O monstro cruel devorou centenas”: medo em tempo de epidemia do Cólera no Crato (1862)

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Alexandre, Jucieldo Ferreira
Data de Publicação: 2012
Tipo de documento: Artigo de conferência
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Institucional da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Texto Completo: http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/43031
Resumo: No dia 08 de fevereiro de 1862, uma notícia publicada no jornal O Araripe, impresso em Crato, na província do Ceará, apresentava um cenário de tensão e medo: Há dias tem estado agitada esta cidade: morrem mais porcos, que cristãos novos nas ruas de Lisboa: Dá-se um verdadeiro S. Bartolomeu da raça suína. [...]. Que dias aziagos para estas inocentes criaturas! Sacrificados à raiva do conquistador, a desolação os fere, quando ele inda agora começa sua guerra cruenta pelo litoral. É que um raio de sua vista tem mil léguas, e sua voz fere as camadas do ar de um pólo a outro pólo: Morra o porco, ou morrerá o homem, que se aproximar a sua lama, respirar o seu hálito imundo!... (O Araripe, 08.02.1862, p. 3, grifos meus). Segundo a citação, o Crato estava vivendo dias agitados, devido a uma matança generalizada de porcos, provavelmente sob orientação das autoridades locais. No texto, tal matança foi comparada, em tom nitidamente exagerado, à perseguição aos judeus pela Inquisição e ao massacre dos huguenotes, na França (século XVI), o que buscava realçar a afirmação feita sobre o tumulto vivenciado na localidade. O motivo deste São Bartolomeu da raça suína tinha haver com a crença de que tais animais podiam favorecer a infecção da cidade pelo cólera, que surgira cruento no litoral e que ameaçava atravessar mil léguas, como um raio. A matança de animais em época de epidemia não foi um fato isolado. Jean Delumeau identificou tal prática nos surtos medievais da peste negra. Ante a violência da moléstia e as inquietações sobre suas causas, porcos, cães, gatos e pombos foram mortos em massa na Europa (1989, p. 121). Como os suínos são comumente representados como seres imundos, é possível que a morte dos animais citada pelo documento fosse reflexo do medo sobre os eventuais efeitos miasmáticos das varas sobre a atmosfera, daí o motivo da declaração de que “morrerá o homem, que se aproximar à sua lama, respirar o seu hálito imundo!” [...]
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