Transplante de córnea: tendências e impacto da pandemia de Covid-19

• Autor(a) principal: Moriyama, Aline Silveira [UNIFESP]
• Data de Publicação: 2021
• Tipo de documento: Tese
• Idioma: por
• Título da fonte: Repositório Institucional da UNIFESP
• Texto Completo: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=11155431; https://repositorio.unifesp.br/11600/68312
• topic: Ceratoplastia; Ceratoplastia Lamelar; Banco De Olhos; Covid-19; SARS-CoV-2; Keratoplasty; Lamellar Keratoplasty; Eye Bank; Covid-19; SARS-CoV-2

Objetivos: O presente estudo de doutorado tem por finalidade estudar as tendências de utilização das diferentes técnicas de transplante de córnea (TC) em um serviço de referência no país, e estudar fatores que podem impactar a realização do TC entre cirurgiões de córnea, como aprendizado cirúrgico, possibilidade de ampliação de disponibilização de tecido doado e, mais recentemente, os graves desdobramentos da pandemia de doença do coronavírus 2019 (COVID-19), na atividade de bancos de olhos e TC. Métodos: 1. Estudo retrospectivo de avaliação de viabilidade endotelial de todas as córneas tectônicas preservadas pelo BOS, entre janeiro e abril de 2014. O potencial uso dessas em transplantes lamelares posteriores foi estimado por meio da separação das que apresentavam endotélio viável, com densidade celular endotelial (DCE) ³ 2.000céls/mm2 e boa avaliação nos parâmetros endoteliais à lâmpada de fenda. 2. Estudo prospectivo dos primeiros 53 casos consecutivos de DMEK realizados por médicos em programa de subespecialização em córnea no HOS/BOS, com análise de melhor acuidade visual corrigida, densidade endotelial e complicações. 3. Estudo retrospectivo de tendência de uso de técnicas cirúrgicas e indicações de TC em um hospital terciário entre 2012 e 2019, por meio de análise de prontuários. 4. Editorial referente aos potenciais impactos a curto e longo prazos, causados pela pandemia de COVID-19 nos programas de TC e funcionamento de bancos de olhos sob perspectiva global, evidenciando-se as principais normativas internacionais, bem como os pontos de discordância e incertezas, com a necessidade de maiores estudos e consenso. 5. Estudo retrospectivo sobre o impacto da pandemia de COVID-19 na atividade de TC no Brasil, usando-se dados do Hospital Oftalmológico de Sorocaba, do Banco de Olhos de Sorocaba (HOS/BOS), estado de São Paulo e Brasil, nos períodos de suspensão de TC eletivo e após sua retomada, em comparação aos dados pré-pandemia. 6. Relato de 2 casos de portadores de TC com rejeição em enxerto de ceratoplastia endotelial da membrana de Descemet (DMEK) durante infeção por SARS-CoV-2. Resultados: 1. Foram avaliadas 2.847 córneas preservadas pelo BOS, das quais 423 foram classificadas como tectônicas, de acordo com parâmetros biomicroscópicos e DCE. Entre essas, 87 (20,56%) apresentavam viabilidade endotelial compatível com uso em EK. A DCE média desse grupo de córneas foi de 2.471 ± 256 células/mm2, variando de 2.012 a 2.967. células/mm2. 2. Entre os olhos com potencial pleno de visão, 97% atingiram BCVA ≥ 20/40, após 6 meses da cirurgia. O preparo do enxerto de DMEK pelos cirurgiões em treinamento foi bem-sucedido em todos os casos. Nove olhos (17%) apresentaram descolamento parcial do enxerto, tendo sido manejados com sucesso por meio de injeção intracameral de ar. Falência primária ocorreu em 3 olhos (5,7%), havendo necessidade de nova EK. 3. No total, 16.250 cirurgias de TC foram realizadas de 1 de janeiro de 2012 a 31 de dezembro de 2019. Houve uma tendência significante de redução de ceratoplastia penetrante (PK, p<0,0001) e ceratoplastia lamelar anterior (ALK, p<0,0001), em contraste com tendência significante de aumento de ceratoplastia endotelial (EK) durante o período, que aumentou de 7,8%, em 2012, para 39,9%, em 2019 (p<0,0001). Entre as cirurgias de EK, DMEK mostrou uma tendência significante de crescimento, com elevação de 12,8%, em 2012, para 74,4%, em 2019 (p<0,0001). 4. A transmissão de SARS-CoV-2 pelo transplante de córnea é incerta, porém possível, sendo necessário estabelecimento de critérios específicos para seleção de doadores de tecidos oculares e receptores de TC. 5. Foi observada significante redução do número de transplantes realizado tanto durante suspensão de TC eletivo quanto após a retomada, em relação aos números pré-pandemia, tanto no HOS/BOS quanto no estado de São Paulo e no Brasil. Entre os TC com finalidade óptica realizados no HOS/BOS após a retomada, houve uma redução significante de EK e aumento de PK, em comparação com antes da pandemia. O número de pacientes adicionados à lista de espera após a retomada dos TC eletivos atingiu valores equiparáveis aos pré-pandemia no estado de São Paulo, gerando aumento significante na lista de espera. 6. Duas pacientes com distrofia de Fuchs e em pósoperatório de DMEK apresentaram quadro compatível com rejeição do enxerto, durante infecção por COVID-19. As pacientes necessitaram internação, mas não intubação orotraqueal. Ambas faziam uso de corticoide tópico, mas suspenderam aplicação durante a hospitalização. Conclusões: 1. Um número significante de córneas doadoras tradicionalmente classificadas como tectônicas apresentam características endoteliais compatíveis com uso em EK. Esses resultados fomentaram o desenvolvimento de um novo sistema de classificações para córneas de banco de olhos no estado de São Paulo, Brasil. 2. O ensino cirúrgico de DMEK em um programa de subespecialização baseado em técnica padronizada e supervisão constante de um cirurgião experiente apresentou resultados positivos, com bons resultados visuais pós-operatórios e índices aceitáveis de complicações intra e pós-operatórias. 3. Uma marcada tendência de aumento do uso de EK foi constatada, concordante com uma tendência de redução de PK e ALK. Entre as EK, a DMEK apresentou rápido crescimento durante o período estudado. 4. São necessários estudos e consenso relacionados aos critérios de exclusão de doadores com suspeita, diagnóstico ou fatores de risco para COVID-19 e utilidade do uso de RT-PCR para rastreio de doadores e receptores. 5. A pandemia afetou dramaticamente a atividade de TC no Brasil, com repercussões impactantes a longo prazo. Estima-se que seja necessário um aumento de 34% em São Paulo e 91% no Brasil nas taxas de TC para que a fila de espera retorne ao montante pré-pandemia ao final de dois anos. 6. Os casos descritos apoiam uma possível associação entre COVID-19 e rejeição de TC.