"Escravos sem dono": a experiência social dos campos de trabalho em Moçambique no período socialista
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2008 |
Tipo de documento: | Artigo |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Revista de antropologia (São Paulo. Online) |
Texto Completo: | https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/27305 |
Resumo: | Nos dezessete anos que se seguiram à independência, boa parte da população moçambicana foi objeto de deslocamentos forçados, ora como conseqüência de projetos específicos de desenvolvimento ou expedientes repressivos levados a cabo pelo regime socialista, ora em função da cruel guerra civil na qual mergulhou o país. Entre os projetos de desenvolvimento, destacam-se as grandes empresas agrícolas que tinham como propósito concentrar a população camponesa do país, ou mesmo operações de deportação massiva de indivíduos classificados como "improdutivos" para regiões longínquas, onde deveriam transformar-se em mão-de-obra rural; milhares de indivíduos foram ainda objeto de expedientes repressivos, os quais se traduziram nos"campos de reeducação" ou em campos de prisioneiros políticos, para onde eram enviados aqueles considerados inimigos do processo revolucionário em curso. Por fim, o"rapto" foi freqüentemente utilizado pela Renamo, movimento que se opunha ao regime socialista do partido Frelimo, e mesmo pelo exército governamental para engajar jovens do conflito bélico. A experiência de desterritorialização acompanha assim a memória de parte significativa da população moçambicana. Neste artigo sugerimos que tal experiência é percebida por aqueles que a viveram, particularmente no sul de Moçambique, como parte de um processo histórico mais longo que tem raízes nos conflitos que assolaram a região entre meados e fim do século XIX. Por outro lado, rapto e deportação são interpretados como mecanismos próprios de construção, pacificação e até mesmo eliminação daqueles indivíduos classificados como"inimigos", e que caracteriza a dinâmica social do sul de Moçambique. |
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