Os silêncios de Mnemosyne: oralidade e a construção da memória da penitência em Barbalha-CE.

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: BEZERRA, Cícera Patrícia Alcântara.
Data de Publicação: 2008
Tipo de documento: Artigo de conferência
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFCG
Texto Completo: http://dspace.sti.ufcg.edu.br:8080/jspui/handle/riufcg/36491
Resumo: A forte religiosidade se tornou uma das principais características do Cariri cearense. Um grande caleidoscópio de representações do catolicismo popular e suas crenças. Essa religiosidade é caracterizada pelas constantes re-elaborações e reincorporações realizadas principalmente por leigos, enquanto condutores dessa cultura religiosa pluralizada, que dispensa o intermédio do clero para manutenção de suas expressões de fé. Um dos principais rituais devocionais praticados no Brasil desde período colonial é a penitência, esta, teria sido trazida ao Brasil pelos padres jesuítas, assumindo particularmente no Nordeste características específicas. Elas são identificadas nessa região a partir do século XVIII, muito influenciadas pelos missionários capuchinhos italianos e lazaristas franceses, sobretudo os primeiros, que em seus sermões sempre enfatizavam de forma agressiva a ideia de um Deus intransigente e cheio de fúria, incentivando nos fiéis o temor ao inferno, que seria o ponto de chegada de quem houvesse desobedecido a Deus pecando contra suas palavras. A epidemia de cólera morbo, ocorrida em meados do Século XIX, dizimou grande parte da população da região do Cariri Cearense, o que contribuiu para que houvesse um afloramento de práticas penitenciais públicas na região do Cariri, que contavam com a participação de muitos padres, onde se acreditava que através do sofrimento coletivo, diminuiriam os pecados dos homens e a ira de Deus, proporcionando dessa forma, o fim da epidemia que representava o castigo divino pelos pecados dos homens. Os periódicos que circulavam no Cariri no período da epidemia de cólera, dentre os quais se destaca o jornal “O Araripe”, assim como a literatura escrita sobre a região, referenciam que as Ordens de Penitentes remontam a pelo menos 1850, período anterior a atuação missionária do Padre Ibiapina no Cariri que ocorreu a partir de 1864, tendo sido ele responsável pela construção em Crato e em Barbalha, de algumas Casas de Caridade e Cemitérios, para atender a população castigada pelas constantes secas e pela epidemia. No discurso apresentado pelos componentes da Irmandade da Cruz, aparece clara a representação do Padre Ibiapina como fundador não apenas desse grupo, como de outros localizados na região. O cemitério do sítio, onde também se realizam as práticas de mortificação corporal, teria sido construído pelo missionário para o sepultamento das vítimas do cólera. O jornal “O Araripe”, na edição de 11.05.18642, contabilizava no Sítio Cabeceiras no ano de 1864, o número de 60 acometidos pela doença, dentre os quais três mortos. Neste sentido, podemos perceber a existência de determinados elementos que se fazem presente nas narrativas orais dos componentes do grupo, particularmente, os elementos que relacionam o Padre Ibiapina e a epidemia de Cólera Morbo enquanto “mitos fundadores” da penitencia no sítio cabeceiras. Tais elementos diferem, do que alguns “historiógrafos’, particularmente, J. de Figueiredo Filho e Irineu Pinheiro apresentam como sendo “verdade” sobre a prática de autoflagelação no Cariri Cearense. O que pretendemos demonstrar neste artigo, é que os diferentes sujeitos constroem enredos específicos para contar as “suas” histórias.
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