Burocratas de nível de rua do Sistema Único de Assistência Social : o que fazem, como interagem e classificam os usuários?

• Autor(a) principal: Marcos Arcanjo de Assis
• Data de Publicação: 2023
• Tipo de documento: Tese
• Idioma: por
• Título da fonte: Repositório Institucional da UFMG
• Texto Completo: http://hdl.handle.net/1843/60229; https://orcid.org/0000-0002-8226-7379
• topic: Implementação de políticas públicas; Burocratas de nível de rua; Sistema Único da Assistência Social; Estilos de interação; Esquemas de categorização; Ciência política - Teses; Políticas públicas - Teses; Sistema Único da Assistência Socal (Brasil) - Teses

O tema da pesquisa é a implementação, por burocratas do nível de rua (BNR), de um serviço do Sistema Único da Assistência Social. Os BNR são profissionais que executam os serviços públicos diretamente aos cidadãos, em condições de trabalho quase sempre inadequadas. Para atuar dentro dessas condições e atender às especificidades dos usuários atendidos, esses agentes exercem discricionariedade e fazem julgamentos, o que supostamente tem implicações para as políticas públicas e para os cidadãos. O objetivo do estudo foi descrever e analisar a atuação de BNR do Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família e Indivíduos, destinado a famílias em situação de violação de direitos relacionais, ofertando acompanhamento socioassistencial baseado em práticas de construção de vínculo e referência com as famílias. O framework da pesquisa considerou como elementos analíticos: as práticas realizadas, os estilos de interação adotados com os usuários e os esquemas de categorização do público mobilizados pela BNR; os fatores que afetam, de modo agregado, a sua atuação; e as diferenciações sociais dos usuários associadas ao seu comportamento. Realizou-se um estudo de caso único com uma equipe de 11 BNR do serviço em Belo Horizonte. Utilizou-se a abordagem qualitativa de aproximação e análise do objeto e a coleta de dados triangulou técnicas de observação direta, entrevistas e fontes documentais (registros administrativos e Prontuários de Acompanhamento dos usuários). O material foi sistematizado com o procedimento de codificação no Atlas.Ti, à luz da abordagem interpretativa. Observou-se que as BNR do serviço realizam o acompanhamento dos usuários de forma convergente com o previsto, exercendo a discricionariedade no espaço deixado pelas orientações normativas, ou seja, adaptando algumas atividades, decidindo quais não fazer e realizando outras “não escritas”. No caso pesquisado, a atuação pelas práticas tende à padronização. Mas as agentes exercem discricionariedade ao adotarem 17 estilos de interação com os usuários, com destaque para os que os valorizam e mediam suas relações familiares, bem como ao operarem julgamentos na mobilização de dois esquemas de categorização comportamental do público: resistente-aderente e organizado-desorganizado. As BRN pesquisadas parecem aplicar conhecimentos de sua profissão para conceber o seu trabalho, realizar determinadas práticas e criar uma forma de interação pedagógica com os usuários. Os casos acompanhados por elas são discutidos coletivamente com a rede de serviços e com a gestão local, em relações que afetam a sua atuação. Mas a principal influência são as condições físicas, demandas e comportamentos dos usuários, além de alguns elementos organizacionais, como a sobrecarga de trabalho e a capacidade de atendimento da rede de serviços. Se, por um lado, observou-se uma diferenciação simbólica imbricada na segmentação dos usuários como mais ou menos capazes de superar suas violações, por outro identificou-se diferenciações positivas de tratamento: o insistir com o caso de usuários resistentes e a seleção de casos de usuários organizados para desligamento com ou sem encaminhamento final. Notou-se ainda que práticas, estilos e categorizações são combinados na implementação do serviço, conformando conjuntamente a atuação das agentes. A pesquisa destaca contribuições imediatas para os estudos sobre BNR, para debates sobre os princípios do Sistema Único de Assistência Social e para a gestão do Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família e Indivíduos.