A experiência de um refugiado: desenraizamento e enraizamento

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Viana, Tamires de Souza
Data de Publicação: 2023
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-30082023-122216/
Resumo: I) Violência, governos arbitrários, instabilidade política, conflitos armados, perseguição religiosa, crise econômica e miséria, são exemplos do que a generalizada violação dos direitos humanos é capaz. Dados do relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) apontam que, até o final de 2021 cerca de 89,3 milhões de pessoas estavam em situação de deslocamento forçado no mundo. Nos últimos anos, o problema do refúgio tem tomado proporções cada vez maiores devido à dimensão dos fluxos migratórios e, nessa conjuntura, o Brasil tem sido o destino de muitas pessoas que se veem obrigadas a migrar. Apesar de sermos um país visto como plural e acolhedor, não asseguramos abraçar e conviver com as diferenças; os antagonismos de classe, associados a outros antagonismos de grupos, assinalam as persistentes relações de dominação entre nós. Um refugiado, forçado a abandonar seu país por ameaças contra sua vida (noção que será empregada no sentido, sobretudo, econômico e biológico) e contra sua dignidade (no sentido ético e político) irá, no Brasil, inserir-se noutras situações ameaçadoras mais do que apenas encontrar abrigo material e moral. Se não dispuser de fundos rentistas ou privilégios de classe e de mando, dependerá de uma proteção que não é trazida: a proteção de uma comunidade, de uma rede de trocas, da participação social igualitária, de políticas públicas de benefício universal, abertas às pessoas todas, nativas e estrangeiras. II) Dessa forma, com apoio da narrativa de um refugiado, este estudo se propôs analisar traços psicossociais ligados à experiência do refúgio e avaliá-los enquanto fatores de desenraizamento e enraizamento. III) Estes traços foram retirados de narrativas dos próprios refugiados (narrativas guardadas de várias pequenas conversas e, posteriormente, registradas de uma longa entrevista semiaberta). A entrevista foi estruturada de forma a colher lembranças e memórias, mais do que opiniões. IV) Esta pesquisa está composta primeiramente por 1) um breve apanhado teórico pensado a partir do contato com os refugiados, cujo desenvolvimento baseou-se em autores como Hannah Arendt, Simone Weil, Ecléa Bosi, Gonçalves Filho, Achille Mbembe, Kabengele Munanga, Lilia Schwarcz e Zygmunt Bauman; e, finalmente, pela 2) análise da narrativa de nosso depoente, orientada por estudos de memória em Psicologia Social e elaborada em conjunto com estes autores. V) Da interpretação do depoimento emergiram questões que sintetizam nossos resultados: a) o refúgio é fundamentalmente político; b) o nível de desenraizamento pode ser reduzido quanto maior a participação do sujeito em seu deslocamento; c) o país destino não é apenas sinônimo de colo; d) o refugiado negro está em dupla condição de rebaixamento; e) no refúgio a errância é também psicológica; f) o presente e o futuro têm suas raízes no passado e são mediados pela memória e g) apenas em comunidade, através da participação efetiva, o refugiado poderá enraizar-se em novo solo. VI) Esta investigação assumiu caráter piloto, pretendendo ser continuada em regime de doutorado, onde contará então com outros depoentes, além de hipóteses, instrumentos e método testados.
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Apesar de sermos um país visto como plural e acolhedor, não asseguramos abraçar e conviver com as diferenças; os antagonismos de classe, associados a outros antagonismos de grupos, assinalam as persistentes relações de dominação entre nós. Um refugiado, forçado a abandonar seu país por ameaças contra sua vida (noção que será empregada no sentido, sobretudo, econômico e biológico) e contra sua dignidade (no sentido ético e político) irá, no Brasil, inserir-se noutras situações ameaçadoras mais do que apenas encontrar abrigo material e moral. Se não dispuser de fundos rentistas ou privilégios de classe e de mando, dependerá de uma proteção que não é trazida: a proteção de uma comunidade, de uma rede de trocas, da participação social igualitária, de políticas públicas de benefício universal, abertas às pessoas todas, nativas e estrangeiras. II) Dessa forma, com apoio da narrativa de um refugiado, este estudo se propôs analisar traços psicossociais ligados à experiência do refúgio e avaliá-los enquanto fatores de desenraizamento e enraizamento. III) Estes traços foram retirados de narrativas dos próprios refugiados (narrativas guardadas de várias pequenas conversas e, posteriormente, registradas de uma longa entrevista semiaberta). A entrevista foi estruturada de forma a colher lembranças e memórias, mais do que opiniões. IV) Esta pesquisa está composta primeiramente por 1) um breve apanhado teórico pensado a partir do contato com os refugiados, cujo desenvolvimento baseou-se em autores como Hannah Arendt, Simone Weil, Ecléa Bosi, Gonçalves Filho, Achille Mbembe, Kabengele Munanga, Lilia Schwarcz e Zygmunt Bauman; e, finalmente, pela 2) análise da narrativa de nosso depoente, orientada por estudos de memória em Psicologia Social e elaborada em conjunto com estes autores. V) Da interpretação do depoimento emergiram questões que sintetizam nossos resultados: a) o refúgio é fundamentalmente político; b) o nível de desenraizamento pode ser reduzido quanto maior a participação do sujeito em seu deslocamento; c) o país destino não é apenas sinônimo de colo; d) o refugiado negro está em dupla condição de rebaixamento; e) no refúgio a errância é também psicológica; f) o presente e o futuro têm suas raízes no passado e são mediados pela memória e g) apenas em comunidade, através da participação efetiva, o refugiado poderá enraizar-se em novo solo. VI) Esta investigação assumiu caráter piloto, pretendendo ser continuada em regime de doutorado, onde contará então com outros depoentes, além de hipóteses, instrumentos e método testados.I) Violence, arbitrary governments, political instability, armed conflicts, religious persecution, economic crisis and misery are examples of what the generalized violation of human rights is capable of. Data from the United Nations High Commission for Refugees (UNHCR) show that about 89.3 million people were in situation of forced displacement in 2021. In the past years, the refuge problem has been increasing significantly due to the dimension of migratory flows, where people see no other option but to migrate. Although Brazil is considered as a plural and welcoming country, its population dont really embrace the differences; the class antagonisms, associated to other group antagonisms, point the persistent power dynamics in the relationships. In Brazil, a refugee, forced to leave their country due to threats against their lives (notion that will be treated mainly in the economic and biologic sense) and against their dignity (in the ethical and political sense), will find themselves in other threatening situations, rather than only find material and moral shelter. If there are no income sources or class privileges, they will depend on a protection that it is not assured: the protection of the community, he exchange network, the equitable social participation and of public policies of universal benefits, open to all, natives and foreigners. II) Therefore, based on a refugees narrative, this research aims to analyse the psychosocial traits linked to the experience of the refuge and evaluate them as factors of uprooting and rooting. III) These traits were taken from the narratives of the refugees themselves (narratives of short conversations and, later on, recorded on semi structured interviews). IV) This research is composed primarily of 1) a brief theoretical section conceived from the contact with the refugees, and developed based on authors like Hannah Arendt, Simone Weil, Ecléa Bosi, Gonçalves Filho, Achille Mbembe, Kabengele Munanga, Lilia Schwarcz and Zygmunt Bauman; and finally, by the 2) analysis of the narrative of the deponent, also elaborated in conjunction with the authors. V) From the interpretation of the interview, the emerged issues that summarize our results are: a) the refuge in fundamentally political; b) the level of uprooting can be reduced according to the level of participation of the subject in their displacement; c) the country of destination is not only a shelter; d) the black refugee is in a double condition of relegation; e) in the refuge, the wandering is also psychological; f) the present and the future are mediated through memory and g) only within a community, with effective participation, the refugee will be able to root in the new country. VI) This investigation assumed a pilot nature, intended to be continued in a doctoral research, where it will count on other deponents, besides of hypothesis, instruments and tested methods.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPGoncalves Filho, Jose MouraViana, Tamires de Souza2023-04-28info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47134/tde-30082023-122216/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2023-09-15T20:52:02Zoai:teses.usp.br:tde-30082023-122216Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212023-09-15T20:52:02Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
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