Você tem sede de quê? O programa de cisternas na promoção da segurança alimentar no semiárido brasileiro
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Data de Publicação: | 2022 |
Tipo de documento: | Tese |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Repositório Institucional da UFRN |
Texto Completo: | https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/49927 |
Resumo: | A seca que permeia o Semiárido nordestino, embora apresente um caráter natural, desencadeia vários problemas de ordem social, econômica e política, expressos, principalmente, pela fome, migrações, propagações de doenças e até mortes. Por décadas, o discurso de combate à seca tem fundamentado o delineamento das políticas públicas, entretanto, os seus resultados não foram suficientes para a resolução do problema. No final da década de 1990, com o fortalecimento do discurso sobre a convivência com o Semiárido, a problemática da água passou a ser vista sob um novo viés, pois se observou que a causa principal não era a escassez, mas as formas de distribuição, armazenamento e governança desse recurso. Dentro desse contexto, a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) desenvolveu o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Um Milhão de Cisternas Rurais, instigando a adoção da cultura do estoque da água, inicialmente, para o consumo humano, através do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) e, posteriormente, para a produção de alimentos, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2). Dessa forma, a pergunta que direcionou o estudo em questão foi estruturada da seguinte maneira: como os programas de cisternas têm logrado democratizar o acesso à água, garantir segurança alimentar e ser um instrumento pedagógico de ampliação da autonomia dos beneficiários? Para tanto, a análise foi centrada no P1MC e no P1+2. O objetivo principal consistiu em analisar como as tecnologias advindas desses programas têm favorecido o acesso à água e ao alimento e, consequentemente, refletido na segurança alimentar das famílias beneficiadas. Para tal, esta Tese está organizada em quatro partes principais: a primeira trata dos aspectos teóricos metodológicos da pesquisa (introdução, fundamentação teórica e aspectos metodológicos); as demais partes consistem na elaboração de três artigos cuja finalidade foi refletir os objetivos específicos da pesquisa. O primeiro artigo, intitulado “Você tem sede de quê? Os programas de cisternas no Semiárido potiguar brasileiro como dispositivos de desenvolvimento”, objetivou analisar a evolução do processo de implementação dos programas de cisternas no Estado do Rio Grande do Norte, apontando as possíveis implicações do desmonte dessa política para as famílias rurais do Semiárido potiguar. A partir de revisão documental e bibliográfica, fora reconstituída a trajetória de execução desses programas e também desenvolvido o estado da arte, apresentando os possíveis cenários e consequências do seu esvaziamento. Esse artigo evidenciou que os programas de cisternas têm contribuições importantes para a agricultura familiar, que se expressam em diferentes dimensões: políticas, sociais, econômicas. Destacou-se o caráter includente da ação e a sua capacidade mobilizadora, construídos mediante a valorização dos saberes e da realidade do local. É proeminente nos estudos a referência à melhoria da qualidade de vida da população, que se iniciou com o acesso à água para consumo e, posteriormente, possibilitou a produção agroecológica, ampliando as possibilidades de segurança alimentar. Entretanto, a descontinuidade dessa política significa privar milhares de camponeses pobres de expandirem suas capacidades. Já o segundo artigo, “O P1+2 e a (in) segurança alimentar no Semiárido nordestino”, buscou compreender como o P1+2 ampliou o acesso à água e ao alimento, e como isso é refletido na segurança alimentar e nas diferentes formas de liberdades das famílias beneficiadas. Através de revisão de literatura e documental, contextualizou-se as políticas de desenvolvimento para o Nordeste, a trajetória do Programa e suas contribuições para as famílias beneficiadas. A análise foi feita sob a ótica do desenvolvimento como liberdade, de Sen (2010). Evidenciou-se que o Programa tem contribuições importantes, sobretudo, para a segurança alimentar das famílias beneficiadas. Porém, a sua descontinuidade representa um cenário de privações à segurança protetora, às oportunidades sociais e às liberdades individuais das pessoas. Por fim, o artigo “Para além da segurança alimentar: os programas de cisternas sob a ótica da colonialidade/decolonialidade” teve como objetivo refletir como o P1+2 promove processos de decolonialidades a partir do acesso à água e ao alimento. Como recurso metodológico, foi feita uma revisão de literatura e documental, assim como entrevistas com representantes de duas unidades executoras do Programa e com 42 famílias beneficiadas. A pesquisa de campo foi realizada no Território Sertão do Apodi, no Estado do Rio Grande do Norte (RN). A análise foi elaborada a partir do entendimento de colonialidade/decolonialidade conforme tratado por Maldonado-Torres (2007) e por Castro-Gómez (2012), dentre outros. Desse modo, pôde-se observar que o P1+2 se apresenta como instrumento de decolonialidade, visto que representa a conquista de toda uma luta que se fez – e se faz – em favor do acesso, domínio e gestão da água e do alimento pela soberania alimentar. Tal processo fundamenta-se em outras lógicas epistemológicas que se constroem pautadas na ecologia de saberes, conforme abordada por Santos (2007), possibilitando às famílias o rompimento de hierarquias que se construíram por décadas nos campos do saber, do poder e do ser através das políticas implementadas sob a ótica do combate à seca e da modernização agrícola. Apesar de ficar expressa a importância do programa como instrumento de decolonialidade, pôde-se perceber alguns elementos limitantes, como, por exemplo: a dificuldade financeira das famílias para assumir a contrapartida exigida pelo Programa; a dependência das famílias em relação ao poder público municipal para pagar a energia das bombas que abastecem as cisternas e, também, para o reabastecimento delas em períodos de estiagens; e a necessidade de comprar água em determinado período do ano. O estudo apresenta uma abordagem interdisciplinar, uma vez que mobiliza leituras e reflexões advindas de diferentes áreas do conhecimento. De modo geral, evidenciou-se que o P1MC e o P1+2 possibilitam o acesso à água e ao alimento, contribuindo para a segurança alimentar das famílias beneficiadas, constituindo-se como importantes instrumentos de decolonialidade e de liberdade. |
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Tese (Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) - Centro de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2022.https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/49927A seca que permeia o Semiárido nordestino, embora apresente um caráter natural, desencadeia vários problemas de ordem social, econômica e política, expressos, principalmente, pela fome, migrações, propagações de doenças e até mortes. Por décadas, o discurso de combate à seca tem fundamentado o delineamento das políticas públicas, entretanto, os seus resultados não foram suficientes para a resolução do problema. No final da década de 1990, com o fortalecimento do discurso sobre a convivência com o Semiárido, a problemática da água passou a ser vista sob um novo viés, pois se observou que a causa principal não era a escassez, mas as formas de distribuição, armazenamento e governança desse recurso. Dentro desse contexto, a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) desenvolveu o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Um Milhão de Cisternas Rurais, instigando a adoção da cultura do estoque da água, inicialmente, para o consumo humano, através do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) e, posteriormente, para a produção de alimentos, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2). Dessa forma, a pergunta que direcionou o estudo em questão foi estruturada da seguinte maneira: como os programas de cisternas têm logrado democratizar o acesso à água, garantir segurança alimentar e ser um instrumento pedagógico de ampliação da autonomia dos beneficiários? Para tanto, a análise foi centrada no P1MC e no P1+2. O objetivo principal consistiu em analisar como as tecnologias advindas desses programas têm favorecido o acesso à água e ao alimento e, consequentemente, refletido na segurança alimentar das famílias beneficiadas. Para tal, esta Tese está organizada em quatro partes principais: a primeira trata dos aspectos teóricos metodológicos da pesquisa (introdução, fundamentação teórica e aspectos metodológicos); as demais partes consistem na elaboração de três artigos cuja finalidade foi refletir os objetivos específicos da pesquisa. O primeiro artigo, intitulado “Você tem sede de quê? Os programas de cisternas no Semiárido potiguar brasileiro como dispositivos de desenvolvimento”, objetivou analisar a evolução do processo de implementação dos programas de cisternas no Estado do Rio Grande do Norte, apontando as possíveis implicações do desmonte dessa política para as famílias rurais do Semiárido potiguar. A partir de revisão documental e bibliográfica, fora reconstituída a trajetória de execução desses programas e também desenvolvido o estado da arte, apresentando os possíveis cenários e consequências do seu esvaziamento. Esse artigo evidenciou que os programas de cisternas têm contribuições importantes para a agricultura familiar, que se expressam em diferentes dimensões: políticas, sociais, econômicas. Destacou-se o caráter includente da ação e a sua capacidade mobilizadora, construídos mediante a valorização dos saberes e da realidade do local. É proeminente nos estudos a referência à melhoria da qualidade de vida da população, que se iniciou com o acesso à água para consumo e, posteriormente, possibilitou a produção agroecológica, ampliando as possibilidades de segurança alimentar. Entretanto, a descontinuidade dessa política significa privar milhares de camponeses pobres de expandirem suas capacidades. Já o segundo artigo, “O P1+2 e a (in) segurança alimentar no Semiárido nordestino”, buscou compreender como o P1+2 ampliou o acesso à água e ao alimento, e como isso é refletido na segurança alimentar e nas diferentes formas de liberdades das famílias beneficiadas. Através de revisão de literatura e documental, contextualizou-se as políticas de desenvolvimento para o Nordeste, a trajetória do Programa e suas contribuições para as famílias beneficiadas. A análise foi feita sob a ótica do desenvolvimento como liberdade, de Sen (2010). Evidenciou-se que o Programa tem contribuições importantes, sobretudo, para a segurança alimentar das famílias beneficiadas. Porém, a sua descontinuidade representa um cenário de privações à segurança protetora, às oportunidades sociais e às liberdades individuais das pessoas. Por fim, o artigo “Para além da segurança alimentar: os programas de cisternas sob a ótica da colonialidade/decolonialidade” teve como objetivo refletir como o P1+2 promove processos de decolonialidades a partir do acesso à água e ao alimento. Como recurso metodológico, foi feita uma revisão de literatura e documental, assim como entrevistas com representantes de duas unidades executoras do Programa e com 42 famílias beneficiadas. A pesquisa de campo foi realizada no Território Sertão do Apodi, no Estado do Rio Grande do Norte (RN). A análise foi elaborada a partir do entendimento de colonialidade/decolonialidade conforme tratado por Maldonado-Torres (2007) e por Castro-Gómez (2012), dentre outros. Desse modo, pôde-se observar que o P1+2 se apresenta como instrumento de decolonialidade, visto que representa a conquista de toda uma luta que se fez – e se faz – em favor do acesso, domínio e gestão da água e do alimento pela soberania alimentar. Tal processo fundamenta-se em outras lógicas epistemológicas que se constroem pautadas na ecologia de saberes, conforme abordada por Santos (2007), possibilitando às famílias o rompimento de hierarquias que se construíram por décadas nos campos do saber, do poder e do ser através das políticas implementadas sob a ótica do combate à seca e da modernização agrícola. Apesar de ficar expressa a importância do programa como instrumento de decolonialidade, pôde-se perceber alguns elementos limitantes, como, por exemplo: a dificuldade financeira das famílias para assumir a contrapartida exigida pelo Programa; a dependência das famílias em relação ao poder público municipal para pagar a energia das bombas que abastecem as cisternas e, também, para o reabastecimento delas em períodos de estiagens; e a necessidade de comprar água em determinado período do ano. O estudo apresenta uma abordagem interdisciplinar, uma vez que mobiliza leituras e reflexões advindas de diferentes áreas do conhecimento. De modo geral, evidenciou-se que o P1MC e o P1+2 possibilitam o acesso à água e ao alimento, contribuindo para a segurança alimentar das famílias beneficiadas, constituindo-se como importantes instrumentos de decolonialidade e de liberdade.The drought that permeates the northeastern semi-arid region, although it has a natural character, triggers several social, economic and political problems expressed mainly by hunger, migrations, spread of diseases and even deaths. For decades, the discourse on combating drought has been the basis for the design of public policies, however, its results were not enough to solve the problem. At the end of the 1990s, with the strengthening discourse on coexistence with the semi-arid region, the problem of water began to be seen under a new bias, as it was observed that the main cause was not the scarcity, but the forms of distribution, storage and governance of that resource. Within this context, the Articulation of the Semi-Arid (ASA) developed the Formation and Social Mobilization Program for interaction with the Semi-Arid Region: One Million Rural Cisterns, instigating the adoption of the culture of water storage, initially for human consumption, through the One Million Rural Cisterns Program (P1MC) and, later, for food production, through the One Land and Two Waters (P1+2). Thus, the question that guided the study in question was structured as follows: how have cistern programs managed to democratize access to water, guarantee food security and to be a pedagogical instrument for expanding the autonomy of beneficiaries? Therefore, the analysis was centered on the P1MC and P1+2. The main objective was to analyze how the technologies coming from these programs have favored access to water and food and, consequently, reflected in the food security of the beneficiary families. To this end, this Thesis is organized into four main parts: the first deals with the theoretical and methodological aspects of the research (introduction, theoretical foundation and methodological aspects); the other parts consist of the elaboration of three articles whose purpose was to reflect the specific objectives of the research. The first article, entitled “You thirst for what? Cistern programs in the Brazilian semi-arid region as development devices'' aimed to analyze the evolution of the implementation process of the cistern programs in the State of Rio Grande do Norte, pointing out the possible implications of the dismantling of this policy for rural families in the Potiguar semi-arid region. Based on a documentary and bibliographic review, the trajectory of execution of these programs was reconstructed and the state of the art was also developed, presenting the possible scenarios and consequences of their emptying. This article showed that cistern programs have important contributions to family farming, which are expressed in different dimensions: political, social, economic. The inclusive character of the action and its mobilizing capacity were highlighted, built through the valorization of knowledge and local reality. The reference to improving the population's quality of life is prominent in the studies, which began with access to water for consumption and, later, enabled agroecological production, expanding the possibilities of food security. However, the discontinuity of this politics means depriving thousands of poor peasants from expanding their capacities. The second article, “P1+2 and food (in)security in the northeastern semi-arid region”, sought to understand how P1+2 expanded access to water and food, and how this is reflected in food security and in the different forms of freedom of the beneficiary families. Through a literature and document review, the development policies for the Northeast were contextualized, as well as the Program's trajectory and its contributions to the beneficiary families. The analysis was made from the perspective of development as freedom, by Sen (2010). It was evidenced that the Program has important contributions, above all, for the food security of the beneficiary families. However, its discontinuity represents a scenario of deprivation of protective security, social opportunities and people's individual freedoms. Finally, the article “Beyond food security: cistern programs from the perspective of coloniality/decoloniality” aimed to reflect on how P1+2 promotes decolonial processes based on access to water and food. As a methodological resource, a literature and documental review was carried out, as well as interviews with representatives of two executing units of the Program and with 42 beneficiary families. The field research was carried out in the Sertão do Apodi Territory, in the State of Rio Grande do Norte (RN). The analysis was based on the understanding of coloniality/decoloniality as discussed by Maldonado-Torres (2007) and Castro-Gómez (2012), among others. In this way, it was possible to observe that P1+2 presents itself as an instrument of decoloniality since it represents the conquest of a whole struggle that was made – and is still being done – in favor of access, control and management of water and food for food sovereignty. This process is based on other epistemological logics that are built based on the ecology of knowledge, as discussed by Santos (2007), allowing families to break the hierarchies that were built for decades in the fields of knowledge, power and being through policies implemented from the perspective of combating drought and agricultural modernization. Despite expressing the importance of the program as an instrument of decoloniality, it was possible to perceive some limiting elements, such as, for example: the financial difficulty of the families to assume the compensation required by the Program; the dependence of families in relation to the municipal government to pay for the energy of the pumps that supply the cisterns and, also, for their refueling in periods of drought; and the need to buy water in a certain period of the year. The study presents an interdisciplinary approach, since it mobilizes readings and reflections from different areas of knowledge. In general, it was evidenced that the P1MC and the P1+2 allow access to water and food, contributing to the food security of the beneficiary families, constituting themselves as important instruments of decoloniality and freedom.Universidade Federal do Rio Grande do NortePROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE - PRODEMAUFRNBrasilCNPQ::CIENCIAS BIOLOGICASAgricultura familiarSegurança alimentarP1MCP1+2ColonialidadeVocê tem sede de quê? O programa de cisternas na promoção da segurança alimentar no semiárido brasileiroYou thirst for what? The cisterns program in promoting food security in the Brazilian semiarid regioninfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisinfo:eu-repo/semantics/openAccessporreponame:Repositório Institucional da UFRNinstname:Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)instacron:UFRNORIGINALVocetemsede_Santos_2022.pdfapplication/pdf2269388https://repositorio.ufrn.br/bitstream/123456789/49927/1/Vocetemsede_Santos_2022.pdf09ecd46096dee549d5f100164b07b743MD51123456789/499272022-11-29 17:58:48.13oai:https://repositorio.ufrn.br:123456789/49927Repositório de PublicaçõesPUBhttp://repositorio.ufrn.br/oai/opendoar:2022-11-29T20:58:48Repositório Institucional da UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)false |
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Dentro desse contexto, a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) desenvolveu o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: Um Milhão de Cisternas Rurais, instigando a adoção da cultura do estoque da água, inicialmente, para o consumo humano, através do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais (P1MC) e, posteriormente, para a produção de alimentos, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2). Dessa forma, a pergunta que direcionou o estudo em questão foi estruturada da seguinte maneira: como os programas de cisternas têm logrado democratizar o acesso à água, garantir segurança alimentar e ser um instrumento pedagógico de ampliação da autonomia dos beneficiários? Para tanto, a análise foi centrada no P1MC e no P1+2. O objetivo principal consistiu em analisar como as tecnologias advindas desses programas têm favorecido o acesso à água e ao alimento e, consequentemente, refletido na segurança alimentar das famílias beneficiadas. Para tal, esta Tese está organizada em quatro partes principais: a primeira trata dos aspectos teóricos metodológicos da pesquisa (introdução, fundamentação teórica e aspectos metodológicos); as demais partes consistem na elaboração de três artigos cuja finalidade foi refletir os objetivos específicos da pesquisa. O primeiro artigo, intitulado “Você tem sede de quê? Os programas de cisternas no Semiárido potiguar brasileiro como dispositivos de desenvolvimento”, objetivou analisar a evolução do processo de implementação dos programas de cisternas no Estado do Rio Grande do Norte, apontando as possíveis implicações do desmonte dessa política para as famílias rurais do Semiárido potiguar. A partir de revisão documental e bibliográfica, fora reconstituída a trajetória de execução desses programas e também desenvolvido o estado da arte, apresentando os possíveis cenários e consequências do seu esvaziamento. Esse artigo evidenciou que os programas de cisternas têm contribuições importantes para a agricultura familiar, que se expressam em diferentes dimensões: políticas, sociais, econômicas. Destacou-se o caráter includente da ação e a sua capacidade mobilizadora, construídos mediante a valorização dos saberes e da realidade do local. É proeminente nos estudos a referência à melhoria da qualidade de vida da população, que se iniciou com o acesso à água para consumo e, posteriormente, possibilitou a produção agroecológica, ampliando as possibilidades de segurança alimentar. Entretanto, a descontinuidade dessa política significa privar milhares de camponeses pobres de expandirem suas capacidades. Já o segundo artigo, “O P1+2 e a (in) segurança alimentar no Semiárido nordestino”, buscou compreender como o P1+2 ampliou o acesso à água e ao alimento, e como isso é refletido na segurança alimentar e nas diferentes formas de liberdades das famílias beneficiadas. Através de revisão de literatura e documental, contextualizou-se as políticas de desenvolvimento para o Nordeste, a trajetória do Programa e suas contribuições para as famílias beneficiadas. A análise foi feita sob a ótica do desenvolvimento como liberdade, de Sen (2010). Evidenciou-se que o Programa tem contribuições importantes, sobretudo, para a segurança alimentar das famílias beneficiadas. Porém, a sua descontinuidade representa um cenário de privações à segurança protetora, às oportunidades sociais e às liberdades individuais das pessoas. Por fim, o artigo “Para além da segurança alimentar: os programas de cisternas sob a ótica da colonialidade/decolonialidade” teve como objetivo refletir como o P1+2 promove processos de decolonialidades a partir do acesso à água e ao alimento. Como recurso metodológico, foi feita uma revisão de literatura e documental, assim como entrevistas com representantes de duas unidades executoras do Programa e com 42 famílias beneficiadas. A pesquisa de campo foi realizada no Território Sertão do Apodi, no Estado do Rio Grande do Norte (RN). A análise foi elaborada a partir do entendimento de colonialidade/decolonialidade conforme tratado por Maldonado-Torres (2007) e por Castro-Gómez (2012), dentre outros. Desse modo, pôde-se observar que o P1+2 se apresenta como instrumento de decolonialidade, visto que representa a conquista de toda uma luta que se fez – e se faz – em favor do acesso, domínio e gestão da água e do alimento pela soberania alimentar. Tal processo fundamenta-se em outras lógicas epistemológicas que se constroem pautadas na ecologia de saberes, conforme abordada por Santos (2007), possibilitando às famílias o rompimento de hierarquias que se construíram por décadas nos campos do saber, do poder e do ser através das políticas implementadas sob a ótica do combate à seca e da modernização agrícola. Apesar de ficar expressa a importância do programa como instrumento de decolonialidade, pôde-se perceber alguns elementos limitantes, como, por exemplo: a dificuldade financeira das famílias para assumir a contrapartida exigida pelo Programa; a dependência das famílias em relação ao poder público municipal para pagar a energia das bombas que abastecem as cisternas e, também, para o reabastecimento delas em períodos de estiagens; e a necessidade de comprar água em determinado período do ano. O estudo apresenta uma abordagem interdisciplinar, uma vez que mobiliza leituras e reflexões advindas de diferentes áreas do conhecimento. De modo geral, evidenciou-se que o P1MC e o P1+2 possibilitam o acesso à água e ao alimento, contribuindo para a segurança alimentar das famílias beneficiadas, constituindo-se como importantes instrumentos de decolonialidade e de liberdade. |
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Repositório Institucional da UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) |
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