A ficção e o documento: uma leitura de Mulheres Empilhadas de Patrícia Melo e de Garotas Mortas de Selva Almada

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Azevedo, Luciene
Data de Publicação: 2021
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Matraga (Online)
Texto Completo: https://www.e-publicacoes.uerj.br/matraga/article/view/53201
Resumo: O ensaio tem como principal objetivo refletir sobre a relação entre a literatura e o documento. Se por um lado podemos identificar um interesse teórico por essa relação e um incremento de uma nomenclatura que tenta capturar esse impulso, como a ideia de narrações documentais (RUFFEL, 2012), factografias (ZENETTI, 2011) ou ainda o que Paula Klein (2019) chama de uma poética de arquivos, também é possível identificar que nos últimos anos muitas obras incorporam fotos, materiais de arquivo e anotações do processo de escrita para construir narrativas que põem em xeque seu estatuto ficcional, embora nem sempre essas obras repudiem a chancela do gênero romance. Nesse sentido, me interessa resgatar o argumento principal desenvolvido por Flora Sussekind em Tal Brasil, qual romance (1984) para pensar o que poderia ser considerada uma outra guinada documental da literatura contemporânea. Sussekind afirma que a insistência cíclica da literatura bra­sileira em uma estética naturalista (mais que realista) faz com que as obras neguem sua própria construção enquanto linguagem, pois tomam como paradigma a objetividade e a veracidade que o documento pode garantir à ficção. Se é verdade que desde o início do século XXI podemos falar de uma “fome de real” (SHIEL­DS, 2010), este artigo quer investigar como a utilização de dados factuais (como reprodução de processos jurídicos e reportagens) pode ter muitas nuances. Por um lado, pode servir, sim, para revigorar uma tradição realista que valoriza o mimetismo da ficção em relação ao real, utilizando o documento como prova, mas também é possível arriscar que a tensão criada pela apropriação de fontes documentais por muitas narrativas contemporâneas pode indiciar uma tentativa de redefinir o valor e novas fronteiras para o que entendemos como ficção. Para discutir melhor esse pressuposto, tomaremos para análise Mulheres Empilhadas (2019) de Patrícia Melo e Garotas Mortas (2014) de Selva Almada.
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Se por um lado podemos identificar um interesse teórico por essa relação e um incremento de uma nomenclatura que tenta capturar esse impulso, como a ideia de narrações documentais (RUFFEL, 2012), factografias (ZENETTI, 2011) ou ainda o que Paula Klein (2019) chama de uma poética de arquivos, também é possível identificar que nos últimos anos muitas obras incorporam fotos, materiais de arquivo e anotações do processo de escrita para construir narrativas que põem em xeque seu estatuto ficcional, embora nem sempre essas obras repudiem a chancela do gênero romance. Nesse sentido, me interessa resgatar o argumento principal desenvolvido por Flora Sussekind em Tal Brasil, qual romance (1984) para pensar o que poderia ser considerada uma outra guinada documental da literatura contemporânea. Sussekind afirma que a insistência cíclica da literatura bra­sileira em uma estética naturalista (mais que realista) faz com que as obras neguem sua própria construção enquanto linguagem, pois tomam como paradigma a objetividade e a veracidade que o documento pode garantir à ficção. Se é verdade que desde o início do século XXI podemos falar de uma “fome de real” (SHIEL­DS, 2010), este artigo quer investigar como a utilização de dados factuais (como reprodução de processos jurídicos e reportagens) pode ter muitas nuances. Por um lado, pode servir, sim, para revigorar uma tradição realista que valoriza o mimetismo da ficção em relação ao real, utilizando o documento como prova, mas também é possível arriscar que a tensão criada pela apropriação de fontes documentais por muitas narrativas contemporâneas pode indiciar uma tentativa de redefinir o valor e novas fronteiras para o que entendemos como ficção. Para discutir melhor esse pressuposto, tomaremos para análise Mulheres Empilhadas (2019) de Patrícia Melo e Garotas Mortas (2014) de Selva Almada.The main objective of the essay is to reflect on the relationship between literature and the document. If, on the one hand, we can identify a theoretical interest in this relationship and an increase in a nomenclature that tries to capture this impulse – such as the idea of documentary narrations (RUFFEL, 2012), factographies (ZENETTI, 2011) or even what Paula Klein (2019 ) calls a poetics of archives – it is also possible to identify that in recent years many works incorporate photos, archival materials and notes from the writing process to build narratives that challenge their fictional status, although these works do not always repudiate the seal of the novel genre. In this sense, I am interested in rescuing the main argument developed by Flora Sussekind in Tal Brasil, qual Romance (1984) to think about what could be considered another documental shift in contemporary literature. Sussekind states that the cyclical insistence of Brazilian literature on a naturalistic (more than realistic) aesthetic causes the works to deny their own construction as language, once they take as paradigm the objectivity and veracity that the document can guarantee to fiction. If it is true that since the beginning of the 21st century we can speak of a “hunger for the real” (SHIELDS, 2010), the communication wants to investigate how the use of factual data (such as reproduction of legal reports and journalistic stories) can have many nuances. On the one hand, it can serve to reinvigorate a realistic tradition that values the mimicry of fiction in relation to the real, using the document as proof. But it is also possible to think that the tension created by the appropriation of documentary sources by many contemporary narratives might point to an attempt to redefine the value and establish new boundaries for what we understand as fiction. To better discuss this assumption, we will take as our objects the narratives Mulheres Empilhadas (2019), by Patrícia Melo and Garotas Mortas (2014), by Selva AlmadaUniversidade do Estado do Rio de Janeiro2021-02-03info:eu-repo/semantics/articleinfo:eu-repo/semantics/publishedVersionartigo de literaturaartigos de literaturaapplication/pdfhttps://www.e-publicacoes.uerj.br/matraga/article/view/5320110.12957/matraga.2021.53201Matraga - Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras da UERJ; v. 28 n. 52 (2021): Miscelânea; 113-127MATRAGA - Journal published by the Graduate Program in Letters at Rio de Janeiro State University (UERJ); Vol. 28 No. 52 (2021): Miscelaneous; 113-1272446-69051414-7165reponame:Matraga (Online)instname:Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)instacron:UERJporhttps://www.e-publicacoes.uerj.br/matraga/article/view/53201/36888Azevedo, Lucieneinfo:eu-repo/semantics/openAccess2021-05-13T20:40:37Zoai:ojs.www.e-publicacoes.uerj.br:article/53201Revistahttps://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/matragaPUBhttps://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/matraga/oai||letrasmatraga@uerj.br2446-69051414-7165opendoar:2021-05-13T20:40:37Matraga (Online) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)false
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