A democracia, entre participação e representação

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Rocha, Acílio da Silva Estanqueiro
Data de Publicação: 2019
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: https://hdl.handle.net/1822/62563
Resumo: Trata-se dum trabalho reflexivo sobre a genealogia conceptual de democracia, em torno dos dois grandes modelos – democracia participativa e democracia representativa; se a primeira é, nas suas origens, directa e plebiscitária (portanto participativa), na segunda o voto elege quem decide. Então, de entre os princípios da democracia representativa – uma invenção da era moderna – surge logo como fulcral a separação dos poderes (proposta por Locke e refundida por Montesquieu), permitindo a busca da igualdade na liberdade, ao passo que, segundo Rousseau, a soberania não pode ser representada; por isso, se na lógica d’O Federalista, o critério para definir a democracia é a soberania popular e a participação directa nos assuntos públicos, então, na democracia representativa, subsistirá o critério da soberania popular mas o princípio da participação transformar-se-á em representação. Já Marx critica a democracia representativa, e, com a subversão da dualidade hegeliana entre Sociedade Civil e Estado, vê este como agente dos grandes interesses privados. A questão se há ou não uma teoria da democracia na obra de Marx é também considerada por Hannah Arendt, para quem os humanos só são sujeitos enquanto são pessoas distintas e singulares: ora, o pluralismo daqui decorrente é incompatível com a ideia do proletariado como classe universal ou portadora dum interesse universalizável. Se é a Habermas que é comummente atribuída a fundamentação duma democracia deliberativa (democracia participativa, hoje), todavia foi Hannah quem lançou as bases desse ideal da “acção comunicativa” no espaço público, com vista a uma empenhada participação no processo político; se Habermas em parte o reconhece, alega que Arendt desliga a política do sistema administrativo e não dá conta da violência estrutural das sociedades modernas. Também Carole Pateman, inspirada em Rousseau e Mill, mostrara a indispensabilidade da participação no processo democrático, e Iris Young, na esteira de Hanna Pitkin, enfatiza que a qualidade da representação está ligada sempre à participação dos representados na comunidade, sendo fulcral o momento da responsabilização (accountability). Ao valorizar a incidência da sociedade civil – cuja significação, hoje, é diversa da de Hegel ou Marx – na esfera pública, Habermas releva como, na democracia deliberativa, "o consenso [...] se baseia na autoridade do melhor argumento".
id RCAP_57b8bfb8d03cf1f65f2d8b95b4ce398c
oai_identifier_str oai:repositorium.sdum.uminho.pt:1822/62563
network_acronym_str RCAP
network_name_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository_id_str 7160
spelling A democracia, entre participação e representaçãoDemocraciaDemocracyDemocracia participativaDemocracia representativaParticipatory democracyRepresentative democracyHumanidades::Filosofia, Ética e ReligiãoTrata-se dum trabalho reflexivo sobre a genealogia conceptual de democracia, em torno dos dois grandes modelos – democracia participativa e democracia representativa; se a primeira é, nas suas origens, directa e plebiscitária (portanto participativa), na segunda o voto elege quem decide. Então, de entre os princípios da democracia representativa – uma invenção da era moderna – surge logo como fulcral a separação dos poderes (proposta por Locke e refundida por Montesquieu), permitindo a busca da igualdade na liberdade, ao passo que, segundo Rousseau, a soberania não pode ser representada; por isso, se na lógica d’O Federalista, o critério para definir a democracia é a soberania popular e a participação directa nos assuntos públicos, então, na democracia representativa, subsistirá o critério da soberania popular mas o princípio da participação transformar-se-á em representação. Já Marx critica a democracia representativa, e, com a subversão da dualidade hegeliana entre Sociedade Civil e Estado, vê este como agente dos grandes interesses privados. A questão se há ou não uma teoria da democracia na obra de Marx é também considerada por Hannah Arendt, para quem os humanos só são sujeitos enquanto são pessoas distintas e singulares: ora, o pluralismo daqui decorrente é incompatível com a ideia do proletariado como classe universal ou portadora dum interesse universalizável. Se é a Habermas que é comummente atribuída a fundamentação duma democracia deliberativa (democracia participativa, hoje), todavia foi Hannah quem lançou as bases desse ideal da “acção comunicativa” no espaço público, com vista a uma empenhada participação no processo político; se Habermas em parte o reconhece, alega que Arendt desliga a política do sistema administrativo e não dá conta da violência estrutural das sociedades modernas. Também Carole Pateman, inspirada em Rousseau e Mill, mostrara a indispensabilidade da participação no processo democrático, e Iris Young, na esteira de Hanna Pitkin, enfatiza que a qualidade da representação está ligada sempre à participação dos representados na comunidade, sendo fulcral o momento da responsabilização (accountability). Ao valorizar a incidência da sociedade civil – cuja significação, hoje, é diversa da de Hegel ou Marx – na esfera pública, Habermas releva como, na democracia deliberativa, "o consenso [...] se baseia na autoridade do melhor argumento".It is a reflective essay on the conceptual genealogy of democracy, around the two major models - participatory democracy and representative democracy; the first is, in its origins, direct and plebiscitary (so participatory), the second vote elects to decide. Then, among the principles of representative democracy - the invention of the modern era - the separation of powers emerges as central (proposed by Locke and recast by Montesquieu), allowing the pursuit of equality in freedom, whereas, according to Rousseau, sovereignty cannot be represented; therefore, if in the logic of The Federalist, the criterion for defining democracy is popular sovereignty and direct participation in public affairs, then in representative democracy the criterion of popular sovereignty will remain but the principle of participation will change in representation. Already Marx criticizes representative democracy, and with the subversion of the Hegelian duality between civil society and state, sees this as a representative of the large private interests. The question of whether or not there is a theory of democracy in Marx's work is also considered by Hannah Arendt, to whom human beings are only subject as long as they are distinct and singular persons: now, the resulting pluralism is incompatible with the idea of the proletariat as universal class or carrier of a universalized interest. If it is Habermas that is commonly attributed the foundation of deliberative democracy (participatory democracy today), however, it was Hannah who laid the foundation for this ideal of “communicative action” in the public space, with a view to engaging in the political process; if Habermas partly acknowledges it, he argues that Arendt disengages the politics of the administrative system and fails to account for the structural violence of modern societies. Also Carole Pateman, inspired by Rousseau and Mill, had shown the indispensability of participation in the democratic process, and Iris Young, in the wake of Hanna Pitkin, emphasizes that the quality of representation is always linked to the participation of those represented in the community, the moment of accountability being central. By valuing the incidence of civil society - whose significance today is different from that of Hegel or Marx - in the public sphere, Habermas falls as in deliberative democracy, "the consensus [...] is based on the authority of the better argument".Universidade Católica EditoraUniversidade do MinhoRocha, Acílio da Silva Estanqueiro2019-092019-09-01T00:00:00Zbook partinfo:eu-repo/semantics/publishedVersionapplication/pdfhttps://hdl.handle.net/1822/62563por"A Democracia, entre Participação e Representação", in António Martins Costa e Ernesto Castro Leal (coord.), Democracia, Nação, Federação, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2019, pp. 11-49.9789725406502info:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2024-05-11T06:28:30Zoai:repositorium.sdum.uminho.pt:1822/62563Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openairemluisa.alvim@gmail.comopendoar:71602024-05-11T06:28:30Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse
dc.title.none.fl_str_mv A democracia, entre participação e representação
title A democracia, entre participação e representação
spellingShingle A democracia, entre participação e representação
Rocha, Acílio da Silva Estanqueiro
Democracia
Democracy
Democracia participativa
Democracia representativa
Participatory democracy
Representative democracy
Humanidades::Filosofia, Ética e Religião
title_short A democracia, entre participação e representação
title_full A democracia, entre participação e representação
title_fullStr A democracia, entre participação e representação
title_full_unstemmed A democracia, entre participação e representação
title_sort A democracia, entre participação e representação
author Rocha, Acílio da Silva Estanqueiro
author_facet Rocha, Acílio da Silva Estanqueiro
author_role author
dc.contributor.none.fl_str_mv Universidade do Minho
dc.contributor.author.fl_str_mv Rocha, Acílio da Silva Estanqueiro
dc.subject.por.fl_str_mv Democracia
Democracy
Democracia participativa
Democracia representativa
Participatory democracy
Representative democracy
Humanidades::Filosofia, Ética e Religião
topic Democracia
Democracy
Democracia participativa
Democracia representativa
Participatory democracy
Representative democracy
Humanidades::Filosofia, Ética e Religião
description Trata-se dum trabalho reflexivo sobre a genealogia conceptual de democracia, em torno dos dois grandes modelos – democracia participativa e democracia representativa; se a primeira é, nas suas origens, directa e plebiscitária (portanto participativa), na segunda o voto elege quem decide. Então, de entre os princípios da democracia representativa – uma invenção da era moderna – surge logo como fulcral a separação dos poderes (proposta por Locke e refundida por Montesquieu), permitindo a busca da igualdade na liberdade, ao passo que, segundo Rousseau, a soberania não pode ser representada; por isso, se na lógica d’O Federalista, o critério para definir a democracia é a soberania popular e a participação directa nos assuntos públicos, então, na democracia representativa, subsistirá o critério da soberania popular mas o princípio da participação transformar-se-á em representação. Já Marx critica a democracia representativa, e, com a subversão da dualidade hegeliana entre Sociedade Civil e Estado, vê este como agente dos grandes interesses privados. A questão se há ou não uma teoria da democracia na obra de Marx é também considerada por Hannah Arendt, para quem os humanos só são sujeitos enquanto são pessoas distintas e singulares: ora, o pluralismo daqui decorrente é incompatível com a ideia do proletariado como classe universal ou portadora dum interesse universalizável. Se é a Habermas que é comummente atribuída a fundamentação duma democracia deliberativa (democracia participativa, hoje), todavia foi Hannah quem lançou as bases desse ideal da “acção comunicativa” no espaço público, com vista a uma empenhada participação no processo político; se Habermas em parte o reconhece, alega que Arendt desliga a política do sistema administrativo e não dá conta da violência estrutural das sociedades modernas. Também Carole Pateman, inspirada em Rousseau e Mill, mostrara a indispensabilidade da participação no processo democrático, e Iris Young, na esteira de Hanna Pitkin, enfatiza que a qualidade da representação está ligada sempre à participação dos representados na comunidade, sendo fulcral o momento da responsabilização (accountability). Ao valorizar a incidência da sociedade civil – cuja significação, hoje, é diversa da de Hegel ou Marx – na esfera pública, Habermas releva como, na democracia deliberativa, "o consenso [...] se baseia na autoridade do melhor argumento".
publishDate 2019
dc.date.none.fl_str_mv 2019-09
2019-09-01T00:00:00Z
dc.type.driver.fl_str_mv book part
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv https://hdl.handle.net/1822/62563
url https://hdl.handle.net/1822/62563
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.relation.none.fl_str_mv "A Democracia, entre Participação e Representação", in António Martins Costa e Ernesto Castro Leal (coord.), Democracia, Nação, Federação, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2019, pp. 11-49.
9789725406502
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.format.none.fl_str_mv application/pdf
dc.publisher.none.fl_str_mv Universidade Católica Editora
publisher.none.fl_str_mv Universidade Católica Editora
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron:RCAAP
instname_str Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
instacron_str RCAAP
institution RCAAP
reponame_str Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
collection Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
repository.name.fl_str_mv Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informação
repository.mail.fl_str_mv mluisa.alvim@gmail.com
_version_ 1817544984774049792