Racismo, política pública e modos de subjetivação em um quilombo do Vale do Ribeira

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Costa, Eliane Silvia
Data de Publicação: 2012
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-13082012-104304/
Resumo: No Brasil, historicamente, os sujeitos negros e rurais passam por persistentes processos de desigualdades materiais e simbólicas. Escolhemos, pois, pesquisar uma comunidade negra rural do Vale do Ribeira, o quilombo Maria Rosa, situado em Iporanga. Este foi o primeiro quilombo paulista a receber o título de domínio de uso de terras atribuído pela Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP). Com base nos relatos dos quilombolas entrevistados, buscamos pesquisar se há relação entre a implantação da política pública de titulação de terras e o fortalecimento de uma identidade racial negra nos moradores do referido quilombo. Neste sentido, se a política pública opera psiquicamente como dispositivo contra o racismo. Para atingir os objetivos propostos, as entrevistas realizadas e a análise do material foram orientadas, principalmente, por contribuições de teóricos da psicologia social e da psicanálise dos processos grupais, como é o caso de Bleger, Kaës e Benghozi teóricos que partem da premissa que o sujeito é necessariamente sujeito do vínculo. Como resultado, constatamos que a titulação das terras representa uma conquista importante para os maria rosenses, uma vez que lhes possibilita permanecer em suas terras-territórios. No entanto, não se sentem seguros em função, especialmente, das restrições ambientalistas, que os cerceiam em seus modos tradicionais de trabalhar na roça. Se a política pública ambientalista tem sido vivida por eles como violenta, a política de titulação de terras quilombolas convoca-os a entrar em contato com a ancestralidade negra escravizada e com o racismo, ainda que de forma não planejada. Eles têm tentado transformar o traumatismo advindo dessas modalidades de dominação, mas falta uma política pública articulada entre os diferentes níveis governamentais e voltada para a temática racial que lhes dê o devido apoio. Entre eles ainda não foi gestado um discurso coletivo potente contra o racismo, mas estão atentos às situações de desigualdades por eles vividas e conhecem caminhos para enfrentá-las. Entre os maria rosenses, os sentidos atribuídos à identidade racial variam de acordo com a história pessoal e familiar de cada um deles, e conforme as marcas daquelas estratégias de dominação têm sido elaboradas por essas famílias e pela comunidade. Lá, o termo negro pode significar humilhação tanto quanto identidade positiva constituída; a palavra preto pode reportar à ideia de sujeito coisificado, mas também pode ser sujeito a quem se deseja amar; branco pode ser o inimigo opressor, mas, por outro lado, pode ser alguém a quem se ama; moreno pode ser sinônimo de humanidade, pode indicar intermediação entre o claro e o escuro, mas pode ser negação da negritude. Enfim, lá há polissemia em ser preto, negro, branco ou moreno. Do ponto de vista do sujeito psíquico, a palavra usada ou silenciada para definir para o forasteiro a condição racial deles funciona como manobra exercida diante do aviltamento antigo e atual imposto a eles é ferramenta para conter essa violência imposta
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Neste sentido, se a política pública opera psiquicamente como dispositivo contra o racismo. Para atingir os objetivos propostos, as entrevistas realizadas e a análise do material foram orientadas, principalmente, por contribuições de teóricos da psicologia social e da psicanálise dos processos grupais, como é o caso de Bleger, Kaës e Benghozi teóricos que partem da premissa que o sujeito é necessariamente sujeito do vínculo. Como resultado, constatamos que a titulação das terras representa uma conquista importante para os maria rosenses, uma vez que lhes possibilita permanecer em suas terras-territórios. No entanto, não se sentem seguros em função, especialmente, das restrições ambientalistas, que os cerceiam em seus modos tradicionais de trabalhar na roça. Se a política pública ambientalista tem sido vivida por eles como violenta, a política de titulação de terras quilombolas convoca-os a entrar em contato com a ancestralidade negra escravizada e com o racismo, ainda que de forma não planejada. Eles têm tentado transformar o traumatismo advindo dessas modalidades de dominação, mas falta uma política pública articulada entre os diferentes níveis governamentais e voltada para a temática racial que lhes dê o devido apoio. Entre eles ainda não foi gestado um discurso coletivo potente contra o racismo, mas estão atentos às situações de desigualdades por eles vividas e conhecem caminhos para enfrentá-las. Entre os maria rosenses, os sentidos atribuídos à identidade racial variam de acordo com a história pessoal e familiar de cada um deles, e conforme as marcas daquelas estratégias de dominação têm sido elaboradas por essas famílias e pela comunidade. Lá, o termo negro pode significar humilhação tanto quanto identidade positiva constituída; a palavra preto pode reportar à ideia de sujeito coisificado, mas também pode ser sujeito a quem se deseja amar; branco pode ser o inimigo opressor, mas, por outro lado, pode ser alguém a quem se ama; moreno pode ser sinônimo de humanidade, pode indicar intermediação entre o claro e o escuro, mas pode ser negação da negritude. Enfim, lá há polissemia em ser preto, negro, branco ou moreno. Do ponto de vista do sujeito psíquico, a palavra usada ou silenciada para definir para o forasteiro a condição racial deles funciona como manobra exercida diante do aviltamento antigo e atual imposto a eles é ferramenta para conter essa violência impostaHistorically in Brazil, rural African-Brazilians face constant processes of material and symbolic inequalities. For this reason, we have decided to research about Quilombo Maria Rosa, a rural African-Brazilian community located in Vale do Ribeira, Iporanga, which was the first quilombo in the state of São Paulo to obtain the title for exploring the land, given by Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP). Based on the descriptions provided during interviews by residents of the referred quilombo, we tried to confirm if there is any relation between the implementation of public policy for land titling and its habitants strengthening regarding to a racial Afro-Brazilian identity, therefore, whether that public policy acts psychically as a device against racism. For achieving the proposed goal, the interviews and analysis of material were oriented mainly due to the contribution of theoretical contributions of social psychology and psychoanalysis of group processes. That is the case of Bleger, Kaës and Benghozi, theoreticians that start from the premise that the subject is necessarily subject of bonding. As a result, we have found out landing titling is the image of an important conquering for the maria rosenses (how the inhabitants of the community investigated are called), once the title obtained allows them to stay in their lands/territories. However, they do not feel themselves safe especially due to the environmental limitations that restrict their traditional ways of working in the fields. If the environmental public policy has been considered by the habitants as a violent one, their titling policy calls them up to deal with enslaved African ancestry as well as the racism even though in indirect way. The population has been trying to change the trauma caused by those types of domination but there is a lack of articulated public policy among different governmental levels whose purposes are racial issue and appropriate support to the inhabitants. A strong collective speech against racism has not been established among the inhabitants; however, they are aware of the situations of inequality and the ways to face them. Among the maria rosenses the meanings attributed to the racial identity vary according their own personal and familiar stories and how the signs of the strategies of domination have been elaborated by those families and community as a whole. In Quilombo Maria Rosa the term negro can mean humiliation as well as present a positive constituted identity. The word black can report to the idea of a subject being a thing, an object but it can also be a subject of whom you want to love. White can be the oppressive enemy however, on the other hand, can be someone you love; brown can be a synonym of humanity, can indicate and intermediation between light and dark but can be blackness denial. After all, in that community there is a polysemy in being black, African-Brazilian, white or brown. From the psychic subjects point of view the word adopted or silenced to define to the outsider their racial condition works as a maneuver performed on the former and current degradation imposed on them; it is a device to stop that imposed violenceBiblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPScarcelli, Ianni RegiaCosta, Eliane Silvia2012-04-20info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfhttp://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-13082012-104304/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2016-07-28T16:10:32Zoai:teses.usp.br:tde-13082012-104304Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212016-07-28T16:10:32Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
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