Silenciamento e abandono: uma abordagem pela voz
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2022 |
Tipo de documento: | Tese |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP |
Texto Completo: | https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47133/tde-31012023-120317/ |
Resumo: | A pesquisa tem como objetivo uma abordagem psicanalítica das experiências de solidão e isolamento social em vigência na atualidade, que já alcançam níveis epidêmicos, com significativos prejuízos à saúde física e psíquica, como também ao laço social e a vida em comunidade. Adotamos o conceito de voz como chave de leitura, propondo uma passagem dos termos solidão e isolamento social, para as noções de silenciamento e abandono. A pesquisa se divide em quatro partes. Na primeira, partimos do fenômeno dos Hikikomori, casos extremos de silenciamento e abandono, em que jovens se retiram da vida social e se isolam em seus quartos por anos e até décadas. Inicialmente entendida como síndrome cultural japonesa, hoje sabe-se que o fenômeno se espalha por outros países ao redor do mundo. Destacamos, como traço clínico decisivo, uma recusa da experiência da voz, situando esses casos como desafio ao psicanalista, seja pela recusa em buscar tratamento, seja pela limitação que apresentam em sua associação livre e formulação de demandas. Interrogamos então: o que pode a cura pela palavra, diante de pacientes que se recusam a falar? Na segunda parte, enfrentamos a hipótese da tecnologia como causadora de tais fenômenos. Propomos a leitura da atual relação do humano com a tecnologia como uma confluência assintótica entre duas tendências: a humanização da máquina - como produção de dispositivos tecnológicos que imitam a capacidade relacional do humano, se oferecendo como possíveis interlocutores e a robotização do humano processos de degradação da relação do sujeito com a fala, reduzindo a competência simbólica da linguagem a padrões repetitivos e simplificados de comunicação, afeitos à racionalidade digital. Como efeito dessas tendências, destacamos a crescente indiferenciação entre humano e máquina, e um consequente silenciamento da voz no humano. Na terceira parte, retomamos o texto freudiano sobre os chistes, articulando-o às peças de William Shakespeare para localizar a voz em uma dupla asserção: como algo que opera para o sujeito uma passagem e abertura, tanto quanto como uma particular fonte de prazer que escapa ao peso da censura superegóica. Da obra de Giorgio Agamben, resgatamos o sintagma experimentum linguae, e sua posterior 13 passagem a um experimentum vocis, como índices da potência ética e política da voz, articulando a possibilidade de que cada sujeito possa fazer da voz uma experiência de passagem e encontro com o impossível, e com a potência que daí pode emergir. Por fim, fundamentados pela psicanálise de Freud e Lacan, e pelas elaborações de Alain DidierWeill e Stephen Frosh sobre o tema da voz, propomos uma abordagem topológica de tais casos. Formulamos a proposta de uma variação da topologia da garrafa de Klein, apresentada em sua forma de figura-de-oito. Apoiados nela, sustentamos a proposta de uma clínica da voz, como tratamento possível a casos de silenciamento, e argumentamos por uma ética do chamado, e uma política ressonante, como função e campo possíveis ao psicanalista hoje, conduzindo seu ato ao estatuto de um chamado, capaz de invocar o sujeito para se valer da voz no ato de fala, possibilitando-lhe assumir uma nova posição |
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Destacamos, como traço clínico decisivo, uma recusa da experiência da voz, situando esses casos como desafio ao psicanalista, seja pela recusa em buscar tratamento, seja pela limitação que apresentam em sua associação livre e formulação de demandas. Interrogamos então: o que pode a cura pela palavra, diante de pacientes que se recusam a falar? Na segunda parte, enfrentamos a hipótese da tecnologia como causadora de tais fenômenos. Propomos a leitura da atual relação do humano com a tecnologia como uma confluência assintótica entre duas tendências: a humanização da máquina - como produção de dispositivos tecnológicos que imitam a capacidade relacional do humano, se oferecendo como possíveis interlocutores e a robotização do humano processos de degradação da relação do sujeito com a fala, reduzindo a competência simbólica da linguagem a padrões repetitivos e simplificados de comunicação, afeitos à racionalidade digital. Como efeito dessas tendências, destacamos a crescente indiferenciação entre humano e máquina, e um consequente silenciamento da voz no humano. Na terceira parte, retomamos o texto freudiano sobre os chistes, articulando-o às peças de William Shakespeare para localizar a voz em uma dupla asserção: como algo que opera para o sujeito uma passagem e abertura, tanto quanto como uma particular fonte de prazer que escapa ao peso da censura superegóica. Da obra de Giorgio Agamben, resgatamos o sintagma experimentum linguae, e sua posterior 13 passagem a um experimentum vocis, como índices da potência ética e política da voz, articulando a possibilidade de que cada sujeito possa fazer da voz uma experiência de passagem e encontro com o impossível, e com a potência que daí pode emergir. Por fim, fundamentados pela psicanálise de Freud e Lacan, e pelas elaborações de Alain DidierWeill e Stephen Frosh sobre o tema da voz, propomos uma abordagem topológica de tais casos. Formulamos a proposta de uma variação da topologia da garrafa de Klein, apresentada em sua forma de figura-de-oito. Apoiados nela, sustentamos a proposta de uma clínica da voz, como tratamento possível a casos de silenciamento, e argumentamos por uma ética do chamado, e uma política ressonante, como função e campo possíveis ao psicanalista hoje, conduzindo seu ato ao estatuto de um chamado, capaz de invocar o sujeito para se valer da voz no ato de fala, possibilitando-lhe assumir uma nova posiçãoThe research aims at a psychoanalytical approach to the experiences of loneliness and social isolation in force nowadays, which have already reached epidemic levels, with significant damage to physical and psychological health, as well as to the social bond and communitary life. We adopted the concept of voice as a reading key, proposing a passage from the terms loneliness and social isolation to the notions of silencing and abandonment. The research is divided into four parts. In the first, we start from the phenomenon of the Hikikomori, extreme cases of silencing and abandonment, in which young people withdraw from social life and isolate themselves in their rooms for years and even decades. Initially understood as a Japanese cultural syndrome, today it is known that the phenomenon spreads to other countries around the world. We highlight, as a decisive clinical feature, a refusal of the experience of the voice, situating these cases as a challenge to the psychoanalyst, either by their refusal to seek treatment or by the limitation presented in their free association and formulation of demands. We then ask: what can a talking cure possibly offer, when faced with patients who refuse to speak? In the second part, we confront the hypothesis of technology as the cause of such phenomena. We propose the reading of the current relationship between humans and technology as an asymptotic confluence between two tendencies: the humanization of the machine - as the production of technological devices that imitate the relational capacity of humans, offering themselves as possible interlocutors - and the robotization of the human - processes of degradation of the subject\'s relationship with speech, reducing the symbolic competence of language to repetitive and simplified patterns of communication, suited to digital rationality. As an effect of these tendencies, we highlight the growing indifferentiation between human and machine, and a consequent silencing of the voice in the human. In the third part, we return to the Freudian text on the jokes, articulating it to William Shakespeare\'s plays to locate the voice in a double assertion: as something that operates for the subject a passage and opening, as well as a particular source of pleasure that escapes the weight of the superegoic censorship. From the work of Giorgio Agamben, 15 we rescue the experimentum linguae, and its subsequent passage to an experimentum vocis, as indexes of the ethical and political potency of the voice, articulating the possibility that each subject can make of the voice an experience of passage and encounter with the impossible, and with the potency that can emerge from it. Finally, based on Freudian and Lacanian psychoanalysis, and on the elaborations of Alain Didier-Weill and Stephen Frosh on the theme of voice, we propose a topological approach to such cases. We formulate the proposal of a variation of Klein\'s bottle topology, presented in its figureof-eight form. Based on it, we support the proposal of a clinic of the voice, as a possible treatment to cases of silencing, and we argue for an ethics of the call, and a resonant politics, as a possible function and field for the psychoanalyst today, conducting his act to the statute of a call, capable of invoking the subject to make use of the voice in the speech act, enabling him to assume a new positionBiblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPMoretto, Maria Livia TourinhoAkimoto Junior, Cláudio Kazuo2022-11-21info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/doctoralThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47133/tde-31012023-120317/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2023-02-06T12:37:13Zoai:teses.usp.br:tde-31012023-120317Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212023-02-06T12:37:13Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false |
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