Maternidade e transmissão cultural: o que os Guarani, residentes na periferia da capital paulista têm a dizer...
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2004 |
Tipo de documento: | Dissertação |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP |
Texto Completo: | https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/6/6136/tde-21092023-164003/ |
Resumo: | Este estudo tem por objetivo compreender o significado da Maternidade para os Guarani-Mbyá, residentes na Aldeia Morro da Saudade, localizada na zona sul de São Paulo, região de Parelheiros, portanto vivenciando cotidianamente peculiaridades próprias da periferia de uma grande metrópole. Neste contexto, buscou-se conhecer mais detalhadamente as particularidades do nascimento de um novo ser, no seio desse povo, e de que forma aquele se torna membro do grupo, bem como verificar como procedem as gerações mais velhas, no sentido de assegurar sua sobrevivência e confirmar sua identidade cultural. O caminho metodológico empregado valeu-se da contribuição da etnografia, utilizando-se um \"Diário de Campo\", a um só tempo instrumento de registro e de interpretação. Adotou-se um procedimento dialético no qual as aproximações sucessivas, tais como a ida a campo, visitas, entrevistas, eventos ocorridos e presenciados constituem uma forma de conhecimento e de análise. No conjunto, foram realizadas dezoito entrevistas individuais e três encontros grupais com jovens, homens e mulheres. A análise das \"falas\" revelou que em relação às práticas culturais, como os ritos relacionados com a maternidade, entendida em sentido amplo, houve mudanças e permanências. Entre as mudanças, registraram-se contradições relativas ao casamento precoce, apontado pela população mais velha como um comportamento cada vez mais freqüente entre os jovens, os quais revelaram - por sua vez - ter outras perspectivas em lugar da opção imediata pelo casamento tradicional. Entre as novas opções, salientaram estudar, trabalhar e namorar, seguindo padrões semelhantes aos praticados pela população jovem \"não-índia\". Não ficou claro nas falas se a preocupação com a precocidade, a que se referem os \"mais velhos\", é decorrente de uma possível tutela dos netos, citada como um fato real entre os Guarani, em função das dificuldades financeiras que os pais jovens enfrentam para criar os filhos, ou se é uma incorporação de padrões da sociedade branca, em que, com freqüência, a criação e a educação de filhos, gerados na adolescência, são assumidas pelos avós, quase sempre maternos. A contracepção, enquanto decisão consciente, apresentou posturas contraditórias. Os mais velhos preconizam o uso das ervas tradicionais e os rituais adotados pela cultura Guarani-Mbyá, enquanto os mais jovens mostram-se cada vez mais predispostos a adotar os contraceptivos utilizados pelos brancos, alegando serem de fácil acesso e \"confortáveis\": seu uso não requer dietas alimentares e outros rituais rigorosos. Mulheres apontaram as práticas antigas como empecilho para a adesão aos métodos tradicionais da cultura. Planejar a família foi apontado por mulheres mais jovens como prática que parece cada vez mais regular no âmbito de sua vida reprodutiva. A dificuldade de sobrevivência financeira foi apontada como um fator relevante para esta opção. Há indícios de mudança, uma vez que a tradição Guarani tem na prole numerosa o seu padrão de família. O parto hospitalar foi apontado pela geração mais velha como opção crescente entre mulheres jovens. Estas alegaram insegurança e medo do parto natural, realizado na Aldeia e inserido nas práticas tradicionais da cultura, para justificar a nova opção. Resta saber até que ponto essa escolha não sofre influência do contato com mulheres não-índias, que vivem no entorno da aldeia e adjacências. A discussão destes e de outros resultados levou em conta, também, os achados expressos na literatura, bem como a bibliografia sobre organização social e saúde reprodutiva dos povos indígenas do Brasil. |
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Maternidade e transmissão cultural: o que os Guarani, residentes na periferia da capital paulista têm a dizer...Maternity and cultural transmission: what the Guarani resident in the outskirts of São Paulo\'s capital have to sayEtnia GuaraniGuarani EthnicityMaternidadeMaternityPráticas RituaisReproductive HealthRitual PracticesSaúde ReprodutivaEste estudo tem por objetivo compreender o significado da Maternidade para os Guarani-Mbyá, residentes na Aldeia Morro da Saudade, localizada na zona sul de São Paulo, região de Parelheiros, portanto vivenciando cotidianamente peculiaridades próprias da periferia de uma grande metrópole. Neste contexto, buscou-se conhecer mais detalhadamente as particularidades do nascimento de um novo ser, no seio desse povo, e de que forma aquele se torna membro do grupo, bem como verificar como procedem as gerações mais velhas, no sentido de assegurar sua sobrevivência e confirmar sua identidade cultural. O caminho metodológico empregado valeu-se da contribuição da etnografia, utilizando-se um \"Diário de Campo\", a um só tempo instrumento de registro e de interpretação. Adotou-se um procedimento dialético no qual as aproximações sucessivas, tais como a ida a campo, visitas, entrevistas, eventos ocorridos e presenciados constituem uma forma de conhecimento e de análise. No conjunto, foram realizadas dezoito entrevistas individuais e três encontros grupais com jovens, homens e mulheres. A análise das \"falas\" revelou que em relação às práticas culturais, como os ritos relacionados com a maternidade, entendida em sentido amplo, houve mudanças e permanências. Entre as mudanças, registraram-se contradições relativas ao casamento precoce, apontado pela população mais velha como um comportamento cada vez mais freqüente entre os jovens, os quais revelaram - por sua vez - ter outras perspectivas em lugar da opção imediata pelo casamento tradicional. Entre as novas opções, salientaram estudar, trabalhar e namorar, seguindo padrões semelhantes aos praticados pela população jovem \"não-índia\". Não ficou claro nas falas se a preocupação com a precocidade, a que se referem os \"mais velhos\", é decorrente de uma possível tutela dos netos, citada como um fato real entre os Guarani, em função das dificuldades financeiras que os pais jovens enfrentam para criar os filhos, ou se é uma incorporação de padrões da sociedade branca, em que, com freqüência, a criação e a educação de filhos, gerados na adolescência, são assumidas pelos avós, quase sempre maternos. A contracepção, enquanto decisão consciente, apresentou posturas contraditórias. Os mais velhos preconizam o uso das ervas tradicionais e os rituais adotados pela cultura Guarani-Mbyá, enquanto os mais jovens mostram-se cada vez mais predispostos a adotar os contraceptivos utilizados pelos brancos, alegando serem de fácil acesso e \"confortáveis\": seu uso não requer dietas alimentares e outros rituais rigorosos. Mulheres apontaram as práticas antigas como empecilho para a adesão aos métodos tradicionais da cultura. Planejar a família foi apontado por mulheres mais jovens como prática que parece cada vez mais regular no âmbito de sua vida reprodutiva. A dificuldade de sobrevivência financeira foi apontada como um fator relevante para esta opção. Há indícios de mudança, uma vez que a tradição Guarani tem na prole numerosa o seu padrão de família. O parto hospitalar foi apontado pela geração mais velha como opção crescente entre mulheres jovens. Estas alegaram insegurança e medo do parto natural, realizado na Aldeia e inserido nas práticas tradicionais da cultura, para justificar a nova opção. Resta saber até que ponto essa escolha não sofre influência do contato com mulheres não-índias, que vivem no entorno da aldeia e adjacências. A discussão destes e de outros resultados levou em conta, também, os achados expressos na literatura, bem como a bibliografia sobre organização social e saúde reprodutiva dos povos indígenas do Brasil.The present study aims at understanding the meaning of Maternity for the Guarani-Mbyá resident in the Aldeia Morro da Saudade, in the Parelheiros area, southern region of São Paulo, who experience in their daily life the peculiarities of life in the outskirts of a big metropolis. In this context, the study sought a more detailed knowledge o f the peculiarities o f the birth of a new being among this ethnic group and how he becomes a member o f the group. It also aimed at the investigation on the way the elders grant the survival and confirmation of cultural identity of the group. Ethnography was the methodological path, with the \'field register\' being used both as register and interpretation tool. A dialectical procedure was adopted in which successive approaches such as field trips, visits, interviews, events that took place and those experienced constitute a form of knowledge and analysis. Eighteen individual interviews and three group meetings - with youths, men and women - were carried out. The analysis of the \'discourse\' revealed that in terms of cultural practices such as rites related to maternity in its broad sense presented both permanence and change. Among the changes, contradictions in relation to precocious marriage were found, seen by the elders as an increasingly frequent behavior of youth . The latter revealed having different perspectives in place of the immediate option for traditional marriage. These new options included studying, working and dating following patterns similar to those practiced by the \'non-indian\' young population. seen by the elders as an increasingly frequent behavior of youth. Contraception as a conscious decision presented contradictory postures. The elder commend the use o f traditional herbs and rituais adopted by the Guarani-Mbyá. On the other hand, the young seem increasingly inclined to adopting the contraceptives used by the white justifying it with easy access, \'comfort\' and non-requirement for diets and other strict rituais. Women point to antique practices as impediment to the adhesion to traditional cultural methods. Planning the family was seen by younger women as a practice that seems growingly regular . The difficulty o f financiai survival was indicated as a relevant factor for that option. There are signs of change once the Guarani tradition has, in the numerous offspring, its family pattern. Hospital delivery was attested by the older generation as a growing option among young women .The latter justify their new option claiming insecurity and fear o f natural delivery carried out in the indian settlement according to the traditional practices of culture . One wonders if such choice in not under the influence of contact with non-indian women living around or close to the settlement. The discussion o f these and other results also took into consideration the findings present in the literature as well as the bibliography on social organization and reproductive health o f Indian groups o f Brazil.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPAdorno, Rubens de Camargo FerreiraAzevedo, Marcos Augusto Pinto de2004-03-05info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/6/6136/tde-21092023-164003/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2024-10-09T13:12:47Zoai:teses.usp.br:tde-21092023-164003Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212024-10-09T13:12:47Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false |
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Este estudo tem por objetivo compreender o significado da Maternidade para os Guarani-Mbyá, residentes na Aldeia Morro da Saudade, localizada na zona sul de São Paulo, região de Parelheiros, portanto vivenciando cotidianamente peculiaridades próprias da periferia de uma grande metrópole. Neste contexto, buscou-se conhecer mais detalhadamente as particularidades do nascimento de um novo ser, no seio desse povo, e de que forma aquele se torna membro do grupo, bem como verificar como procedem as gerações mais velhas, no sentido de assegurar sua sobrevivência e confirmar sua identidade cultural. O caminho metodológico empregado valeu-se da contribuição da etnografia, utilizando-se um \"Diário de Campo\", a um só tempo instrumento de registro e de interpretação. Adotou-se um procedimento dialético no qual as aproximações sucessivas, tais como a ida a campo, visitas, entrevistas, eventos ocorridos e presenciados constituem uma forma de conhecimento e de análise. No conjunto, foram realizadas dezoito entrevistas individuais e três encontros grupais com jovens, homens e mulheres. A análise das \"falas\" revelou que em relação às práticas culturais, como os ritos relacionados com a maternidade, entendida em sentido amplo, houve mudanças e permanências. Entre as mudanças, registraram-se contradições relativas ao casamento precoce, apontado pela população mais velha como um comportamento cada vez mais freqüente entre os jovens, os quais revelaram - por sua vez - ter outras perspectivas em lugar da opção imediata pelo casamento tradicional. Entre as novas opções, salientaram estudar, trabalhar e namorar, seguindo padrões semelhantes aos praticados pela população jovem \"não-índia\". Não ficou claro nas falas se a preocupação com a precocidade, a que se referem os \"mais velhos\", é decorrente de uma possível tutela dos netos, citada como um fato real entre os Guarani, em função das dificuldades financeiras que os pais jovens enfrentam para criar os filhos, ou se é uma incorporação de padrões da sociedade branca, em que, com freqüência, a criação e a educação de filhos, gerados na adolescência, são assumidas pelos avós, quase sempre maternos. A contracepção, enquanto decisão consciente, apresentou posturas contraditórias. Os mais velhos preconizam o uso das ervas tradicionais e os rituais adotados pela cultura Guarani-Mbyá, enquanto os mais jovens mostram-se cada vez mais predispostos a adotar os contraceptivos utilizados pelos brancos, alegando serem de fácil acesso e \"confortáveis\": seu uso não requer dietas alimentares e outros rituais rigorosos. Mulheres apontaram as práticas antigas como empecilho para a adesão aos métodos tradicionais da cultura. Planejar a família foi apontado por mulheres mais jovens como prática que parece cada vez mais regular no âmbito de sua vida reprodutiva. A dificuldade de sobrevivência financeira foi apontada como um fator relevante para esta opção. Há indícios de mudança, uma vez que a tradição Guarani tem na prole numerosa o seu padrão de família. O parto hospitalar foi apontado pela geração mais velha como opção crescente entre mulheres jovens. Estas alegaram insegurança e medo do parto natural, realizado na Aldeia e inserido nas práticas tradicionais da cultura, para justificar a nova opção. Resta saber até que ponto essa escolha não sofre influência do contato com mulheres não-índias, que vivem no entorno da aldeia e adjacências. A discussão destes e de outros resultados levou em conta, também, os achados expressos na literatura, bem como a bibliografia sobre organização social e saúde reprodutiva dos povos indígenas do Brasil. |
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