Viagem, desvio e transfiguração. O monólogo interior como acto de resistência no renascimento da mise-en-scène

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Portugal, Paulo Miguel Gonçalves Ralha
Data de Publicação: 2021
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10362/136352
Resumo: A presente dissertação concretiza uma análise filmológica e comparativa ao programa de filmes exibidos durante o Seminário de Realização Cinematográfica (1º semestre letivo 2018-19), sob a orientação pedagógica do Professor Doutor João Mário Grilo e subordinado ao tema viagem. No percurso proposto, parte-se de um enquadramento de análise voltado para os conceitos de percepção com vista à prossecução do acto de criação cinematográfica, assumido na sua dimensão técnica e prática, como gesto produtor de formas (e ferramentas) suscetíveis de demonstrar o projeto concretizador de um filme (ou o monstro, na compreensão proposta pelo docente), tal como esboçado na cabeça do seu autor, tendentes a alcançar a modernidade no cinema. E, sobretudo, nas ruturas provocadas por certos cineastas capazes de sugerir caminhos novos. Contudo, ao longo do desenvolvimento temático, o alinhamento dos filmes selecionados no seminário (e de acordo com a ordem proposta) - enquadrando obras que rasgam o cânone do cinema clássico e favorecem um rumo para a modernidade -, sugeriu uma abordagem fenomenológica a partir de diversos pontos de contacto: começando, desde logo, pelo objeto fílmico proposto, bem como a sua interligação com o ponto de vista do Prof. João Mário Grilo, seja a partir da nossa própria experiência letiva, as entrevistas realizadas durante a investigação (em anexo), bem com a vasta obra académica e teórica publicada; por fim, a relevância de passagens fundamentais de A Divina Comédia, a obra máxima de Dante Alighieri (1265-1321), considerada marco fundamental da literatura do final da Idade Média, embora prenunciando um rumo vital para a gesta criativa que viria a culminar no Renascimento. É neste sentido que se defende a proximidade entre o cinema do pós-guerra, encabeçado sobretudo pela produção italiana, e sobretudo no que se veio a apelidar de neorrealismo, bem como as diversas vagas europeias que o sucederam - no momento crucial de rutura estética com que Gilles Deleuze (1925-1995) assinala a transição de Cinema 1 – A Imagem Ação para Cinema 2 – A Imagem-Tempo - com o relevo literário dos relatos literários das viagens épicas de aventuras, da qual faz parte Odisseia (e Ilíada), de Homero (926 a.C.-898 a.C.), ou mesmo a abertura para a modernidade de Ulisses, de James Joyce (1882-1941). Diante a inesperada proximidade entre a ordem e a temática do programa fílmico com a Commedia de Dante, sugere-se então uma base de leitura e análise suplementar, alicerçada no ponto de vista epistemológico do acto de criação artístico. Na verdade, constatar, como Aby Warburg, como nos explica o antropólogo belga Etienne Samain, na sua reinterpretação ensaística da constelação “Mnemosyne” de Aby Warburg (1866- 1929), e esse repensar do papel das imagens e da Arte”, sem dúvida quando acompanhadas pelos “percursos heurísticos e metodológicos na tentativa de revelar como as imagens conhecem e produzem pensamento”. Neste contexto, não poderemos considerar o conjunto de filmes do Seminário de Realização, no jogo fenomenológico que ensaiam com as outras artes, em geral, e com a História do Cinema em particular, uma aproximação ao “Atlas de Imagens” de Warburg? E investigar como tantas cenas destas ‘reproduções’ fílmicas nos remetem a certos afrescos renascentistas, a baixosrelevos, a grisailles de uma outra ontologia fantasmática? Talvez concordando com Godard quando refere em Ici et ailleurs (1975) que “não existem imagens simples. Qualquer imagem quotidiana faz parte de um sistema, vago e complicado, pelo qual habito o mundo e graças ao qual o mundo me habita”. Será então através da criação artística que se procurará demonstrar como a força da iluminação interior, nomeadamente o monólogo interior, presente nos diversos casos abordados, mesmo quando separados por vários séculos, constitui um verdadeiro acto de resistência, gerador de um renascimento de formas artísticas expressas ao longo da coerência da viagem - bem como do seu desvio ou da sua margem. Promovendo, dessa forma, uma transformação no leitor/espectador. O trabalho completa-se com o videoessay “JMG como JLG”, onde se concretiza de uma forma prática e audiovisual (usando as ferramentas do acto de criação/realização cinematográfica) a tese defendida.
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No percurso proposto, parte-se de um enquadramento de análise voltado para os conceitos de percepção com vista à prossecução do acto de criação cinematográfica, assumido na sua dimensão técnica e prática, como gesto produtor de formas (e ferramentas) suscetíveis de demonstrar o projeto concretizador de um filme (ou o monstro, na compreensão proposta pelo docente), tal como esboçado na cabeça do seu autor, tendentes a alcançar a modernidade no cinema. E, sobretudo, nas ruturas provocadas por certos cineastas capazes de sugerir caminhos novos. Contudo, ao longo do desenvolvimento temático, o alinhamento dos filmes selecionados no seminário (e de acordo com a ordem proposta) - enquadrando obras que rasgam o cânone do cinema clássico e favorecem um rumo para a modernidade -, sugeriu uma abordagem fenomenológica a partir de diversos pontos de contacto: começando, desde logo, pelo objeto fílmico proposto, bem como a sua interligação com o ponto de vista do Prof. João Mário Grilo, seja a partir da nossa própria experiência letiva, as entrevistas realizadas durante a investigação (em anexo), bem com a vasta obra académica e teórica publicada; por fim, a relevância de passagens fundamentais de A Divina Comédia, a obra máxima de Dante Alighieri (1265-1321), considerada marco fundamental da literatura do final da Idade Média, embora prenunciando um rumo vital para a gesta criativa que viria a culminar no Renascimento. É neste sentido que se defende a proximidade entre o cinema do pós-guerra, encabeçado sobretudo pela produção italiana, e sobretudo no que se veio a apelidar de neorrealismo, bem como as diversas vagas europeias que o sucederam - no momento crucial de rutura estética com que Gilles Deleuze (1925-1995) assinala a transição de Cinema 1 – A Imagem Ação para Cinema 2 – A Imagem-Tempo - com o relevo literário dos relatos literários das viagens épicas de aventuras, da qual faz parte Odisseia (e Ilíada), de Homero (926 a.C.-898 a.C.), ou mesmo a abertura para a modernidade de Ulisses, de James Joyce (1882-1941). Diante a inesperada proximidade entre a ordem e a temática do programa fílmico com a Commedia de Dante, sugere-se então uma base de leitura e análise suplementar, alicerçada no ponto de vista epistemológico do acto de criação artístico. Na verdade, constatar, como Aby Warburg, como nos explica o antropólogo belga Etienne Samain, na sua reinterpretação ensaística da constelação “Mnemosyne” de Aby Warburg (1866- 1929), e esse repensar do papel das imagens e da Arte”, sem dúvida quando acompanhadas pelos “percursos heurísticos e metodológicos na tentativa de revelar como as imagens conhecem e produzem pensamento”. Neste contexto, não poderemos considerar o conjunto de filmes do Seminário de Realização, no jogo fenomenológico que ensaiam com as outras artes, em geral, e com a História do Cinema em particular, uma aproximação ao “Atlas de Imagens” de Warburg? E investigar como tantas cenas destas ‘reproduções’ fílmicas nos remetem a certos afrescos renascentistas, a baixosrelevos, a grisailles de uma outra ontologia fantasmática? Talvez concordando com Godard quando refere em Ici et ailleurs (1975) que “não existem imagens simples. Qualquer imagem quotidiana faz parte de um sistema, vago e complicado, pelo qual habito o mundo e graças ao qual o mundo me habita”. Será então através da criação artística que se procurará demonstrar como a força da iluminação interior, nomeadamente o monólogo interior, presente nos diversos casos abordados, mesmo quando separados por vários séculos, constitui um verdadeiro acto de resistência, gerador de um renascimento de formas artísticas expressas ao longo da coerência da viagem - bem como do seu desvio ou da sua margem. Promovendo, dessa forma, uma transformação no leitor/espectador. O trabalho completa-se com o videoessay “JMG como JLG”, onde se concretiza de uma forma prática e audiovisual (usando as ferramentas do acto de criação/realização cinematográfica) a tese defendida.This dissertation carries out a filmological and comparative analysis of the program of films shown during the Film Directing Seminar (in the 1st academic semester 2018-19), under the pedagogical guidance of Professor João Mário Grilo and under the theme of traveling. In the proposed route, it starts from the act of cinematographic creation, assumed in its technical and practical dimension, as a gesture that produces forms (and tools) capable of demonstrating the project of a film (or the ‘monster’, in the understanding proposed by JMG), as outlined in its author's head. And, above all, in the ruptures caused by certain filmmakers capable of suggesting new paths. However, throughout the thematic development, the alignment of the films selected in the seminar (and according to the proposed order) - framing works that tear the canon of classical cinema and favor a path towards modernity - suggested a phenomenological approach based on various points of contact: starting, from the outset, with the proposed filmic object, as well as its interconnection with the point of view of Prof. João Mário Grilo, either from our own teaching experience, the interviews carried out during the investigation (attached), as well as the vast academic and theoretical work published; finally, the relevance of fundamental passages of The Divine Comedy, the greatest work of Dante Alighieri (1265-1321), considered a fundamental mark of the literature of the late Middle Ages, although foreshadowing a vital path for the creative gesture that would culminate in the Rebirth. It is in this sense that the proximity between post-war cinema is defended, led above all by Italian production, and above all in what has come to be called neorealism, as well as the various European waves that followed it - at the crucial moment of aesthetic rupture with that Gilles Deleuze (1925-1995) marks the transition from Cinema 1 – The Action Image to Cinema 2 – The Time-Image - with the literary relief of literary accounts of epic adventure travels, of which Odyssey (and Iliad) is part of Homer (926 BC-898 BC), or even the opening to modernity of Ulysses, by James Joyce (1882-1941). In view of the unexpected proximity between the order and the theme of the film program with Dante's Commedia, a supplementary basis for reading and analysis is suggested, based on the epistemological point of view of the act of artistic creation. In fact, to see, like Aby Warburg, as the Belgian anthropologist Etienne Samain explains to us, in his essayistic reinterpretation of the constellation “Mnemosyne” by Aby Warburg (1866-1929), and this rethinking of the role of images and Art”, undoubtedly when accompanied by “heuristic and methodological paths in an attempt to reveal how images know and produce thought”. In this context, can we not consider the set of films from the Filmmaking Seminar, in the phenomenological game that they rehearse with the other arts, in general, and with the History of Cinema in particular, an approximation to Warburg's “Atlas of Images”? And to investigate how so many scenes of these filmic 'reproductions' remind us of certain Renaissance frescoes, bas-reliefs, the grisailles of another phantasmatic ontology? Perhaps agreeing with Godard when he says in Ici et ailleurs (1975) that “there are no simple images. Any everyday image is part of a system, vague and complicated, by which I inhabit the world and thanks to which the world inhabits me”. Given the unexpected proximity between the order and theme of the film program and Dante's Commedia, a basis for further reading and analysis is suggested, based on the epistemological point of view of the act of artistic creation. It will then be through artistic creation that we will seek to demonstrate how the strength of interior lighting, namely the interior monologue, present in the various cases discussed, even when separated by several centuries, constitutes a true act of resistance, generating a rebirth of expressed artistic forms along the coherence of the trip - as well as its detour or its margin. In this way, promoting a transformation in the reader/spectator. The work is completed with the videoessay “JMG as JLG”, which materializes in a practical and audiovisual way (using the tools of the act of cinematographic creation/direction) the defended thesis.Aparício, Maria IreneRUNPortugal, Paulo Miguel Gonçalves Ralha2022-04-13T15:39:28Z2022-02-032021-08-312022-02-03T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10362/136352TID:202967042porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2024-03-11T05:14:32Zoai:run.unl.pt:10362/136352Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-20T03:48:42.556530Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse
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