Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves
Data de Publicação: 2021
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Institucional da UNESP
Texto Completo: http://hdl.handle.net/11449/214736
Resumo: O Brasil é um país com elevada desigualdade social e educacional, o que transforma o acesso ao ensino superior em uma corrida injusta, como na fábula da lebre e da tartaruga. Essa corrida é, para a lebre, um percurso rotineiro com vitória certa; para a tartaruga, é um desafio, exigindo muito tempo e persistência para, se possível, ser concluído. Diversas pesquisas apontam como essas desigualdades — principalmente as de classe social que representamos pela lebre e a tartaruga — afetam a relação do estudante com a escola e as chances de ingressar no Ensino Superior. Considerando o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como representante dessa corrida, percebemos que poucos trabalhos no ensino de ciências consideram as condições sociais para analisar essa prova. Reconhecendo essa lacuna, utilizamos a teoria de Bourdieu para estudar como a relação com ciência pode ser parte das desigualdades de acesso ao Ensino Superior. Abordamos o conceito de capital da ciência (science capital) por propor a união entre a teoria bourdiana e o ensino de ciências. Para investigarmos a relação entre essas teorias, elaboramos uma revisão da literatura do capital da ciência e uma análise crítica desse conceito baseada na teoria bourdiana. Organizamos os resultados em dois estudos: o primeiro teve o objetivo de investigar a posição dos agentes no espaço social do ENEM 2009; o segundo buscou discutir os aspectos culturais e abordar a relação entre capital cultural e capital da ciência. Em ambos, os dados empíricos — microdados do ENEM 2009 — foram tratados por técnicas estatísticas, com destaque para as Análises de Correspondência Múltiplas (ACM). Os resultados do Estudo 1 mostraram que as condições de existência dos agentes foi o fator mais influente sobre o desempenho na prova de ciências da natureza. A relação com a ciência não aparece nas lebres ou nas tartarugas, mas em uma fração intermediária, que chamamos de híbridos. Para os híbridos, a relação com a ciência tem um caráter de estratégia para uma ascensão social via educação. O Estudo 2 revelou que os hábitos de leitura complementam a condição de classe dos agentes; as lebres leem por prazer e as tartarugas não leem. Os híbridos têm a leitura como parte da estratégia de obter sucesso no ENEM, lendo aquilo que os ajuda na prova e, em menor frequência, revistas de divulgação científica. Ambos os estudos mostraram uma não particularidade das ciências da natureza, pois as ciências exatas e humanas nutriram as mesmas relações no espaço investigado. Assim, interpretamos o gosto por ciências como uma estratégia estruturada e adaptada a uma fração de classe. Os resultados apontaram que o capital da ciência não contempla as características de um capital bourdiano, pois não está relacionado com uma elite ou se reconverte em vantagens no ENEM. A teoria bourdiana mostrou-se atual ao revelar que um gosto esconde os esforços e as desigualdades envolvidas na disputa pelo Ensino Superior. Concluímos que abordar o gosto por ciência como uma estratégia social de ascensão é frutífera para reconhecer o papel das ciências no amplo espaço das desigualdades sociais.
id UNSP_0b3f8fd4db5bf29c174aef339811bdf6
oai_identifier_str oai:repositorio.unesp.br:11449/214736
network_acronym_str UNSP
network_name_str Repositório Institucional da UNESP
repository_id_str 2946
spelling Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino MédioGoing slowly does the turtle get far? The science capital and cultural capital relationship to the performance in the National High School ExamCapital culturalScience capitalPierre BourdieuENEMCultural capitalScience capitalO Brasil é um país com elevada desigualdade social e educacional, o que transforma o acesso ao ensino superior em uma corrida injusta, como na fábula da lebre e da tartaruga. Essa corrida é, para a lebre, um percurso rotineiro com vitória certa; para a tartaruga, é um desafio, exigindo muito tempo e persistência para, se possível, ser concluído. Diversas pesquisas apontam como essas desigualdades — principalmente as de classe social que representamos pela lebre e a tartaruga — afetam a relação do estudante com a escola e as chances de ingressar no Ensino Superior. Considerando o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como representante dessa corrida, percebemos que poucos trabalhos no ensino de ciências consideram as condições sociais para analisar essa prova. Reconhecendo essa lacuna, utilizamos a teoria de Bourdieu para estudar como a relação com ciência pode ser parte das desigualdades de acesso ao Ensino Superior. Abordamos o conceito de capital da ciência (science capital) por propor a união entre a teoria bourdiana e o ensino de ciências. Para investigarmos a relação entre essas teorias, elaboramos uma revisão da literatura do capital da ciência e uma análise crítica desse conceito baseada na teoria bourdiana. Organizamos os resultados em dois estudos: o primeiro teve o objetivo de investigar a posição dos agentes no espaço social do ENEM 2009; o segundo buscou discutir os aspectos culturais e abordar a relação entre capital cultural e capital da ciência. Em ambos, os dados empíricos — microdados do ENEM 2009 — foram tratados por técnicas estatísticas, com destaque para as Análises de Correspondência Múltiplas (ACM). Os resultados do Estudo 1 mostraram que as condições de existência dos agentes foi o fator mais influente sobre o desempenho na prova de ciências da natureza. A relação com a ciência não aparece nas lebres ou nas tartarugas, mas em uma fração intermediária, que chamamos de híbridos. Para os híbridos, a relação com a ciência tem um caráter de estratégia para uma ascensão social via educação. O Estudo 2 revelou que os hábitos de leitura complementam a condição de classe dos agentes; as lebres leem por prazer e as tartarugas não leem. Os híbridos têm a leitura como parte da estratégia de obter sucesso no ENEM, lendo aquilo que os ajuda na prova e, em menor frequência, revistas de divulgação científica. Ambos os estudos mostraram uma não particularidade das ciências da natureza, pois as ciências exatas e humanas nutriram as mesmas relações no espaço investigado. Assim, interpretamos o gosto por ciências como uma estratégia estruturada e adaptada a uma fração de classe. Os resultados apontaram que o capital da ciência não contempla as características de um capital bourdiano, pois não está relacionado com uma elite ou se reconverte em vantagens no ENEM. A teoria bourdiana mostrou-se atual ao revelar que um gosto esconde os esforços e as desigualdades envolvidas na disputa pelo Ensino Superior. Concluímos que abordar o gosto por ciência como uma estratégia social de ascensão é frutífera para reconhecer o papel das ciências no amplo espaço das desigualdades sociais.Brazil is a country with a high level of social and educational inequality, which turns access to higher education into an unfair race, as in the fable the tortoise and the hare. This race is, for the hare, a routine path and a guaranteed victory; for the tortoise, it is a challenge, requiring a lot of time and persistence to complete, if possible. Several researches show how these inequalities - mainly the social class that we represent by the hare and the tortoise - affect the student's relationship with the school and the chances of entering Higher Education. Considering the National High School Exam (ENEM) as a representative of this race, we found that few studies in science education consider the social conditions to analyze this exam. Recognizing this gap, we use Bourdieu's theory to study how the relationship with science can be part of the inequalities in access to Higher Education. We approach the concept of science capital because it proposes the union between Bourdian theory and science education. To investigate the relationship between these theories, we developed a literature review of the science capital and a critical analysis of this concept based on Bourdieu’s theory. We organized the results into two studies: the first aimed to investigate the position of agents in the social space of ENEM 2009; the second aimed to discuss cultural aspects and address the relationship between cultural capital and science capital. In both studies, empirical data — microdata from ENEM 2009 — were approached by statistical techniques, with emphasis on Multiple Correspondence Analysis (ACM). Study 1 results showed that the agents' conditions of existence were the most influential factor on performance in the natural sciences test. The relationship with science does not appear in the hares or the tortoises, but in an intermediate fraction, which we call hybrids. For hybrids, the relationship with science has the role of a strategy for social ascension via education. Study 2 revealed that reading habits complement the agents' class condition; hares read for pleasure and tortoises do not read. Hybrids have reading as part of their strategy to succeed in ENEM, reading what helps them on the test and, less frequently, scientific magazines. Both studies showed a non-particularity of the natural sciences, as the exact and human sciences fostered the same relationships in the investigated social space. Thus, we interpreted the taste for science as a structured and adapted strategy to a social class fraction. The results showed that the science capital does not hold the characteristics of a Bourdian capital, because it is not related to an elite class nor converted into advantages in ENEM. The Bourdian theory proved to be current valid, as it revealed that a taste hides the efforts and inequalities involved in the dispute for Higher Education. We conclude that approaching the taste for science as a social upward strategy is fruitful in recognizing the role of science in the broad space of social inequalities.Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)88882.432787/2019-1Universidade Estadual Paulista (Unesp)Massi, Luciana [UNESP]Nascimento, Matheus MonteiroUniversidade Estadual Paulista (Unesp)Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves2021-10-13T17:25:43Z2021-10-13T17:25:43Z2021-08-11info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/11449/21473633004056079P0porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Institucional da UNESPinstname:Universidade Estadual Paulista (UNESP)instacron:UNESP2024-01-06T06:25:55Zoai:repositorio.unesp.br:11449/214736Repositório InstitucionalPUBhttp://repositorio.unesp.br/oai/requestopendoar:29462024-01-06T06:25:55Repositório Institucional da UNESP - Universidade Estadual Paulista (UNESP)false
dc.title.none.fl_str_mv Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
Going slowly does the turtle get far? The science capital and cultural capital relationship to the performance in the National High School Exam
title Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
spellingShingle Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves
Capital cultural
Science capital
Pierre Bourdieu
ENEM
Cultural capital
Science capital
title_short Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
title_full Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
title_fullStr Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
title_full_unstemmed Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
title_sort Devagar a tartaruga vai longe? As relações do science capital e do capital cultural com o desempenho no Exame Nacional do Ensino Médio
author Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves
author_facet Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves
author_role author
dc.contributor.none.fl_str_mv Massi, Luciana [UNESP]
Nascimento, Matheus Monteiro
Universidade Estadual Paulista (Unesp)
dc.contributor.author.fl_str_mv Moris, Carlos Henrique Aparecido Alves
dc.subject.por.fl_str_mv Capital cultural
Science capital
Pierre Bourdieu
ENEM
Cultural capital
Science capital
topic Capital cultural
Science capital
Pierre Bourdieu
ENEM
Cultural capital
Science capital
description O Brasil é um país com elevada desigualdade social e educacional, o que transforma o acesso ao ensino superior em uma corrida injusta, como na fábula da lebre e da tartaruga. Essa corrida é, para a lebre, um percurso rotineiro com vitória certa; para a tartaruga, é um desafio, exigindo muito tempo e persistência para, se possível, ser concluído. Diversas pesquisas apontam como essas desigualdades — principalmente as de classe social que representamos pela lebre e a tartaruga — afetam a relação do estudante com a escola e as chances de ingressar no Ensino Superior. Considerando o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como representante dessa corrida, percebemos que poucos trabalhos no ensino de ciências consideram as condições sociais para analisar essa prova. Reconhecendo essa lacuna, utilizamos a teoria de Bourdieu para estudar como a relação com ciência pode ser parte das desigualdades de acesso ao Ensino Superior. Abordamos o conceito de capital da ciência (science capital) por propor a união entre a teoria bourdiana e o ensino de ciências. Para investigarmos a relação entre essas teorias, elaboramos uma revisão da literatura do capital da ciência e uma análise crítica desse conceito baseada na teoria bourdiana. Organizamos os resultados em dois estudos: o primeiro teve o objetivo de investigar a posição dos agentes no espaço social do ENEM 2009; o segundo buscou discutir os aspectos culturais e abordar a relação entre capital cultural e capital da ciência. Em ambos, os dados empíricos — microdados do ENEM 2009 — foram tratados por técnicas estatísticas, com destaque para as Análises de Correspondência Múltiplas (ACM). Os resultados do Estudo 1 mostraram que as condições de existência dos agentes foi o fator mais influente sobre o desempenho na prova de ciências da natureza. A relação com a ciência não aparece nas lebres ou nas tartarugas, mas em uma fração intermediária, que chamamos de híbridos. Para os híbridos, a relação com a ciência tem um caráter de estratégia para uma ascensão social via educação. O Estudo 2 revelou que os hábitos de leitura complementam a condição de classe dos agentes; as lebres leem por prazer e as tartarugas não leem. Os híbridos têm a leitura como parte da estratégia de obter sucesso no ENEM, lendo aquilo que os ajuda na prova e, em menor frequência, revistas de divulgação científica. Ambos os estudos mostraram uma não particularidade das ciências da natureza, pois as ciências exatas e humanas nutriram as mesmas relações no espaço investigado. Assim, interpretamos o gosto por ciências como uma estratégia estruturada e adaptada a uma fração de classe. Os resultados apontaram que o capital da ciência não contempla as características de um capital bourdiano, pois não está relacionado com uma elite ou se reconverte em vantagens no ENEM. A teoria bourdiana mostrou-se atual ao revelar que um gosto esconde os esforços e as desigualdades envolvidas na disputa pelo Ensino Superior. Concluímos que abordar o gosto por ciência como uma estratégia social de ascensão é frutífera para reconhecer o papel das ciências no amplo espaço das desigualdades sociais.
publishDate 2021
dc.date.none.fl_str_mv 2021-10-13T17:25:43Z
2021-10-13T17:25:43Z
2021-08-11
dc.type.status.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/publishedVersion
dc.type.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/masterThesis
format masterThesis
status_str publishedVersion
dc.identifier.uri.fl_str_mv http://hdl.handle.net/11449/214736
33004056079P0
url http://hdl.handle.net/11449/214736
identifier_str_mv 33004056079P0
dc.language.iso.fl_str_mv por
language por
dc.rights.driver.fl_str_mv info:eu-repo/semantics/openAccess
eu_rights_str_mv openAccess
dc.format.none.fl_str_mv application/pdf
application/pdf
dc.publisher.none.fl_str_mv Universidade Estadual Paulista (Unesp)
publisher.none.fl_str_mv Universidade Estadual Paulista (Unesp)
dc.source.none.fl_str_mv reponame:Repositório Institucional da UNESP
instname:Universidade Estadual Paulista (UNESP)
instacron:UNESP
instname_str Universidade Estadual Paulista (UNESP)
instacron_str UNESP
institution UNESP
reponame_str Repositório Institucional da UNESP
collection Repositório Institucional da UNESP
repository.name.fl_str_mv Repositório Institucional da UNESP - Universidade Estadual Paulista (UNESP)
repository.mail.fl_str_mv
_version_ 1803047269326389248