Educação especial, conhecimento e capacitismo: a persistência da exclusão no Brasil contemporâneo

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Lima, André Luís de Souza
Data de Publicação: 2022
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10183/240099
Resumo: Esta tese tem como problema central a persistência da exclusão escolar, da injustiça social e do reconhecimento lesivo das pessoas com deficiência no Brasil contemporâneo. Trata-se de um estudo teórico cujo objetivo principal é investigar as formas de conhecer em educação especial. Em nosso entendimento, a desconsideração de questões epistemológicas relevantes, vinculadas as formas de conhecer, tem, além de efeitos na abrangência do cognoscível sobre o histórico, o social, o político e o subjetivo, efeitos éticos no modo de relacionar-se com aqueles sobre os quais os discursos sobre as deficiências e as possibilidades de escolarizar são proferidos. Para perfazer esse argumento, apresentamos quatro ensaios filosóficos que se articulam no alcance do objetivo proposto. No primeiro deles, abordamos a preeminência do discurso médico na educação especial como fonte de mal-estar docente e gerador de uma sensação de despreparo ante estudantes com impasses em sua aprendizagem. Nesse contexto, a retomada de um contato com a vida ordinária da escola parece potente para resgatar sentidos do ensinar e do aprender que se perderam nos processos de objetificação do sujeito da educação especial perpetrado a partir de uma perspectiva biomédica sobre a deficiência. No segundo, retomamos o tema das diferentes concepções de deficiência por meio da análise do fenômeno da medicalização. Para tanto, evocamos o conceito de capacitismo, forma estrutural de discriminação e reconhecimento lesivo, que afeta particularmente as pessoas com deficiência. Percebeu-se, então, o controle medicamentoso das mentes e corpos como decorrentes de uma base epistemológica que sustenta a autoridade médica em sobreposição a questões de ordem cultural, subjetiva, política e econômica. Esse cenário torna urgente uma recepção ampliada das teorias ligadas à construção de um modelo social da deficiência como alternativa que viabiliza as demandas das pessoas com deficiência em termos de direitos humanos e justiça social. O terceiro persiste no tema das bases epistemológicas das concepções de deficiência em jogo e radicaliza a necessidade de atenção a demandas da luta anticapacitista. Para tanto, analisamos aproximações entre as bases do conhecimento que levaram à constituição das noções de normalidade e anormalidade, sobre as quais se assenta o modelo biomédico da deficiência, e outras formas de segregação social que surgiram no contexto europeu e vicejaram nas ex-colônias abaixo do Equador. Os indícios nos evidenciam uma ampla recepção de ideias eugenistas na constituição da educação especial brasileira enquanto área e modalidade de atendimento, levando-nos a questionar a possibilidade de conciliação entre um projeto que não revisita tais origens e um ideal de inclusão. Nesse contexto, a abertura a formas de conceber a deficiência a partir de novas bases de pensamento emerge como ainda mais fundamental e figura cada vez mais longe do eixo ocidental e europeizado da produção de conhecimento. O quarto apresenta-se com a missão de aprofundar a pergunta pela justificação filosófica das epistemologias da educação especial, encaminhando a questão em termos da noção de subjetividade envolvida na construção de conhecimento desse campo. A educação especial tem estendido uma concepção de sujeito que é dependente de teses modernas de cepa iluministas, as quais não encontram mais esteio na contraposição às justificadas críticas a suas práticas e instituições. É preciso considerar um sujeito de conhecimento que não esteja alheio às idiossincrasias da existência ligada a contextos socialmente subalternos, colonizados e disciplinados por um regime de padrões do qual não participa. Nesse ponto, a atenção às perspectivas decoloniais da produção do conhecimento, bem como a análise interseccional das opressões sociais parecem potentes para nos ajudar a oferecer uma possibilidade de educação às pessoas com deficiência que não persista na exclusão de suas particularidades existenciais e, por consequência, na impossibilidade de efetivação da justiça social.
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No primeiro deles, abordamos a preeminência do discurso médico na educação especial como fonte de mal-estar docente e gerador de uma sensação de despreparo ante estudantes com impasses em sua aprendizagem. Nesse contexto, a retomada de um contato com a vida ordinária da escola parece potente para resgatar sentidos do ensinar e do aprender que se perderam nos processos de objetificação do sujeito da educação especial perpetrado a partir de uma perspectiva biomédica sobre a deficiência. No segundo, retomamos o tema das diferentes concepções de deficiência por meio da análise do fenômeno da medicalização. Para tanto, evocamos o conceito de capacitismo, forma estrutural de discriminação e reconhecimento lesivo, que afeta particularmente as pessoas com deficiência. Percebeu-se, então, o controle medicamentoso das mentes e corpos como decorrentes de uma base epistemológica que sustenta a autoridade médica em sobreposição a questões de ordem cultural, subjetiva, política e econômica. Esse cenário torna urgente uma recepção ampliada das teorias ligadas à construção de um modelo social da deficiência como alternativa que viabiliza as demandas das pessoas com deficiência em termos de direitos humanos e justiça social. O terceiro persiste no tema das bases epistemológicas das concepções de deficiência em jogo e radicaliza a necessidade de atenção a demandas da luta anticapacitista. Para tanto, analisamos aproximações entre as bases do conhecimento que levaram à constituição das noções de normalidade e anormalidade, sobre as quais se assenta o modelo biomédico da deficiência, e outras formas de segregação social que surgiram no contexto europeu e vicejaram nas ex-colônias abaixo do Equador. Os indícios nos evidenciam uma ampla recepção de ideias eugenistas na constituição da educação especial brasileira enquanto área e modalidade de atendimento, levando-nos a questionar a possibilidade de conciliação entre um projeto que não revisita tais origens e um ideal de inclusão. Nesse contexto, a abertura a formas de conceber a deficiência a partir de novas bases de pensamento emerge como ainda mais fundamental e figura cada vez mais longe do eixo ocidental e europeizado da produção de conhecimento. O quarto apresenta-se com a missão de aprofundar a pergunta pela justificação filosófica das epistemologias da educação especial, encaminhando a questão em termos da noção de subjetividade envolvida na construção de conhecimento desse campo. A educação especial tem estendido uma concepção de sujeito que é dependente de teses modernas de cepa iluministas, as quais não encontram mais esteio na contraposição às justificadas críticas a suas práticas e instituições. É preciso considerar um sujeito de conhecimento que não esteja alheio às idiossincrasias da existência ligada a contextos socialmente subalternos, colonizados e disciplinados por um regime de padrões do qual não participa. Nesse ponto, a atenção às perspectivas decoloniais da produção do conhecimento, bem como a análise interseccional das opressões sociais parecem potentes para nos ajudar a oferecer uma possibilidade de educação às pessoas com deficiência que não persista na exclusão de suas particularidades existenciais e, por consequência, na impossibilidade de efetivação da justiça social.This thesis central problem is the persistence of school exclusion, social injustice and harmful recognition of people with disabilities in contemporary Brazil. It is a theoretical study whose main objective is to investigate the forms of knowing in special education. In our understanding, the disregard of relevant epistemological issues, linked to these forms of knowing (besides its effects on the scope of the knowable on the historical, the social, the political and the subjective) also has ethical effects on the way of relating to those about whom the speeches about disabilities and the possibilities of schooling are made. To make this argument, we present four philosophical essays that are articulated to reach the proposed goal. In the first one, we address the preeminence of the medical discourse in special education as a source of teachers' uneasiness and as a generator of a feeling of unpreparedness in the face of students with learning impasses. In this context, the resumption of a contact with the ordinary life of the school seems powerful to rescue meanings of teaching and learning that were lost in the objectification processes of the subject of special education perpetrated from a biomedical perspective on disability. In the second, we resume the theme of the different conceptions of disability through the analysis of the phenomenon of medicalization. To this end, we evoked the concept of ableism, a structural form of discrimination and harmful recognition, which particularly affects people with disabilities. We perceived the medical control of minds and bodies as arising from an epistemological base that sustains medical authority over cultural, subjective, political, and economic issues. This scenario makes urgent an expanded reception of theories linked to the construction of a social model of disability as an alternative that enables the demands of people with disabilities in terms of human rights and social justice. The third, persists in the theme of the epistemological bases of the conceptions of disability at stake and radicalizes the need for attention to the demands of the anti-ableist struggle. To this end, we analyze approximations between the bases of knowledge that led to the constitution of the notions of normality and abnormality, on which the biomedical model of disability is based, and other forms of social segregation that emerged in the European context and flourished in the former colonies below the Equator. The evidence shows us a wide reception of eugenicist ideas in the constitution of Brazilian special education as an area and modality of care, leading us to question the possibility of reconciliation between a project that does not revisit such origins and an ideal of inclusion. In this context, the openness to ways of conceiving disability from new bases of thought emerges as even more fundamental and appears increasingly far from the Western and Europeanized axis of knowledge production. The fourth, presents itself with the mission of deepening the question of the philosophical justification of special education epistemologies, addressing the question in terms of the notion of subjectivity involved in the construction of knowledge in this field. Special education has extended a conception of subject that is dependent on modern theses of Enlightenment strain, which no longer find support in the opposition to the justified criticism of its practices and institutions. It is necessary to consider a subject of knowledge that is not alien to the idiosyncrasies of existence linked to socially subaltern contexts, colonized and disciplined by a regime of standards in which it does not participate. At this point, the attention to decolonial perspectives of knowledge production, as well as the intersectional analysis of social oppressions, seem potent to help us offer a possibility of education to people with disabilities that does not persist in the exclusion of their existential particularities and, consequently, in the impossibility of the effectuation of social justice.application/pdfporEducação especialFilosofia da educaçãoDecolonialidadeSpecial educationKnowledgeDisability studiesPhilosophy of educationDecolonialismEducação especial, conhecimento e capacitismo: a persistência da exclusão no Brasil contemporâneoinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisUniversidade Federal do Rio Grande do SulFaculdade de EducaçãoPrograma de Pós-Graduação em EducaçãoPorto Alegre, BR-RS2022doutoradoinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGSinstname:Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)instacron:UFRGSTEXT001141149.pdf.txt001141149.pdf.txtExtracted Texttext/plain234807http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/10183/240099/2/001141149.pdf.txtea5161ee36d1a3da2245e9a1708e229eMD52ORIGINAL001141149.pdfTexto completoapplication/pdf1099459http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/10183/240099/1/001141149.pdf5d473bc48b96701521fe98e3ebac2b98MD5110183/2400992022-06-11 05:02:42.23889oai:www.lume.ufrgs.br:10183/240099Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttps://lume.ufrgs.br/handle/10183/2PUBhttps://lume.ufrgs.br/oai/requestlume@ufrgs.br||lume@ufrgs.bropendoar:18532022-06-11T08:02:42Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)false
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