Programa de Hidrogeografia
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2005 |
Tipo de documento: | Livro |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) |
Texto Completo: | http://hdl.handle.net/10451/62510 |
Resumo: | A Hidrogeografia tem sido, tal como lhe chamou Mateu Bellés (1989), o "ramo desprezado" da Geografia Física, nas escolas de Geografia da Europa Mediterrânea. Numa região do Globo em que a irregularidade temporal (intra e interanual) da quantidade de água disponível é um factor condicionante da manutenção dos padrões de produtividade agrícola, energética e industrial e do próprio desenvolvimento, a Hidráulica foi privilegiada no contexto da Hidrologia. A necessidade de construção de estruturas hidráulicas capazes de reter a água nas épocas de abundância para as de escassez ou que permitissem o desvio do escoamento fluvial durante as cheias, a fim de minorar as respectivas consequências, facilitou a "apropriação" da Engenharia dos estudos hidrológicos, sendo acompanhada (em menor grau) pela Geologia (hidrogeologia), já que o abastecimento através das águas subterrâneas é essencial em áreas onde os recursos hídricos superficiais se revelam insuficientes para as actividades humanas. As outras ciências foram assim relegadas para uma posição secundária e a Geografia não foi excepção. Contudo, este panorama viria a sofrer uma profunda modificação a partir de meados dos anos 80, com a generalização e agravamento das questões ambientais, de entre as quais se destacam a degradação e escassez crescentes dos recursos hídricos. A multiplicidade de problemas que afectam a água e a sua transversalidade relativamente aos vários subsistemas que constituem o Sistema Ambiental Terrestre (atmosfera, litosfera, hidrosfera, biosfera e noosfera) contribuíram para a diversificação dos estudos com ela relacionados e para o desenvolvimento de ciências e de ramos científicos, com fortes ligações à Hidrologia. O aprofundamento da visão sistémica e holística foi eliminando a resolução pontual e parcelar das questões relativas à água, estando esta a ser progressivamente substituída por modelos integrados de gestão dos recursos hídricos, que necessitam de estudos multi e inter - disciplinares no âmbito, não só das Ciências da Terra e da Vida, mas também das Ciências Sociais e Humanas. A Hidrogeografia beneficiou desta nova realidade “renascendo das cinzas” nas escolas mediterrâneas de Geografia, mas sobretudo nas escolas anglo-saxónicas, onde atingiu um extraordinário desenvolvimento, através da aposta na modelização por parte dos geógrafos físicos. É por impulso destes geógrafos, nomeadamente do Reino Unido e da América do Norte, que é criado em 1998, no seio da União Geográfica Internacional, o Study Group on Environmental Change and Extreme Hydrological Events, cuja 1ª reunião se efectuou em Lisboa, aquando da Conferência Regional da U.G.I.. O Grupo mudou, posteriormente, a sua designação para Study Group on Water Sustainability, na reunião de Seoul (2000), acompanhando as tendências prioritárias dos estudos hidrológicos: dos fenómenos extremos (especialmente as cheias), nos finais do século XX, para a sustentabilidade dos recursos hídricos, no século XXI. O dinamismo do Grupo foi reconhecido na reunião de 2004, efectuada em Durban, quando subiu na hierarquia da UGI para Commission for Water Sustainability. A Geografia Humana também não ficou insensível à crescente preocupação e debate sobre a utilização sustentável dos recursos hídricos e a um dos principais problemas que a Humanidade terá que defrontar no século XXI: a “crise” generalizada da água no Planeta. As enormes dissimetrias regionais do acesso à água, os custos da utilização sustentada deste recurso tanto em qualidade como em quantidade, a diferente capacidade económica das populações para os suportar e as tensões políticas e sociais que daí poderão advir, levaram ao desenvolvimento daquilo a que J. Bethemont designou como Hidrogeopolítica (hidropolítica para outros autores) e que para R. Maury (1992) constitui um novo capítulo da Geografia Política e Económica. Na Escola de Geografia de Lisboa, os estudos hidrológicos foram sendo ministrados, de forma parcelar, nas disciplinas de base de Geografia Física (nomeadamente na Prática de Geografia Física, mais tarde designada por Geografia Física II), ou ocasional, em algumas opções designadas por Hidrologia, a ciência base dos estudos hidrológicos. Assim, no pós-25 de Abril, foram leccionados por Suzanne Daveau, a opção “Hidrologia: os Rios Portugueses”, no ano lectivo de 1976-77, e o Seminário (também optativo) “A Água e o Homem em Portugal”, no ano lectivo de 1979-80. Nos 10 anos lectivos seguintes (durante toda a década de 80) não houve qualquer cadeira, ministrada nas licenciaturas em Geografia, no domínio dos estudos hidrológicos. Este vazio foi interrompido, no ano lectivo de 1990-91, por Suzanne Daveau ao reiniciar o ensino autónomo (optativo) das disciplinas de Hidrologia. Na década de 90, as opções em Hidrologia (com as designações de “Elementos de Hidrologia”, “Hidrologia” e “Hidrologia Fluvial”), foram-se sucedendo apenas não funcionando em 1995-96 e 1997-98. Este facto deveu-se não só ao empenhamento de Suzanne Daveau, mas também ao interesse crescente de alguns assistentes de Geografia Física (Catarina Ramos, Maria José Machado e Eusébio Reis) pelo estudo dos fenómenos hidrológicos e pelas questões relativas à água. A Escola de Geografia de Lisboa seguia, deste modo, as tendências evolutivas, referidas acima, de outras escolas europeias no domínio dos estudos hidrológicos. Concomitantemente, o aparecimento do Tema Água nos elencos curriculares dos ensinos básico e secundário e a preparação deficiente dos professores de Geografia neste tema (como eles próprios várias vezes nos transmitiram), bem como o reconhecimento em Portugal, a nível oficial, da Bacia Hidrográfica como a unidade física base do planeamento e gestão dos recursos hídricos e, ainda, a consciencialização de que uma grande parte dos problemas que afectam a água se deve ao desordenamento do território, fortaleceram a convicção de que era necessário dar aos futuros geógrafos uma preparação básica neste domínio, de uma forma sistemática e não ocasional. Perante esta conjuntura, quando, entre 1996 e 1998, se discutiu a revisão do elenco curricular das disciplinas de Geografia Física, que deveriam integrar o chamado “tronco comum” da licenciatura em Geografia, pareceu aos docentes de Geografia Física que o “4º ramo” da Geografia Física - a Hidrogeografia - tinha condições para ser ministrada autonomamente, a par dos outros três ramos - Geomorfologia, Climatologia e Biogeografia - de tradições mais fortes entre os geógrafos. O Programa de Hidrogeografia, que a seguir se apresenta, resulta da experiência de ensino desta disciplina, a nível teórico e prático, a partir do ano lectivo de 1999-2000 e dos ajustamentos daí decorrentes. Estes ajustamentos foram efectuados com base na análise crítica dos docentes que leccionaram a disciplina, bem como da avaliação feita pelos alunos no final do 1º ano do seu funcionamento. O Processo de Bolonha conduziu, durante o ano de 2005, à proposta de uma nova licenciatura em Geografia, com a duração de 3 anos lectivos, na qual a Hidrogeografia continua a ser ministrada obrigatoriamente, integrando a unidade curricular “Hidrossistemas e Ecossistemas”, com uma valência de 10 ECTS (5 ECTS para os Hidrossistemas). Essa proposta foi aprovada pela Comissão Científica do Departamento de Geografia da F.L.U.L., mas à data de elaboração deste relatório (Dezembro de 2005) ainda não subiu ao Senado da Universidade. Aos colegas que comigo leccionam ou leccionaram a disciplina de Hidrogeografia - Eusébio Reis e Henrique Andrade - quero expressar o meu agradecimento, não só pelas sugestões e melhorias introduzidas no ensino das aulas práticas, mas também pelo empenho e dedicação na sua leccionação. |
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A multiplicidade de problemas que afectam a água e a sua transversalidade relativamente aos vários subsistemas que constituem o Sistema Ambiental Terrestre (atmosfera, litosfera, hidrosfera, biosfera e noosfera) contribuíram para a diversificação dos estudos com ela relacionados e para o desenvolvimento de ciências e de ramos científicos, com fortes ligações à Hidrologia. O aprofundamento da visão sistémica e holística foi eliminando a resolução pontual e parcelar das questões relativas à água, estando esta a ser progressivamente substituída por modelos integrados de gestão dos recursos hídricos, que necessitam de estudos multi e inter - disciplinares no âmbito, não só das Ciências da Terra e da Vida, mas também das Ciências Sociais e Humanas. A Hidrogeografia beneficiou desta nova realidade “renascendo das cinzas” nas escolas mediterrâneas de Geografia, mas sobretudo nas escolas anglo-saxónicas, onde atingiu um extraordinário desenvolvimento, através da aposta na modelização por parte dos geógrafos físicos. É por impulso destes geógrafos, nomeadamente do Reino Unido e da América do Norte, que é criado em 1998, no seio da União Geográfica Internacional, o Study Group on Environmental Change and Extreme Hydrological Events, cuja 1ª reunião se efectuou em Lisboa, aquando da Conferência Regional da U.G.I.. O Grupo mudou, posteriormente, a sua designação para Study Group on Water Sustainability, na reunião de Seoul (2000), acompanhando as tendências prioritárias dos estudos hidrológicos: dos fenómenos extremos (especialmente as cheias), nos finais do século XX, para a sustentabilidade dos recursos hídricos, no século XXI. O dinamismo do Grupo foi reconhecido na reunião de 2004, efectuada em Durban, quando subiu na hierarquia da UGI para Commission for Water Sustainability. A Geografia Humana também não ficou insensível à crescente preocupação e debate sobre a utilização sustentável dos recursos hídricos e a um dos principais problemas que a Humanidade terá que defrontar no século XXI: a “crise” generalizada da água no Planeta. As enormes dissimetrias regionais do acesso à água, os custos da utilização sustentada deste recurso tanto em qualidade como em quantidade, a diferente capacidade económica das populações para os suportar e as tensões políticas e sociais que daí poderão advir, levaram ao desenvolvimento daquilo a que J. Bethemont designou como Hidrogeopolítica (hidropolítica para outros autores) e que para R. Maury (1992) constitui um novo capítulo da Geografia Política e Económica. Na Escola de Geografia de Lisboa, os estudos hidrológicos foram sendo ministrados, de forma parcelar, nas disciplinas de base de Geografia Física (nomeadamente na Prática de Geografia Física, mais tarde designada por Geografia Física II), ou ocasional, em algumas opções designadas por Hidrologia, a ciência base dos estudos hidrológicos. Assim, no pós-25 de Abril, foram leccionados por Suzanne Daveau, a opção “Hidrologia: os Rios Portugueses”, no ano lectivo de 1976-77, e o Seminário (também optativo) “A Água e o Homem em Portugal”, no ano lectivo de 1979-80. Nos 10 anos lectivos seguintes (durante toda a década de 80) não houve qualquer cadeira, ministrada nas licenciaturas em Geografia, no domínio dos estudos hidrológicos. Este vazio foi interrompido, no ano lectivo de 1990-91, por Suzanne Daveau ao reiniciar o ensino autónomo (optativo) das disciplinas de Hidrologia. Na década de 90, as opções em Hidrologia (com as designações de “Elementos de Hidrologia”, “Hidrologia” e “Hidrologia Fluvial”), foram-se sucedendo apenas não funcionando em 1995-96 e 1997-98. Este facto deveu-se não só ao empenhamento de Suzanne Daveau, mas também ao interesse crescente de alguns assistentes de Geografia Física (Catarina Ramos, Maria José Machado e Eusébio Reis) pelo estudo dos fenómenos hidrológicos e pelas questões relativas à água. A Escola de Geografia de Lisboa seguia, deste modo, as tendências evolutivas, referidas acima, de outras escolas europeias no domínio dos estudos hidrológicos. Concomitantemente, o aparecimento do Tema Água nos elencos curriculares dos ensinos básico e secundário e a preparação deficiente dos professores de Geografia neste tema (como eles próprios várias vezes nos transmitiram), bem como o reconhecimento em Portugal, a nível oficial, da Bacia Hidrográfica como a unidade física base do planeamento e gestão dos recursos hídricos e, ainda, a consciencialização de que uma grande parte dos problemas que afectam a água se deve ao desordenamento do território, fortaleceram a convicção de que era necessário dar aos futuros geógrafos uma preparação básica neste domínio, de uma forma sistemática e não ocasional. Perante esta conjuntura, quando, entre 1996 e 1998, se discutiu a revisão do elenco curricular das disciplinas de Geografia Física, que deveriam integrar o chamado “tronco comum” da licenciatura em Geografia, pareceu aos docentes de Geografia Física que o “4º ramo” da Geografia Física - a Hidrogeografia - tinha condições para ser ministrada autonomamente, a par dos outros três ramos - Geomorfologia, Climatologia e Biogeografia - de tradições mais fortes entre os geógrafos. O Programa de Hidrogeografia, que a seguir se apresenta, resulta da experiência de ensino desta disciplina, a nível teórico e prático, a partir do ano lectivo de 1999-2000 e dos ajustamentos daí decorrentes. Estes ajustamentos foram efectuados com base na análise crítica dos docentes que leccionaram a disciplina, bem como da avaliação feita pelos alunos no final do 1º ano do seu funcionamento. O Processo de Bolonha conduziu, durante o ano de 2005, à proposta de uma nova licenciatura em Geografia, com a duração de 3 anos lectivos, na qual a Hidrogeografia continua a ser ministrada obrigatoriamente, integrando a unidade curricular “Hidrossistemas e Ecossistemas”, com uma valência de 10 ECTS (5 ECTS para os Hidrossistemas). Essa proposta foi aprovada pela Comissão Científica do Departamento de Geografia da F.L.U.L., mas à data de elaboração deste relatório (Dezembro de 2005) ainda não subiu ao Senado da Universidade. Aos colegas que comigo leccionam ou leccionaram a disciplina de Hidrogeografia - Eusébio Reis e Henrique Andrade - quero expressar o meu agradecimento, não só pelas sugestões e melhorias introduzidas no ensino das aulas práticas, mas também pelo empenho e dedicação na sua leccionação.Centro de Estudos Geográficos, Universidade de LisboaRepositório da Universidade de LisboaRamos, Catarina2024-02-08T12:34:51Z20052005-01-01T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/bookapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10451/62510por972-636-159-1info:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2024-02-12T01:18:52Zoai:repositorio.ul.pt:10451/62510Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-20T02:37:49.087346Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse |
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As outras ciências foram assim relegadas para uma posição secundária e a Geografia não foi excepção. Contudo, este panorama viria a sofrer uma profunda modificação a partir de meados dos anos 80, com a generalização e agravamento das questões ambientais, de entre as quais se destacam a degradação e escassez crescentes dos recursos hídricos. A multiplicidade de problemas que afectam a água e a sua transversalidade relativamente aos vários subsistemas que constituem o Sistema Ambiental Terrestre (atmosfera, litosfera, hidrosfera, biosfera e noosfera) contribuíram para a diversificação dos estudos com ela relacionados e para o desenvolvimento de ciências e de ramos científicos, com fortes ligações à Hidrologia. O aprofundamento da visão sistémica e holística foi eliminando a resolução pontual e parcelar das questões relativas à água, estando esta a ser progressivamente substituída por modelos integrados de gestão dos recursos hídricos, que necessitam de estudos multi e inter - disciplinares no âmbito, não só das Ciências da Terra e da Vida, mas também das Ciências Sociais e Humanas. A Hidrogeografia beneficiou desta nova realidade “renascendo das cinzas” nas escolas mediterrâneas de Geografia, mas sobretudo nas escolas anglo-saxónicas, onde atingiu um extraordinário desenvolvimento, através da aposta na modelização por parte dos geógrafos físicos. É por impulso destes geógrafos, nomeadamente do Reino Unido e da América do Norte, que é criado em 1998, no seio da União Geográfica Internacional, o Study Group on Environmental Change and Extreme Hydrological Events, cuja 1ª reunião se efectuou em Lisboa, aquando da Conferência Regional da U.G.I.. O Grupo mudou, posteriormente, a sua designação para Study Group on Water Sustainability, na reunião de Seoul (2000), acompanhando as tendências prioritárias dos estudos hidrológicos: dos fenómenos extremos (especialmente as cheias), nos finais do século XX, para a sustentabilidade dos recursos hídricos, no século XXI. O dinamismo do Grupo foi reconhecido na reunião de 2004, efectuada em Durban, quando subiu na hierarquia da UGI para Commission for Water Sustainability. A Geografia Humana também não ficou insensível à crescente preocupação e debate sobre a utilização sustentável dos recursos hídricos e a um dos principais problemas que a Humanidade terá que defrontar no século XXI: a “crise” generalizada da água no Planeta. As enormes dissimetrias regionais do acesso à água, os custos da utilização sustentada deste recurso tanto em qualidade como em quantidade, a diferente capacidade económica das populações para os suportar e as tensões políticas e sociais que daí poderão advir, levaram ao desenvolvimento daquilo a que J. Bethemont designou como Hidrogeopolítica (hidropolítica para outros autores) e que para R. Maury (1992) constitui um novo capítulo da Geografia Política e Económica. Na Escola de Geografia de Lisboa, os estudos hidrológicos foram sendo ministrados, de forma parcelar, nas disciplinas de base de Geografia Física (nomeadamente na Prática de Geografia Física, mais tarde designada por Geografia Física II), ou ocasional, em algumas opções designadas por Hidrologia, a ciência base dos estudos hidrológicos. Assim, no pós-25 de Abril, foram leccionados por Suzanne Daveau, a opção “Hidrologia: os Rios Portugueses”, no ano lectivo de 1976-77, e o Seminário (também optativo) “A Água e o Homem em Portugal”, no ano lectivo de 1979-80. Nos 10 anos lectivos seguintes (durante toda a década de 80) não houve qualquer cadeira, ministrada nas licenciaturas em Geografia, no domínio dos estudos hidrológicos. Este vazio foi interrompido, no ano lectivo de 1990-91, por Suzanne Daveau ao reiniciar o ensino autónomo (optativo) das disciplinas de Hidrologia. Na década de 90, as opções em Hidrologia (com as designações de “Elementos de Hidrologia”, “Hidrologia” e “Hidrologia Fluvial”), foram-se sucedendo apenas não funcionando em 1995-96 e 1997-98. Este facto deveu-se não só ao empenhamento de Suzanne Daveau, mas também ao interesse crescente de alguns assistentes de Geografia Física (Catarina Ramos, Maria José Machado e Eusébio Reis) pelo estudo dos fenómenos hidrológicos e pelas questões relativas à água. A Escola de Geografia de Lisboa seguia, deste modo, as tendências evolutivas, referidas acima, de outras escolas europeias no domínio dos estudos hidrológicos. Concomitantemente, o aparecimento do Tema Água nos elencos curriculares dos ensinos básico e secundário e a preparação deficiente dos professores de Geografia neste tema (como eles próprios várias vezes nos transmitiram), bem como o reconhecimento em Portugal, a nível oficial, da Bacia Hidrográfica como a unidade física base do planeamento e gestão dos recursos hídricos e, ainda, a consciencialização de que uma grande parte dos problemas que afectam a água se deve ao desordenamento do território, fortaleceram a convicção de que era necessário dar aos futuros geógrafos uma preparação básica neste domínio, de uma forma sistemática e não ocasional. Perante esta conjuntura, quando, entre 1996 e 1998, se discutiu a revisão do elenco curricular das disciplinas de Geografia Física, que deveriam integrar o chamado “tronco comum” da licenciatura em Geografia, pareceu aos docentes de Geografia Física que o “4º ramo” da Geografia Física - a Hidrogeografia - tinha condições para ser ministrada autonomamente, a par dos outros três ramos - Geomorfologia, Climatologia e Biogeografia - de tradições mais fortes entre os geógrafos. O Programa de Hidrogeografia, que a seguir se apresenta, resulta da experiência de ensino desta disciplina, a nível teórico e prático, a partir do ano lectivo de 1999-2000 e dos ajustamentos daí decorrentes. Estes ajustamentos foram efectuados com base na análise crítica dos docentes que leccionaram a disciplina, bem como da avaliação feita pelos alunos no final do 1º ano do seu funcionamento. O Processo de Bolonha conduziu, durante o ano de 2005, à proposta de uma nova licenciatura em Geografia, com a duração de 3 anos lectivos, na qual a Hidrogeografia continua a ser ministrada obrigatoriamente, integrando a unidade curricular “Hidrossistemas e Ecossistemas”, com uma valência de 10 ECTS (5 ECTS para os Hidrossistemas). Essa proposta foi aprovada pela Comissão Científica do Departamento de Geografia da F.L.U.L., mas à data de elaboração deste relatório (Dezembro de 2005) ainda não subiu ao Senado da Universidade. Aos colegas que comigo leccionam ou leccionaram a disciplina de Hidrogeografia - Eusébio Reis e Henrique Andrade - quero expressar o meu agradecimento, não só pelas sugestões e melhorias introduzidas no ensino das aulas práticas, mas também pelo empenho e dedicação na sua leccionação. |
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