Burocracia, criatividade e discernimento: lições de uma cafeteira desaparecida
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2020 |
Tipo de documento: | Artigo |
Idioma: | por eng |
Título da fonte: | Revista de antropologia (São Paulo. Online) |
Texto Completo: | https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/178843 |
Resumo: | Com base na descrição etnográfica do processo administrativo instaurado a partir do sumiço de uma cafeteira em um órgão público federal, este artigo propõe que a transposição ponderada e criativa da distância entre o esquematismo das fórmulas burocráticas e a complexidade das situações às quais elas se dirigem é tão constitutiva da burocracia quanto suas expressões mais bizarras, cuja insensatez anedótica frequentemente resulta em violência e injustiça. No caso em questão, cuja análise integra um estudo mais amplo sobre práticas burocráticas e procedimentos disciplinares na administração pública, dois aspectos se sobressaem: de um lado, as prescrições normativas conferem ao processo um impulso próprio, que prenuncia sanções aos servidores formalmente implicados no desaparecimento do bem; de outro, e ao mesmo tempo, sua tramitação desencadeia um investimento cuidadoso de diferentes atores e instâncias para conter um movimento cego em direção a resultados indesejáveis. Essas condições permitem problematizar a consideração usual da discricionariedade no serviço público – que chamarei de discernimento, aproximando-me de certo uso nativo – como expressão de autonomia ou arbítrio individual. Em vez disso, a etnografia realça o caráter intrinsecamente coletivo do discernimento burocrático, sem o qual a efetivação consequente das normas não seria possível. |
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Burocracia, criatividade e discernimento: lições de uma cafeteira desaparecidaBureaucracy, creativity and discernment: lessons from a missing coffee makerAntropologia da burocraciaprocessos administrativosservidores públicosdiscricionariedadediscernimentoAnthropology of bureaucracyadministrative proceedingscivil servantsdiscretiondiscernmentCom base na descrição etnográfica do processo administrativo instaurado a partir do sumiço de uma cafeteira em um órgão público federal, este artigo propõe que a transposição ponderada e criativa da distância entre o esquematismo das fórmulas burocráticas e a complexidade das situações às quais elas se dirigem é tão constitutiva da burocracia quanto suas expressões mais bizarras, cuja insensatez anedótica frequentemente resulta em violência e injustiça. No caso em questão, cuja análise integra um estudo mais amplo sobre práticas burocráticas e procedimentos disciplinares na administração pública, dois aspectos se sobressaem: de um lado, as prescrições normativas conferem ao processo um impulso próprio, que prenuncia sanções aos servidores formalmente implicados no desaparecimento do bem; de outro, e ao mesmo tempo, sua tramitação desencadeia um investimento cuidadoso de diferentes atores e instâncias para conter um movimento cego em direção a resultados indesejáveis. Essas condições permitem problematizar a consideração usual da discricionariedade no serviço público – que chamarei de discernimento, aproximando-me de certo uso nativo – como expressão de autonomia ou arbítrio individual. Em vez disso, a etnografia realça o caráter intrinsecamente coletivo do discernimento burocrático, sem o qual a efetivação consequente das normas não seria possível.Based on the ethnographic description of the administrative proceedings ensued by the disappearance of an electric coffee maker from a federal public institution, this article proposes that the thoughtful and creative transposition of the distance between the schematism of bureaucratic formulas and the complexity of the situations they address is as constitutive of bureaucracy as its more bizarre expressions, whose anecdotal stupidity often produces violence and injustice. In the case in question, whose analysis integrates a broader research on bureaucratic practices and disciplinary procedures in Brazilian public administration, two aspects stand out: on the one hand, normative prescriptions endow the process with its own impulse, foreshadowing sanctions to the servants formally involved in the good’s disappearance; on the other, and at the same time, the proceedings unleash a careful investment by different actors and instances to contain a blind movement towards undesirable results. These conditions make it possible to problematize discretion in public service – which I call discernment, approaching a certain native use of the term – as an expression of individual autonomy or choice. Instead, ethnography highlights the intrinsically collective character of bureaucratic discernment, without which the sensible implementation of legal and institutional norms would not be possible.Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas2020-12-04info:eu-repo/semantics/articleinfo:eu-repo/semantics/publishedVersionTextoapplication/pdfapplication/pdftext/xmlhttps://www.revistas.usp.br/ra/article/view/17884310.11606/1678-9857.ra.2020.178843Revista de Antropologia; v. 63 n. 3 (2020); e178843Revista de Antropologia; Vol. 63 No 3 (2020); e178843Revista de Antropologia; Vol. 63 Núm. 3 (2020); e178843Revista de Antropologia; Vol. 63 No. 3 (2020); e1788431678-98570034-7701reponame:Revista de antropologia (São Paulo. Online)instname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPporenghttps://www.revistas.usp.br/ra/article/view/178843/165566https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/178843/179393https://www.revistas.usp.br/ra/article/view/178843/171712Copyright (c) 2020 Revista de Antropologiahttp://creativecommons.org/licenses/by/4.0info:eu-repo/semantics/openAccessBevilaqua, Ciméa Barbato 2022-01-09T11:28:39Zoai:revistas.usp.br:article/178843Revistahttp://www.revistas.usp.br/raPUBhttp://www.revistas.usp.br/ra/oairevista.antropologia.usp@gmail.com||revant@edu.usp.br1678-98570034-7701opendoar:2022-01-09T11:28:39Revista de antropologia (São Paulo. Online) - Universidade de São Paulo (USP)false |
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