Crítica da razão logratória: da malandragem à velhacaria
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2018 |
Tipo de documento: | Tese |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Repositório Institucional da UNESP |
Texto Completo: | http://hdl.handle.net/11449/157272 |
Resumo: | Começando por Leonardinho-Pataca em Memórias de um Sargento de Milícias(1854), de Manuel Antônio de Almeida, até chegarmos a Ricardo de Mello, de Tanto Faz(1981) e Abacaxi (1985), romances escritos por Reinaldo Moraes, são quase 150 anos de uma figura tipicamente brasileira flanando pela literatura nacional, passando pelo índio Macunaíma, de Mário de Andrade, por Geraldo Viramundo, de Fernando Sabino, pelo deputado federal Paulo Santos, de Mário Palmério, pelo próprio Brás Cubas, de Machado de Assis, entre muitos outros, com importantes traços da tradição picaresca somados ao problema da brasilidade e a outros elementos que tornaram o malandro brasileiro um tipo peculiar. A esperteza e a sagacidade são algumas das características mais marcantes do malandro, que normalmente renega o trabalho, a ordem estabelecida e procura viver aproveitando-se de oportunidades e circunstâncias que facilitem de alguma maneira a sua tortuosa trajetória. Em seu ensaio “Dialética da Malandragem” (1970), Antônio Candido enumera semelhanças e diferenças entre este malandro que encontramos na literatura nacional, especialmente em Memórias de um Sargento de Milícias, em relação ao pícaro, que surge em obras como La vida de Lazarillo, de Tormes (1554) e Vida y hechos, de Estebanillo González (1645). Candido não filia o primeiro ao segundo, mas elenca características que podem aproximar o malandro brasileiro do pícaro, como a origem humilde e a itinerância, por exemplo. Aqui analisamos a figura do malandro, de Manuel Antônio de Almeida, até seus desdobramentos, transformações e ampliações para além da figura clássica, chegando ao contemporâneo protagonista de Reinaldo Moraes, levando em consideração a própria história e natureza da forma romanesca, para, então, nos debruçarmos numa reflexão que permita compreender de que modo essa manifestação particular do romance pode ser útil para pensarmos não só a relação entre literatura e sociedade, considerada em função de determinado aspecto da cultura nacional, mas, sobretudo, como certos romances concebem personagens cínicas, aproveitadoras, arrivistas, egoístas e até mesmo corruptas que, escondidas sob a dissimulação do humor, confundem-se, muitas vezes, com a própria figura do malandro. A partir do tipo malandro genuinamente brasileiro, que começa em Leonardinho, passamos por essa figura da literatura nacional através dos tempos, até chegarmos a um novo tipo que surge e que pode ser representado por Brás Cubas, por exemplo, um sujeito que não é marcado pelo conflito entre status e circunstâncias sociais ou posição de classe e adversidade. Do ponto de vista da condição social, essas personagens caracterizam-se por práticas e formas de agir que contrariam valores éticos e morais, que deveriam fundamentar os comportamentos e as práticas sociais. São personagens que manipulam esses mesmos valores, de forma consciente, em nome do privilégio de classe, da influência social e principalmente do benefício próprio, passando da malandragem à velhacaria, como é o caso de Ricardo de Mello, narrador e protagonista dos romances Tanto Faz e Abacaxi, figuras que trazem à literatura nacional o tipo dos privilégios, prerrogativas e favorecimento social, valendo-se da finta, do jeitinho e da malandragem como instrumentos para a obtenção de vantagens particulares, os denominados “velhacos”. |
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Crítica da razão logratória: da malandragem à velhacariaCritique of deceptive intent: from "malandragem" to "velhacaria".MalandroVelhacoMalandragemVelhacariaJeitinhoRogueRoguenessComeçando por Leonardinho-Pataca em Memórias de um Sargento de Milícias(1854), de Manuel Antônio de Almeida, até chegarmos a Ricardo de Mello, de Tanto Faz(1981) e Abacaxi (1985), romances escritos por Reinaldo Moraes, são quase 150 anos de uma figura tipicamente brasileira flanando pela literatura nacional, passando pelo índio Macunaíma, de Mário de Andrade, por Geraldo Viramundo, de Fernando Sabino, pelo deputado federal Paulo Santos, de Mário Palmério, pelo próprio Brás Cubas, de Machado de Assis, entre muitos outros, com importantes traços da tradição picaresca somados ao problema da brasilidade e a outros elementos que tornaram o malandro brasileiro um tipo peculiar. A esperteza e a sagacidade são algumas das características mais marcantes do malandro, que normalmente renega o trabalho, a ordem estabelecida e procura viver aproveitando-se de oportunidades e circunstâncias que facilitem de alguma maneira a sua tortuosa trajetória. Em seu ensaio “Dialética da Malandragem” (1970), Antônio Candido enumera semelhanças e diferenças entre este malandro que encontramos na literatura nacional, especialmente em Memórias de um Sargento de Milícias, em relação ao pícaro, que surge em obras como La vida de Lazarillo, de Tormes (1554) e Vida y hechos, de Estebanillo González (1645). Candido não filia o primeiro ao segundo, mas elenca características que podem aproximar o malandro brasileiro do pícaro, como a origem humilde e a itinerância, por exemplo. Aqui analisamos a figura do malandro, de Manuel Antônio de Almeida, até seus desdobramentos, transformações e ampliações para além da figura clássica, chegando ao contemporâneo protagonista de Reinaldo Moraes, levando em consideração a própria história e natureza da forma romanesca, para, então, nos debruçarmos numa reflexão que permita compreender de que modo essa manifestação particular do romance pode ser útil para pensarmos não só a relação entre literatura e sociedade, considerada em função de determinado aspecto da cultura nacional, mas, sobretudo, como certos romances concebem personagens cínicas, aproveitadoras, arrivistas, egoístas e até mesmo corruptas que, escondidas sob a dissimulação do humor, confundem-se, muitas vezes, com a própria figura do malandro. A partir do tipo malandro genuinamente brasileiro, que começa em Leonardinho, passamos por essa figura da literatura nacional através dos tempos, até chegarmos a um novo tipo que surge e que pode ser representado por Brás Cubas, por exemplo, um sujeito que não é marcado pelo conflito entre status e circunstâncias sociais ou posição de classe e adversidade. Do ponto de vista da condição social, essas personagens caracterizam-se por práticas e formas de agir que contrariam valores éticos e morais, que deveriam fundamentar os comportamentos e as práticas sociais. São personagens que manipulam esses mesmos valores, de forma consciente, em nome do privilégio de classe, da influência social e principalmente do benefício próprio, passando da malandragem à velhacaria, como é o caso de Ricardo de Mello, narrador e protagonista dos romances Tanto Faz e Abacaxi, figuras que trazem à literatura nacional o tipo dos privilégios, prerrogativas e favorecimento social, valendo-se da finta, do jeitinho e da malandragem como instrumentos para a obtenção de vantagens particulares, os denominados “velhacos”.For almost 150 years, a typically Brazilian character hass a unteredour national literature, from Leonardinho-Pataca in Manuel Antonio de Almeida’s Memórias de um Sargento de Milícias(1854) to Ricardo de Mello, in Reinaldo Moraes’ novelsTanto Faz (1981) andAbacaxi (1985). Otherexamples include, among others, Mario de Andrade’s Indian Macunaíma, Fernando Sabino’s Geraldo Viramundo, Mauro Palmério’s federal Congressman Paulo Santos, and Machado de Assis’ Brás Cubas. This Brazilian rogue (the “malandro”) is peculiar because he embodies important features of the picaresque tradition and also the problem of Brazilianness, among other aspects. Cunningness and sagaciousness are some of the most remarkable traits of the “malandro”, who often eschews work, the established order, and is always trying to use the circumstances and opportunities to his own advantage, in an attempt to make his tortuous trajectory easier. In his essay “Dialética da Malandragem” (1970), Antonio Candido lists the similarities and differences between this “malandro” in our national literature, mainly in Memórias de um Sargento de Milícias, and the “pícaro” in La vida de Lazarillo, de Tormes(1554) and Vida y hechos, de Estebanillo González (1645). Despite not linking the “malandro” to the “pícaro”, Candido highlights common traits between them, such as their poor origin and their rambling. Here we examine Manuel Antonio de Almeida’s “malandro”, how it expands beyond that classical figure and culminates in Reinaldo Moraes’ contemporary protagonist. To do that, we take into consideration the history and nature of the novel as form to try and understand how this specific type of novel can help us think about the relationship between literature and society, considered in function of a given aspect of national culture. But, above all, we bear in mind how certain novels conceive of spongers and social climbers, selfish, cynical and even corrupt characters who, under the mask of humour, pass off, many times, as the “malandro” himself. From the genuinely Brazilian “malandro” inaugurated by Leonardinho we look into this character in national literature through the ages until we arrive at a new type that is born with and can be represented by BrásCubas, for example, one who is not marked by the conflict between status and social circumstances or class position and adversity. From the point of view of the social condition, these characters are identified by attitudes and actions that contradict the ethical and moral values which are the blueprint for social behaviour and practices. They consciously manipulate these values in the name of class privilegie, social influence and mainly for their own benefit, going from “malandragem” to rogueness, such as is the case of Ricardo de Mello, the narrator and protagonist of the novels TantoFazand Abacaxi. They are the so-called “velhacos” (rogues) who inscribe in our national literature these types of privileges, prerogatives and social favouring by obtaining personal advantages through wiliness and the sorts of Brazilian trickery and rogueness known as “jeitinho” and “malandragem”.Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)140889/2014-0Universidade Estadual Paulista (Unesp)Scheel, Márcio [UNESP]Universidade Estadual Paulista (Unesp)Coleone, Eduardo2018-10-09T17:34:45Z2018-10-09T17:34:45Z2018-09-06info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/11449/15727200090883733004153015P22801543046216783porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Institucional da UNESPinstname:Universidade Estadual Paulista (UNESP)instacron:UNESP2023-11-22T06:18:14Zoai:repositorio.unesp.br:11449/157272Repositório InstitucionalPUBhttp://repositorio.unesp.br/oai/requestopendoar:29462024-08-05T18:27:18.171919Repositório Institucional da UNESP - Universidade Estadual Paulista (UNESP)false |
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