Da história genealógica como esvaziamento do presente: uma análise dos cursos de Michel Foucault no Collège de France (1970-1984)
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2022 |
Tipo de documento: | Tese |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP |
Texto Completo: | https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48135/tde-01092022-111845/ |
Resumo: | Este estudo devota-se a escrutinar os usos da história no pensamento de Michel Foucault, em específico nos treze cursos que ministrou no Collège de France, de 1970 a 1984. Para tanto, focaliza de início os debates derivados da onda recentemente testemunhada de destruição de estátuas de personagens associados a regimes políticos tidos como racistas e genocidas. Em face da acirrada polêmica quanto ao destino a ser dado a tais monumentos, desponta a objeção a pensadores que, como Foucault, teriam questionado a noção de real histórico e, por extensão, colaborado para um suposto quadro de presentismo, o qual dificultaria a orientação dos sujeitos em relação às experiências passadas, bem como à concepção de futuros outros. Em direção contrária, este estudo movimenta as ideias de Foucault segundo três frentes distintas. Na primeira, com vistas a aferir as reverberações de seu pensamento no meio historiográfico e, em especial, no histórico-educacional, o pensador é perspectivado de acordo com historiadores que se posicionaram de modo ora crítico, ora favorável a ele. Na segunda frente, Foucault é mobilizado como o principal referencial teórico do estudo, sobretudo em razão de sua reflexão acerca do arquivo, a reboque da qual desponta a defesa de uma concepção temporal não redutível à oposição entre história e anacronismo. O terceiro endereçamento ao pensador dá-se quando o estudo faz uma imersão analítica nas investigações genealógicas levadas a cabo em seus cursos, de modo a apreender faticamente tanto os meandros de sua mirada genealógica quanto a efetiva relação desta com a história. Tratando-se grosso modo de uma leitura crítica sobre os modos de governamento do presente pelos discursos científicos, as investigações de Foucault deram vazão à noção de saber como excesso em vez de medida , cuja eficácia veridictiva residiria na crença de que ele sobrepairaria as relações políticas que o conformam. Em decorrência disso, a defesa de que a história, por meio da definição do real, proveria parâmetros seguros para a mediação de conflitos hodiernos foi cedendo passo a outra abordagem, voltada doravante a uma experiência de ontologização crítica do próprio presente. Não mais versando sobre o passado, tal como é usual nos estudos historiográficos, mas sobre o arquivo, a história genealógica entabulada por Foucault foi capaz de dar a ver a imanência das múltiplas temporalidades operando nos acontecimentos, rompendo, assim, a ideia de um tempo linear, com periodicidades bem delimitadas e sucessivas, na esteira da qualse pudesse reordenar a matéria arquivística de modo inconteste. Ao fazê-lo, Foucault teria evidenciado a impossibilidade de se antecipar àquilo que se dará na experiência por vir, já que não haveria nenhuma finalidade transcendental concatenando os acontecimentos dispersivos da atualidade histórica. Explicita-se assim a proposição geral do estudo: de que, em vez de forjar prognósticos que esconjurem a variedade de leituras da realidade, almejando controlar seus efeitos, a história se ocupe de esvaziar o presente de suas certezas, colaborando para a emergência de formas outras de pensamento e, por extensão, de experiências ético-políticas inauditas. |
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Da história genealógica como esvaziamento do presente: uma análise dos cursos de Michel Foucault no Collège de France (1970-1984)Of genealogical history as emptiness of the present: an analysis of Michel Foucaults Collège de France courses (1970-1984)GenealogiaGenealogyHistóriaHistoryMichel FoucaultMichel FoucaultOntologia do presenteOntology of the presentEste estudo devota-se a escrutinar os usos da história no pensamento de Michel Foucault, em específico nos treze cursos que ministrou no Collège de France, de 1970 a 1984. Para tanto, focaliza de início os debates derivados da onda recentemente testemunhada de destruição de estátuas de personagens associados a regimes políticos tidos como racistas e genocidas. Em face da acirrada polêmica quanto ao destino a ser dado a tais monumentos, desponta a objeção a pensadores que, como Foucault, teriam questionado a noção de real histórico e, por extensão, colaborado para um suposto quadro de presentismo, o qual dificultaria a orientação dos sujeitos em relação às experiências passadas, bem como à concepção de futuros outros. Em direção contrária, este estudo movimenta as ideias de Foucault segundo três frentes distintas. Na primeira, com vistas a aferir as reverberações de seu pensamento no meio historiográfico e, em especial, no histórico-educacional, o pensador é perspectivado de acordo com historiadores que se posicionaram de modo ora crítico, ora favorável a ele. Na segunda frente, Foucault é mobilizado como o principal referencial teórico do estudo, sobretudo em razão de sua reflexão acerca do arquivo, a reboque da qual desponta a defesa de uma concepção temporal não redutível à oposição entre história e anacronismo. O terceiro endereçamento ao pensador dá-se quando o estudo faz uma imersão analítica nas investigações genealógicas levadas a cabo em seus cursos, de modo a apreender faticamente tanto os meandros de sua mirada genealógica quanto a efetiva relação desta com a história. Tratando-se grosso modo de uma leitura crítica sobre os modos de governamento do presente pelos discursos científicos, as investigações de Foucault deram vazão à noção de saber como excesso em vez de medida , cuja eficácia veridictiva residiria na crença de que ele sobrepairaria as relações políticas que o conformam. Em decorrência disso, a defesa de que a história, por meio da definição do real, proveria parâmetros seguros para a mediação de conflitos hodiernos foi cedendo passo a outra abordagem, voltada doravante a uma experiência de ontologização crítica do próprio presente. Não mais versando sobre o passado, tal como é usual nos estudos historiográficos, mas sobre o arquivo, a história genealógica entabulada por Foucault foi capaz de dar a ver a imanência das múltiplas temporalidades operando nos acontecimentos, rompendo, assim, a ideia de um tempo linear, com periodicidades bem delimitadas e sucessivas, na esteira da qualse pudesse reordenar a matéria arquivística de modo inconteste. Ao fazê-lo, Foucault teria evidenciado a impossibilidade de se antecipar àquilo que se dará na experiência por vir, já que não haveria nenhuma finalidade transcendental concatenando os acontecimentos dispersivos da atualidade histórica. Explicita-se assim a proposição geral do estudo: de que, em vez de forjar prognósticos que esconjurem a variedade de leituras da realidade, almejando controlar seus efeitos, a história se ocupe de esvaziar o presente de suas certezas, colaborando para a emergência de formas outras de pensamento e, por extensão, de experiências ético-políticas inauditas.This study explores the uses of history in Michel Foucault\'s work, specifically in the thirteen courses he taught at the Collège de France, from 1970 to 1984. It initially focuses on the debates arising from the recent wave of destruction of statues of people associated with political regimes considered racist and genocidal. In view of the controversy regarding the destination to be given to such monuments, arises the objection to thinkers who, like Foucault, would have questioned the notion of historical reality and, by extension, allegedly collaborated for a presentist idea of history, which would disorientate subjects in relation to past experiences as well as conceptions of other possible futures. In the opposite direction, this study uses Foucault\'s ideas in three different fronts. In the first one, intending to measure the reverberations of his thought in the historiographical field and, particularly, in the History of Education, the thinker is mobilized by historians who have positioned themselves in a way that is sometimes critical, sometimes favorable to his ideas. In the second front, Foucault is used as the main theoretical reference of this study, mainly because of his concept of archive, in the wake of which emerges the defense of a temporal conception that cannot be reduced to the opposition between history and anachronism. The third use of Foucaults thought takes place by an analytical immersion in the genealogical investigations carried out by him in his courses, in order to apprehend both the intricacies of his genealogical gaze and its effective relationship with history. Roughly dealing with a critical reading of the ways of government of the present by scientific discourses, Foucault\'s investigations gave rise to the notion of knowledge as excess - instead of measure , whose veridictive efficacy would reside in the belief that it would be above the political relationships that frame it. Thereby, the defense that history, through the definition of reality, would provide safe parameters to mediate today\'s conflicts, gave way to another approach, now focused on an experience of critical ontologization of the present itself. No longer dealing with the past, as is usually dealt with in historiographical studies, but with the archive, the genealogical history established by Foucault was able to expose the immanence of multiple temporalities operating in historical events, thus apparting from the idea of a linear time, with well-defined and successive periodicities, in the wake of which the archive could be reordered in an uncontestable way. In doing so, Foucault would have highlighted the impossibility of anticipating what will happen in the experience to come since there would be no transcendental purpose concatenating the dispersive events of historical actuality. This explains the general proposition of this study: that, instead of forging prognoses that conjure up the variety of readings of reality, aiming to control its effects, history takes care of emptying the present of its certainties, collaborating for the emergence of other forms of thought and, by extension, of unprecedented ethical-political experiences.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPAquino, Julio Roberto GroppaSantos, Flavio Tito Cundari da Rocha2022-07-01info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48135/tde-01092022-111845/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2022-09-02T17:35:11Zoai:teses.usp.br:tde-01092022-111845Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212022-09-02T17:35:11Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false |
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Este estudo devota-se a escrutinar os usos da história no pensamento de Michel Foucault, em específico nos treze cursos que ministrou no Collège de France, de 1970 a 1984. Para tanto, focaliza de início os debates derivados da onda recentemente testemunhada de destruição de estátuas de personagens associados a regimes políticos tidos como racistas e genocidas. Em face da acirrada polêmica quanto ao destino a ser dado a tais monumentos, desponta a objeção a pensadores que, como Foucault, teriam questionado a noção de real histórico e, por extensão, colaborado para um suposto quadro de presentismo, o qual dificultaria a orientação dos sujeitos em relação às experiências passadas, bem como à concepção de futuros outros. Em direção contrária, este estudo movimenta as ideias de Foucault segundo três frentes distintas. Na primeira, com vistas a aferir as reverberações de seu pensamento no meio historiográfico e, em especial, no histórico-educacional, o pensador é perspectivado de acordo com historiadores que se posicionaram de modo ora crítico, ora favorável a ele. Na segunda frente, Foucault é mobilizado como o principal referencial teórico do estudo, sobretudo em razão de sua reflexão acerca do arquivo, a reboque da qual desponta a defesa de uma concepção temporal não redutível à oposição entre história e anacronismo. O terceiro endereçamento ao pensador dá-se quando o estudo faz uma imersão analítica nas investigações genealógicas levadas a cabo em seus cursos, de modo a apreender faticamente tanto os meandros de sua mirada genealógica quanto a efetiva relação desta com a história. Tratando-se grosso modo de uma leitura crítica sobre os modos de governamento do presente pelos discursos científicos, as investigações de Foucault deram vazão à noção de saber como excesso em vez de medida , cuja eficácia veridictiva residiria na crença de que ele sobrepairaria as relações políticas que o conformam. Em decorrência disso, a defesa de que a história, por meio da definição do real, proveria parâmetros seguros para a mediação de conflitos hodiernos foi cedendo passo a outra abordagem, voltada doravante a uma experiência de ontologização crítica do próprio presente. Não mais versando sobre o passado, tal como é usual nos estudos historiográficos, mas sobre o arquivo, a história genealógica entabulada por Foucault foi capaz de dar a ver a imanência das múltiplas temporalidades operando nos acontecimentos, rompendo, assim, a ideia de um tempo linear, com periodicidades bem delimitadas e sucessivas, na esteira da qualse pudesse reordenar a matéria arquivística de modo inconteste. Ao fazê-lo, Foucault teria evidenciado a impossibilidade de se antecipar àquilo que se dará na experiência por vir, já que não haveria nenhuma finalidade transcendental concatenando os acontecimentos dispersivos da atualidade histórica. Explicita-se assim a proposição geral do estudo: de que, em vez de forjar prognósticos que esconjurem a variedade de leituras da realidade, almejando controlar seus efeitos, a história se ocupe de esvaziar o presente de suas certezas, colaborando para a emergência de formas outras de pensamento e, por extensão, de experiências ético-políticas inauditas. |
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