Para além do que se vê: cicatrizes da violência doméstica contra mulheres

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Duarte, Flávia Meneses
Data de Publicação: 2018
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47132/tde-01042019-093632/
Resumo: Determinadas cicatrizes são inextricavelmente ligadas a experiências de vida dolorosas; também marcam a pessoa, mas em um âmbito que excede o físico. Mulheres que sobreviveram à violência doméstica normalmente passam a conviver com repercussões de longo prazo em decorrência das agressões, e a cicatriz é uma delas. A natureza desse tipo de cicatriz denuncia ao mundo um acontecimento pessoal, doloroso e humilhante, do qual normalmente não se quer falar; assim, evita-se exibi-las de forma a não fomentar a curiosidade alheia e a rememoração da violência sofrida diante da indagação proveniente das relações eu-outro (mundo). A cicatriz é, nesse sentido, a memória corporificada de uma agressão. Convém salientar que o significado das cicatrizes nesta pesquisa não foi compreendido, exclusivamente, à marca visível na pele, mas se estendendo a demais eventos rememorados pelas entrevistadas em suas narrativas. Nesse sentido, o objetivo desta pesquisa consistiu em investigar como o passado, gravado na pele em forma de cicatrizes, afeta a perspectiva de vida de mulheres que passaram por situação de violência doméstica, especialmente, no que diz respeito à forma como a mulher passa a conceber a futuridade; e quais as repercussões físicas e psicológicas que um corpo marcado por cicatrizes traz a mulher, sobretudo, o papel das relações eu-outro (mundo) sobre o processo de significação que se dá em torno das cicatrizes. A metodologia utilizada foi de base qualitativa e idiográfica, por meio de análise e interpretação de estudos de caso. A coleta de dados se deu através de entrevistas narrativas. A análise e a interpretação das narrativas foram embasadas nos pressupostos da perspectiva construtivista semiótico-cultural em Psicologia, balizadas pelas noções filosóficas de temporalidade e alteridade. No âmbito da temporalidade, os resultados indicaram, como esperado, que a experiência de violência doméstica não se encerra quando o último golpe é deferido na mulher: ela sente a extensão das agressões do passado ao conviver com os inúmeros prejuízos vivenciados no presente, que acabam por influenciar, de forma existencialmente negativa, a sua perspectiva de futuro. As entrevistadas mais jovens agem na direção das metas, que envolvem, primordialmente, a garantia da própria segurança material, física e psicológica, bem como a dos seus dependentes, apesar das tensões frente ao desconhecido. As entrevistadas mais maduras percebem-se limitadas ou mesmo impossibilitadas à realização das metas, que abarcam o desejo por um novo relacionamento amoroso. Isso porque, no âmbito da alteridade, todas as entrevistadas apresentaram uma tendência a generalizar todos os homens com base naquele que as agrediu. Além disso, as relações eu-mundo são prejudicadas, de forma geral, na medida em que a figura do outro é a de alguém em quem não se pode confiar. Destaca-se também que a situação da pesquisa pode gerar acolhimento à mulher e à sua narrativa, muitas vezes velada por receio de crítica ou vergonha, pois, na medida em que o pesquisador se coloca como um outro que inspira confiança, abre possibilidades para que a mulher ressignifique a experiência de violência e abra caminho para uma eventual superação
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Convém salientar que o significado das cicatrizes nesta pesquisa não foi compreendido, exclusivamente, à marca visível na pele, mas se estendendo a demais eventos rememorados pelas entrevistadas em suas narrativas. Nesse sentido, o objetivo desta pesquisa consistiu em investigar como o passado, gravado na pele em forma de cicatrizes, afeta a perspectiva de vida de mulheres que passaram por situação de violência doméstica, especialmente, no que diz respeito à forma como a mulher passa a conceber a futuridade; e quais as repercussões físicas e psicológicas que um corpo marcado por cicatrizes traz a mulher, sobretudo, o papel das relações eu-outro (mundo) sobre o processo de significação que se dá em torno das cicatrizes. A metodologia utilizada foi de base qualitativa e idiográfica, por meio de análise e interpretação de estudos de caso. A coleta de dados se deu através de entrevistas narrativas. A análise e a interpretação das narrativas foram embasadas nos pressupostos da perspectiva construtivista semiótico-cultural em Psicologia, balizadas pelas noções filosóficas de temporalidade e alteridade. No âmbito da temporalidade, os resultados indicaram, como esperado, que a experiência de violência doméstica não se encerra quando o último golpe é deferido na mulher: ela sente a extensão das agressões do passado ao conviver com os inúmeros prejuízos vivenciados no presente, que acabam por influenciar, de forma existencialmente negativa, a sua perspectiva de futuro. As entrevistadas mais jovens agem na direção das metas, que envolvem, primordialmente, a garantia da própria segurança material, física e psicológica, bem como a dos seus dependentes, apesar das tensões frente ao desconhecido. As entrevistadas mais maduras percebem-se limitadas ou mesmo impossibilitadas à realização das metas, que abarcam o desejo por um novo relacionamento amoroso. Isso porque, no âmbito da alteridade, todas as entrevistadas apresentaram uma tendência a generalizar todos os homens com base naquele que as agrediu. Além disso, as relações eu-mundo são prejudicadas, de forma geral, na medida em que a figura do outro é a de alguém em quem não se pode confiar. Destaca-se também que a situação da pesquisa pode gerar acolhimento à mulher e à sua narrativa, muitas vezes velada por receio de crítica ou vergonha, pois, na medida em que o pesquisador se coloca como um outro que inspira confiança, abre possibilidades para que a mulher ressignifique a experiência de violência e abra caminho para uma eventual superaçãoCertain scars are inextricably linked to painful life experiences; it also mark the person, but in a way that exceeds physical limits. Women who have survived domestic violence usually has to deal with long-term repercussions because of the aggression and the scar is just one of them. The nature of this type of scar reveals to the world a personal, painful and humiliating event, of which one does not normally want to speak about; women avoid showing them to inhibit others curiosity and the remembrance of the violence suffered due to the inquiry coming from the other-world relations. The scar is, in a way, the embodied memory of an aggression. It should be noted that the meaning of the scars in this research was not understood exclusively by visible marks on the skin, but leading to other events brought by the interviewees in their narratives. The purpose of the research was to investigate how the past, marked as scars in the skin, affects life perspectives in a woman who lived domestic violence experiences, especially, regarding the way women conceive futurity; and what are the physical and psychological repercussions that a body marked by scars has on a womans life, above all, the role of I-other relations (world) on the process of meaning that occurs considering the scars. We used a qualitative and idiographic methodology, by analysis and interpretation of case studies, The data were composed by narrative interviews. The analysis and interpretation of the narratives were based on the theories of the semiotic-cultural constructivist perspective in Psychology, defined by the philosophical notions of temporality and otherness. In the scope of temporality, the results indicate, as expected, that the aggressions do not end with the last assault suffered by the woman, who feels the consequences of those past aggressions by living with the innumerable losses experienced in the present that end up influencing, in an existentially negative way, her perspective on the future. Younger interviewees are moving towards their goals, which primarily include ensuring their own material, physical and psychological security, as well as of their dependents, despite tensions with the unknown. More mature interviewees perceive themselves limited or even disabled to achieve the goals, which involve the desire of a new relationship. This is because, in the context of alterity, all interviewees showed a tendency to generalize all men based on the one who attacked them. Besides, I-world relations are generally impaired, since the figure of the other is the one not be trusted. It is also worth noting that the research situation can generate a welcome to the woman and her narrative, often veiled by fear of criticism or shame, because, as long as the researcher behaves as a reliable other, it can enable the woman to re-signify the experience and open the way for an eventual overcomingBiblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPSimao, Livia MathiasDuarte, Flávia Meneses2018-12-10info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfhttp://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47132/tde-01042019-093632/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2021-04-10T15:59:49Zoai:teses.usp.br:tde-01042019-093632Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212021-04-10T15:59:49Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
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