Os factos do direito

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Ferreira, Pedro Tiago da Silva
Data de Publicação: 2016
Tipo de documento: Dissertação
Idioma: por
Título da fonte: Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10451/26146
Resumo: O objetivo deste estudo é lançar e desenvolver um argumento segundo o qual o Direito é totalmente composto por factos. Este argumento não é original, nem tão-pouco desconhecido da generalidade dos autores que se debruçam sobre as temáticas da Teoria e da Filosofia do Direito, mas cremos que algumas das suas características e, naturalmente, das suas implicações ainda não foram satisfatoriamente compreendidas, o que se deve, no nosso entender, em parte ao facto de as bases para um entendimento ontológico do Direito como sendo uma realidade completamente factual não serem especificamente jurídicas. Dito por outras palavras, é a partir do trabalho de autores que não se debruçam diretamente sobre o Direito que se começa a perceber não que o Direito não pode ser separado daquilo a que tradicionalmente se chama «matéria de facto», mas sim que o Direito é, considerado em si mesmo, facto. Ora, a diferença entre uma conceção do Direito como sendo inseparável dos factos, tese que uma fação importante de autores pós-positivistas não tem dificuldade em reconhecer, e uma conceção do Direito como sendo, efetivamente, facto, não consiste nem numa subtileza, nem num mero jogo terminológico. Este trabalho é dedicado, precisamente, a elucidar esta diferença entre ambas as conceções sem, no entanto, recorrer a um método comparativo, ou seja, a exposição não consistirá numa avaliação dos méritos de cada uma das conceções com o intuito de demonstrar as razões pelas quais a segunda é melhor do que a primeira. Pelo contrário, toda a exposição assume que conceber o Direito como facto explica cabalmente a natureza do Direito, e é um ponto de partida para discutir outros detalhes filosoficamente obscuros da realidade jurídica, e, por isso, encetamos uma análise dos pressupostos sob os quais a conceção do Direito como sendo uma realidade integralmente factual assenta. Esses pressupostos passam, em primeiro lugar, por debater a natureza do conceito designado através do termo «facto». O Capítulo 1 é dedicado a factos brutos e ao papel que a intenção desempenha quando o facto bruto seja resultado da produção de um ato físico voluntário. O Capítulo 2 debruça-se sobre factos mentais. Esta distinção demonstra, desde já, que arguir que todo o Direito é facto não implica defender qualquer tese niilista contra a possibilidade de existência de uma realidade normativa. Pelo contrário, essa realidade normativa encontra-se muito presente na vida do Direito, mas, ao contrário do que é assumido e entendido pela maioria dos autores, não é uma realidade do dever-ser, uma espécie de tertium genus entre o factual e o ficcional. O normativo é uma valência do factual, inserindo-se na categoria de factos mentais. No Capítulo 2 esclarecemos igualmente em que circunstâncias é que certos factos mentais, como regras jurídicas, poderão pertencer ao domínio do dever-ser, mas uma das coisas que pretendemos demonstrar ao longo do argumento é que factos mentais, tomados em si mesmos, são realidades da ordem do ser, e não do dever-ser. Distinguidos os tipos de factos mais importantes para a vida do Direito, no Capítulo 3 desenvolvemos um argumento segundo o qual o pensamento humano debruça-se metodologicamente de igual forma sobre todo o tipo de factos, brutos ou mentais. Este argumento é importante porque os juristas, académicos e praticantes, pensam o Direito de forma unitária, ou seja, é nossa contenção que, independentemente de qual a sua conceção da natureza do Direito, todos os juristas tratam aquilo que é tradicionalmente designado pela expressão «matéria de facto» da mesma forma, e com o mesmo rigor, com que tratam aquilo que é tradicionalmente designado através da expressão «matéria de Direito». Isto significa não que põem o mesmo empenho no apuramento dos factos brutos relevantes para o caso concreto que põem na interpretação de certos factos institucionais como as regras jurídicas (este grau de empenho depende do zelo profissional de cada um), mas sim que, para se resolver uma questão de Direito, o tipo de pensamento analítico que há que encetar sobre a «matéria de facto» é idêntico ao que incide sobre a «matéria de Direito». Conceber todo o Direito como sendo facto, bruto e mental, implica demonstrar que a forma que os seres humanos têm de pensar sobre estes dois tipos de factos é idêntica. O Capítulo 4 é uma exploração, com algum detalhe, de uma circunstância resultante do corolário do argumento do Capítulo 3; na medida em que pensamos sobre factos brutos e mentais da mesma forma, a maneira através da qual elucidamos o significado de termos concretos e abstratos é, também, idêntica entre si. O argumento apresentado neste Capítulo é importante porque ajuda a explicar as razões pelas quais algumas das definições atualmente existentes de termos e expressões jurídicos são deficitárias, apontando o caminho que, no nosso entender, deve ser seguido para se elucidar convenientemente os termos e expressões que fazem parte do vocabulário jurídico, ao mesmo tempo que distingue entre termos e expressões que cumprem o seu papel característico em conclusões de Direito e termos e expressões cujo papel característico aparece na descrição de factos institucionais. O Capítulo 5, não sendo uma conclusão (algo que, de resto, aparece após esse mesmo Capítulo), pretende ser um capítulo aglutinador das várias linhas de pensamento desenvolvidas nos quatro Capítulos anteriores, propondo uma conceção de «norma jurídica» que, no nosso entender, não é totalmente original, embora os moldes em que a mesma é exposta o sejam porque a mesma efetua um corte radical entre regra legal, ou consuetudinária, por exemplo, e norma jurídica, que tem como característica principal, de acordo com a conceção avançada, o ser sempre individual e concreta e criada por quem tenha a responsabilidade de tomar um ato de decisão jurídico. Com efeito, somos da opinião de que «regra» e «norma» não devem ser usados como sinónimos, mas sim como termos de arte que distingam entre uma injunção ou permissão retirada de uma fonte do Direito e uma declaração que diga, numa situação concreta, a que é que determinado indivíduo se encontra adstrito, i.e., que conduta é que deve realizar tendo em conta a sua situação concreta.
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Ora, a diferença entre uma conceção do Direito como sendo inseparável dos factos, tese que uma fação importante de autores pós-positivistas não tem dificuldade em reconhecer, e uma conceção do Direito como sendo, efetivamente, facto, não consiste nem numa subtileza, nem num mero jogo terminológico. Este trabalho é dedicado, precisamente, a elucidar esta diferença entre ambas as conceções sem, no entanto, recorrer a um método comparativo, ou seja, a exposição não consistirá numa avaliação dos méritos de cada uma das conceções com o intuito de demonstrar as razões pelas quais a segunda é melhor do que a primeira. Pelo contrário, toda a exposição assume que conceber o Direito como facto explica cabalmente a natureza do Direito, e é um ponto de partida para discutir outros detalhes filosoficamente obscuros da realidade jurídica, e, por isso, encetamos uma análise dos pressupostos sob os quais a conceção do Direito como sendo uma realidade integralmente factual assenta. Esses pressupostos passam, em primeiro lugar, por debater a natureza do conceito designado através do termo «facto». O Capítulo 1 é dedicado a factos brutos e ao papel que a intenção desempenha quando o facto bruto seja resultado da produção de um ato físico voluntário. O Capítulo 2 debruça-se sobre factos mentais. Esta distinção demonstra, desde já, que arguir que todo o Direito é facto não implica defender qualquer tese niilista contra a possibilidade de existência de uma realidade normativa. Pelo contrário, essa realidade normativa encontra-se muito presente na vida do Direito, mas, ao contrário do que é assumido e entendido pela maioria dos autores, não é uma realidade do dever-ser, uma espécie de tertium genus entre o factual e o ficcional. O normativo é uma valência do factual, inserindo-se na categoria de factos mentais. No Capítulo 2 esclarecemos igualmente em que circunstâncias é que certos factos mentais, como regras jurídicas, poderão pertencer ao domínio do dever-ser, mas uma das coisas que pretendemos demonstrar ao longo do argumento é que factos mentais, tomados em si mesmos, são realidades da ordem do ser, e não do dever-ser. Distinguidos os tipos de factos mais importantes para a vida do Direito, no Capítulo 3 desenvolvemos um argumento segundo o qual o pensamento humano debruça-se metodologicamente de igual forma sobre todo o tipo de factos, brutos ou mentais. Este argumento é importante porque os juristas, académicos e praticantes, pensam o Direito de forma unitária, ou seja, é nossa contenção que, independentemente de qual a sua conceção da natureza do Direito, todos os juristas tratam aquilo que é tradicionalmente designado pela expressão «matéria de facto» da mesma forma, e com o mesmo rigor, com que tratam aquilo que é tradicionalmente designado através da expressão «matéria de Direito». Isto significa não que põem o mesmo empenho no apuramento dos factos brutos relevantes para o caso concreto que põem na interpretação de certos factos institucionais como as regras jurídicas (este grau de empenho depende do zelo profissional de cada um), mas sim que, para se resolver uma questão de Direito, o tipo de pensamento analítico que há que encetar sobre a «matéria de facto» é idêntico ao que incide sobre a «matéria de Direito». Conceber todo o Direito como sendo facto, bruto e mental, implica demonstrar que a forma que os seres humanos têm de pensar sobre estes dois tipos de factos é idêntica. O Capítulo 4 é uma exploração, com algum detalhe, de uma circunstância resultante do corolário do argumento do Capítulo 3; na medida em que pensamos sobre factos brutos e mentais da mesma forma, a maneira através da qual elucidamos o significado de termos concretos e abstratos é, também, idêntica entre si. O argumento apresentado neste Capítulo é importante porque ajuda a explicar as razões pelas quais algumas das definições atualmente existentes de termos e expressões jurídicos são deficitárias, apontando o caminho que, no nosso entender, deve ser seguido para se elucidar convenientemente os termos e expressões que fazem parte do vocabulário jurídico, ao mesmo tempo que distingue entre termos e expressões que cumprem o seu papel característico em conclusões de Direito e termos e expressões cujo papel característico aparece na descrição de factos institucionais. O Capítulo 5, não sendo uma conclusão (algo que, de resto, aparece após esse mesmo Capítulo), pretende ser um capítulo aglutinador das várias linhas de pensamento desenvolvidas nos quatro Capítulos anteriores, propondo uma conceção de «norma jurídica» que, no nosso entender, não é totalmente original, embora os moldes em que a mesma é exposta o sejam porque a mesma efetua um corte radical entre regra legal, ou consuetudinária, por exemplo, e norma jurídica, que tem como característica principal, de acordo com a conceção avançada, o ser sempre individual e concreta e criada por quem tenha a responsabilidade de tomar um ato de decisão jurídico. Com efeito, somos da opinião de que «regra» e «norma» não devem ser usados como sinónimos, mas sim como termos de arte que distingam entre uma injunção ou permissão retirada de uma fonte do Direito e uma declaração que diga, numa situação concreta, a que é que determinado indivíduo se encontra adstrito, i.e., que conduta é que deve realizar tendo em conta a sua situação concreta.This essay’s goal is to develop the following idea: law is a factual reality in its entirety. This hypothesis is neither original nor unknown amongst the authors who write on legal theory and legal philosophy, but I believe that some of its features and implications have not been satisfactorily understood so far, which may have to do with the fact that the bases for an ontological understanding of law as a completely factual reality are not specifically juridical. In other words, it is from the work of authors whose concerns are not directly legal that one comes to understand not so much that law cannot be separated from what is traditionally known as ‘matter of fact’ but that law is, in itself, fact. Now, the difference between a conception of law as inseparable from facts, a hypothesis acknowledged by most post-positivistic authors, and a conception of law as being, in itself, fact, is not a mere terminological difference. This work intends to elucidate this difference without, however, using a comparative method. This means that the argument of this essay is not built by comparing the relative merits of each of the two conceptions of law abovementioned with the intention of showing why the latter is better than the former. In fact, I assume throughout the essay that conceiving law as fact thoroughly explains the nature of law, which is a good starting point to discuss other somewhat philosophically obscure details of legal reality. For this reason, the argument unfolds through an analysis of the foundations over which the conception of law as a factual reality is based. First off, it is necessary to shed some light on the nature of the concept designated by the term ‘fact’. Chapter 1 is dedicated to brute facts and to the role performed by intention whenever the brute fact in question comes about as the result of a voluntary physical act. Chapter 2 is about mental facts. This distinction shows that arguing for a conception of law as fact does not entail a nihilist hypothesis against normative reality. On the contrary, normative reality is part and parcel of the life of the law but it is not in itself an ought, unlike what is assumed by most authors, who tend to fit the law in between the factual and the fictional. Both the normative and the mental are part of the factual. Chapter 2 is also devoted to a discussion of the circumstances in which certain mental facts, as, for instance, legal rules, may be considered as an ought, despite the fact that, in themselves, mental facts are an is, not an ought. After making these distinctions concerning the most important kinds of fact for the life of the law, I present, in chapter 3, an argument according to which human thought is methodologically the same regarding every kind of fact. This argument is important for the aim of this essay because it outlines the reasons why lawyers and jurists do not think about law and fact in a distinct way. In other words, the type of thinking one has to do regarding what is traditionally called ‘matter of fact’ is undistinguishable from the type of thinking that is to be done concerning what is traditionally referred to as ‘matter of law’. This means that the sort of analytical thought which is necessary to decide a legal question is the same for both the factual and the legal parts of the legal question. To conceive the law as being utterly fact, both brute and mental, implies showing that the way human beings think about these two kinds of fact is identical. Chapter 4 explores a circumstance which results from the corollary of the argument presented in chapter 3, namely that, since we all think about brute and mental facts in the same way, we necessarily elucidate the meaning of concrete and abstract terms in the same way as well. The argument outlined in this chapter is important because it helps to explain the reasons why some of the currently existing definitions of legal terms and expressions are inadequate. The argument aims, furthermore, to point the way that should be followed in order to conveniently elucidate legal terms and expressions, as well as distinguishing between terms and expressions that play a characteristic role in conclusions of law and terms and expressions whose characteristic role is played by describing institutional facts. Chapter 5 gathers all trains of thought developed throughout the essay while proposing a conception of ‘legal norm’ which, in my opinion, is not completely original, although some of its features are because it clearly separates, in a somewhat novel may, legal rules, customary rules and legal norms. According to the conception of norm introduced in this chapter, the legal norm is always individual and concrete, and is created by whoever has the responsibility of taking a legal act of decision. This means that, contrary to the current accepted linguistic usage, the terms ‘rule’ and ‘norm’ should not be employed as synonyms, but as terms of art capable of distinguishing between an enjoinment or a permission derived from one of the traditional sources of law and a statement which says, in a concrete situation, what it is that an individual is bound to, i.e. which conduct they ought to follow considering their concrete situation.Branco, Susana Antas Fernandes VideiraRepositório da Universidade de LisboaFerreira, Pedro Tiago da Silva2017-01-23T19:27:47Z2016-12-152016-12-15T00:00:00Zinfo:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/masterThesisapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/10451/26146porinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2023-11-08T16:16:06Zoai:repositorio.ul.pt:10451/26146Portal AgregadorONGhttps://www.rcaap.pt/oai/openaireopendoar:71602024-03-19T21:42:54.097492Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) - Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãofalse
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Esses pressupostos passam, em primeiro lugar, por debater a natureza do conceito designado através do termo «facto». O Capítulo 1 é dedicado a factos brutos e ao papel que a intenção desempenha quando o facto bruto seja resultado da produção de um ato físico voluntário. O Capítulo 2 debruça-se sobre factos mentais. Esta distinção demonstra, desde já, que arguir que todo o Direito é facto não implica defender qualquer tese niilista contra a possibilidade de existência de uma realidade normativa. Pelo contrário, essa realidade normativa encontra-se muito presente na vida do Direito, mas, ao contrário do que é assumido e entendido pela maioria dos autores, não é uma realidade do dever-ser, uma espécie de tertium genus entre o factual e o ficcional. O normativo é uma valência do factual, inserindo-se na categoria de factos mentais. No Capítulo 2 esclarecemos igualmente em que circunstâncias é que certos factos mentais, como regras jurídicas, poderão pertencer ao domínio do dever-ser, mas uma das coisas que pretendemos demonstrar ao longo do argumento é que factos mentais, tomados em si mesmos, são realidades da ordem do ser, e não do dever-ser. Distinguidos os tipos de factos mais importantes para a vida do Direito, no Capítulo 3 desenvolvemos um argumento segundo o qual o pensamento humano debruça-se metodologicamente de igual forma sobre todo o tipo de factos, brutos ou mentais. Este argumento é importante porque os juristas, académicos e praticantes, pensam o Direito de forma unitária, ou seja, é nossa contenção que, independentemente de qual a sua conceção da natureza do Direito, todos os juristas tratam aquilo que é tradicionalmente designado pela expressão «matéria de facto» da mesma forma, e com o mesmo rigor, com que tratam aquilo que é tradicionalmente designado através da expressão «matéria de Direito». Isto significa não que põem o mesmo empenho no apuramento dos factos brutos relevantes para o caso concreto que põem na interpretação de certos factos institucionais como as regras jurídicas (este grau de empenho depende do zelo profissional de cada um), mas sim que, para se resolver uma questão de Direito, o tipo de pensamento analítico que há que encetar sobre a «matéria de facto» é idêntico ao que incide sobre a «matéria de Direito». Conceber todo o Direito como sendo facto, bruto e mental, implica demonstrar que a forma que os seres humanos têm de pensar sobre estes dois tipos de factos é idêntica. O Capítulo 4 é uma exploração, com algum detalhe, de uma circunstância resultante do corolário do argumento do Capítulo 3; na medida em que pensamos sobre factos brutos e mentais da mesma forma, a maneira através da qual elucidamos o significado de termos concretos e abstratos é, também, idêntica entre si. O argumento apresentado neste Capítulo é importante porque ajuda a explicar as razões pelas quais algumas das definições atualmente existentes de termos e expressões jurídicos são deficitárias, apontando o caminho que, no nosso entender, deve ser seguido para se elucidar convenientemente os termos e expressões que fazem parte do vocabulário jurídico, ao mesmo tempo que distingue entre termos e expressões que cumprem o seu papel característico em conclusões de Direito e termos e expressões cujo papel característico aparece na descrição de factos institucionais. O Capítulo 5, não sendo uma conclusão (algo que, de resto, aparece após esse mesmo Capítulo), pretende ser um capítulo aglutinador das várias linhas de pensamento desenvolvidas nos quatro Capítulos anteriores, propondo uma conceção de «norma jurídica» que, no nosso entender, não é totalmente original, embora os moldes em que a mesma é exposta o sejam porque a mesma efetua um corte radical entre regra legal, ou consuetudinária, por exemplo, e norma jurídica, que tem como característica principal, de acordo com a conceção avançada, o ser sempre individual e concreta e criada por quem tenha a responsabilidade de tomar um ato de decisão jurídico. Com efeito, somos da opinião de que «regra» e «norma» não devem ser usados como sinónimos, mas sim como termos de arte que distingam entre uma injunção ou permissão retirada de uma fonte do Direito e uma declaração que diga, numa situação concreta, a que é que determinado indivíduo se encontra adstrito, i.e., que conduta é que deve realizar tendo em conta a sua situação concreta.
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