A protecção ao nascituro na Constituição, na legislação ordinária e na moderna jurisprudência portuguesa e brasileira: Análise comparativa
Autor(a) principal: | |
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Data de Publicação: | 2015 |
Outros Autores: | |
Tipo de documento: | Artigo |
Idioma: | por |
Título da fonte: | Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos) |
Texto Completo: | http://hdl.handle.net/11328/1385 |
Resumo: | O Código Civil português determina que a personalidade jurídica se adquire no momento do nascimento completo e com vida e, no que respeita à capacidade jurídica ou capacidade de gozo (por contraposição à capacidade de exercício, que se adquire com a maioridade), prescreve que esta consiste na suscetibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito de direitos e obrigações. O ordenamento jurídico português confere alguma proteção ao nascituro – e até ao concepturo – mas (com exceção das limitações legais à licitude da interrupção voluntária da gravidez), fá-la depender do posterior nascimento completo e com vida. Não obstante, a melhor doutrina portuguesa vem defendendo que a ordem jurídica não pode negar o facto evidente de que, face à realidade biológica, o nascituro e a criança nascida são idênticos. O ordenamento jurídico brasileiro vai muito mais longe do que o luso na proteção ao nascituro. Na verdade, uma interpretação sistemática e evolutiva do texto constitucional brasileiro e dos demais dispositivos infraconstitucionais obriga a concluir que ao ser humano, desde sua concepção, devem ser assegurados o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de o colocar a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. O Código Civil brasileiro, no artigo 2º, dispõe que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, sendo certo que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Neste contexto, é objetivo deste trabalho a análise comparativa acerca da proteção que os ordenamentos jurídicos, português e brasileiro, dão ao nascituro. Propõe-se ainda o cotejo direto entre a jurisprudência dos dois países irmãos, utilizando-se como exemplos o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça brasileiro no recurso especial n° 399.028 - sp (2001/0147319-0), publicado a 23.06.2003, e o proferido Supremo Tribunal de Justiça português a 03.04.2014, no processo 436/07.6TBVRL.P1.S1, 2ª Seção. Em ambos, estava em causa uma indemnização por responsabilidade civil por morte a favor de um nascituro, neles se discutindo, entre outras questões, a respetiva personalidade e capacidade jurídicas. No primeiro dos aludidos arestos o Supremo Tribunal de Justiça brasileiro entendeu que o nascituro também tem direito a uma indemnização por danos morais em consequência da morte do pai, embora a circunstância de não o ter conhecido em vida tenha influência na fixação do quantum. Por sua vez, na citada decisão Supremo Tribunal de Justiça português tomou posição no sentido de que o artigo 66.º, n.º 1, do CC deve ser entendido como referindo-se à capacidade de gozo e não propriamente à personalidade jurídica, uma vez que o reconhecimento da personalidade de seres humanos está fora do alcance e da competência da lei, seja ela ordinária ou constitucional. |
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A protecção ao nascituro na Constituição, na legislação ordinária e na moderna jurisprudência portuguesa e brasileira: Análise comparativaDireitos fundamentaisDireitos de personalidadeCapacidadeProteção do nascituroDanos moraisFundamental rightsPersonalityCapacityUnborn childMoral damagesO Código Civil português determina que a personalidade jurídica se adquire no momento do nascimento completo e com vida e, no que respeita à capacidade jurídica ou capacidade de gozo (por contraposição à capacidade de exercício, que se adquire com a maioridade), prescreve que esta consiste na suscetibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito de direitos e obrigações. O ordenamento jurídico português confere alguma proteção ao nascituro – e até ao concepturo – mas (com exceção das limitações legais à licitude da interrupção voluntária da gravidez), fá-la depender do posterior nascimento completo e com vida. Não obstante, a melhor doutrina portuguesa vem defendendo que a ordem jurídica não pode negar o facto evidente de que, face à realidade biológica, o nascituro e a criança nascida são idênticos. O ordenamento jurídico brasileiro vai muito mais longe do que o luso na proteção ao nascituro. Na verdade, uma interpretação sistemática e evolutiva do texto constitucional brasileiro e dos demais dispositivos infraconstitucionais obriga a concluir que ao ser humano, desde sua concepção, devem ser assegurados o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de o colocar a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. O Código Civil brasileiro, no artigo 2º, dispõe que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, sendo certo que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Neste contexto, é objetivo deste trabalho a análise comparativa acerca da proteção que os ordenamentos jurídicos, português e brasileiro, dão ao nascituro. Propõe-se ainda o cotejo direto entre a jurisprudência dos dois países irmãos, utilizando-se como exemplos o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça brasileiro no recurso especial n° 399.028 - sp (2001/0147319-0), publicado a 23.06.2003, e o proferido Supremo Tribunal de Justiça português a 03.04.2014, no processo 436/07.6TBVRL.P1.S1, 2ª Seção. Em ambos, estava em causa uma indemnização por responsabilidade civil por morte a favor de um nascituro, neles se discutindo, entre outras questões, a respetiva personalidade e capacidade jurídicas. No primeiro dos aludidos arestos o Supremo Tribunal de Justiça brasileiro entendeu que o nascituro também tem direito a uma indemnização por danos morais em consequência da morte do pai, embora a circunstância de não o ter conhecido em vida tenha influência na fixação do quantum. Por sua vez, na citada decisão Supremo Tribunal de Justiça português tomou posição no sentido de que o artigo 66.º, n.º 1, do CC deve ser entendido como referindo-se à capacidade de gozo e não propriamente à personalidade jurídica, uma vez que o reconhecimento da personalidade de seres humanos está fora do alcance e da competência da lei, seja ela ordinária ou constitucional.According to the Portuguese Civil Code, one is a person only the moment one is born. With birth, that is complete separation from one’s mother, and provided one is not stillborn, the law recognizes one’s personality, one’s ability to be the subject of rights and obligations. The Portuguese law does provide some protection to the unborn child - and in very specific cases even to a child that has yet to be conceived - - but (with the possible exception of limitations to the legality of abortion), this protection is dependent on the subsequent birth with life. Nevertheless, the best Portuguese doctrine has advocated that the law cannot deny the obvious fact that the unborn and the born child are biologically identical, and must therefore be accorded identical treatment in the eyes of the law. Brazilian law goes much further than the Portuguese in protecting the unborn child. In fact, a systematic and evolutionary interpretation of the Brazilian Constitution and of infra constitutional law dictates the conclusion that the human being’s rights to health, food, education, leisure, professional training, culture, dignity, respect, freedom, and family and community life, and to be safe from all forms of negligence, discrimination, exploitation, violence, cruelty and oppression should be ensured from conception. According to Article 2 of the Brazilian Civil Code, a person's civil personality also begins with birth, but the provision goes further: it also states that the rights of the unborn are protected from the moment it is conceived. This is the background for what we propose in this paper, i.e., a comparative analysis on the protection both jurisdictions, Portuguese and Brazilian, grant the unborn child. We also propose to make a direct comparison between the case law of the two countries taking as examples the judgment of the Brazilian Superior Court in the special appeal n ° 399 028 - sp (2001 / 0147319-0), published on 23.06.2003 and the decision of the Portuguese Supreme Court of 03.04.2014, in Case 436 / 07.6TBVRL.P1.S1, 2nd Section. In both cases, what was under discussion was the right of a child that had not yet been born at the time their respective fathers died to a compensation for the loss of said parent. In order to reach a decision, both courts had to deal with issues of the unborn child’s personality and legal capacity. In the first of this decisions, the Brazilian Supreme Court easily ruled that the unborn child is also entitled to compensation for moral damages as a result of his father's death, although the fact of not having known in life has influence in determining the quantum. In turn, the Portuguese Supreme Court was more limited by the text of the Civil Code, and decided that Article 66, paragraph 1, should be interpreted as referring to a person’s legal capacity, and not one’s personality, since the recognition of the personality of human beings is beyond the reach and jurisdiction of the Constitution and of ordinary law.Asociación Xuristas en Acción2016-01-19T12:01:59Z2015-01-01T00:00:00Z2015info:eu-repo/semantics/publishedVersioninfo:eu-repo/semantics/articleapplication/pdfhttp://hdl.handle.net/11328/1385por2340-860XMartinez de Campos, MónicaCosta, Eva Diasinfo:eu-repo/semantics/openAccessreponame:Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (Repositórios Cientìficos)instname:Agência para a Sociedade do Conhecimento (UMIC) - FCT - Sociedade da Informaçãoinstacron:RCAAP2023-06-15T02:09:38ZPortal AgregadorONG |
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O Código Civil português determina que a personalidade jurídica se adquire no momento do nascimento completo e com vida e, no que respeita à capacidade jurídica ou capacidade de gozo (por contraposição à capacidade de exercício, que se adquire com a maioridade), prescreve que esta consiste na suscetibilidade de a pessoa jurídica ser sujeito de direitos e obrigações. O ordenamento jurídico português confere alguma proteção ao nascituro – e até ao concepturo – mas (com exceção das limitações legais à licitude da interrupção voluntária da gravidez), fá-la depender do posterior nascimento completo e com vida. Não obstante, a melhor doutrina portuguesa vem defendendo que a ordem jurídica não pode negar o facto evidente de que, face à realidade biológica, o nascituro e a criança nascida são idênticos. O ordenamento jurídico brasileiro vai muito mais longe do que o luso na proteção ao nascituro. Na verdade, uma interpretação sistemática e evolutiva do texto constitucional brasileiro e dos demais dispositivos infraconstitucionais obriga a concluir que ao ser humano, desde sua concepção, devem ser assegurados o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de o colocar a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. O Código Civil brasileiro, no artigo 2º, dispõe que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, sendo certo que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Neste contexto, é objetivo deste trabalho a análise comparativa acerca da proteção que os ordenamentos jurídicos, português e brasileiro, dão ao nascituro. Propõe-se ainda o cotejo direto entre a jurisprudência dos dois países irmãos, utilizando-se como exemplos o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça brasileiro no recurso especial n° 399.028 - sp (2001/0147319-0), publicado a 23.06.2003, e o proferido Supremo Tribunal de Justiça português a 03.04.2014, no processo 436/07.6TBVRL.P1.S1, 2ª Seção. Em ambos, estava em causa uma indemnização por responsabilidade civil por morte a favor de um nascituro, neles se discutindo, entre outras questões, a respetiva personalidade e capacidade jurídicas. No primeiro dos aludidos arestos o Supremo Tribunal de Justiça brasileiro entendeu que o nascituro também tem direito a uma indemnização por danos morais em consequência da morte do pai, embora a circunstância de não o ter conhecido em vida tenha influência na fixação do quantum. Por sua vez, na citada decisão Supremo Tribunal de Justiça português tomou posição no sentido de que o artigo 66.º, n.º 1, do CC deve ser entendido como referindo-se à capacidade de gozo e não propriamente à personalidade jurídica, uma vez que o reconhecimento da personalidade de seres humanos está fora do alcance e da competência da lei, seja ela ordinária ou constitucional. |
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