Aquisição dos complementos dos verbos percetivos em português europeu por crianças bilingues português-italiano

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Aliverti-Piuri, Costanza
Data de Publicação: 2023
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10451/63174
Resumo: O presente estudo debruça-se sobre a aquisição dos complementos de verbos percetivos em português europeu (PE) por parte de crianças bilingues italiano-PE, falando estas crianças italiano com ambos os pais, ou PE com um progenitor e italiano com o outro. Com o objetivo de averiguar os padrões de aquisição destes falantes, foi realizado um teste experimental de produção provocada, e os respetivos resultados foram comparados com a produção de crianças monolingues portuguesas. Esta comparação permitiu, por um lado, testar algumas hipóteses gerais sobre a aquisição da sintaxe que foram, até agora, testadas apenas em crianças monolingues; por outro lado, evidenciou a presença de influência interlinguística (crosslinguistic influence) na produção das crianças bilingues. Este estudo constitui, tendo em conta o nosso conhecimento, a primeira investigação sobre a aquisição da sintaxe por parte de crianças bilingues italiano-PE. O número reduzido da amostra deve-se ao facto de a recolha de dados ter decorrido durante a pandemia de COVID-19. Trata-se, portanto, de um estudo de caráter exploratório. O italiano e o PE são duas línguas que oferecem um grande leque de possibilidades no que diz respeito aos complementos dos verbos percetivos. Em PE, temos i) a completiva finita, ii) a completiva de infinitivo flexionado, iii) a construção de infinitivo preposicionado (PIC, do inglês Prepositional Infinitival Construction), iv) a completiva com elevação de sujeito para objeto (RtO, do inglês Raising-to-Object), e v) a completiva de fazer-Inf (FI). Em italiano, temos i) a completiva finita, ii) a pseudorrelativa, iii) a completiva de RtO e iv) a completiva de FI. As duas línguas têm, portanto, algumas completivas em comum (completiva finita, RtO e FI), e outras completivas não partilhadas (PIC e completiva de infinitivo flexionado são exclusivas do PE, a pseudorrelativa é exclusiva do italiano). Esta sobreposição parcial das estruturas aceitáveis como complementos de verbos percetivos permitiu investigar os efeitos da influência interlinguística, definida em termos de priming interlinguístico (Serratrice 2013, 2016): esperamos, portanto, que as crianças bilingues produzam mais completivas finitas (e, eventualmente, de RtO e FI), em contraste com menor produção de completivas de infinitivo flexionado e/ou PIC, por comparação com as crianças monolingues. Sendo que o efeito do priming interlinguístico será tanto mais forte quanto mais recente e frequentemente é usada a língua que determina tal efeito (no nosso caso, o italiano) (Santos e Flores, 2016), esperamos diferenças nas produções das crianças que falam italiano em casa com ambos os pais por comparação com as crianças que, em casa, falam italiano com um progenitor e PE com o outro. Além disto, foi testada a Complete Functional Complement Hypothesis (CFCH), proposta por Santos, Gonçalves e Hyams (2016), segundo a qual as crianças preferem Complementos Funcionalmente Completos (CFC, Complete Functional Complement). As autoras, neste mesmo estudo, observaram também que o grupo de crianças de 4 e 5 anos preferia produzir completivas finitas com predicados télicos e PIC com predicados atélicos. Com o intento de testar os efeitos do priming interlinguístico, a CFCH e a sensibilidade à telicidade do predicado encaixado, foi realizado um teste de produção provocada constituído por 32 itens: 16 itens de teste e 16 distratores. Dos 16 itens de teste, 8 continham, na oração encaixada, predicados télicos e 8 predicados atélicos. Foram testadas 14 crianças bilingues entre os 4;11 e os 10 anos. Destas 14 crianças, 4 falam italiano com ambos os pais (sendo ambos os pais italianos) e 10 falam italiano com um progenitor e PE com o outro (sendo um progenitor italiano e o outro português). Como grupo de controlo, foram testadas 24 crianças entre os 5 e os 10 anos. Os resultados confirmam a CFCH: todas as crianças produziram quase exclusivamente completivas finitas e PIC. Não se confirma, de modo geral, a preferência das crianças por completivas finitas com predicados télicos e por PIC com predicados atélicos. Apenas o grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais apresentaram alguma associação dos predicados télicos com a completiva finita, existindo, porém, uma grande variação individual. O fator idade também parece ter algum papel neste quadro: o grupo de crianças bilingues mais novas é mais sensível à telicidade do predicado do que as crianças bilingues mais velhas, ou mesmo do que as crianças monolingues da mesma idade. As produções das crianças bilingues confirmam ainda a presença de influência interlinguística: esta foi mais evidente no grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais do que no grupo de crianças que falam italiano com um progenitor e PE com o outro. Estes resultados são compatíveis com uma análise da influência interlinguística como consequência de priming interlinguístico: as crianças que têm mais exposição ao italiano tiveram efeitos de priming mais evidentes do que as crianças que têm menos exposição ao italiano.
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Este estudo constitui, tendo em conta o nosso conhecimento, a primeira investigação sobre a aquisição da sintaxe por parte de crianças bilingues italiano-PE. O número reduzido da amostra deve-se ao facto de a recolha de dados ter decorrido durante a pandemia de COVID-19. Trata-se, portanto, de um estudo de caráter exploratório. O italiano e o PE são duas línguas que oferecem um grande leque de possibilidades no que diz respeito aos complementos dos verbos percetivos. Em PE, temos i) a completiva finita, ii) a completiva de infinitivo flexionado, iii) a construção de infinitivo preposicionado (PIC, do inglês Prepositional Infinitival Construction), iv) a completiva com elevação de sujeito para objeto (RtO, do inglês Raising-to-Object), e v) a completiva de fazer-Inf (FI). Em italiano, temos i) a completiva finita, ii) a pseudorrelativa, iii) a completiva de RtO e iv) a completiva de FI. As duas línguas têm, portanto, algumas completivas em comum (completiva finita, RtO e FI), e outras completivas não partilhadas (PIC e completiva de infinitivo flexionado são exclusivas do PE, a pseudorrelativa é exclusiva do italiano). Esta sobreposição parcial das estruturas aceitáveis como complementos de verbos percetivos permitiu investigar os efeitos da influência interlinguística, definida em termos de priming interlinguístico (Serratrice 2013, 2016): esperamos, portanto, que as crianças bilingues produzam mais completivas finitas (e, eventualmente, de RtO e FI), em contraste com menor produção de completivas de infinitivo flexionado e/ou PIC, por comparação com as crianças monolingues. Sendo que o efeito do priming interlinguístico será tanto mais forte quanto mais recente e frequentemente é usada a língua que determina tal efeito (no nosso caso, o italiano) (Santos e Flores, 2016), esperamos diferenças nas produções das crianças que falam italiano em casa com ambos os pais por comparação com as crianças que, em casa, falam italiano com um progenitor e PE com o outro. Além disto, foi testada a Complete Functional Complement Hypothesis (CFCH), proposta por Santos, Gonçalves e Hyams (2016), segundo a qual as crianças preferem Complementos Funcionalmente Completos (CFC, Complete Functional Complement). As autoras, neste mesmo estudo, observaram também que o grupo de crianças de 4 e 5 anos preferia produzir completivas finitas com predicados télicos e PIC com predicados atélicos. Com o intento de testar os efeitos do priming interlinguístico, a CFCH e a sensibilidade à telicidade do predicado encaixado, foi realizado um teste de produção provocada constituído por 32 itens: 16 itens de teste e 16 distratores. Dos 16 itens de teste, 8 continham, na oração encaixada, predicados télicos e 8 predicados atélicos. Foram testadas 14 crianças bilingues entre os 4;11 e os 10 anos. Destas 14 crianças, 4 falam italiano com ambos os pais (sendo ambos os pais italianos) e 10 falam italiano com um progenitor e PE com o outro (sendo um progenitor italiano e o outro português). Como grupo de controlo, foram testadas 24 crianças entre os 5 e os 10 anos. Os resultados confirmam a CFCH: todas as crianças produziram quase exclusivamente completivas finitas e PIC. Não se confirma, de modo geral, a preferência das crianças por completivas finitas com predicados télicos e por PIC com predicados atélicos. Apenas o grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais apresentaram alguma associação dos predicados télicos com a completiva finita, existindo, porém, uma grande variação individual. O fator idade também parece ter algum papel neste quadro: o grupo de crianças bilingues mais novas é mais sensível à telicidade do predicado do que as crianças bilingues mais velhas, ou mesmo do que as crianças monolingues da mesma idade. As produções das crianças bilingues confirmam ainda a presença de influência interlinguística: esta foi mais evidente no grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais do que no grupo de crianças que falam italiano com um progenitor e PE com o outro. Estes resultados são compatíveis com uma análise da influência interlinguística como consequência de priming interlinguístico: as crianças que têm mais exposição ao italiano tiveram efeitos de priming mais evidentes do que as crianças que têm menos exposição ao italiano.expect differences in the production of children who speak Italian at home with both parents, when compared with children who, at home, speak Italian with one parent and EP with the other. In addition to this, we tested the Complete Functional Complement Hypothesis (CFCH), put forward by Santos, Gonçalves and Hyams (2016), according to which children prefer Complete Functional Complements (CFC). In the same study, the authors also observed that the group of 4-year-old children preferred to produce a that-clause with telic predicates and PIC with an atelic predicate. To assess the effects of crosslinguistic priming, the CFCH and telicity sensitivity, we carried out a test of elicited production consisting of 32 items: 16 test items and 16 distractors. Of the 16 test items, 8 contained telic predicates in the embedded sentence and 8 presented atelic predicates. 14 bilingual children between 4;11 and 10 years old were tested. Of these 14 children, 4 speak Italian with both parents (both parents being Italian) and 10 speak Italian with one parent and EP with the other (one parent being Italian and the other Portuguese). As a control group, 24 monolingual Portuguese children between 5 and 10 years old were also tested. The results confirm the CFCH: all children almost exclusively produced that-clauses and PICs. A possible preference for that-clause with telic predicates and for PIC with atelic predicates is generally not confirmed. Only the group of bilingual children who speak Italian with both parents showed some association of the telic predicate with the that-clause, although there was a large individual variation. The age factor also seemed to play some role in this picture: the younger group of bilingual children was more sensitive to the telicity of the predicate than older bilingual children, and more than monolingual children of the same age. The productions of the bilingual children confirm the presence of crosslinguistic influence: this was more evident in the group of bilingual children speaking Italian with both parents than in the group of children speaking Italian with one parent and EP with the other. These results are compatible with an analysis of crosslinguistic influence as a consequence of crosslinguistic priming: children with more exposure to Italian presented more evident priming effects than children with less exposure.Santos, Ana LúciaGonçalves, AnabelaRepositório da Universidade de LisboaAliverti-Piuri, Costanza2024-03-05T12:13:30Z2024-01-302023-10-042024-01-30T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10451/63174TID:203527470porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2024-03-11T01:20:01Zoai:repositorio.ul.pt:10451/63174Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-20T03:14:30.361283Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse
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O número reduzido da amostra deve-se ao facto de a recolha de dados ter decorrido durante a pandemia de COVID-19. Trata-se, portanto, de um estudo de caráter exploratório. O italiano e o PE são duas línguas que oferecem um grande leque de possibilidades no que diz respeito aos complementos dos verbos percetivos. Em PE, temos i) a completiva finita, ii) a completiva de infinitivo flexionado, iii) a construção de infinitivo preposicionado (PIC, do inglês Prepositional Infinitival Construction), iv) a completiva com elevação de sujeito para objeto (RtO, do inglês Raising-to-Object), e v) a completiva de fazer-Inf (FI). Em italiano, temos i) a completiva finita, ii) a pseudorrelativa, iii) a completiva de RtO e iv) a completiva de FI. As duas línguas têm, portanto, algumas completivas em comum (completiva finita, RtO e FI), e outras completivas não partilhadas (PIC e completiva de infinitivo flexionado são exclusivas do PE, a pseudorrelativa é exclusiva do italiano). Esta sobreposição parcial das estruturas aceitáveis como complementos de verbos percetivos permitiu investigar os efeitos da influência interlinguística, definida em termos de priming interlinguístico (Serratrice 2013, 2016): esperamos, portanto, que as crianças bilingues produzam mais completivas finitas (e, eventualmente, de RtO e FI), em contraste com menor produção de completivas de infinitivo flexionado e/ou PIC, por comparação com as crianças monolingues. Sendo que o efeito do priming interlinguístico será tanto mais forte quanto mais recente e frequentemente é usada a língua que determina tal efeito (no nosso caso, o italiano) (Santos e Flores, 2016), esperamos diferenças nas produções das crianças que falam italiano em casa com ambos os pais por comparação com as crianças que, em casa, falam italiano com um progenitor e PE com o outro. 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Destas 14 crianças, 4 falam italiano com ambos os pais (sendo ambos os pais italianos) e 10 falam italiano com um progenitor e PE com o outro (sendo um progenitor italiano e o outro português). Como grupo de controlo, foram testadas 24 crianças entre os 5 e os 10 anos. Os resultados confirmam a CFCH: todas as crianças produziram quase exclusivamente completivas finitas e PIC. Não se confirma, de modo geral, a preferência das crianças por completivas finitas com predicados télicos e por PIC com predicados atélicos. Apenas o grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais apresentaram alguma associação dos predicados télicos com a completiva finita, existindo, porém, uma grande variação individual. O fator idade também parece ter algum papel neste quadro: o grupo de crianças bilingues mais novas é mais sensível à telicidade do predicado do que as crianças bilingues mais velhas, ou mesmo do que as crianças monolingues da mesma idade. As produções das crianças bilingues confirmam ainda a presença de influência interlinguística: esta foi mais evidente no grupo de crianças bilingues que falam italiano com ambos os pais do que no grupo de crianças que falam italiano com um progenitor e PE com o outro. Estes resultados são compatíveis com uma análise da influência interlinguística como consequência de priming interlinguístico: as crianças que têm mais exposição ao italiano tiveram efeitos de priming mais evidentes do que as crianças que têm menos exposição ao italiano.
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