O devir lésbico na literatura brasileira: entre a tradição e a ruptura

• Autor(a) principal: Melo, Carolinne Taveira de
• Data de Publicação: 2021
• Tipo de documento: Dissertação
• Idioma: por
• Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UEPB
• Texto Completo: http://tede.bc.uepb.edu.br/jspui/handle/tede/3723
• topic: Literatura brasileira; Narrativa; Lesbianidade; Gênero; Sexuaidade; LINGUISTICA, LETRAS E ARTES::LETRAS

A história da lesbianidade foi, durante muito tempo, destituída da sua legimitimidade e marginalizada. Pouco se sabe a respeito de mulheres lésbicas, e isso reverbera nos amplos espaços artísticos. Não poderia ser diferente na Literatura. Nesse contexto, este trabalho se propõe a analisar as representações e figurações da lesbianidade na prosa de ficção brasileira partindo das primeiras narrativas com a presença de personagens lésbicas/com tendências homoeróticas, publicadas no final do século XIX, para em seguida discutir as narrativas de Amora (2015), de Natalia Borges Polesso, de modo a ler, em diálogo, pontos significativos que marcam trajetórias de tradição e ruptura das representações e figurações da lesbianidade na literatura brasileira. Para isso, fez-se um levantamento da presença dessas personagens em seus primórdios na narrativa brasileira, dentre as quais foram selecionados: O Cortiço (1890), Histórias da Gente Alegre (1910) e A Condessa Vésper (1902). Sabendo que a história não é necessariamente linear e apresenta vestígios no presente (BENJAMIN, 1987), lemos o passado da personagem lésbica na literatura brasileira não apenas no intuito de encontrar vestígios de figuras invisibilizadas socialmente, mas para analisar suas configurações e para compreender os pontos de atrito entre as narrativas. Identificamos, num primeiro momento, personagens categoricamente marginalizadas pela maneira subversiva como agem nas narrativas. Por sua vez, encontram formas alternativas de sobressair-se em meio aos entraves sociais e culturais, de modo que elas emergem como potências subjetivas, figurando um devir-lésbico (DELEUZE; GUATTARI, 2012) na literatura brasileira. Enquanto que as personagens de Polesso parecem, por vezes, mais comedidas, são também mais livres em suas ações. Para as discussões acerca de personagens lésbicas, são estudos fundamentais para a construção desta pesquisa: Judith Butler (2019) e suas contribuições dentro do campo de gênero e sexualidades; Monique Wittig (2019), ao problematizar o lugar do sujeito feminino construído socialmente; Maria Rita Kehl (2008), em seu estudo acerca da histeria feminina nos séculos passados. Consideramos, também, os períodos em que cada narrativa está inserida, de modo a não perder de vista as relações das narrativas dos séculos XIX e início do XX com o Naturalismo e o Decadentismo no Brasil. Para tanto, recorremos às discussões de Antonio Candido (1991), Araripe Jr. (2013), Nelson Werneck Sodré (1965) e Silviano Santiago (2004). Quanto às relações de continuidade e ruptura no contexto contemporâneo de representações da lesbianidade, centramo-nos no livro de contos Amora, de Natalia Borges Polesso, que explora inúmeras expressões subjetivas da mulher lésbica. Personagens infantis, jovens e idosas têm suas histórias entrelaçadas em fios afetuosos que permitem enxergar o amor em gestos silenciosos, mas também ensurdecedores, por vezes. Em Amora, destacamos as vivências lésbicas das personagens, a fim de analisar suas potências, representações, ler os seus silêncios e problematizar os seus lugares e formas de ser e viver. Empregamos, para isso, as reflexões de Spinoza (2019) a respeito do afeto e retomamos Deleuze e Guattari (2012) quanto ao ritornelo e aos movimentos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização, lendo tais discussões para discorrer a respeito do ritmo da vivência do sentimento amoroso nos relatos analisados. Nesse sentido, nosso olhar para a lesbianidade e para esses textos literários é não-linear e visa a discussão das representações, das figurações, da legitimidade e das subjetividades das personagens lésbicas ou com tendências homoeróticas na literatura brasileira em prosa, nesses pontos selecionados de sua trajetória. Constata-se, nesse percurso, que as fissuras nas ações das personagens as tornam mais complexas do que o senso comum normalmente sugere em relação à mulher lésbica, talvez porque a própria condição de ser mulher implique, frequentemente, uma fissura, na arte, na vida.