Modalidade epistémica e persistência

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Marques, Rui
Data de Publicação: 2022
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: https://ojs.letras.up.pt/index.php/EL/article/view/12819
Resumo: A adição de bem a uma proposição modalizada, como em é bem possível que ele já tenha saído, aumenta o grau de convicção veiculado. Aparentemente, este reforço epistémico decorrente da presença de bem corresponde à expressão de um grau de crença mais elevado do que o que é expresso sem bem. Concretamente, enquanto ser possível que p indica que p é uma possibilidade, ser bem possível que p indicará que p é uma boa possibilidade A ser assim, o significado de construções resultantes da adição de bem a uma proposição modalizada pode ser captado no quadro da análise da modalidade em Krazter (1991, e.o.), que considera diferentes graus de modalidade expressáveis pelas línguas naturais, entre os quais o de possibilidade e o de boa possibilidade. Deste modo, será compreensível que bem possa coocorrer com operadores modais fracos, como ser possível, poder, ou ser capaz, mas não com modais fortes, como dever ou ter de, dado que estes últimos já codificam um valor forte, sendo normal que o mesmo não possa ser reforçado com a adição de bem. No entanto, há contra-argumentos a esta hipótese, que, entre outros problemas, não permitem explicar porque é que bem pode coocorrer com vários tipos de operadores modais ou verbos de atitude proposicional que expressam um valor epistémico forte, como, e.g., certo, em é bem certo!, ou saber, em ele sabe bem que está atrasado. Assim, levantam-se duas questões: (i) como explicar o reforço epistémico resultante da adição de bem a uma frase com um operador modal epistémico? (ii) por que razão bem se pode combinar com alguns operadores modais epistémicos, mas não com todos? É apresentada e explorada uma hipótese alternativa, de acordo com a qual bem não contribui para as condições de verdade da frase, antes desempenhando uma função a nível discursivo. Concretamente, a hipótese defendida é que a adição de bem a uma proposição modalizada indica a expetativa de que essa proposição se mantenha válida com a continuação do discurso. Ou seja, bem tem a função de tornar persistente a proposição em que ocorre. Assumindo esta hipótese, o significado das construções resultantes da adição de bem a uma frase modalizada é captável por uma análise da modalidade no quadro da semântica dinâmica, em que o significado de uma frase é concebido como o potencial que essa frase apresenta para atualizar a informação do contexto (ou estado de informação) relativamente ao qual é asserida. Esta análise permite responder às duas questões consideradas. O reforço epistémico concretizado pela adição de bem corresponde à veiculação da expetativa de que a proposição modalizada se mantenha válida com o avanço do discurso. A razão para bem poder coocorrer com alguns operadores epistémicos, mas não com todos, decorrerá do tipo de estado epistémico descrito pela frase com cada um deles. Como previsto pela hipótese em causa, bem não pode coocorrer com operadores modais que expressam uma inferência decorrente de informação particular e que pode não se manter com a aquisição de nova informação.
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