O papel da segunda pele

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Castro, Vera
Data de Publicação: 2010
Tipo de documento: Livro
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10400.21/7628
Resumo: No princípio deste trabalho estava a ideia de abordar o figurino como matéria sobre a qual pouco se escreve. Existem livros focados em criadores ou em percursos de grupos de teatro, mas o figurino, em si, parece não ter suscitado, até agora, interesse para ser eleito como matéria a tratar. Pensei, inicialmente, em falar sobre o que a prática me tinha ensinado ao longo dos anos, ao criar figurinos para teatro, dança e ópera, artes do palco que me fizeram conviver com inúmeras pessoas e criadores diversificados. Entendi, no entanto, que poderia ser mais interessante e enriquecedor sair do meu pequeno universo e registar os depoimentos de alguns profissionais que lhe estão ligados, no presente momento, em Portugal, sem pretender fazer uma investigação teórica e exaustiva sobre o assunto. Iniciei, então, uma abordagem à prática de sete figurinistas, através de entrevistas. Porém, achei que não bastava. Queria também o testemunho de quem, de uma maneira ou de outra, com eles se relacionavam. Por isso, fez todo o sentido ouvir a palavra dos que dirigem os espectáculos (encenadores e coreógrafos); dos intérpretes que vestem os figurinos (actores e bailarinos); de quem os executa (mestra de guarda-roupa) e de quem cuida deles (zeladora de guarda-roupa), assim como ouvir aqueles que estão do outro lado do palco: programador de teatro, críticos (teatro e dança) e director do Museu de Teatro, último reduto onde alguns figurinos poderão continuar a existir. Se alguns nomes ficaram de fora, outros aparecem referenciados pelos próprios entrevistados. Quis dar a conhecer semelhanças ou contrastes na maneira de trabalhar e pensar de alguns profissionais e de certos aspectos dos seus percursos, cingindo-me àqueles que, no momento em que iniciei as entrevistas, estavam no activo da sua profissão. Então formulei um conjunto de questões que me pareciam importantes e decidi, dentro do possível, manter esse padrão para, mais facilmente, se poder chegar a algumas conclusões. O facto de manter esse padrão de perguntas levou-me a constatar, por exemplo, que aquilo que certos criadores perseguem é o que, justamente, outros rejeitam; que certos intérpretes gostam e sabem potenciar ao máximo as possibilidades de um figurino; que é transversal, a várias áreas, o sentimento de enorme desgosto pela maneira desleixada e pouco profissional a que alguns intérpretes sujeitam o figurino; que ver certos fatos num guarda-roupa pode convocar os fantasmas desses corpos ausentes que já os habitaram e lhes deram alma; e ainda que, afinal, a maior parte dos figurinistas vieram parar à profissão por mero acaso. Hoje em dia, já podemos ver, também, um trabalho continuado numa nova geração que pôde fazer a sua formação específica em escolas para tal direccionadas. Contudo, há espectáculos em que é convidado um artista plástico ou um estilista para fazer os figurinos; outros há em que é o próprio colectivo que assume a concepção do guarda-roupa. É com enorme gosto que dou a partilhar o modo de pensar, o saber, as pequenas estórias de uma história maior, de percursos exemplares de paixão, dedicação e partilha, num trabalho colectivo que é necessário à construção de um espectáculo. Evidentemente, muitos criadores que aqui falam são também, simultaneamente, criadores noutras áreas, embora, neste caso, se tenham cingido à vertente que mais nos interessa. É com enorme carinho que também dou a conhecer profissionais com uma visibilidade menor, mas cuja excelência do seu trabalho é primordial para a qualidade do resultado final. Este é um pequeno retrato de família, de parentes que, muitas vezes, pouco sabem uns dos outros e que só se vêem de longe a longe. Não deixou de ser curioso verificar, ao fazer as entrevistas de viva voz, para que os testemunhos fossem mais espontâneos, como num universo tão pequeno podemos estar tão isolados, desconhecendo que, às vezes, partilhamos os mesmos sentimentos; sentimentos esses que nem sempre ficaram aqui registados – foram desabafos em voz off. Por vezes, o pudor de confessar que se vai pouco ao teatro; outras vezes, o anseio de uma maior dignificação da profissão; às vezes, o receio de que a palavra possa trair o pensamento; e, ainda, pelo meio, pequenas descobertas do tipo: – Ah! Tem graça, ainda não tinha pensado nisso... Espero que hoje, como no futuro, este registo possa suscitar, em quem se dispuser a lê-lo, se não uma reflexão sobre a situação do figurino em Portugal, no princípio do século XXI, pelo menos, a curiosidade por saber como se pro cessa a passagem de uma personagem do papel para o palco, enfim, o percurso de um figurino até que a cortina se abra para o espectador. Coisa bonita é saber que muitos segredos e mistérios se revelam a quem é dado ver, mas muitos se mantêm a quem é dado fazer.
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Porém, achei que não bastava. Queria também o testemunho de quem, de uma maneira ou de outra, com eles se relacionavam. Por isso, fez todo o sentido ouvir a palavra dos que dirigem os espectáculos (encenadores e coreógrafos); dos intérpretes que vestem os figurinos (actores e bailarinos); de quem os executa (mestra de guarda-roupa) e de quem cuida deles (zeladora de guarda-roupa), assim como ouvir aqueles que estão do outro lado do palco: programador de teatro, críticos (teatro e dança) e director do Museu de Teatro, último reduto onde alguns figurinos poderão continuar a existir. Se alguns nomes ficaram de fora, outros aparecem referenciados pelos próprios entrevistados. Quis dar a conhecer semelhanças ou contrastes na maneira de trabalhar e pensar de alguns profissionais e de certos aspectos dos seus percursos, cingindo-me àqueles que, no momento em que iniciei as entrevistas, estavam no activo da sua profissão. Então formulei um conjunto de questões que me pareciam importantes e decidi, dentro do possível, manter esse padrão para, mais facilmente, se poder chegar a algumas conclusões. O facto de manter esse padrão de perguntas levou-me a constatar, por exemplo, que aquilo que certos criadores perseguem é o que, justamente, outros rejeitam; que certos intérpretes gostam e sabem potenciar ao máximo as possibilidades de um figurino; que é transversal, a várias áreas, o sentimento de enorme desgosto pela maneira desleixada e pouco profissional a que alguns intérpretes sujeitam o figurino; que ver certos fatos num guarda-roupa pode convocar os fantasmas desses corpos ausentes que já os habitaram e lhes deram alma; e ainda que, afinal, a maior parte dos figurinistas vieram parar à profissão por mero acaso. Hoje em dia, já podemos ver, também, um trabalho continuado numa nova geração que pôde fazer a sua formação específica em escolas para tal direccionadas. Contudo, há espectáculos em que é convidado um artista plástico ou um estilista para fazer os figurinos; outros há em que é o próprio colectivo que assume a concepção do guarda-roupa. É com enorme gosto que dou a partilhar o modo de pensar, o saber, as pequenas estórias de uma história maior, de percursos exemplares de paixão, dedicação e partilha, num trabalho colectivo que é necessário à construção de um espectáculo. Evidentemente, muitos criadores que aqui falam são também, simultaneamente, criadores noutras áreas, embora, neste caso, se tenham cingido à vertente que mais nos interessa. É com enorme carinho que também dou a conhecer profissionais com uma visibilidade menor, mas cuja excelência do seu trabalho é primordial para a qualidade do resultado final. Este é um pequeno retrato de família, de parentes que, muitas vezes, pouco sabem uns dos outros e que só se vêem de longe a longe. Não deixou de ser curioso verificar, ao fazer as entrevistas de viva voz, para que os testemunhos fossem mais espontâneos, como num universo tão pequeno podemos estar tão isolados, desconhecendo que, às vezes, partilhamos os mesmos sentimentos; sentimentos esses que nem sempre ficaram aqui registados – foram desabafos em voz off. Por vezes, o pudor de confessar que se vai pouco ao teatro; outras vezes, o anseio de uma maior dignificação da profissão; às vezes, o receio de que a palavra possa trair o pensamento; e, ainda, pelo meio, pequenas descobertas do tipo: – Ah! Tem graça, ainda não tinha pensado nisso... Espero que hoje, como no futuro, este registo possa suscitar, em quem se dispuser a lê-lo, se não uma reflexão sobre a situação do figurino em Portugal, no princípio do século XXI, pelo menos, a curiosidade por saber como se pro cessa a passagem de uma personagem do papel para o palco, enfim, o percurso de um figurino até que a cortina se abra para o espectador. 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