Construções sobre a vítima de violência doméstica a partir da utilização da estratégia penal

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Silva, Fabiana Pagel da
Data de Publicação: 2022
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10183/252408
Resumo: Essa dissertação aborda a temática do enfrentamento à violência doméstica a partir da perspectiva de que a utilização da estratégia penal permitiu a construção de sentidos sobre “ser vítima”, normalizando-os e normatizando-os. Assim, a pergunta que guia a presente investigação é: “De que forma a utilização da estratégia penal permitiu a construção, normalização e normatização de discursos sobre o sentido de ser vítima de violência doméstica?”. A pesquisa trabalha com a hipótese inicial de que, ao trazer o fenômeno social da violência contra a mulher para o Direito Penal, houve a exclusão de importantes perspectivas sobre o problema, relacionadas à sua perspectiva relacional e à agência da mulher, limitando-a à percepção do patriarcado como fonte de violência simbólica e hierárquica exercida pelo homem contra a mulher na sociedade. Tais limitações, incorporadas pelo discurso presente no nome da Lei e nas campanhas de enfrentamento, juntamente com as percepções sobre a vítima já presentes no sistema penal, resultam que a estratégia penal não joga luz sobre a complexidade do fenômeno da violência doméstica, mas sobre a vítima mulher. Assim, a segunda hipótese que o trabalho enfrenta parte das noções de dispositivo apresentada por Michel Foucault, e de enquadramento proposta por Judith Butler, para delimitar os discursos sobre o sentido de ser vítima, suas normalizações e normatizações presentes no dispositivo da vitimidade, que, configurando critérios de justiça e conduta, aproximam-na da figura ideal e dos estereótipos já presentes no controle informal. A exigência de tais enquadramentos opera na invisibilidade do fenômeno, limitação das estratégias possíveis e violência institucional, dificultando a compreensão de fenômenos como ciclo de violência ou mesmo a retomada da relação com o réu e o desejo de pôr fim ao processo. A pesquisa empírica permitirá problematizar a identidade fixa da vítima presente no dispositivo da vitimidade, para verificar sua multiplicidade que pode determinar racionalidades diversas, além da diversidade de mobilizações da mulher enquanto utiliza o direito como agência possível, que por vezes não se relacionam à pretensão punitiva do agressor. Por fim, como terceira hipótese, constata-se que, quando é dado a mulher falar, as cenas de interpelação revelam a lógica das normalizações e normatizações no dispositivo, momento em que deverá enquadrar-se na vitimidade para que possa gozar do trânsito pelo sistema penal sem sofrer vitimização secundária. A mulher deverá então vitimizar-se para desvitimizar-se. Desvelam-se, por outro lado, as resistências ao saber único da mulher como vítima, seja no âmbito do poder, enquanto práticas quotidianas nas varas de violência doméstica, seja na esfera de saber, a partir das novas percepções da criminologia feminista, seja na subjetivação das mulheres enquanto interpeladas a sujeitar-se ao enquadramento da vitimidade. Tais resistências problematizam a fratura entre a efetividade pretendida por parcela do feminismo e a efetividade mobilizada pelas mulheres ao denunciar a violência, permitindo questionar o quanto a possibilidade de vitimização secundária das mulheres está sendo considerada na efetividade pretendida a partir da resposta penal simbólica.
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Tais limitações, incorporadas pelo discurso presente no nome da Lei e nas campanhas de enfrentamento, juntamente com as percepções sobre a vítima já presentes no sistema penal, resultam que a estratégia penal não joga luz sobre a complexidade do fenômeno da violência doméstica, mas sobre a vítima mulher. Assim, a segunda hipótese que o trabalho enfrenta parte das noções de dispositivo apresentada por Michel Foucault, e de enquadramento proposta por Judith Butler, para delimitar os discursos sobre o sentido de ser vítima, suas normalizações e normatizações presentes no dispositivo da vitimidade, que, configurando critérios de justiça e conduta, aproximam-na da figura ideal e dos estereótipos já presentes no controle informal. A exigência de tais enquadramentos opera na invisibilidade do fenômeno, limitação das estratégias possíveis e violência institucional, dificultando a compreensão de fenômenos como ciclo de violência ou mesmo a retomada da relação com o réu e o desejo de pôr fim ao processo. A pesquisa empírica permitirá problematizar a identidade fixa da vítima presente no dispositivo da vitimidade, para verificar sua multiplicidade que pode determinar racionalidades diversas, além da diversidade de mobilizações da mulher enquanto utiliza o direito como agência possível, que por vezes não se relacionam à pretensão punitiva do agressor. Por fim, como terceira hipótese, constata-se que, quando é dado a mulher falar, as cenas de interpelação revelam a lógica das normalizações e normatizações no dispositivo, momento em que deverá enquadrar-se na vitimidade para que possa gozar do trânsito pelo sistema penal sem sofrer vitimização secundária. A mulher deverá então vitimizar-se para desvitimizar-se. Desvelam-se, por outro lado, as resistências ao saber único da mulher como vítima, seja no âmbito do poder, enquanto práticas quotidianas nas varas de violência doméstica, seja na esfera de saber, a partir das novas percepções da criminologia feminista, seja na subjetivação das mulheres enquanto interpeladas a sujeitar-se ao enquadramento da vitimidade. Tais resistências problematizam a fratura entre a efetividade pretendida por parcela do feminismo e a efetividade mobilizada pelas mulheres ao denunciar a violência, permitindo questionar o quanto a possibilidade de vitimização secundária das mulheres está sendo considerada na efetividade pretendida a partir da resposta penal simbólica.This dissertation aims to discuss domestic violence from the perspective that the use of the penal strategy has allowed the construction of meanings of “being victim”, normalizing and standardizing them . Thus, the question that guides this investigation is: “How has the use of the penal strategy allowed the construction, normalization and standardization of discourses about the meaning of being a victim of domestic violence?”. This research discusses the initial hypothesis that, by bringing the social phenomenon of violence against women into Criminal Law, feminism has traditionally excluded the important perspectives on the problem related to its relational perspective and the women’s agency, limiting it to the perception of patriarchy as a source of symbolic and hierarchical violence exercised by men against women in society. Such limitations, incorporated by the discourse present in the name of the Law and in the campaigns of confrontation, along with the perceptions about the victim already present in the penal system, result in the penal strategy not shedding light on the complexity of the phenomenon of domestic violence, but on the woman victim. Thus, the second hypothesis that the work faces starts from the notions of device presented by Michel Foucault, and of framing proposed by Judith Butler, to delimit the discourses on the meaning of being a victim, its normalizations and normatizations present in the device of victimhood, which, configuring criteria of justice and conduct, bring it closer to the ideal figure and the stereotypes already present in informal control. The requirement of such frameworks operates in the invisibility of the phenomenon, limitation of possible strategies and institutional violence, making it difficult to understand phenomena such as the cycle of violence or even the resumption of the relationship with the defendant and the desire to end the process. The empirical research Will allow us make to problematize the fixed identity of the victim present in the victimhood device, to verify its multiplicity that can determine diverse rationalities, besides the diversity of women's mobilizations while using the law as a possible agency, which sometimes are not related to the punitive claim of the aggressor's . Finally, as a third hypothesis, it is observed that when the woman is given the opportunity to speak, the interpellation scenes reveal the logic of normalizations in the device, at which moment she willhave to fit into the victimhood so that she can enjoy the transit through the criminal system without suffering secondary victimization. The woman must then victimize herself in order to deviate (de-victimize herself) . On the other hand, resistance to the unique knowledge of woman as victim is unveiled, whether in the sphere of power, as daily practices in the domestic violence court, or in the sphere of knowledge, from the new perceptions of feminist criminology, or in the subjectivation of women as they are interpellated to subject themselve to the framing of victimhood. Such resistance problematizes the fracture between the effectiveness intended by official feminism and the effectiveness mobilized by women when denouncing violence, allowing us to question how much the possibility of secondary victimization of women is being considered in the effectiveness intended from the symbolic penal response.application/pdfporViolência domésticaCriminologiaVitimologiaDireito penalDomestic violencePenal strategyGenderFeminist criminologyVictimologyVictimhoodConstruções sobre a vítima de violência doméstica a partir da utilização da estratégia penalinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisUniversidade Federal do Rio Grande do SulFaculdade de DireitoPrograma de Pós-Graduação em DireitoPorto Alegre, BR-RS2022mestradoinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGSinstname:Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)instacron:UFRGSTEXT001155236.pdf.txt001155236.pdf.txtExtracted Texttext/plain562168http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/10183/252408/2/001155236.pdf.txte585c5bd8edac282f5f48fbba154bc9fMD52ORIGINAL001155236.pdfTexto completoapplication/pdf3601568http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/10183/252408/1/001155236.pdf728ec3de306274807af28dc68930ee4eMD5110183/2524082022-12-08 06:02:43.186309oai:www.lume.ufrgs.br:10183/252408Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttps://lume.ufrgs.br/handle/10183/2PUBhttps://lume.ufrgs.br/oai/requestlume@ufrgs.br||lume@ufrgs.bropendoar:18532022-12-08T08:02:43Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)false
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