the second path. The ‘sequeiro’ has reborn (...)." Architect José Gigante ‐ old upland. House in Guimarães. 2002_2005. 5 . "It burned a barn in Montemor. Someone took the opportunity, partitioned the space and made a vulgar house. Arranged the yard, took care of the walnut tree and ripped windows to the main street. Once populated, the house was again abandoned." Architect Miguel Figueira ‐ old barn. House Montemor. 2006 |
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