Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Guimarães, Ana Paula
Data de Publicação: 2020
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/11328/3310
Resumo: A ciência é, indiscutivelmente, uma ferramenta da maior valia em vários aspectos da vida da sociedade, em geral, e dos indivíduos, em particular. Agora, em contexto de pandemia, as expectativas do mundo pairam sobre o conhecimento científico em busca de uma solução eficaz. Os instrumentos científicos serviram e continuam a servir muitas outras finalidades, entre elas, a descoberta da verdade em matéria criminal probatória. A Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro, aprovou a criação de uma base de dados de perfis de ADN, tanto para fins de identificação civil, como para fins de investigação criminal. Uma das questões mais debatidas centrou-se na discussão sobre a obrigatoriedade ou não obrigatoriedade, em caso de condenação pela prática de crime doloso em pena de prisão igual ou superior a três anos, de o tribunal ordenar, por despacho autónomo proferido após trânsito em julgado da decisão, a recolha de amostra do condenado (caso ainda não tivesse sido extraída anteriormente durante o procedimento criminal), para fins de inserção do seu perfil de ADN na base de dados, conforme o inicialmente previsto no n.º 2, do artigo 8.º da correspondente Lei. De igual modo no que respeita à declaração de inimputabilidade, quando ao arguido é aplicada uma medida de segurança (n.º 3 do normativo). A doutrina pronunciou-se e a jurisprudência também tomou posição neste debate. Não foi encontrada unanimidade nas posições adoptadas: uns pugnaram pela não automaticidade da determinação judicial, enquanto outros defenderam justamente o contrário, que só assim deveria ser decidido quando razões bastantes o aconselhassem, como o tipo de personalidade do arguido, a gravidade do crime praticado e o alarme social provocado, perigo de continuação da actividade criminosa, entre outros elementos apurados no caso concreto. A redacção inicial do invocado normativo (artigo 8.º, n.ºs 2 e 3) não era suficientemente clara e, dada a não liquidez nesta matéria, a prática judicial também não era uniforme. Afinal, os dados genéticos de uma pessoa condenada nos termos acima enunciados têm necessária e inevitavelmente de fazer parte da base de dados de perfis de ADN? E, para isso, o tribunal que condena tem de ordená-lo sempre ou cabe-lhe a liberdade discricionária ‒ embora não arbitrária ‒ de, casuisticamente, assim decidir de acordo com uma ponderação de interesses a realizar no caso em apreço? Trata-se, por um lado, de uma questão de particular importância já que o património genético do condenado é um bem a ser salvaguardado, atenta a informação de que o ADN é portador de cada pessoa e dos bens jurídicos em potencial colisão por via de uma recolha imposta e, portanto, para a qual não tem relevância a falta de consentimento do visado. Por outro lado, trata-se de uma questão que envolve finalidades de prevenção criminal, desígnios de segurança comunitária a partir deste material genético que assim contribui para a criação, construção e manutenção de uma base de dados instrumental aos fins públicos de investigação e prossecução criminal. Fazemos uma incursão por várias decisões jurisprudenciais, onde vemos vertidas as diferentes posições sobre o tema, elencando os principais fundamentos jurídicos utilizados a favor e contra a obrigatoriedade da determinação judicial, passando pelo Acórdão n.º 333/2018, do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República n.º 152/2018, Série II, de 08/08. Findamos o percurso com o mais recente enquadramento normativo, resultante da nova redacção do artigo 8.º, dada pela Lei n.º 90/2017, de 22 de Agosto, que veio fixar a regra segundo a qual é sempre ordenada na sentença a recolha de amostra biológica dos condenados em pena de prisão igual ou superior a três anos, por crimes dolosos, e dos arguidos declarados inimputáveis a quem sejam aplicadas medidas de segurança de internamento, mesmo que as sanções sejam suspensas na sua execução, com a correspondente inserção do perfil de ADN na base de dados.
id RCAP_dd3a6f27bf5b4301fa18c6725e826260
oai_identifier_str oai:repositorio.uportu.pt:11328/3310
network_acronym_str RCAP
network_name_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository_id_str
spelling Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dadosSegurançaLiberdadeBase de dados de ADNInvestigação criminalCondenaçãoA ciência é, indiscutivelmente, uma ferramenta da maior valia em vários aspectos da vida da sociedade, em geral, e dos indivíduos, em particular. Agora, em contexto de pandemia, as expectativas do mundo pairam sobre o conhecimento científico em busca de uma solução eficaz. Os instrumentos científicos serviram e continuam a servir muitas outras finalidades, entre elas, a descoberta da verdade em matéria criminal probatória. A Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro, aprovou a criação de uma base de dados de perfis de ADN, tanto para fins de identificação civil, como para fins de investigação criminal. Uma das questões mais debatidas centrou-se na discussão sobre a obrigatoriedade ou não obrigatoriedade, em caso de condenação pela prática de crime doloso em pena de prisão igual ou superior a três anos, de o tribunal ordenar, por despacho autónomo proferido após trânsito em julgado da decisão, a recolha de amostra do condenado (caso ainda não tivesse sido extraída anteriormente durante o procedimento criminal), para fins de inserção do seu perfil de ADN na base de dados, conforme o inicialmente previsto no n.º 2, do artigo 8.º da correspondente Lei. De igual modo no que respeita à declaração de inimputabilidade, quando ao arguido é aplicada uma medida de segurança (n.º 3 do normativo). A doutrina pronunciou-se e a jurisprudência também tomou posição neste debate. Não foi encontrada unanimidade nas posições adoptadas: uns pugnaram pela não automaticidade da determinação judicial, enquanto outros defenderam justamente o contrário, que só assim deveria ser decidido quando razões bastantes o aconselhassem, como o tipo de personalidade do arguido, a gravidade do crime praticado e o alarme social provocado, perigo de continuação da actividade criminosa, entre outros elementos apurados no caso concreto. A redacção inicial do invocado normativo (artigo 8.º, n.ºs 2 e 3) não era suficientemente clara e, dada a não liquidez nesta matéria, a prática judicial também não era uniforme. Afinal, os dados genéticos de uma pessoa condenada nos termos acima enunciados têm necessária e inevitavelmente de fazer parte da base de dados de perfis de ADN? E, para isso, o tribunal que condena tem de ordená-lo sempre ou cabe-lhe a liberdade discricionária ‒ embora não arbitrária ‒ de, casuisticamente, assim decidir de acordo com uma ponderação de interesses a realizar no caso em apreço? Trata-se, por um lado, de uma questão de particular importância já que o património genético do condenado é um bem a ser salvaguardado, atenta a informação de que o ADN é portador de cada pessoa e dos bens jurídicos em potencial colisão por via de uma recolha imposta e, portanto, para a qual não tem relevância a falta de consentimento do visado. Por outro lado, trata-se de uma questão que envolve finalidades de prevenção criminal, desígnios de segurança comunitária a partir deste material genético que assim contribui para a criação, construção e manutenção de uma base de dados instrumental aos fins públicos de investigação e prossecução criminal. Fazemos uma incursão por várias decisões jurisprudenciais, onde vemos vertidas as diferentes posições sobre o tema, elencando os principais fundamentos jurídicos utilizados a favor e contra a obrigatoriedade da determinação judicial, passando pelo Acórdão n.º 333/2018, do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República n.º 152/2018, Série II, de 08/08. Findamos o percurso com o mais recente enquadramento normativo, resultante da nova redacção do artigo 8.º, dada pela Lei n.º 90/2017, de 22 de Agosto, que veio fixar a regra segundo a qual é sempre ordenada na sentença a recolha de amostra biológica dos condenados em pena de prisão igual ou superior a três anos, por crimes dolosos, e dos arguidos declarados inimputáveis a quem sejam aplicadas medidas de segurança de internamento, mesmo que as sanções sejam suspensas na sua execução, com a correspondente inserção do perfil de ADN na base de dados.UNISBA2021-01-05T16:31:12Z2020-01-01T00:00:00Z2020info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/articleapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/11328/3310por2447-9047Guimarães, Ana Paulainfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2023-06-15T02:11:45ZPortal AgregadorONG
dc.title.none.fl_str_mv Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
title Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
spellingShingle Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
Guimarães, Ana Paula
Segurança
Liberdade
Base de dados de ADN
Investigação criminal
Condenação
title_short Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
title_full Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
title_fullStr Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
title_full_unstemmed Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
title_sort Entre a segurança e a liberdade: A introdução do perfil de ADN do condenado na base de dados
author Guimarães, Ana Paula
author_facet Guimarães, Ana Paula
author_role author
dc.contributor.author.fl_str_mv Guimarães, Ana Paula
dc.subject.por.fl_str_mv Segurança
Liberdade
Base de dados de ADN
Investigação criminal
Condenação
topic Segurança
Liberdade
Base de dados de ADN
Investigação criminal
Condenação
description A ciência é, indiscutivelmente, uma ferramenta da maior valia em vários aspectos da vida da sociedade, em geral, e dos indivíduos, em particular. Agora, em contexto de pandemia, as expectativas do mundo pairam sobre o conhecimento científico em busca de uma solução eficaz. Os instrumentos científicos serviram e continuam a servir muitas outras finalidades, entre elas, a descoberta da verdade em matéria criminal probatória. A Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro, aprovou a criação de uma base de dados de perfis de ADN, tanto para fins de identificação civil, como para fins de investigação criminal. Uma das questões mais debatidas centrou-se na discussão sobre a obrigatoriedade ou não obrigatoriedade, em caso de condenação pela prática de crime doloso em pena de prisão igual ou superior a três anos, de o tribunal ordenar, por despacho autónomo proferido após trânsito em julgado da decisão, a recolha de amostra do condenado (caso ainda não tivesse sido extraída anteriormente durante o procedimento criminal), para fins de inserção do seu perfil de ADN na base de dados, conforme o inicialmente previsto no n.º 2, do artigo 8.º da correspondente Lei. De igual modo no que respeita à declaração de inimputabilidade, quando ao arguido é aplicada uma medida de segurança (n.º 3 do normativo). A doutrina pronunciou-se e a jurisprudência também tomou posição neste debate. Não foi encontrada unanimidade nas posições adoptadas: uns pugnaram pela não automaticidade da determinação judicial, enquanto outros defenderam justamente o contrário, que só assim deveria ser decidido quando razões bastantes o aconselhassem, como o tipo de personalidade do arguido, a gravidade do crime praticado e o alarme social provocado, perigo de continuação da actividade criminosa, entre outros elementos apurados no caso concreto. A redacção inicial do invocado normativo (artigo 8.º, n.ºs 2 e 3) não era suficientemente clara e, dada a não liquidez nesta matéria, a prática judicial também não era uniforme. Afinal, os dados genéticos de uma pessoa condenada nos termos acima enunciados têm necessária e inevitavelmente de fazer parte da base de dados de perfis de ADN? E, para isso, o tribunal que condena tem de ordená-lo sempre ou cabe-lhe a liberdade discricionária ‒ embora não arbitrária ‒ de, casuisticamente, assim decidir de acordo com uma ponderação de interesses a realizar no caso em apreço? Trata-se, por um lado, de uma questão de particular importância já que o património genético do condenado é um bem a ser salvaguardado, atenta a informação de que o ADN é portador de cada pessoa e dos bens jurídicos em potencial colisão por via de uma recolha imposta e, portanto, para a qual não tem relevância a falta de consentimento do visado. Por outro lado, trata-se de uma questão que envolve finalidades de prevenção criminal, desígnios de segurança comunitária a partir deste material genético que assim contribui para a criação, construção e manutenção de uma base de dados instrumental aos fins públicos de investigação e prossecução criminal. Fazemos uma incursão por várias decisões jurisprudenciais, onde vemos vertidas as diferentes posições sobre o tema, elencando os principais fundamentos jurídicos utilizados a favor e contra a obrigatoriedade da determinação judicial, passando pelo Acórdão n.º 333/2018, do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República n.º 152/2018, Série II, de 08/08. Findamos o percurso com o mais recente enquadramento normativo, resultante da nova redacção do artigo 8.º, dada pela Lei n.º 90/2017, de 22 de Agosto, que veio fixar a regra segundo a qual é sempre ordenada na sentença a recolha de amostra biológica dos condenados em pena de prisão igual ou superior a três anos, por crimes dolosos, e dos arguidos declarados inimputáveis a quem sejam aplicadas medidas de segurança de internamento, mesmo que as sanções sejam suspensas na sua execução, com a correspondente inserção do perfil de ADN na base de dados.
publishDate 2020
dc.date.none.fl_str_mv 2020-01-01T00:00:00Z
2020
2021-01-05T16:31:12Z
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
dc.type.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/article
format article
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv http://hdl.handle.net/11328/3310
url http://hdl.handle.net/11328/3310
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.relation.none.fl_str_mv 2447-9047
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.format.none.fl_str_mv application/pdf
dc.publisher.none.fl_str_mv UNISBA
publisher.none.fl_str_mv UNISBA
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron:RCAAP
instname_str Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron_str RCAAP
institution RCAAP
reponame_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
collection Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository.name.fl_str_mv
repository.mail.fl_str_mv
_version_ 1777302554892304384