O declínio da transmissão na formação: notas psicanalíticas.

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Batista, Douglas Emiliano
Data de Publicação: 2009
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP
Texto Completo: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-29042009-150003/
Resumo: A presente dissertação inscreve-se no campo das conexões entre psicanálise e educação e tem como objetivo analisar o declínio contemporâneo da transmissão na formação. Para tanto, buscamos na psicanálise e também na filosofia uma rede de conceitos capaz de circunscrever o fato de que a subjetividade de um recém-chegado ao mundo é necessariamente fecundada pelos mais velhos, pelos que já se encontravam antes no mundo, e o que demanda a transmissão não apenas de conteúdos mas de marcas inconscientes que testemunham a divisão psíquica do adulto e, portanto, a impossibilidade desse adulto tudo dizer à criança. E é em vista dessa impossibilidade do adulto tudo (se) dizer, que então se torna possível transmitir inconscientemente ao infans (que não fala) a impossibilidade de tão só ouvir (ou tudo ouvir, e o que, no limite, seria exatamente o mesmo que não ouvir absolutamente nada), ensejando assim ao pequeno que, uma vez tomado por esse conflito psíquico humanizante, chegue um dia se pronunciar como um sujeito (um sujeito portanto cindido), isto é, como alguém que tanto deseja falar quanto ouvir porque sabe que não está à altura de dar a última palavra (aquela que tanto o emudeceria cabalmente quanto a seus ouvintes). Mas, ao contrário do que supõe a pedagogia hodierna, não é porque não podemos (felizmente!) tudo dizer às crianças que não devemos nada lhes dizer, esperando assim que elas falem por si mesmas e tal como se a presença do adulto nada tivesse a ver com isso, ou como se essa fala nova não fosse função da transferência da criança aos velhos. A (psico)pedagogia contemporânea pretende que a criança seja estimulada a falar naturalmente e quando for chegada a justa hora, a hora própria do amadurecimento das capacidades interiores. Mas se fosse assim, por que então falaríamos a elas fora de hora, isto é, antes da hora, e às vezes apenas para fazer hora até que elas eventualmente respondam? E por que depois continuamos então lhes falando, e ela a nós? Por sermos naturalmente tagarelas? Ou por que isso cavouca em nós a nossa conflitante divisão psíquica que nos foi inseminada simbolicamente por alguém primordial, alguém que não se calou de todo muito embora não pudesse estar de todo certo acerca do teor mesmo de sua fala (e que, assim, acabou transmitindo um lugar para um outro se filiar e depois (se) falar como um outro)? Eis que o declínio da transmissão na formação na contemporaneidade deriva assim da psicologização generalizada da pedagogia e da educação, e graças ao que as prerrogativas simbólicas de formação e transmissão não apenas por parte dos adultos em âmbito familiar como também por parte do dispositivo escolar e, portanto, dos professores em vista de seus alunos - deram lugar a postulados que acabaram substituindo a formação cultural pelo desenvolvimento natural, e o que tanto conduziu à descaracterização da escola quanto à pauperização e à banalização do currículo escolar, criando mediante isso mais obstáculos para o estabelecimento da diferença simbólica entre as gerações.
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E é em vista dessa impossibilidade do adulto tudo (se) dizer, que então se torna possível transmitir inconscientemente ao infans (que não fala) a impossibilidade de tão só ouvir (ou tudo ouvir, e o que, no limite, seria exatamente o mesmo que não ouvir absolutamente nada), ensejando assim ao pequeno que, uma vez tomado por esse conflito psíquico humanizante, chegue um dia se pronunciar como um sujeito (um sujeito portanto cindido), isto é, como alguém que tanto deseja falar quanto ouvir porque sabe que não está à altura de dar a última palavra (aquela que tanto o emudeceria cabalmente quanto a seus ouvintes). Mas, ao contrário do que supõe a pedagogia hodierna, não é porque não podemos (felizmente!) tudo dizer às crianças que não devemos nada lhes dizer, esperando assim que elas falem por si mesmas e tal como se a presença do adulto nada tivesse a ver com isso, ou como se essa fala nova não fosse função da transferência da criança aos velhos. A (psico)pedagogia contemporânea pretende que a criança seja estimulada a falar naturalmente e quando for chegada a justa hora, a hora própria do amadurecimento das capacidades interiores. Mas se fosse assim, por que então falaríamos a elas fora de hora, isto é, antes da hora, e às vezes apenas para fazer hora até que elas eventualmente respondam? E por que depois continuamos então lhes falando, e ela a nós? Por sermos naturalmente tagarelas? Ou por que isso cavouca em nós a nossa conflitante divisão psíquica que nos foi inseminada simbolicamente por alguém primordial, alguém que não se calou de todo muito embora não pudesse estar de todo certo acerca do teor mesmo de sua fala (e que, assim, acabou transmitindo um lugar para um outro se filiar e depois (se) falar como um outro)? Eis que o declínio da transmissão na formação na contemporaneidade deriva assim da psicologização generalizada da pedagogia e da educação, e graças ao que as prerrogativas simbólicas de formação e transmissão não apenas por parte dos adultos em âmbito familiar como também por parte do dispositivo escolar e, portanto, dos professores em vista de seus alunos - deram lugar a postulados que acabaram substituindo a formação cultural pelo desenvolvimento natural, e o que tanto conduziu à descaracterização da escola quanto à pauperização e à banalização do currículo escolar, criando mediante isso mais obstáculos para o estabelecimento da diferença simbólica entre as gerações.This work belongs to the field of possible connections between psychoanalysis and education and its purpose is to analyze the contemporary decline of the transmission in the education. We searched a net of concepts inside psychoanalysis and also philosophy in order to circumscribe the fact that the subjectivity of a new comer into the world is necessarily impregnated by the older ones, those who were already in the world. Besides, the transmission also requires not only knowledge but unconscious marks that testify the psychic division of the adult and, therefore, the impossibility of this adult to say everything to the child. This same impossibility of the adult to say everything is what makes possible for him to unconsciously transmit to the infans (the one that doesnt speak) the impossibility of just listening (or listen to everything, which is the same of not listening anything at all), allowing the little one to get to speak as subject, once he is affected by this psychic humanizing conflict. That means that he is necessarily going to be a split subject, someone who desire to speak and also to hear because he knows that he is not able to say the last word (the one that would make him and his listeners speechless at all). However, differently from what the contemporary pedagogy believes, not being able to say everything to the children does not mean that we shouldnt say anything at all, does not mean that we should wait for them to speak for themselves as if the presence of the adult had nothing to do with it, as if this new speech was not the consequence of the childs transference toward the older ones. The contemporary (psycho)pedagogy intend to stimulate the child to speak naturally and at the exact time, the time of the development of the inner capacities. But if it worked like that, why we would speak to the children before this exact time, and sometimes only to spare or even to gain time waiting until they eventually answer? And why do we keep talking to them and vice-versa? Just because we enjoy talking a lot? Or because this drive causes our conflictive psychic division which was impregnated in us by a primordial adult, someone that didnt stayed quiet (and by that accomplished the transmission of a place from where another being can be part of a heritage and can be able to speak as any other)? The decline of the transmission in the contemporary education comes from the fact that, nowadays, psychology rules in the field of pedagogy and education. Also, it is a consequence of the fact that either in family education as at school, cultural formation gave place to natural development. This substitution lead to the descharacterization of school and also the reduction of the curriculum, what creates more obstacles to the establishment of the symbolic difference between generation.Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USPLajonquière, Leandro deBatista, Douglas Emiliano2009-01-28info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttp://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-29042009-150003/reponame:Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USPinstname:Universidade de São Paulo (USP)instacron:USPLiberar o conteúdo para acesso público.info:eu-repo/semantics/openAccesspor2016-07-28T16:10:00Zoai:teses.usp.br:tde-29042009-150003Biblioteca Digital de Teses e Dissertaçõeshttp://www.teses.usp.br/PUBhttp://www.teses.usp.br/cgi-bin/mtd2br.plvirginia@if.usp.br|| atendimento@aguia.usp.br||virginia@if.usp.bropendoar:27212016-07-28T16:10Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP - Universidade de São Paulo (USP)false
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