Somos todos empreendedores? A demanda empreendedora como dispositivo de governo neoliberal

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Uchôa de Oliveira, Flávia Manuella
Data de Publicação: 2020
Tipo de documento: Tese
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-09072020-161211/
Resumo: Empreendedorismo e empreendedor são palavras-chave utilizadas para explicar, caracterizar e analisar os indivíduos e, ao mesmo tempo, nossa sociedade. Nas conversas do cotidiano, nos debates acadêmicos ou nos discursos políticos, o empreendedorismo e o empreendedor são utilizados para analisar o desenvolvimento econômico e a modernização dos países; para estimular políticas públicas para a geração de novos negócios e inserção econômica; para discutir a erradicação da pobreza; para exercitar a criatividade e promover a inovação nas sociedades; para desenvolver programas de educação. Também são usadas como motes para novelas, programas de TV, de rádio, além de ser tema principal de inúmeras revistas e publicações. É recorrente o anúncio de que somos todos empreendedores. Diante da relevância e da atualidade de um tema que está vinculado a tudo e a todos, cabe perguntarmos: somos mesmo todos empreendedores? Como este anúncio de que somos todos empreendedores surgiu? E, se somos ou não, o que é isso, o empreendedorismo? Tendo como horizonte essas questões, nosso estudo teve por objetivo geral: investigar como emerge o anúncio de que somos todos empreendedores, particularmente no contexto brasileiro, bem como discutir esse anúncio junto aos trabalhadores. Para alcançar esse objetivo, utilizamos como instrumentos metodológicos as entrevistas e convivência com 26 trabalhadores e também a pesquisa histórica de inspiração genealógica a partir de um arquivo composto pelos relatórios GEM - Empreendedorismo no Brasil e dos arquivos e cursos de acesso público do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, o Sebrae. Ademais, estabelecemos duas referências teórico-metodológicas para nossa pesquisa: partimos da Psicologia Social do Trabalho e dos Estudos de governamentalidade. Nossa pesquisa aponta para uma compreensão do empreendedorismo como uma demanda. Isto é, trata-se de uma exigência feita aos sujeitos para se conformem a uma normatividade. Por isso, não deve ser procurada ou localizada nos sujeitos, mas naquilo que deles é demandado (aprender a ser, se portar, se mostrar, se conduzir) para alcançar uma ordem social pautada pelo mercado. Essa ordem mercadológica faz parte da racionalidade neoliberal e funciona em determinados arranjos. Nesse sentido, a demanda empreendedora pode ser compreendida como um dispositivo de governo neoliberal, o que quer dizer que em uma rede intrincada de discursos, instituições, leis, arquiteturas e práticas há uma condução do trabalho e dos trabalhadores, e ao fim e ao cabo, da vida em sociedade. Contudo, essa condução deve ser pensada a partir de nosso contexto ao Sul, considerando um campo de disputas e não o exercício de uma hegemonia neoliberal encerrada em si mesma. Embora colocada como pretensamente inescapável, a demanda empreendedora encontra a resistência na astúcia, no oportunismo e na tática dos sujeitos. Ainda, nossa pesquisa aponta para um governo da precariedade por meio do empreendedorismo. O qual seja, a demanda empreendedora governamentaliza as várias e diferentes formas de trabalhar: a polimorfia do trabalho. Inclusive e principalmente, a precariedade constituinte dessa polimorfia
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spelling Somos todos empreendedores? A demanda empreendedora como dispositivo de governo neoliberalAre we all entrepreneurs? The entrepreneurial demand as a neoliberal dispositifEmpreendedorismoEntreprenerushipEstudos de GovernamentalidadeGovernamentality studiesNeoliberalismNeoliberalismoPsicologia social do trabalhoSocial psychology of workEmpreendedorismo e empreendedor são palavras-chave utilizadas para explicar, caracterizar e analisar os indivíduos e, ao mesmo tempo, nossa sociedade. Nas conversas do cotidiano, nos debates acadêmicos ou nos discursos políticos, o empreendedorismo e o empreendedor são utilizados para analisar o desenvolvimento econômico e a modernização dos países; para estimular políticas públicas para a geração de novos negócios e inserção econômica; para discutir a erradicação da pobreza; para exercitar a criatividade e promover a inovação nas sociedades; para desenvolver programas de educação. Também são usadas como motes para novelas, programas de TV, de rádio, além de ser tema principal de inúmeras revistas e publicações. É recorrente o anúncio de que somos todos empreendedores. Diante da relevância e da atualidade de um tema que está vinculado a tudo e a todos, cabe perguntarmos: somos mesmo todos empreendedores? Como este anúncio de que somos todos empreendedores surgiu? E, se somos ou não, o que é isso, o empreendedorismo? Tendo como horizonte essas questões, nosso estudo teve por objetivo geral: investigar como emerge o anúncio de que somos todos empreendedores, particularmente no contexto brasileiro, bem como discutir esse anúncio junto aos trabalhadores. Para alcançar esse objetivo, utilizamos como instrumentos metodológicos as entrevistas e convivência com 26 trabalhadores e também a pesquisa histórica de inspiração genealógica a partir de um arquivo composto pelos relatórios GEM - Empreendedorismo no Brasil e dos arquivos e cursos de acesso público do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, o Sebrae. Ademais, estabelecemos duas referências teórico-metodológicas para nossa pesquisa: partimos da Psicologia Social do Trabalho e dos Estudos de governamentalidade. Nossa pesquisa aponta para uma compreensão do empreendedorismo como uma demanda. Isto é, trata-se de uma exigência feita aos sujeitos para se conformem a uma normatividade. Por isso, não deve ser procurada ou localizada nos sujeitos, mas naquilo que deles é demandado (aprender a ser, se portar, se mostrar, se conduzir) para alcançar uma ordem social pautada pelo mercado. Essa ordem mercadológica faz parte da racionalidade neoliberal e funciona em determinados arranjos. Nesse sentido, a demanda empreendedora pode ser compreendida como um dispositivo de governo neoliberal, o que quer dizer que em uma rede intrincada de discursos, instituições, leis, arquiteturas e práticas há uma condução do trabalho e dos trabalhadores, e ao fim e ao cabo, da vida em sociedade. Contudo, essa condução deve ser pensada a partir de nosso contexto ao Sul, considerando um campo de disputas e não o exercício de uma hegemonia neoliberal encerrada em si mesma. Embora colocada como pretensamente inescapável, a demanda empreendedora encontra a resistência na astúcia, no oportunismo e na tática dos sujeitos. Ainda, nossa pesquisa aponta para um governo da precariedade por meio do empreendedorismo. O qual seja, a demanda empreendedora governamentaliza as várias e diferentes formas de trabalhar: a polimorfia do trabalho. Inclusive e principalmente, a precariedade constituinte dessa polimorfiaEntrepreneurship and entrepreneur are key words to explain, characterize and analyze individuals and, at the same time, our society. In everyday conversations, academic debates or political speeches, entrepreneurship and the entrepreneur can be of use to analyze the economic development and modernization of countries; to promote new firms and job creation; to debate poverty eradication; to stimuli creativity as an individual asset, and to promote innovation in societies; to develop education programs and so on. Those words are also the theme of soap operas, TV and radio shows, as well as the theme for countless magazines and books. The announcement that we are all entrepreneurs is recurring. Given the relevance and timeliness of a theme that is apparently linked to everything and everyone, it is worth asking: are we all entrepreneurs? How this announcement that we are all entrepreneurs has emerged? In addition, and regardless if we are or if we are not all entrepreneurs, what is entrepreneurship? Having these questions as our departure point, our research aimed to investigate how the announcement that we are all entrepreneurs have emerged, particularly in Brazil. It also aimed to discuss this announcement with workers from different backgrounds. In order to achieve these objectives, we conducted 26 interviews with workers from firms, startups and from a poor neighborhood in São Paulo city, southeast of Brazil. We also conducted genealogical research using reports from the Global Entrepreneurship Monitor and documents from the Brazilian Micro and Small Business Support Service. Regarding our theoretical and methodological approach, we have two main references, the Social Psychology of work as developed in Brazil since 1980s and the governamentality studies. Our research points to an understanding of entrepreneurship as a demand. That is, entrepreneurship is an exigency imposed on subjects so that they conform to a normativity. As a consequence, entrepreneurship must not be seek in the subjects, rather it must be seen on what is demanded of subjects to learn by themselves how to behave, to conduct their lives, and therefore how to be in our society in order to achieve a society-wide market-based norm. This normativity is part of the neoliberal rationality and works within determined arrangements. In this sense, the entrepreneurial demand can be understood as a neoliberal dispositif, which means it works through an intricate web of discourses, institutions, laws, architecture and practices that aims to conduct work and the conduct of workers, and therefore, to conduct life in our society. However, we must analyze this conducting of conducts within a historical and geopolitical frame, especially from the Global South, considering the neoliberal hegemony as a dispute not as a given reality. Although supposedly inescapable, the entrepreneurial demand finds resistance in the cunning acts, tactics and opportunism of subjects. In addition, our research points to what we have named the govern of precariousness through the medium of entrepreneurship. That is, the entrepreneurial demand governs the multiple and different forms of work the polymorphism of work. Even and mainly, the precariousness that constitutes this polymorphismBiblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPSato, LenyUchôa de Oliveira, Flávia Manuella 2020-04-17info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-09072020-161211/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2020-07-10T00:30:02Zoai:teses.usp.br:tde-09072020-161211Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212020-07-10T00:30:02Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
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