O direito das plataformas: procedimento, legitimidade e constitucionalização na regulação privada da liberdade de expressão na internet
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2020 |
Tipo de documento: | Dissertação |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP |
Texto Completo: | https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2139/tde-02052021-222935/ |
Resumo: | Esta é uma dissertação sobre o papel que os atores privados exercem na regulação da liberdade de expressão. Em específico, ela investiga o funcionamento da moderação de conteúdo das plataformas da internet, o mecanismo decisório estruturado pelas empresas que estão por trás de espaços como o Facebook, o YouTube e o Twitter para controlar aquilo que as pessoas podem dizer. Para fazer isso, o trabalho parte, no Capítulo 1, de um problema, baseado em duas constatações. Primeiro, a de que as transformações tecnológicas que fizeram com que as pessoas utilizassem redes sociais como o Facebook para se expressar não criaram apenas novos espaços de manifestação - as plataformas da internet -, mas também se traduziram em novos espaços de decisão - estruturas que, integradas às plataformas, são mantidas pelas empresas que as criaram para exercer poder sobre aquilo que as pessoas dizem ali. Segundo, a de que esse mecanismo privado de regulação da liberdade de expressão tem se transformado de um modo que desafia, com sucesso, a forma como ele é compreendido. Em particular, as plataformas da internet têm transitado de um modelo decisório antes caracterizado pela opacidade, pela ausência de participação dos seus usuários e pela irrecorribilidade de suas decisões, para outro, marcado por procedimentos transparentes, que viabilizam a participação dos usuários e que tornam possível questionar - até mesmo para instâncias externas e independentes - suas decisões. Que razões existiriam para que as plataformas, depois de desenvolverem um sistema próprio de moderação de conteúdo - construído para que tivessem o total controle sobre os espaços virtuais que administram - agora se empenhassem em transformá-lo, perdendo, com isso o domínio que têm sobre o que é dito na internet? Por que essas empresas estão abrindo mão do seu poder? A dissertação se propõe a responder a essas perguntas em dois passos: primeiro, no Capítulo 2, empreendendo uma investigação a respeito de como os mecanismos de moderação de conteúdo funcionam, sistematizando-os para lançar luz à forma como essas decisões são tomadas. Segundo, utilizando a sociologia jurídica - e, em particular, a Teoria dos Sistemas, justificada e reconstruída, respectivamente, nos Capítulos 3 e 4 - para entender as razões por trás desse movimento de transformação. Para isso, o trabalho acopla o funcionalismo estrutural de Niklas Luhmann - capaz de identificar o papel que essa forma de tomar decisões tem em seu lugar de origem, o Estado - com o aporte feito à teoria por Gunther Teubner - que, reinterpretando o pluralismo jurídico sob uma perspectiva sistêmica, tornou a Teoria dos Sistemas capaz de analisar o direito também como um fenômeno não-estatal. Construída essa estrutura analítica, o Capítulo 5 da dissertação sustenta que a utilização de técnicas procedimentais estatais para tomar decisões nas plataformas tem dois significados: primeiro, essa é uma solução para um problema de falta de legitimidade decisória, porque procedimentos transparentes e participativos levam as pessoas - tanto nos Estados, quanto nas plataformas - a aceitarem as decisões, mesmo que lhes sejam desfavoráveis. Segundo, ela é parte de um movimento mais amplo, uma manifestação da constitucionalização do mundo digital, pela qual as plataformas da internet se mobilizam para adotar formas procedimentais capazes de imunizar as decisões da moderação de conteúdo da intervenção de outros atores institucionais que atuam regulando a liberdade de expressão, como o Estado. O trabalho conclui, portanto, que por trás dessa transformação inexplicada há um tradeoff oculto que a justifica: quanto maior a autonomia que as plataformas conferem à moderação de conteúdo, construindo procedimentos que a aproximam do modelo decisório do Estado, mais ela se constitui como um direito propriamente dito - o Direito das Plataformas - vocacionando-se a ser legítimo e independente em relação às influências tanto internas quanto externas à estrutura empresarial que o criou. |
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O direito das plataformas: procedimento, legitimidade e constitucionalização na regulação privada da liberdade de expressão na internetThe law of the platforms: procedure, legitimacy and constitutionalization in the private regulation of the freedom of expression on the internetCensuraComunicação digitalContent moderationFreedom of expressionInternetInternet platformsLiberdade de expressão (Controle)Niklas LuhmannRedes sociaisSociologia jurídicaSociology of lawEsta é uma dissertação sobre o papel que os atores privados exercem na regulação da liberdade de expressão. Em específico, ela investiga o funcionamento da moderação de conteúdo das plataformas da internet, o mecanismo decisório estruturado pelas empresas que estão por trás de espaços como o Facebook, o YouTube e o Twitter para controlar aquilo que as pessoas podem dizer. Para fazer isso, o trabalho parte, no Capítulo 1, de um problema, baseado em duas constatações. Primeiro, a de que as transformações tecnológicas que fizeram com que as pessoas utilizassem redes sociais como o Facebook para se expressar não criaram apenas novos espaços de manifestação - as plataformas da internet -, mas também se traduziram em novos espaços de decisão - estruturas que, integradas às plataformas, são mantidas pelas empresas que as criaram para exercer poder sobre aquilo que as pessoas dizem ali. Segundo, a de que esse mecanismo privado de regulação da liberdade de expressão tem se transformado de um modo que desafia, com sucesso, a forma como ele é compreendido. Em particular, as plataformas da internet têm transitado de um modelo decisório antes caracterizado pela opacidade, pela ausência de participação dos seus usuários e pela irrecorribilidade de suas decisões, para outro, marcado por procedimentos transparentes, que viabilizam a participação dos usuários e que tornam possível questionar - até mesmo para instâncias externas e independentes - suas decisões. Que razões existiriam para que as plataformas, depois de desenvolverem um sistema próprio de moderação de conteúdo - construído para que tivessem o total controle sobre os espaços virtuais que administram - agora se empenhassem em transformá-lo, perdendo, com isso o domínio que têm sobre o que é dito na internet? Por que essas empresas estão abrindo mão do seu poder? A dissertação se propõe a responder a essas perguntas em dois passos: primeiro, no Capítulo 2, empreendendo uma investigação a respeito de como os mecanismos de moderação de conteúdo funcionam, sistematizando-os para lançar luz à forma como essas decisões são tomadas. Segundo, utilizando a sociologia jurídica - e, em particular, a Teoria dos Sistemas, justificada e reconstruída, respectivamente, nos Capítulos 3 e 4 - para entender as razões por trás desse movimento de transformação. Para isso, o trabalho acopla o funcionalismo estrutural de Niklas Luhmann - capaz de identificar o papel que essa forma de tomar decisões tem em seu lugar de origem, o Estado - com o aporte feito à teoria por Gunther Teubner - que, reinterpretando o pluralismo jurídico sob uma perspectiva sistêmica, tornou a Teoria dos Sistemas capaz de analisar o direito também como um fenômeno não-estatal. Construída essa estrutura analítica, o Capítulo 5 da dissertação sustenta que a utilização de técnicas procedimentais estatais para tomar decisões nas plataformas tem dois significados: primeiro, essa é uma solução para um problema de falta de legitimidade decisória, porque procedimentos transparentes e participativos levam as pessoas - tanto nos Estados, quanto nas plataformas - a aceitarem as decisões, mesmo que lhes sejam desfavoráveis. Segundo, ela é parte de um movimento mais amplo, uma manifestação da constitucionalização do mundo digital, pela qual as plataformas da internet se mobilizam para adotar formas procedimentais capazes de imunizar as decisões da moderação de conteúdo da intervenção de outros atores institucionais que atuam regulando a liberdade de expressão, como o Estado. O trabalho conclui, portanto, que por trás dessa transformação inexplicada há um tradeoff oculto que a justifica: quanto maior a autonomia que as plataformas conferem à moderação de conteúdo, construindo procedimentos que a aproximam do modelo decisório do Estado, mais ela se constitui como um direito propriamente dito - o Direito das Plataformas - vocacionando-se a ser legítimo e independente em relação às influências tanto internas quanto externas à estrutura empresarial que o criou.This is a dissertation about the role that private actors play in regulating freedom of expression. Specifically, it investigates how content moderation - the decision-making mechanism structured by the companies behind spaces like Facebook, YouTube and Twitter to control what people can say - works on Internet platforms. In order to do this, it starts, in Chapter 1, with a problem based on two findings. First, it states that the technological transformations that made people use social networks like Facebook to express themselves not only created new spaces for manifestation - the internet platforms - but also new spaces for decision-making - structures that, integrated to the platforms, were created by the companies to exercise power over what people say. Second, that this private mechanism that regulates freedom of expression has been transformed in a way that successfully challenges our thoughts about it. In particular, Internet platforms have shifted from a decision-making model previously characterized by opacity, lack of user participation, and impossibility of appeal, to one marked by transparent procedures that enable users to participate and even to question these decisions. What reasons would exist for platforms, after developing their own content moderation system - designed so they would have full control over the spaces managed by them - now strive to transform it, thereby losing their dominance over them? Why are these companies giving up their power? This dissertation intends to answer these questions in two steps: first, in Chapter 2, by undertaking an investigation into how content moderation mechanisms work, systematizing them and shedding light on how these decisions are made. Second, using sociology of Law - and, in particular, Systems Theory, justified and reconstructed respectively in Chapters 3 and 4 - to understand the reasons behind this platform-driven movement of transformation. In order to do this, this work couples the structural functionalism of Niklas Luhmann - which is able to identify the role that this form of decision-making has in its place of origin, the State - with the contributions made to the theory by Gunther Teubner - who, reinterpreting the legal pluralism from a systemic perspective, made Systems Theory capable of analyzing law as a non-state phenomenon. Having built this analytical framework, Chapter 5 of the dissertation holds that the use of state procedural techniques in platform decisions has two meanings. First, it is a solution for a problem of lack of decision-making legitimacy, as transparent and participatory procedures lead people - in States, as well as in platforms - to accept decisions, even if they are unfavorable to them. Second, this transition is part of a larger movement of constitutionalization of the digital world, by which internet platforms adopt procedural forms capable of immunizing their content moderation decisions from the intervention of other institutional actors that regulate freedom of expression. This work concludes that, behind this unexplained transformation, there is a tradeoff that justifies it: the greater the autonomy that platforms give to content moderation, the more it constitutes itself as a kind of Law - the Law of Platforms - becoming both legitimate and autonomous regarding the influences that are internal and external to the corporate structure that created it.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPVillas Bôas Filho, OrlandoRamos, Carlos Eduardo Vieira2020-08-21info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttps://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2139/tde-02052021-222935/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2023-05-02T12:59:11Zoai:teses.usp.br:tde-02052021-222935Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212023-05-02T12:59:11Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false |
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Esta é uma dissertação sobre o papel que os atores privados exercem na regulação da liberdade de expressão. Em específico, ela investiga o funcionamento da moderação de conteúdo das plataformas da internet, o mecanismo decisório estruturado pelas empresas que estão por trás de espaços como o Facebook, o YouTube e o Twitter para controlar aquilo que as pessoas podem dizer. Para fazer isso, o trabalho parte, no Capítulo 1, de um problema, baseado em duas constatações. Primeiro, a de que as transformações tecnológicas que fizeram com que as pessoas utilizassem redes sociais como o Facebook para se expressar não criaram apenas novos espaços de manifestação - as plataformas da internet -, mas também se traduziram em novos espaços de decisão - estruturas que, integradas às plataformas, são mantidas pelas empresas que as criaram para exercer poder sobre aquilo que as pessoas dizem ali. Segundo, a de que esse mecanismo privado de regulação da liberdade de expressão tem se transformado de um modo que desafia, com sucesso, a forma como ele é compreendido. Em particular, as plataformas da internet têm transitado de um modelo decisório antes caracterizado pela opacidade, pela ausência de participação dos seus usuários e pela irrecorribilidade de suas decisões, para outro, marcado por procedimentos transparentes, que viabilizam a participação dos usuários e que tornam possível questionar - até mesmo para instâncias externas e independentes - suas decisões. Que razões existiriam para que as plataformas, depois de desenvolverem um sistema próprio de moderação de conteúdo - construído para que tivessem o total controle sobre os espaços virtuais que administram - agora se empenhassem em transformá-lo, perdendo, com isso o domínio que têm sobre o que é dito na internet? Por que essas empresas estão abrindo mão do seu poder? A dissertação se propõe a responder a essas perguntas em dois passos: primeiro, no Capítulo 2, empreendendo uma investigação a respeito de como os mecanismos de moderação de conteúdo funcionam, sistematizando-os para lançar luz à forma como essas decisões são tomadas. Segundo, utilizando a sociologia jurídica - e, em particular, a Teoria dos Sistemas, justificada e reconstruída, respectivamente, nos Capítulos 3 e 4 - para entender as razões por trás desse movimento de transformação. Para isso, o trabalho acopla o funcionalismo estrutural de Niklas Luhmann - capaz de identificar o papel que essa forma de tomar decisões tem em seu lugar de origem, o Estado - com o aporte feito à teoria por Gunther Teubner - que, reinterpretando o pluralismo jurídico sob uma perspectiva sistêmica, tornou a Teoria dos Sistemas capaz de analisar o direito também como um fenômeno não-estatal. Construída essa estrutura analítica, o Capítulo 5 da dissertação sustenta que a utilização de técnicas procedimentais estatais para tomar decisões nas plataformas tem dois significados: primeiro, essa é uma solução para um problema de falta de legitimidade decisória, porque procedimentos transparentes e participativos levam as pessoas - tanto nos Estados, quanto nas plataformas - a aceitarem as decisões, mesmo que lhes sejam desfavoráveis. Segundo, ela é parte de um movimento mais amplo, uma manifestação da constitucionalização do mundo digital, pela qual as plataformas da internet se mobilizam para adotar formas procedimentais capazes de imunizar as decisões da moderação de conteúdo da intervenção de outros atores institucionais que atuam regulando a liberdade de expressão, como o Estado. O trabalho conclui, portanto, que por trás dessa transformação inexplicada há um tradeoff oculto que a justifica: quanto maior a autonomia que as plataformas conferem à moderação de conteúdo, construindo procedimentos que a aproximam do modelo decisório do Estado, mais ela se constitui como um direito propriamente dito - o Direito das Plataformas - vocacionando-se a ser legítimo e independente em relação às influências tanto internas quanto externas à estrutura empresarial que o criou. |
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