O Município de Campina Grande 1840 - 1905: estrutura de distribuição de terras, economia e sociedade.

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: VIANNA, Marly de Almeida Gomes.
Data de Publicação: 2013
Tipo de documento: Livro
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFCG
Texto Completo: http://dspace.sti.ufcg.edu.br:8080/jspui/handle/riufcg/29497
Resumo: Este trabalho foi minha dissertação de mestrado, apresentada no curso de Mestrado em Economia da Universidade Federal da Paraíba, Campus II, hoje Universidade Federal de Campina Grande, (Defendida ainda no século XX, as referências ao “século passado” referem-se ao XIX) sob a orientação do professor Dr.Ciro Flamarion Santana Cardoso. Escolher como tema da dissertação a estrutura de distribuição de terras no município de Campina Grande, na segunda metade do século passado, chegou a parecer estranho a algumas pessoas. Um município do interior nordestino ainda poder-se-ia compreender, mas por que o século passado? A escolha do tema prendeu-se intimamente à necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a agricultura brasileira e à visão que tenho do que seja aprofundar tais conhecimentos. Foi decisiva também a influência das pesquisas coordenadas pelos professores Maria Yedda Linhares e Ciro Flamarion Cardoso sobre a agricultura. Já há algum tempo, em busca de explicações para o subdesenvolvimento, muitos estudiosos brasileiros se voltaram para a agricultura. É grande a contribuição de inúmeros autores que se vêm dedicando ao assunto, embora suas abordagens sejam bastante diversas. A polêmica prende-se muito à complexidade do tema e ao relativamente curto período que têm estes estudos, mas também a uma certa fragilidade dos conhecimentos sobre a tão decantada realidade brasileira, a começar por suas bases coloniais. ... A necessidade de reorientar as pesquisas, sobretudo para estudos locais, mais aprofundados, capazes de revelar a ‘face oculta’ de uma sociedade fundamentalmente agrária até um passado bem recente, e por demais retratada a partir da ‘casa grande’ e ‘senzala’ 1 foi o que decidiu a escolha do tema. N a tentativa de compreender melhor a atualidade do problema agrário no Brasil, voltar os olhos para o passado, sobretudo para a segunda metade do século XIX, é, a meu ver, imprescindível. Como disse Marc Bloch, tentar entender o presente como se fosse autointeligívél não tem ajudado a explicá-lo. A escolha do antigo município de Campina Grande não se deveu apenas ao fato de estar vivendo na cidade. Dentro da ideia inicial de realizar estudos locais, que se juntassem para permitir uma visão global da complexa e diversificada realidade agrária do país, o antigo município de Campina Grande pareceu-me suficientemente representativo para o que desejava: sair dos modelos agrários do Sudeste cafeeiro e das áreas açucareiras do Nordeste, tomando para estudo uma área do Agreste, importante por sua ligação comercial com o Sertão e o Litoral e, além do mais, pouco estudada. Os limites temporais do trabalho foram marcados por ser a segunda metade do século passado um dos períodos mais importantes para o país, período de transição da economia colonial escravista para o capitalismo dependente. Já em 1840, o “Golpe da Maioridade” consolidara a unidade nacional sob a hegemonia da economia cafeeira. Reformularam-se naquele período as concepções sobre a posse da terra, o trabalho escravo foi sendo gradualmente abolido, houve mudanças fundamentais nos sistema financeiro, fiscal, creditício e também no administrativo e no político. Estou convencida de que para entender a atual estrutura agrária do Brasil é necessário estudar o processo de desenvolvimento e implantação do capitalismo como modo de produção dominante, nas diversas regiões do país. Meu trabalho tem a pretensão, nem tanto de ser uma considerável contribuição ao estudo da realidade agrária, mas de chamar a atenção para a importância de pesquisas que permitam integrar articuladamente as especificações locais numa síntese globalizante da agricultura brasileira. Considero imprescindível começar pela estrutura de distribuição de terras, formas de apropriação do solo e formação do grande latifúndio; buscar o papel da pequena produção dentro de um sistema escravista, as formas de trabalho livre que aparecem -ou se consolidam com a gradual abolição do trabalho escravo e a estrutura de classes daí decorrentes. Desde o início tive algumas indagações básicas; se Campina Grande era sede de importante comércio regional, por que forma se fazia, e quem era responsável pelo abastecimento desse mercado interno, por mais acanhado que fosse? Qual a amplitude deste mercado? Com estruturas escravistas desde o início da colonização, como se configuraram e se afirmaram as relações de produção não escravistas? De que forma tais relações foram se transformando ou se adaptando à transformação das estruturas coloniais de produção? Parti de duas premissas teóricas básicas. Em primeiro lugar, a de que o Nordeste não ficou imune às transformações por que passou o país na segunda metade do século passado. As mudanças que ocorrem, capitaneadas pelo Sudeste, não criaram “dois brasis”: um Sudeste capitalista e um Nordeste paralelamente pré-capitalista. As mudanças atingiram o.país em sua totalidade. Em segundo lugar, de que é preciso buscar nos fatores internos a base das transformações ocorridas. Examinar, portanto, as mudanças ocorridas na produção (sem deixar de lado, evidentemente, os fatores externos). Julgo necessária a análise das formas de acesso ao solo e aos outros meios de produção por serem “a base das relações de produção na agricultura e da estrutura de classes no campo. Sem referência a um sistema social definido, termos como ‘propriedade da terra’, ‘arrendamento ’, ‘parceria’, ‘camponeses’, etc. tomam-se abstrações sem conteúdo e sentido precisos”2.
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A polêmica prende-se muito à complexidade do tema e ao relativamente curto período que têm estes estudos, mas também a uma certa fragilidade dos conhecimentos sobre a tão decantada realidade brasileira, a começar por suas bases coloniais. ... A necessidade de reorientar as pesquisas, sobretudo para estudos locais, mais aprofundados, capazes de revelar a ‘face oculta’ de uma sociedade fundamentalmente agrária até um passado bem recente, e por demais retratada a partir da ‘casa grande’ e ‘senzala’ 1 foi o que decidiu a escolha do tema. N a tentativa de compreender melhor a atualidade do problema agrário no Brasil, voltar os olhos para o passado, sobretudo para a segunda metade do século XIX, é, a meu ver, imprescindível. Como disse Marc Bloch, tentar entender o presente como se fosse autointeligívél não tem ajudado a explicá-lo. A escolha do antigo município de Campina Grande não se deveu apenas ao fato de estar vivendo na cidade. 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Já há algum tempo, em busca de explicações para o subdesenvolvimento, muitos estudiosos brasileiros se voltaram para a agricultura. É grande a contribuição de inúmeros autores que se vêm dedicando ao assunto, embora suas abordagens sejam bastante diversas. A polêmica prende-se muito à complexidade do tema e ao relativamente curto período que têm estes estudos, mas também a uma certa fragilidade dos conhecimentos sobre a tão decantada realidade brasileira, a começar por suas bases coloniais. ... A necessidade de reorientar as pesquisas, sobretudo para estudos locais, mais aprofundados, capazes de revelar a ‘face oculta’ de uma sociedade fundamentalmente agrária até um passado bem recente, e por demais retratada a partir da ‘casa grande’ e ‘senzala’ 1 foi o que decidiu a escolha do tema. N a tentativa de compreender melhor a atualidade do problema agrário no Brasil, voltar os olhos para o passado, sobretudo para a segunda metade do século XIX, é, a meu ver, imprescindível. Como disse Marc Bloch, tentar entender o presente como se fosse autointeligívél não tem ajudado a explicá-lo. A escolha do antigo município de Campina Grande não se deveu apenas ao fato de estar vivendo na cidade. Dentro da ideia inicial de realizar estudos locais, que se juntassem para permitir uma visão global da complexa e diversificada realidade agrária do país, o antigo município de Campina Grande pareceu-me suficientemente representativo para o que desejava: sair dos modelos agrários do Sudeste cafeeiro e das áreas açucareiras do Nordeste, tomando para estudo uma área do Agreste, importante por sua ligação comercial com o Sertão e o Litoral e, além do mais, pouco estudada. Os limites temporais do trabalho foram marcados por ser a segunda metade do século passado um dos períodos mais importantes para o país, período de transição da economia colonial escravista para o capitalismo dependente. Já em 1840, o “Golpe da Maioridade” consolidara a unidade nacional sob a hegemonia da economia cafeeira. Reformularam-se naquele período as concepções sobre a posse da terra, o trabalho escravo foi sendo gradualmente abolido, houve mudanças fundamentais nos sistema financeiro, fiscal, creditício e também no administrativo e no político. Estou convencida de que para entender a atual estrutura agrária do Brasil é necessário estudar o processo de desenvolvimento e implantação do capitalismo como modo de produção dominante, nas diversas regiões do país. Meu trabalho tem a pretensão, nem tanto de ser uma considerável contribuição ao estudo da realidade agrária, mas de chamar a atenção para a importância de pesquisas que permitam integrar articuladamente as especificações locais numa síntese globalizante da agricultura brasileira. Considero imprescindível começar pela estrutura de distribuição de terras, formas de apropriação do solo e formação do grande latifúndio; buscar o papel da pequena produção dentro de um sistema escravista, as formas de trabalho livre que aparecem -ou se consolidam com a gradual abolição do trabalho escravo e a estrutura de classes daí decorrentes. Desde o início tive algumas indagações básicas; se Campina Grande era sede de importante comércio regional, por que forma se fazia, e quem era responsável pelo abastecimento desse mercado interno, por mais acanhado que fosse? Qual a amplitude deste mercado? Com estruturas escravistas desde o início da colonização, como se configuraram e se afirmaram as relações de produção não escravistas? De que forma tais relações foram se transformando ou se adaptando à transformação das estruturas coloniais de produção? Parti de duas premissas teóricas básicas. Em primeiro lugar, a de que o Nordeste não ficou imune às transformações por que passou o país na segunda metade do século passado. As mudanças que ocorrem, capitaneadas pelo Sudeste, não criaram “dois brasis”: um Sudeste capitalista e um Nordeste paralelamente pré-capitalista. As mudanças atingiram o.país em sua totalidade. Em segundo lugar, de que é preciso buscar nos fatores internos a base das transformações ocorridas. Examinar, portanto, as mudanças ocorridas na produção (sem deixar de lado, evidentemente, os fatores externos). Julgo necessária a análise das formas de acesso ao solo e aos outros meios de produção por serem “a base das relações de produção na agricultura e da estrutura de classes no campo. Sem referência a um sistema social definido, termos como ‘propriedade da terra’, ‘arrendamento ’, ‘parceria’, ‘camponeses’, etc. tomam-se abstrações sem conteúdo e sentido precisos”2.
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